Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 025/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 187/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Autoriza o Poder Executivo, em caráter excepcional, a conceder remissão de 50% (cinquenta por cento) do índice de reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU referente ao ano de 2021"

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 025/2021 à Câmara Municipal, o qual “Autoriza o Poder Executivo, em caráter excepcional, a conceder remissão de 50% (cinquenta por cento) do índice de reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU referente ao ano de 2021”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do RI.

2. mérito:

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe alterações quanto à remissão, em caráter excepcional, de 50% (cinquenta por cento) do índice de correção aplicado ao IPTU, exclusivamente para o exercício 2021, matéria para a qual é reconhecida a iniciativa concorrente, nos termos do artigo 61 da CF/88, artigo 59 da CE/RS e artigo 38 da Lei Orgânica Municipal:

A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário. A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca. O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara, especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo, ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado. (ADI 724 Me rel. min. Celso de Mello, j. 7-5-1992, P, DJ de 27-4-2001).

A norma não reserva à iniciativa privativa do Presidente da República toda e qualquer lei que cuide de tributos, senão apenas a matéria tributária dos Territórios (ARE 743.480 RCI, voto do rel. min. Gilmar Mendes, j. 10-10-2013, P, DJE de 20-11-2013, Tema 682).

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, II, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” A CF/88 ainda prevê, no artigo 30, III, a competência do Municípios para “instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazo fixados em lei.”

As alterações trazidas com a proposta se inserem, efetivamente, na definição de interesse local e dizem respeito à arrecadação dos tributos municipais.

A Emenda nº 3, de 17.3.1993, ao alterar a redação do parágrafo sexto, do artigo 150, da Constituição Federal, aperfeiçoou o texto constitucional e estendeu o princípio da legalidade específica a quaisquer subsídios e causas extintivas ou excludentes do crédito tributário. Destarte, na lição precisa da Doutora Mizabel de Abreu Machado Derzi, ficou consagrada a exclusividade da lei tributária para conceder quaisquer exonerações, subsídios e outros benefícios, redutores, extintivos ou excludentes do crédito tributário.

O Código Tributário Nacional define a remissão tributária como a dispensa de pagamento de tributo devido, total ou parcial, conforme preceitua o art. 172 do CTN:

Art. 172. A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo:

I – à situação econômica do sujeito passivo;

II – ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de fato;

III – à diminuta importância do crédito tributário;

IV – a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso;        

V – a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante.

A Constituição Federal restringiu a disciplina da remissão e passou a exigir lei específica para evitar o oportunismo oculto em leis sobre matérias totalmente diversas, conforme se observa de seu art. 150, § 6º:

Art. 150 (...)

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

No que concerne à matéria de fundo, no atual Sistema Tributário Constitucional, não se verifica o instituto da remissão de correção monetária. A remissão extingue uma obrigação existente, sendo causa de extinção do crédito tributário (art. 156, IV do CTN). A remissão é o perdão do crédito tributário decorrente da obrigação tributária principal, ou seja, a remissão é hipótese de extinção do crédito tributário e refere-se a um perdão total ou parcial do crédito tributário já lançado em dívida ativa, nos termos dos arts. 156, IV e 172 do CTN.

Sendo assim, pode-se aventar que a propositura legislativa seja alterada no sentido de que haja a remissão parcial do crédito tributário relativamente aos impactos advindos da alta exponencial do IGP-M no período (o que se pode considerar uma medida justa e adequada à política fiscal em tempos de pandemia - justiça fiscal constitucionalmente assegurada, melhor refletindo as variações econômicas da moeda no período).

Na lição de Hugo de Brito Machado, quanto ao instituto da remissão:

Por isto a remissão, no Direito Tributário, depende de expressa previsão legal. A lei é a forma pela qual o Estado pode validamente manifestar sua vontade de renunciar ao tributo. Assim, se estabelece como premissa básica que o perdão da dívida tributária tem por imprescindível a autorização legislativa específica, imposição que deflui diretamente do texto constitucional, art. 150, § 6º, sem a qual não pode a autoridade administrativa, esponte sua, renunciar ao tributo.

Veja-se ainda os prejulgados deste Tribunal de Contas de Santa Catarina, que tratam do tema:

Prejulgado 1582

A anistia - por ser hipótese de exclusão do crédito tributário - somente poderá ser concedida antes do lançamento da obrigação tributária. Assim, esta modalidade só é aplicável caso a penalidade não esteja constituída como crédito tributário.
2. A remissão é o perdão da dívida após a constituição do crédito tributário, cuja concessão está subordinada ao atendimento das hipóteses elencadas no art. 172, I a V, da Lei Federal nº 5.172/66 (Código Tributário Nacional - CTN). Esta modalidade se aplica quando a penalidade estiver constituída como crédito tributário, ou seja, depois de lançada.

Conforme informações do Poder Executivo Municipal, o crédito tributário relativo ao IPTU já foi devidamente lançado, sendo possível a aplicação do instituto da remissão tributária.

O que se costuma verificar nos demais entes, principalmente em tempos de calamidade pública, é a modificação excepcional, através de autorização legislativa, do índice de correção monetária, via de regra o IGP-M, o que seria medida viável juridicamente para a alteração do índice de correção do IPTU/2021.

Via de regra, diante do que determina LRF, para que não haja obstáculos materiais ou formais a tais propostas, em situações normais deveria ser apresentado estudo de impacto orçamentário e financeiro contemplando as exigências do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/00).

Ocorre que a Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021, acrescentou o art. 167-D à Constituição Federal, flexibilizando e afastando as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal nos casos das proposições legislativas se exclusivamente com objetivo de enfrentamento de calamidade se vigorarem e tiverem efeitos restritos à duração da calamidade:

Art. 167-D. As proposições legislativas e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, desde que não impliquem despesa obrigatória de caráter continuado, ficam dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa e à concessão ou à ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

Diante desse fundamento, seria admissível o afastamento da norma constante do art. 14, da LRF, concedendo benefício tributário ao contribuinte sem o devido impacto, se comprovadamente se tratar de medida de enfrentamento da pandemia pela COVID-19 com vigência e efeitos restritos à duração da calamidade.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 025/2021, desde que tenha o propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, desnecessária assim a apresentação de impacto orçamentário-financeiro, nos termos do recentíssimo art. 167-D da Constituição Federal, acrescentado pela EC 109/2021.

Pode-se aventar que a propositura legislativa seja alterada no sentido de que haja a remissão parcial do crédito tributário relativamente aos impactos advindos da alta exponencial do IGP-M no período (o que se pode considerar uma medida justa e adequada à política fiscal em tempos de pandemia - justiça fiscal constitucionalmente assegurada, melhor refletindo as variações econômicas da moeda no período).

                                                                     

É o parecer.

Guaíba, 15 de junho de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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15/06/2021 17:03:07
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