Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 115/2021
PROPONENTE : Ver. Alex Medeiros
     
PARECER : Nº 230/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera os artigos 159 e 171 da Lei municipal n˚ 194/1973 “Lei que institui o Código de Obras do Município de Guaíba”"

1. Relatório:

Veio ao exame desta Procuradoria o Projeto de Lei do Legislativo nº 115/2021, apresentado pelo Vereador Alex Medeiros (PP), o qual “Altera os artigos 159 e 171 da Lei municipal n˚ 194/1973 “Lei que institui o Código de Obras do Município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal.

2. MÉRITO:

Preliminarmente, constata-se que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

 IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Leciona Alexandre de Moraes que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 115/2021, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), visa regular matéria relativa ao exercício de polícia administrativa em âmbito local, especificamente com a alteração de normas previstas no Código de Obras do Município de Guaíba que regulam as habitações populares (art. 159) e que regulam a obrigatoriedade de instalação de elevadores.

Além disso, a CE/RS, no artigo 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais”.

No presente caso, a medida está realmente inserida no âmbito do planejamento e ordenamento municipal, especificamente no controle da construção e edificação, controle e fiscalização do espaço construído, cuja competência para definição é do Município. O poder de polícia, no magistério de Hely Lopes Meirelles é a “faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”, estando limitado seu exercício através da “Constituição Federal, de seus princípios e da lei”.[1]

A própria Constituição Federal garante tal prerrogativa aos entes municipais em seu artigo 174, caput, in verbis:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

No mesmo sentido estabelece a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, no seu artigo 13, inciso I, anteriormente citado:

Art. 13. É competência do Município, além da prevista na Constituição Federal e ressalvada a do Estado:

I – exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais;

(...)

IX - promover a acessibilidade nas edificações e logradouros de uso público e seus entornos, bem como a adaptação dos transportes coletivos, para permitir o acesso das pessoas portadoras de deficiências ou com mobilidade reduzida. (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 56, de 03/04/08)

Com efeito, cumpre observar que consoante a lição do doutrinador Hely Lopes Meirelles, as atribuições municipais no campo urbanístico desdobram-se em dois setores distintos: "o da ordenação espacial, que se consubstancia no plano diretor e nas normas de uso, parcelamento e ocupação do solo urbano e urbanizável, abrangendo o zoneamento, o loteamento e a composição estética e paisagística da cidade; e o controle da construção, incidindo sobre o traçado urbano, os equipamentos sociais, até a edificação particular nos seus requisitos funcionais e estéticos, expressos no Código de Obras e normas complementares". (in Direito Municipal Brasileiro, 6ª ed., Malheiros Editores, pág. 392).

A matéria de fundo diz respeito ao Código de Obras, conceituado como um conjunto de normas onde se encontram definidas regras que visam garantir a segurança, salubridade e acessibilidade das edificações, possibilitando que a administração municipal controle e fiscalize o espaço construído e seu entorno.

Destarte, do ponto de vista da competência, a proposição encontra amparo no ordenamento jurídico e na repartição constitucional de competências entre os entes federados, encontrando amparo no art. 30, inciso I, da Constituição Federal, bem como no exercício do poder de polícia relativo às construções, ou à polícia edilícia, a qual decorre do art. 30, inciso VIII, da Constituição Federal.

Quanto à iniciativa, o E. STF assentou o entendimento de que “A matéria respeitante a loteamento, uso e ocupação do solo urbano, zoneamento, construções e edificações é da iniciativa legislativa concorrente.” (STF, RE 218.110-SP), cabendo a iniciativa parlamentar:

Ementa: “Recurso extraordinário. Ação direta de inconstitucionalidade contra lei municipal, dispondo sobre matéria tida como tema contemplado no art. 30, VIII, da Constituição Federal, da competência dos Municípios. 2. Inexiste norma que confira a Chefe do Poder Executivo municipal a exclusividade de iniciativa relativamente à matéria objeto do diploma legal impugnado. Matéria de competência concorrente. Inexistência de invasão da esfera de atribuições do Executivo municipal. 3. Recurso extraordinário não conhecido” (STF, RE 218.110-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Néri da Silveira, 02-04-2002, v.u., DJ 17-05-2002, p. 73).

