Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 018/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 159/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dá nova redação ao artigo 1º da Lei Municipal nº 3.965 de 05 de maio de 2021, que dispõe sobre a concessão de até 35% (trinta e cinco por cento) de desconto para pagamento em parcela única do IPTU, exercício 2021."

1. Relatório:

 O Projeto de Lei n.º 018/2021, de autoria do Poder Executivo Municipal, o qual “Dá nova redação ao artigo 1º da Lei Municipal nº 3.965 de 05 de maio de 2021, que dispõe sobre a concessão de até 35% (trinta e cinco por cento) de desconto para pagamento em parcela única do IPTU, exercício 2021”, foi encaminhado a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO:

Constata-se que a matéria constante do Projeto de Lei n.º 018/2021, de autoria do Poder Executivo Municipal, de fato insere-se no âmbito de matérias de interesse local, nos termos do artigo 30, I, da Constituição Federal, portanto de competência legislativa do município, ao qual ainda cabe suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, por força do artigo 30, II da CF/88. Também o inciso III, do artigo 30 da Constituição Federal garante aos municípios autonomia financeira através da outorga de competência tributária:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

Alexandre de Moraes expõe que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)." (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local.

Luís Roberto Barroso destaca a autonomia municipal para se auto-organizar:

Ressalte-se, por oportuno, que a capacidade de auto-organização é, do ponto de vista formal, a mais relevante manifestação da autonomia às Unidades federadas e o poder de se estruturarem tal qual um Estado, gozando de titularidade de funções da mesma natureza daquelas que compõem o Estado federal.[1]

A lei tributária municipal será viável na medida em que conformar-se às diretrizes traçadas pela Constituição Federal. O próprio Código Tributário Nacional expressa a atribuição constitucional da competência tributária, compreendendo a competência legislativa do município, conforme leciona o E. Ministro Luís Roberto Barroso:

Aos Municípios cabe decretar seus impostos, o que só podem fazer, obviamente, através de leis que, consequentemente, têm que emanar de seu poder legiferante. Elaboram, ainda, inúmeros preceitos regendo as mais diversas relações de âmbito local. Conclusivamente, então, podemos asseverar que, dentro dos limites fixados pela Constituição estadual e pela Lei Orgânica, possuem os Municípios capacidade para legislar sobre as matérias que lhes são especificamente afetadas.[2]

Portanto, compete ao Município, nos termos do art. 30, I e III, da CF/88, relativamente aos tributos de sua competência, a concessão de benefícios fiscais, criação de mecanismos redutores de juros e multa, alteração do número de parcelas, majoração de percentuais de desconto para pagamento do IPTU em cota única para atrair contribuintes, estejam ou não em débito, sendo matérias afeitas à autonomia municipal garantidas pela Constituição Federal.

Compete assim ao Município estabelecer no seu Código Tributário causas de outorga de isenções de tributos municipais, concessão de benefícios fiscais, majoração de descontos, desde que atendidas as exigências de natureza orçamentário-financeiras previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal. Nesse sentido, note-se o que dispõe o art. 150, § 6º, da CF/88:

Art. 150. (...)

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g.

 Quanto à iniciativa legislativa, cumpre salientar que, segundo o entendimento jurisprudencial dominante, cabe ao Município a responsabilidade pela consecução de sua legislação tributária, pertencendo ao Executivo, ao Legislativo e, ainda, à população, através de iniciativa popular, a deflagração dos referidos projetos, por não haver restrição expressa à iniciativa para matéria tributária:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS DE DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO LEGISLATIVO. NORMAS SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO. INICIATIVA CONCORRENTE ENTRE O CHEFE DO PODER EXECUTIVO E OS MEMBROS DO LEGISLATIVO. POSSIBILIDADE DE LEI QUE VERSE SOBRE O TEMA PERCUTIR NO ORÇAMENTO DO ENTE FEDERADO. IRRELEVÂNCIA PARA FINS DE DEFINIÇÃO DOS LEGITIMADOS PARA A INSTAURAÇÃO DO PROCESSO LEGISLATIVO. AGRAVO IMPROVIDO. I. A iniciativa de leis que versem sobre matéria tributária é concorrente entre o chefe do poder executivo e os membros do legislativo. II. A circunstância de as leis que versem sobre matéria tributária poderem repercutir no orçamento do ente federado não conduz à conclusão de que sua iniciativa é privativa do chefe do executivo. III. Agravo Regimental improvido. (STF - RE: 590697 MG, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 23/08/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-171 DIVULG 05-09-2011 PUBLIC 06-09-2011 EMENT VOL-02581-01 PP- 00169).

