Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 013/2021
PROPONENTE : Ver. Rosalvo Duarte
     
PARECER : Nº 106/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a Instituição de patrocínio para fornecimento e instalação de placas de indicação de nomes de ruas e dá outras providências"

1. Relatório:

Veio ao exame desta Procuradoria o Substitutivo ao Projeto de Lei nº 013/2021, apresentado pelo Vereador Rosalvo Duarte (DEM), o qual “Dispõe sobre a Instituição de patrocínio para fornecimento e instalação de placas de indicação de nomes de ruas e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal.

2. MÉRITO:

Preliminarmente, constata-se que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente, e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

(...)

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

  

O E. Supremo Tribunal Federal precisou que as competências legislativas do município caracterizam-se pelo princípio da predominância do interesse local e ressaltou ser salutar que a interpretação constitucional de normas dessa natureza seja mais favorável à autonomia legislativa dos Municípios, haja vista ter sido essa a intenção do constituinte ao elevar os Municípios ao status de ente federativo na Constituição Cidadã de 1988.[1] Nessa perspectiva, a doutrina de Alexandre de Moraes leciona que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740).

Para o STF, essa autonomia revela-se fundamentalmente quando o Município exerce, de forma plena, sua competência legislativa em matéria de interesse da municipalidade, como previsto no art. 30, I, da CF.[2] Por esse ângulo, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local.

Isso porque o Substitutivo ao Projeto de Lei nº 013/2020, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), visa regular matéria relativa à identificação dos próprios em âmbito local, especificamente com a previsão de instituição de patrocínio para o fornecimento e instalação do mobiliário urbano no Município de Guaíba.

A própria Constituição Federal garante tal prerrogativa aos entes municipais, tratando da política urbana, conforme estabelece seu art. 182, como objetivos a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar da população através de políticas de desenvolvimento urbano que atendam às necessidades dos habitantes quanto às funções de habitação e circulação:

 Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

  

A propositura legislativa encontra fundamento ainda nos princípios da publicidade e transparência dos atos do Poder Público, e no direito à informação sobre os atos estatais, conforme estabelecido pelos arts. 5º, XXXIII, e 37, caput, § 1º e § 3º, II, da Constituição Federal.

As normas do ordenamento jurídico brasileiro impõem à Administração Pública o dever de assegurar o pleno acesso dos cidadãos às informações relativas à coisa pública, incluída a denominação dos logradouros públicos, determinando que "a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos" (art. 37, § 1º, CR/88). Nesse sentido respalda também a propositura o art. 5º, XXXIII, da CF/88:

Art. 5°...

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

No presente caso, a medida não configura invasão de competência privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal, estabelecida no art. 60 da CERS, já que não trata de criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado. A Lei Orgânica Municipal também prevê a competência para tanto.

Nesse sentido o assentado pelo E. TJRS quanto à constitucionalidade da lei municipal de iniciativa parlamentar nº 3.506/2005, do Município de São Borja, a qual possui teor análogo ao da proposição em análise:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 70076014240. LEI MUNICIPAL de Iniciativa Parlamentar QUE DISPÕE SOBRE A INSTITUIÇÃO DE PATROCÍNIO NOS UNIFORMES ESCOLARES DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE ENSINO. MATÉRIA REGULAMENTADA PELO PODER EXECUTIVO. INEXISTÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. A Lei Municipal n. 3.506/2005 que dispõe sobre a instituição de patrocínio nos uniformes escolares da rede pública municipal de ensino de São Borja não padece de inconstitucionalidade formal e material, pois não houve usurpação de competência do Chefe do Poder Executivo Municipal, tanto é assim que, ao fim e ao cabo, é a própria regulamentação da matéria procedida pelo Decreto baixado pelo Prefeito Municipal que regulamentará e disciplinará a utilização e uniformização do vestuário dos alunos. Nº 70076014240. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Unânime. 07 de maio de 2018. DES. RICARDO TORRES HERMANN, Relator.