Portanto, constitucionais os textos normativos cuja iniciativa do processo legislativo deu-se no âmbito do Poder Legislativo e que digam respeito ao loteamento, uso e ocupação do solo urbano, zoneamento, construções e edificações, desde que não determinem atribuições aos órgãos da administração municipal de maneira a afrontar o princípio da separação e independência entre os poderes insculpido no artigo 10 da Carta Estadual. É esta a interpretação do Supremo Tribunal Federal no acórdão a seguir ementado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 742.532 SÃO PAULO. CONSTITUCIONAL. LEI MUNICIPAL (Código de Obras e Edificações): OBRIGATORIEDADE DE PRÉDIOS COMERCIAIS DISPOREM DE FRALDÁRIOS. INEXISTÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO PRINCÍPIO DA RESERVA DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.

(...)

Não há na Lei Complementar n. 475/2009, de iniciativa parlamentar, regulamentação de matéria outorgada ao Chefe do Poder Executivo pela Constituição da República. Assim, não se há cogitar de afronta ao princípio da independência e harmonia dos Poderes.

                       

Foi nesse sentido também o teor do parecer da Procuradoria-Geral da República quando do julgamento do RE 742.532, acolhido em seus fundamentos pelo STF:

“O único fundamento para o Tribunal de Justiça declarar a inconstitucionalidade da norma residiu no que entendeu se tratar de invasão da reserva de iniciativa do Chefe do Executivo municipal. A apreciação da controvérsia, desse modo, beneficia-se do entendimento assentado no Supremo Tribunal Federal de que ‘a iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que - por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo - deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca’ (ADI 724 MC, rel. o Ministro Celso de Mello, DJ 27-04- 2001). Por isso, também, tem sido reiterado que ‘não procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá ser proposto pelo Chefe do Executivo’ (ADI 3.394, rel. o Ministro Eros Grau, DJe 15.8.2008) e que, ‘se se entender que qualquer dispositivo que interfira no orçamento fere a iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo para lei orçamentária, não será possível legislar’ (ADI 2.072-MC, rel. o Ministro Moreira Alves, DJ 19.9.2003). Não há, no plano federal, exclusividade de iniciativa em tema de exigências para edificações e obras. A lei, a par disso, não permite supor que ocasione alteração alguma na ordem burocrática do Município, tampouco importa direto dispêndio de recursos públicos. Não se positiva, por certo, hipótese em que, em face do princípio da similitude com o modelo federal de processo legislativo, a iniciativa da lei impugnada estivesse reservada ao Prefeito. Insubsistente a causa de inconstitucionalidade apontada no acórdão recorrido, o parecer é pelo provimento do recurso” (fls. 195- 196).

Ressalta-se, ademais, a exigência de ampla divulgação por meio de Audiência Pública[2] da presente proposição conforme exige a Lei Orgânica Municipal em seu artigo 46, I, já que pretende alterar o Código de Obras Municipal, e, ainda, a necessidade de aprovação por maioria absoluta dos membros da Casa Legislativa, já que se trata de matéria reservada a Lei Complementar.

Anote-se, ademais, que o Estatuto da Cidade (Lei Federal n.° 10.257, de 10 de julho de 2001) estabelece um processo amplamente participativo da população e de associações representativas dos vários segmentos sociais e econômicos durante a implementação de normas e diretrizes relativas ao desenvolvimento urbano:

Art. 2°. A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

[...]

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE– LEI COMPLEMENTAR DISCIPLINANDO O USO E OCUPAÇÃO DO SOLO – PROCESSO LEGISLATIVO SUBMETIDO À PARTICIPAÇÃO POPULAR – VOTAÇÃO, CONTUDO, DE PROJETO SUBSTITUTIVO QUE, A DESPEITO DE ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS DO PROJETO INICIAL, NÃO FOI LEVADO AO CONHECIMENTO DOS MUNÍCIPES – VÍCIO INSANÁVEL – INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA. ‘O projeto de lei apresentado para apreciação popular atendia aos interesses da comunidade local, que atuava ativamente a ponto de formalizar pedido exigindo o direito de participar em audiência pública. Nada obstante, a manobra política adotada subtraiu dos interessados a possibilidade de discutir assunto local que lhes era concernente, causando surpresa e indignação. Cumpre ressaltar que a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com ideias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhe expõem os interesses envolvidos e a consequências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta.

