Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 024/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 173/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"“Dá nova redação ao inciso I do artigo 2º da Lei Municipal nº 3.960 de 27 de abril de2021, que cria o Programa de Recuperação de Créditos - REFIS/2021 e dá outras providências”"

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 024/2021 à Câmara Municipal, o qual “Dá nova redação ao inciso I do artigo 2º da Lei Municipal nº 3.960 de 27 de abril de 2021, que cria o Programa de Recuperação de Créditos - REFIS/2021 e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do RI.

2. MÉRITO:

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe alterações na Lei Municipal nº 3.960/2021, que trata da instituição do Programa de Recuperação de Créditos Fiscais – REFIS/2021, para o pagamento com desconto em juros e multas ou parcelamento com redução proporcional desses encargos, matéria para a qual é reconhecida a iniciativa concorrente, nos termos do artigo 61 da CF/88, artigo 59 da CE/RS e artigo 38 da Lei Orgânica Municipal:

A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário. A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca. O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara, especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo, ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado. (ADI 724 Me rel. min. Celso de Mello, j. 7-5-1992, P, DJ de 27-4-2001).

A norma não reserva à iniciativa privativa do Presidente da República toda e qualquer lei que cuide de tributos, senão apenas a matéria tributária dos Territórios (ARE 743.480 RCI, voto do rel. min. Gilmar Mendes, j. 10-10-2013, P, DJE de 20-11-2013, Tema 682).

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, II, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” A CF/88 ainda prevê, no artigo 30, III, a competência do Municípios para “instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazo fixados em lei.”

As alterações trazidas com a proposta se inserem, efetivamente, na definição de interesse local e dizem respeito à arrecadação dos tributos municipais. Isso porque o Projeto de Lei nº 024/2021 apenas estabelece alterações no inciso I do artigo 2º da referida Lei Municipal, alterando o prazo para pagamento das parcelas anteriormente previstas para o oitavo dia do mês subsequente para “os mesmos dias dos meses subsequentes” da data da adesão ao Programa de Recuperação de Créditos Fiscais – REFIS 2021, alargando o intervalo de pagamento entre as parcelas, tornando possível a participação de um maior número de pessoas com dívidas junto ao Município de Guaíba e a regularização de mais casos.

No que concerne à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 024/2021 é apenas ajustar os intervalos entre os pagamentos das parcelas do REFIS/2021, de modo a possibilitar que mais pessoas se regularizem aderindo ao parcelamento das dívidas ativas.

Os descontos que incidem sobre os pagamentos das dívidas parceladas nos termos do REFIS/2021 configuram espécie de anistia, pois abrangem exclusivamente as infrações cometidas anteriormente à vigência da lei que a concede, nos termos do artigo 180 do Código Tributário Nacional. E, tendo a natureza de anistia, que exclui o crédito tributário (artigo 175, II, CTN), exige a CF/88, no artigo 150, § 6º, que a concessão do benefício seja feita mediante previsão em lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente a matéria ou o correspondente tributo ou contribuição, exigência que foi devidamente atendida neste caso.

Via de regra, diante do que determina LRF, para que não haja obstáculos materiais ou formais a tais propostas, em situações normais deveria ser apresentado novo estudo de impacto orçamentário e financeiro contemplando as exigências do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/00).

Ocorre que a Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021, acrescentou o art. 167-D à Constituição Federal, flexibilizando e afastando as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal nos casos das proposições legislativas se exclusivamente com objetivo de enfrentamento de calamidade se vigorarem e tiverem efeitos restritos à duração da calamidade:

Art. 167-D. As proposições legislativas e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, desde que não impliquem despesa obrigatória de caráter continuado, ficam dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa e à concessão ou à ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

Diante desse fundamento, seria admissível o afastamento da norma constante do art. 14, da LRF, concedendo benefício tributário ao contribuinte sem o devido impacto, se comprovadamente se tratar de medida de enfrentamento da pandemia pela COVID-19 com vigência e efeitos restritos à duração da calamidade.

Ademais, para além do permissivo do art. 167-D da Constituição Federal, a simples alteração dos períodos mensais para a efetivação dos pagamentos (do oitavo dia para o mesmo dia do mês subsequente) não teria por efeito, a priori, o aumento da renúncia de receita.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 024/2021 – Executivo Municipal, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que o REFIS tenha o propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, desnecessária assim a apresentação de impacto orçamentário-financeiro, nos termos do recentíssimo art. 167-D da Constituição Federal, acrescentado pela EC 109/2021.

É o parecer.

 

Guaíba, 08 de junho de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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08/06/2021 14:00:09
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