A jurisprudência colacionada ampara a constitucionalidade da proposição em análise, valendo a pena trazer à tona trechos do acórdão referido do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul na ADI nº 70076014240, os quais ressaltam a inexistência de violação à separação entre os poderes, já que não importa em alteração da organização das escolas municipais:

Com bem ressaltado na defesa apresentada pela Procuradoria do Município: “Excelência, inexorável ressaltar que o diploma legal atacado não representou qualquer prejuízo a este Município. Além disso, ela [a Lei questionada] não [gera ] despesas, não trata especificamente da estrutura organizacional ou do próprio funcionamento do aparato administrativo da educação pública, mas tão somente de autorização concedida ao poder executivo para buscar recursos outros para auxiliar na confecção dos uniformes escolares.”

Com efeito, na espécie, impossível identificar violação ao princípio da separação de poderes, previsto no art. 10 da Constituição do Estado, mormente não se perdendo de vista que o singelo projeto de patrocínio dos uniformes escolares não importa em alteração da organização das escolas municipais, esta sim incumbência reservada à atividade administrativa do Chefe do Poder Executivo Municipal. Tampouco se pode olvidar que a educação, nos exatos termos do que estabelece o art. 205, do Constituição Federal, constitui-se em direito de todos e dever do Estado e da família e será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Ora, sendo um dever de todos, nada mais razoável que a proposta de auxílio à administração pudesse partir de vereadores, por via da captação dos recursos necessários à confecção dos uniformes. E nem se diga que a pequena publicidade poderia gerar qualquer constrangimento ou embaraço, na medida em que, na própria regulamentação procedida pelo atual Prefeito, que encampou a ideia e editou norma regulamentadora, o nome da empresa patrocinadora não poderá ser maior que o brasão do Município de São Borja e o dizer Secretaria Municipal de Educação (art. 7º, § único, do Decreto 17.267, de 11 de julho de 2017, fls. 68/69).

Afora isso, é manifesta a vantagem produzida pela padronização das vestimentas escolares, na medida em que se trata de uma importante ferramenta de identificação e, consequentemente, de segurança para alunos, pais e professores, e é defendida por especialistas em educação, como também bem defendido pelo Procurador do Município. Em tal contexto, não se afigura inconstitucional, do ponto de vista formal, pois não houve usurpação de competência do Chefe do Poder Executivo Municipal, tanto é assim que, ao fim e ao cabo, é a própria regulamentação da matéria procedida pelo Decreto baixado pelo Prefeito Municipal que regulamentará e disciplinará a utilização e uniformização do vestuário dos alunos da rede pública municipal de ensino de São Borja.

Tampouco, do ponto de vista material se verifica o vício de inconstitucionalidade questionado. Tal se dá, pois não houve a criação de qualquer despesa pública, tampouco interferência na organização do funcionamento das escolas pertencentes à rede municipal de educação, de forma que a norma legal sobrevive inclusive ao crivo da análise da constitucionalidade sob o ponto de vista material.

Nessa perspectiva, quanto à inocorrência de invasão de competência do Poder Executivo da proposição, cabe trazer a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, na Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70074889684, justamente quanto à lei municipal que institui o Programa Adote uma Lixeira:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL N. 3.038/2017, DO MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO, QUE INSTITUI O PROGRAMA ADOTE UMA LIXEIRA. LEI DE INICIATIVA DO PODER LEGISLATIVO. VÍCIO DE INICIATIVA NÃO CONFIGURADO. Lei que apenas faculta ao Poder Executivo MUNICIPAL ESTABELECER PARCERIAS COM EMPRESAS PRIVADAS, ENTIDADES SOCIAIS OU PESSOAS FÍSICAS INTERESSADAS EM FINANCIAR A INSTALAÇÃO E MANUTENÇÃO DE LIXEIRAS EM LOGRADOUROS PÚBLICOS. Ausência de determinação legal de regulamentação e implantação do programa pela administração pública municipal. Ausência de criação de atribuições a Secretarias Municipais. Violação ao princípio da separação e independência dos poderes não configurada. Não padece de inconstitucionalidade formal, por vício de iniciativa, lei municipal de iniciativa do Poder Legislativo que cria o programa denominado “Adote uma Lixeira”, facultando ao Município o estabelecimento de parcerias com empresas privadas, entidades sociais, ou pessoas físicas interessadas em financiar a instalação e manutenção de lixeiras nos logradouros públicos, com direito à publicidade. A lei impugnada não determina a implantação do programa em questão e nem estabelece prazo para tanto, meramente facultando à Administração Pública Municipal efetivar tal programa, atendendo critérios de conveniência e oportunidade, não criando atribuições a órgãos da Administração Pública e tampouco dispondo sobre matérias cuja lei é de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, previstas no art. 60, inc. II, da Constituição Estadual. JULGARAM IMPROCEDENTE. Ação Direta de Inconstitucionalidade Órgão Especial. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70074889684, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 09 de abril de 2018.)