Inclusive, o TJRS já declarou a inconstitucionalidade formal de lei municipal que, ao alterar o Plano Diretor (matéria análoga ao PLL ora em análise), deixou de oportunizar a participação popular na discussão da proposta:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 2.960/16, DO MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO, A QUAL ALTERA A REDAÇÃO DA LEI INSTITUIDORA DO PLANO DIRETOR DE DESENVOLVIMENTO URBANO DO MUNICÍPIO. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO. AUSÊNCIA DA OBRIGATÓRIA PARTICIPAÇÃO POPULAR PARA DISCUSSÃO ACERCA DO PLANO DIRETOR. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. A lei municipal objeto da presente ação direta de inconstitucionalidade padece de vício formal, pois alterou a lei instituidora do plano diretor de desenvolvimento urbano do Município sem observar o regular processo legislativo, que deve assegurar a participação popular na definição do plano diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, nos termos do preceito constante no art. 177, § 5º, da Constituição Estadual. Da mesma forma, restou violada a regra disposta no art. 29, inc. XII, da Constituição Federal, que determina a cooperação das associações representativas no planejamento municipal, norma de observância obrigatória pelos Municípios. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70072802689, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angela Terezinha de Oliveira Brito, Julgado em: 11-12-2017)

Cabe ressaltar, ademais, que sob o ponto de vista material, cabe ressaltar que todas as leis (sejam municipais, estaduais ou federais) devem obedecer a algumas regras, que viabilizem, do ponto de vista formal, o seu trâmite legislativo. A realização de estudos técnicos em projetos de alteração de edificações e obras encontra fundamento no princípio do paralelismo de formas, que determina que os mesmos pressupostos utilizados para a elaboração de um instituto também deverão ser utilizados para sua alteração ou extinção.

O uso do paralelismo para exigência de estudos técnicos já foi objeto de decisões dos Tribunais pátrios, que diversas vezes utilizaram esse princípio para declarar a inconstitucionalidade de leis municipais que tratavam de planejamento urbanístico e elaboradas sem estudos técnicos:

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal 11.810 de 09.10.18, dispondo sobre as regras específicas a serem observadas no projeto, no licenciamento, na execução, na manutenção e na utilização de contêineres como residências ou estabelecimentos comerciais de qualquer natureza. Vício de iniciativa. Inocorrência. Iniciativa legislativa comum. Recente orientação do Eg. Supremo Tribunal Federal. Causa petendi aberta. Possível análise de outros aspectos constitucionais da questão. Falta de participação popular. Imprescindível a efetiva participação da comunidade, por suas entidades representativas. A Constituição Estadual prevê a necessidade de participação comunitária em matéria urbanística. Precedentes deste WWF-BRASIL 2020 C. Órgão Especial. Inconstitucional o ato normativo impugnado. Estudo prévio. Necessidade. Se no âmbito do Executivo esse planejamento ou prévios estudos se fazem necessários, de igual forma se justificam idênticas medidas para modificar a regra original. Precedentes. Procedente a ação.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Leis n°s. 11.764/2003, 11.878/2004 e 12.162/2004, do município de Campinas - Legislações, de iniciativa parlamentar, que alteram regras de zoneamento em determinadas áreas da cidade - Impossibilidade - Planejamento urbano - Uso e ocupação do solo - Inobservância de disposições constitucionais - Ausente participação da comunidade, bem como prévio estudo técnico que indicasse os benefícios e eventuais prejuízos com a aplicação da medida - Necessidade manifesta em matéria de uso do espaço urbano, independentemente de compatibilidade com plano diretor - Respeito ao pacto federativo com a obediência a essas exigências - Ofensa ao princípio da impessoalidade - Afronta, outrossim, ao princípio da separação dos Poderes - Matéria de cunho eminentemente administrativo - Leis dispuseram sobre situações concretas, concernentes à organização administrativa - Ação direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade das normas.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADIN. MUNICÍPIO DE VIÇOSA. LEIS MUNICIPAIS N° 2.136/2011 E 2.139/2011. ALTERAÇÃO DAS REGRAS DE ZONEAMENTO URBANO. AUSÊNCIA DE ESTUDOS TÉCNICOS E AUDIÊNCIA PÚBLICA. INOBSERVÂNCIA DE DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS. (TJ-MG; 1.0000.13.063910-7/000; Relator do Acórdão: Des.(a) Antônio Sérvulo Data do Julgamento: 26/02/2014)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI 5.780, DE 26 DE FEVEREIRO DE 2019, DO MUNICÍPIO DE VALINHOS, QUE DISPÕE SOBRE A INSTALAÇÃO DOS SISTEMAS DENOMINADOS "TELHADO VERDE" E "JARDIM VERTICAL" - NORMA DE INICIATIVA PARLAMENTAR – OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E VÍCIO DE INICIATIVA – NÃO CARACTERIZAÇÃO - MATÉRIA RELACIONADA AO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO URBANO QUE EXIGE PRÉVIO ESTUDO TÉCNICO E PARTICIPAÇÃO POPULAR – INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 180, II E 191, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – AÇÃO PROCEDENTE. (TJSP; Direta de Inconstitucionalidade 2103283-44.2019.8.26.0000; Relator (a): Ferraz de Arruda; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 11/09/2019; Data de Registro: 16/09/2019)

