Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 099/2021
PROPONENTE : Ver. Tiago Green
     
PARECER : Nº 204/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Acrescenta o artigo 103-A ao Código de Posturas de Guaíba – Lei nº 1.027/1990, dispondo sobre a proibição de permanência de animais de grande porte em áreas de lazer e nos espaços destinados para a prática de esportes no Município de Guaíba"

1. Relatório:

Veio ao exame desta Procuradoria o Projeto de Lei nº 099/2021, apresentado pelo Vereador Tiago Green (PTB), o qual “Acrescenta o artigo 103-A ao Código de Posturas de Guaíba – Lei nº 1.027/1990, dispondo sobre a proibição de permanência de animais de grande porte em áreas de lazer e nos espaços destinados para a prática de esportes no Município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal.

2. MÉRITO:

Preliminarmente, constata-se que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

 IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Leciona Alexandre de Moraes que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 099/2021, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), visa regular matéria relativa ao exercício de polícia administrativa em âmbito local, especificamente com a previsão de multas no caso de descumprimento de normas previstas no Código de Posturas Municipal.

Além disso, a CE/RS, no artigo 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais”.

No presente caso, a medida está realmente inserida no âmbito das posturas municipais, cuja competência para definição é do Município. O poder de polícia, no magistério de Hely Lopes Meirelles é a “faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”, estando limitado seu exercício através da “Constituição Federal, de seus princípios e da lei” (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 34. Ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 133 e 137).

A própria Constituição Federal garante tal prerrogativa aos entes municipais em seu artigo 174, caput, in verbis:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

      No mesmo sentido estabelece a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, no seu artigo 13, inciso I, anteriormente citado:

Art. 13. É competência do Município, além da prevista na Constituição Federal e ressalvada a do Estado:

I – exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais;

Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado. A Lei Orgânica Municipal prevê a competência para tanto.

A Constituição da República estabelece ainda que cabe ao Poder Público fomentar práticas desportivas e incentivar o lazer como forma de promoção social em seu art. 217, caput e § 3º e em seu art. 227, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem o direito ao lazer:

Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:

(...)

§ 3º O Poder Público incentivará o lazer, como forma de promoção social.

 

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Também a Lei Orgânica Municipal estabelece como dever do Município incentivar e proteger a prática de esportes, o lazer e a recreação como direito de todos os seus habitantes, bem como garantir condições para o gozo desse direito:

Art. 160 É dever do Município fomentar e amparar o desporto, o lazer e recreação, como direito de todos, observados:

I - a promoção prioritária do desporto educacional, em termos de recurso humanos, financeiros materiais em suas atividades meio e fim:

II - a dotação de instalações esportivas recreativas para as instituições escolares públicas;

III - a garantia de condições para a prática de educação física, do lazer e do esporte ao deficiente.

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convêm lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 099/2021 é dar efetividade ao disposto na Lei n.º 1.027/1990, mais especificamente com o objetivo de assegurar o direito ao lazer nos espaços públicos destinados à prática de esporte a ao lazer no Município, proibindo a permanência de animais de grande porte nesses espaços e acrescendo os valores referentes às multas impostas em caso de incumprimento, através da legislação local e do poder de polícia administrativa, conforme a jurisprudência concernente, que assegura aos parlamentares a iniciativa para propor matérias relativas à polícia administrativa:

TJ-SP. Processo nº 2157719-89.2015.8.26.0000 Direta de Inconstitucionalidade - São Paulo - Relator: Des.: Evaristo dos Santos - Autor: Prefeito do Município de Mirassol - Réu: Presidente da Câmara Municipal de Mirassol. Requerente: Prefeito do Município de Mirassol Requerida: Câmara Municipal de Mirassol. Ementa: 1) Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 3.618, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol, de iniciativa parlamentar, que Dispõe sobre a proibição de qualquer cidadão jogar lixo em logradouros públicos, no Município de Mirassol e dá outras providências. 2) Não é reservada ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa legislativa, nem se encontra na reserva da Administração, matéria relativa à polícia administrativa, como a proibição a qualquer cidadão de jogar lixo nas ruas, avenidas, praças e demais logradouros públicos com previsão de sanção pecuniária (multa).

A jurisprudência colacionada a seguir ampara a legalidade da proposição em análise, valendo a pena trazer à tona decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo nesse sentido:

TJSP. 1024383-87.2016.8.26.0576 Apelação / Multas e demais Relator(a): Rezende Silveira Comarca: São José do Rio Preto Órgão julgador: 15ª Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 23/03/2017. Data de registro: 27/03/2017. Ementa: APELAÇÃO – EMBARGOS À EXECUÇÃO – Multa por descumprimento de Lei Municipal – Município de São José do Rio Preto – Atendimento em agência bancária – Lei Municipal nº 10.761/2010, que determinou a instalação de divisórias entre os caixas das agências bancárias – Lei que já foi declarada constitucional pelo C. Órgão Especial - Violação à Constituição não configurada – Multa que, ademais, não possui caráter confiscatório, mostrando-se adequada ao propósito de desestimular as condutas que a ensejam - Sentença mantida – Recurso improvido.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE LEI Nº 13.882, DE 2 DE SETEMBRO DE 2016, DO MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO PRETO QUE DISPÕE SOBRE A POSTURA MUNICIPAL EM PARQUES PÚBLICOS, AUTORIZANDO A ENTRADA DE ANIMAIS. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DO PODER LEGISLATIVO E EXECUTIVO PARA LEGISLAR SOBRE A MATÉRIA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. AÇÃO IMPROCEDENTE. Direta de Inconstitucionalidade: 2228138-03.2016.8.26.0000 Autor: Prefeito do Município de Ribeirão Preto Réu: Presidente da Câmara Municipal de Ribeirão Preto.

Ressalta-se, ademais, a exigência de ampla divulgação da presente proposição conforme exige a Lei Orgânica Municipal em seu artigo 46, já que pretende alterar o Código de Posturas Municipal, e, ainda, a necessidade de aprovação por maioria absoluta dos membros da Casa Legislativa, já que se trata de matéria reservada a Lei Complementar.

3. Conclusão:

Diante dos fundamentos expostos, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 099/2021, por inexistirem óbices de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que respeitadas as exigências do artigo 46 da Lei Orgânica Municipal - ampla divulgação para o recebimento de sugestões e aprovação por maioria absoluta dos membros da Câmara Municipal, por ser matéria reservada a Lei Complementar.

 É o parecer.

Guaíba, 30 de junho de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral da Câmara Municipal de Guaíba

OAB/RS nº 107.136

Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:
ICP-BrasilFERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS:01902836022
30/06/2021 11:08:54
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 30/06/2021 ás 11:07:50. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 7fdc2d00c7234670fd1af880bd3f04a9.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 94034.