  

O alcance material da norma diz respeito à matéria tributária no âmbito do município em que o Executivo Municipal busca, mais especificamente:

  • Alteração por via legislativa das datas de vencimento e desconto para arrecadação do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU de 2021, em caso de parcela única, até o dia 30 de julho de 2021.

As medidas pretendidas pela propositura legislativa estão em consonância com a distribuição de competências estabelecidas pela Constituição Federal e dizem respeito à autonomia do ente municipal e à iniciativa concorrente.

Quanto à alteração pretendida pela propositura legislativa, a justificativa do Chefe do Poder Executivo aduz que no momento do trâmite interno nessa Casa Legislativa, restou emendado o Projeto, com a apresentação de uma alteração, dentre outras, que mudou a data de pagamento prevista no artigo 1º da referida Lei, adiando o prazo para o dia 31 de julho de 2021, e que para fins do “regular trâmite administrativo e operacionalização dos ditames legais propostos na Lei, bem como, de evitar obstáculos de ordem contábil, é necessário que se altere a data prevista no artigo 1º para o dia útil imediatamente anterior, ou seja, que o pagamento esteja previsto para 30 de julho de 2021”.

Foi observada a regra limitada a qual possibilita este tipo a prorrogação de prazo para pagamento de tributos, devendo ocorrer sempre no mesmo exercício financeiro de 2021, sendo a data limite até o dia 31 de dezembro de 2021 (exercício financeiro de 2021). A Lei Municipal nº 3.965 de 05 de maio de 2021, que dispõe sobre a concessão de até 35% (trinta e cinco por cento) de desconto para pagamento em parcela única do IPTU, exercício 2021, corretamente exige condições formais para a concessão, com o objetivo de garantir que os benefícios de política tributária não prejudiquem a gestão fiscal responsável, planejada e transparente, prevenindo situações de desequilíbrio orçamentário.

De fato, a data prevista no processo legislativo da Lei Municipal nº 3.965 de 05 de maio de 2021 foi alterada para um dia não útil (31 de julho) através de Emenda Parlamentar, o que pode vir a acarretar problemas de operacionalização e de obstáculos de ordem contábil, já que poderia ocorrer que a competência de arrecadação se desse no próximo dia útil seguinte previsto na Emenda Parlamentar – já no mês de agosto.

A medida, a priori, não virá a caracterizar novas causas de outorga de isenções de tributos municipais, de concessão de benefícios fiscais, de majoração de descontos ou nova remissão parcial do crédito tributário, não vindo a prejudicar a gestão fiscal responsável, planejada e transparente.

Ademais, a Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021, acrescentou o art. 167-D à Constituição Federal, flexibilizando e afastando as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal nos casos das proposições legislativas se exclusivamente com objetivo de enfrentamento de calamidade se vigorarem e tiverem efeitos restritos à duração da calamidade:

Art. 167-D. As proposições legislativas e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, desde que não impliquem despesa obrigatória de caráter continuado, ficam dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa e à concessão ou à ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

[1] Barroso, Luís Roberto, Direito Constitucional Brasileiro: O Problema da Federação, Rio de Janeiro, p. 22.

[2] Barroso, Luís Roberto, op. Cit., pág. 76

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das Comissões Permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela constitucionalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei n.º 018/2021, de autoria do Poder Executivo Municipal.

É o parecer.

Guaíba, 25 de maio de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136

 

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25/05/2021 15:04:16
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