Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 026/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 194/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera dispositivos da Lei Municipal n° 2.048, de 16 de janeiro de 2006, e dá outras providências."

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 026/2021 à Câmara Municipal, o qual “Altera dispositivos da Lei Municipal n° 2048, de 16 de janeiro de 2006, e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Vereadores.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva, no sentido de alertar para inconformidades que possam estar presentes. Conforme Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. MÉRITO:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A medida que se pretende instituir se insere, efetivamente, na definição de interesse local, uma vez que diz respeito ao estrito âmbito do Município de Guaíba, dispondo sobre matéria relativa ao regime de previdência dos servidores públicos municipais.

A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 026/2021 propõe alterar legislação que diz respeito ao regime previdenciário de servidores públicos, matéria para a qual é reconhecida a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, nos termos do artigo 61, § 1º, II, c), da CF/88, aplicado por simetria ao Prefeito Municipal:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998);

(...)

É pacífico o entendimento dos Tribunais de que a matéria sobre a qual veras a proposição em análise é de iniciativa reservada do Chefe do Poder Executivo Municipal, visto que veicula normas do regime previdenciário dos servidores públicos. Nesse sentido, verificam-se os acórdãos do E. Supremo Tribunal Federal e do Órgão Especial do TJSP abaixo ementados:

DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACRÉSCIMO DE BENEFÍCIO AOS PROVENTOS, POR LEI, SEM INICIATIVA DO GOVERNADOR (REGIME JURÍDICO DE SERVIDOR) E SEM PREVISÃO DE FONTE DE CUSTEIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 39, DE 23 DE NOVEMBRO DE 1994, DO ESTADO DO AMAZONAS. 1. Havendo a Lei em questão instituído benefício previdenciário, em acréscimo a benefício já percebido pelo aposentado, por invalidez, sem que o projeto (sobre regime jurídico de servidor) tenha tido a iniciativa do governador, e sem previsão de fonte de custeio, é de se lhe declarar a inconstitucionalidade, por inobservância dos princípios dos artigos 61, § 1º, "c", 195, § 5º, c/c artigo 25 da parte permanente da C.F. de 05.10.1988 e art. 11 do A.D.C.T. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. Plenário. Decisão unânime” (STF, ADI 1.223-AM, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 12-02-2003, v.u., DJ 28-03-2003, p. 63).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 16.675, de 13 de março de 2018, do Estado de São Paulo, de iniciativa parlamentar, que “altera a Lei nº 14.653, de 22 de dezembro de 2011, que institui o regime de previdência complementar no âmbito do Estado de São Paulo, fixa o limite máximo para a concessão de aposentadorias e pensões de que trata o artigo 40 da Constituição Federal, autoriza a criação de entidade fechada de previdência complementar, na forma de fundação, e dá outras providências” Regime jurídico de servidores públicos estaduais - Configurado o vício de iniciativa, que é privativa do Poder Executivo - Artigos 24, parágrafo 2º, '4', 126, parágrafo 15º da Constituição do Estado de São Paulo. Violação à separação de poderes. Imposição de inscrição automática dos servidores ao regime de previdência complementar, contrariando o caráter facultativo previsto no artigo 126, parágrafo 16º da Constituição Bandeirante, que reproduz o artigo 202 da Constituição Federal, que exige a prévia e expressa opção do servidor Inconstitucionalidade declarada – AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. (TJSP - Direta de Inconstitucionalidade nº 2104844-06.2019.8.26.0000 - Voto nº 37527, São Paulo, 27 de maio de 2020. ELCIO TRUJILLO - RELATOR).

Ação direta de inconstitucionalidade. Lei complementar 4.298, de 16 de novembro de 2015, do Município de Taquaritinga -Dispõe sobre alterações na Lei Complementar 4.029, de 18 de junho de 2013, que reestrutura o Regime Próprio de Previdência Social do Município de Taquaritinga e dá outras providências-. Inconstitucionalidade, por se imiscuírem matéria de competência exclusiva do Poder Executivo. Vício de iniciativa. Desrespeito aos artigos5º, caput, 24, §2º, 1 e 2, 47, incisos II, XIV e XIX,alínea 'a', e 144 da Constituição do Estado. Ação procedente. (ADI nº 2208090-23.2016.8.26.0000, Rel. Des. Borelli Thomaz, j. 31.05.2017, v.u.);

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Com efeito, a propositura legislativa em análise possui sólido fundamento na legislação federal - Lei Federal nº 13.135, de 17 de junho de 2015, que alterou o caráter vitalício da pensão por morte no regime geral e no regime próprio. Assim, passa a existir a carência de 2 anos para o funcionário contribuir ao regime, sendo a vitaliciedade agora exceção. Em suma, a partir da Lei nº 13.135, de 2015, para cônjuges e companheiros dependentes serem beneficiários de Pensão por Morte é necessário se observar uma escala, a partir da idade do beneficiário na data do óbito do segurado.       