 

                      Naquela ocasião, o TJRS consignou que “A leitura do texto legal revela que não foram impostas obrigações diretas e imediatas ao Executivo (salvo a de regulamentar a lei em 30 dias - art. 3°), tampouco foram criadas novas tarefas para seus órgãos.” e que a “A iniciativa do Poder Legislativo é louvável e vem ao encontro do interesse público” – o que se depreende ser o caso da propositura em análise.

Por se tratar de alteração do Código de Posturas, com natureza de Lei Complementar[3], faz-se necessária a ampla divulgação do projeto antes de sua aprovação, por força do art. 46 da LOM:

Art. 46 São leis complementares que dependem da aprovação da maioria absoluta dos membros da Câmara:

I - código de obras;

II - código de posturas;

III - código tributário;

IV - plano diretor;

V - código do meio ambiente;

VI - estatuto do servidor público;

VII - planos de carreira dos servidores;

VIII - lei que trata da elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.

§ 1º Observado o Regimento Interno da Câmara Municipal, é assegurada a ampla divulgação e a realização de consulta pública aos projetos de leis complementares referidos no caput para recebimento de sugestões.

          Quanto ao disposto no § 1º do art. 46 da LOM, o Regimento Interno estabelece a obrigatoriedade de divulgação dos Projetos de Lei Complementar com a maior amplitude possível com prazo de 15 dias para apresentação de sugestões:

                       

Regimento Interno

 Art. 135. São objeto de Lei Complementar, entre outros:

(...)

III - código tributário e fiscal;

(...)

§ 2º Dos projetos de códigos e respectivas exposições de motivos, antes de submetidos à discussão, será dada divulgação com maior amplitude possível.

§ 3º Dentro de 15 (quinze) dias, contados da data da divulgação de tais projetos, qualquer cidadão ou entidade poderá apresentar sugestões ao Presidente da Câmara, que as encaminhará às Comissões Permanentes.

[1] RE 1.151.237; RE 1.052.719.

[2] RE 610.221 RG

[3] A óptica terminológica aduz que a lei complementar é instrumento normativo emanado do órgão legislativo e que, após o devido processo legislativo de tramitação, com aprovação da maioria absoluta dos membros de cada Casa Legislativa, cria, modifica ou extingue as posições jurídicas subjetivas que lhe são constitucionalmente reservadas. KOZIKOSKI, Antonio. Comentários ao artigo 59. In MORAES, Alexandre de; et. al. Constituição federal comentada.

3. Conclusão:

Diante dos fundamentos expostos e consoante a jurisprudência do TJRS quanto à matéria, a Procuradoria opina pela constitucionalidade, legalidade e regular tramitação do Substitutivo ao Projeto de Lei nº 013/2021, de autoria do Vereador Rosalvo Duarte (DEM), por inexistirem óbices de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que observadas as exigências do artigo 46 da Lei Orgânica Municipal - ampla divulgação para o recebimento de sugestões e aprovação por maioria absoluta dos membros da Câmara Municipal.

É o parecer.

Guaíba, 14 de abril de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:
ICP-BrasilFERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS:01902836022
14/04/2021 17:10:12
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 14/04/2021 ás 17:09:00. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação bac0c6c6ec207bdcb152bd788bfa999d.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 87561.