TJ-ES. Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade – Lei nº 3.449⁄2012 do Município de Guarapari⁄ES, que estabelece normas e autoriza o município a conceder direito real de uso resolúvel de áreas públicas e loteamentos fechados - Lei que não foi precedida de estudos técnicos e de audiências públicas - Alteração do Plano Diretor Urbano - Processo Legislativo – Inobservância do princípio da democracia participativa - Ausência de participação da sociedade civil - Violação do princípio da democracia - Ação Direta julgada procedente – Declaração de inconstitucionalidade – Efeitos ex tunc. ADI 00068277220168080000. Órgão Julgador. Tribunal Pleno. Relator Adalto Dias Tristão. Publicação 24/02/2017. Julgamento 16 de Fevereiro de 2017.

 Ainda em relação à matéria de fundo, especificamente a alteração do art. 171, contata-se que a Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida prevê a necessidade de especificações técnicas e de projeto que facilitem a instalação de um elevador adaptado, devendo os demais elementos de uso comum destes edifícios atender aos requisitos de acessibilidade:

 Art. 14. Os edifícios a serem construídos com mais de um pavimento além do pavimento de acesso, à exceção das habitações unifamiliares, e que não estejam obrigados à instalação de elevador, deverão dispor de especificações técnicas e de projeto que facilitem a instalação de um elevador adaptado, devendo os demais elementos de uso comum destes edifícios atender aos requisitos de acessibilidade.

No mesmo sentido o Decreto Federal nº 5.296 de 2 de dezembro de 2004, que regulamenta as Leis nº 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e a referida Lei nº 10.098/2000:

Art. 27 (...)

§ 3º  Os edifícios a serem construídos com mais de um pavimento além do pavimento de acesso, à exceção das habitações unifamiliares e daquelas que estejam obrigadas à instalação de elevadores por legislação municipal, deverão dispor de especificações técnicas e de projeto que facilitem a instalação de equipamento eletromecânico de deslocamento vertical para uso das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Art. 28.  Na habitação de interesse social, deverão ser promovidas as seguintes ações para assegurar as condições de acessibilidade dos empreendimentos:

IV - elaboração de especificações técnicas de projeto que facilite a instalação de elevador adaptado para uso das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Infere-se, diante desses fundamentos, que a pretendida alteração do Código de Obras de Guaíba é possível, desde que com o devido planejamento, lastreado em estudos técnicos, sob pena de o projeto vir a prover uma lei, caso durante a sua tramitação isso não ocorra devidamente, substancialmente inconstitucional por patente violação ao princípio do planejamento, o qual circunda qualquer norma de cunho urbanístico.

Necessária a correção das disposições previstas na alteração do art. 171, já que a redação “até 5 pavimentos” vai em sentido contrário ao que se extrai da justificativa do Projeto. A redação do PLL estabeleceria que as edificações com até 5 pavimentos fossem obrigatoriamente servidas por elevadores, o que não parece ser o objetivo da proposta.

[1] Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 34. Ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 133 e 137.

[2] FERNANDES, Edésio. Direito urbanístico. 1. ed. Belo Horizonte: Del Rey, p. 61.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 115/2021, de autoria do Vereador Alex Medeiros (PP), por inexistirem óbices de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, observada a necessidade de ampla participação popular através de audiências públicas e que da realização dos necessários estudos técnicos, requisitos indispensáveis à legalidade da propositura legislativa, além da necessidade de correção da alteração do art. 171 do Código de Obras, visto que da forma que se encontra redigido o Projeto estabeleceria que as edificações com até 5 pavimentos fossem obrigatoriamente servidas por elevadores, o que não parece ser o objetivo da proposta.

É o parecer.

Guaíba, 16 de julho de 2021.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:
ICP-BrasilFERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS:01902836022
16/07/2021 11:43:01
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 16/07/2021 ás 11:42:24. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação f523a728a17e188f8c80b69539af42dd.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 95414.