A finalidade principal da proposta legislativa é a adequação da Lei Municipal nº 2.048, de 16 de janeiro de 2016, a qual “REESTRUTURA O REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA DO MUNICÍPIO DE GUAÍBA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS” para que esteja em simetria ao que estabelece a referida legislação federal.

O Departamento dos Regimes de Previdência no Serviço Público – DRPSP – da Secretaria de Políticas de Previdência Social – SPPS – do Ministério da Previdência, em agosto de 2015, publicou a Nota Técnica nº 11/2015, dispondo sobre a “APLICAÇÃO, AOS SEGURADOS DOS REGIMES PRÓPRIOS DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, DAS REGRAS DE PENSÃO POR MORTE INSERIDAS NA LEI Nº 8.213/1991 PELA LEI Nº 13.135, de 17/06/2015. Propósitos das mudanças ocorridas no Regime Geral de Previdência Social. Análise das novas regras, fundamentos e condições para sua extensão aos segurados dos Regimes Próprios de Previdência Social”.

De acordo com a Nota Técnica nº 11/2015 da Secretaria de Políticas de Previdência Social – SPPS, a orientação é que os RPPS dos Municípios sigam as mesmas regras da Lei nº 13.135, de 2015:

(...)

  1. Tendo tais alterações se consolidado na Lei nº 13.135/2015, com muitos ajustes em relação ao texto original da Medida Provisória nº 664/2014, faz-se necessário reexaminar o tema para orientar os demais entes federativos acerca da edição de lei estendendo essas regras aos servidores amparados em RPPS. Em relação aos servidores vinculados ao RPPS da União, as novas regras já se encontram vigentes, uma vez que a Lei nº 13.135/2015 alterou de forma expressa os dispositivos da Lei nº 8.112/1990 que disciplinam a concessão da pensão por morte. A edição da lei local tem fundamento no art. 24, XII e § 2º e no art. 30, I e II da Constituição Federal, bem como no art. 61, § 1º, II, “c” da mesma carta, aplicável a todos os entes federativos em razão do princípio da Simetria.

(...)

V - Conclusões

  1. Diante disso, conclui-se que:

a) As novas regras para concessão e manutenção do benefício de pensão por morte inseridas na Lei nº 8.213/1991 pela Lei nº 13.135/2015 podem e devem ser adotadas, mediante reprodução em lei local, para os servidores amparados pelos RPPS dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a exemplo do que se deu na Lei nº 8.112/1990, para o RPPS da União, pois, além de evitar distorções, impedindo a concessão de benefícios em situações que não guardam conformidade com os objetivos da previdência social, também serão favoráveis à busca do equilíbrio financeiro atuarial dos RPPS, princípio estatuído no art. 1º da Lei nº 9.717/1998, no art. 69 da Lei de Responsabilidade Fiscal e no caput do art. 40 da Constituição Federal.

(...)

c) As regras para a pensão por morte vigentes no Brasil até 2014 eram excessivamente frágeis e liberais, mostrando-se desalinhadas das melhores práticas internacionais a respeito da concessão desse benefício, permitindo fraudes e comportamentos individuais oportunistas, em detrimento da coletividade. Promovidas as adequações no RGPS e no RPPS da União, devem os demais entes federativos também buscar esse alinhamento em relação aos seus RPPS.

Portanto, tem-se que o escopo das alterações é a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial dos regimes previdenciários para buscar a sustentabilidade do RPPS, visto que a adoção por simetria da Lei Federal nº 13.135/2015 propõe um melhor equacionamento entre o custeio e o pagamento do beneficio através de um plano temporário de recebimento da pensão em função da idade, até limite de 44 (quarenta e quatro) anos, para que, somente a partir dessa idade, a pensão seja concedida como beneficio vitalício.

Por outro lado, observa-se que tanto o § 2º como o § 4º do art. 47-A tratam sobre o óbito de acidente ou doença do trabalho, possuindo comando normativo redundante, recomendando-se a seguinte redação, nos mesmos termos da Lei Federal nº 13.135/2015, dando mais clareza ao texto (art. 11 da LC nº 95/98), especialmente em relação à palavra “esta”, que pelas regras gramaticais está se referindo às doenças:

 

Art. 47-A

 

§ 2º Não se enquadrando nos requisitos mínimos fixados no § 1º, a pensão será devida por 4 (quatro) meses.

(...)

§ 4º Se o óbito do servidor decorrer de acidente de qualquer natureza ou doença profissional ou do trabalho, o benefício será concedido independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável.

Faz-se necessária, ainda, a correção do § 1º do art. 47-A da proposição para que conste “a pensão será devida somente caso o segurado...”, podendo se dar em eventual Redação Final pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 026/2021, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

 

Recomenda-se reanálise do teor dos §§ 2º e 4º do art. 47-A, para que o texto possua linguagem mais clara e, especificamente quanto ao § 4º, para que permita melhor interpretação, além da correção da redação do § 1º do art. 47-A.

É o parecer.

Guaíba, 22 de junho de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136

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