Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 020/2021
PROPONENTE : Ver. Manoel Eletricista
     
PARECER : Nº 048/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dá denominação definitiva ao Hospital Municipal"

1. Relatório:

O Vereador Manoel Eletricista apresentou o Projeto de Lei nº 020/2021 à Câmara Municipal de Guaíba, o qual “Dá denominação definitiva ao Hospital Municipal”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO:

Constata-se que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Leciona Alexandre de Moraes que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local, já que pretende denominar bem público pertencente ao patrimônio do Município.

Diante de tais considerações, o Projeto de Lei nº 020/2021 se insere, efetivamente, na definição de interesse local[1], na medida em que pretende conceder denominação a Hospital no Município de Guaíba. Quanto à matéria de fundo, vejo que a proposta não pretende promover autoridades ou servidores públicos (vedação do artigo 37, § 1º, da CF/88), objetivando tão somente homenagear pessoa já falecida que muito contribuiu para as conquistas de Guaíba, o que não caracteriza qualquer ilegalidade.

Verifica-se, ademais, que a proposta não se insere nas vedações de aposição de cognome de pessoa pública viva em prédio público municipal, sendo de conhecimento notório e público que a pessoa homenageada já é falecida (vide Lei Federal n° 6454/77 e art. 37, § 1º da CF/88).

No que diz respeito à iniciativa para a deflagração do processo legislativo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 03/10/2019, que tanto o Prefeito quanto a Câmara Municipal de Sorocaba (SP) têm competência normativa para a denominação de vias, logradouros e prédios públicos. Por maioria, ao declarar a constitucionalidade de dispositivo da Lei Orgânica do Município, foi assentada a existência de uma coabitação normativa entre os Poderes Executivos (por meio de decreto) e do Legislativo (por meio de lei) para o exercício dessa competência, cada qual no âmbito de suas atribuições. A decisão foi tomada no exame do Recurso Extraordinário (RE) 1151237, que teve repercussão geral reconhecida na sessão de julgamento, sendo o Acórdão assim ementado:

Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. COMPETÊNCIA PARA DENOMINAÇÃO DE PRÓPRIOS, VIAS E LOGRADOUROS PÚBLICOS E SUAS ALTERAÇÕES. COABITAÇÃO NORMATIVA ENTRE OS PODERES EXECUTIVO (DECRETO) E O LEGISLATIVO (LEI FORMAL), CADA QUAL NO ÂMBITO DE SUAS ATRIBUIÇÕES.

  1. As competências legislativas do município caracterizam-se pelo princípio da predominância do interesse local, que, apesar de difícil conceituação, refere-se àqueles interesses que disserem respeito mais diretamente às suas necessidades imediatas. 6. A atividade legislativa municipal submete-se à Lei Orgânica dos municípios, à qual cabe o importante papel de definir, mesmo que exemplificativamente, as matérias de competência legislativa da Câmara, uma vez que a Constituição Federal (artigos 30 e 31) não as exaure, pois usa a expressão interesse local como catalisador dos assuntos de competência municipal. Essa função legislativa é exercida pela Câmara dos Vereadores, que é o órgão legislativo do município, em colaboração com o prefeito, a quem cabe também o poder de iniciativa das leis, assim como o poder de sancioná-las e promulgá-las, nos termos propostos como modelo, pelo processo legislativo federal. 7. A Lei Orgânica do Município de Sorocaba, ao estabelecer, em seu artigo 33, inciso XII, como matéria de interesse local, e, consequentemente, de competência legislativa municipal, a disciplina de denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações, representa legítimo exercício da competência legislativa municipal. Não há dúvida de que se trata de assunto predominantemente de interesse local (CF, art. 30, I). 8. Por outro lado, a norma em exame não incidiu em qualquer desrespeito à Separação de Poderes, pois a matéria referente à “denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações” não pode ser limitada tão somente à questão de “atos de gestão do Executivo”, pois, no exercício dessa competência, o Poder Legislativo local poderá realizar homenagens cívicas, bem como colaborar na concretização da memorização da história e da proteção do patrimônio cultural imaterial do Município. 9. Em nenhum momento, a Lei Orgânica Municipal afastou expressamente a iniciativa concorrente para propositura do projeto de lei sobre a matéria. Portanto, deve ser interpretada no sentido de não excluir a competência administrativa do Prefeito Municipal para a prática de atos de gestão referentes a matéria; mas, também, por estabelecer ao Poder Legislativo, no exercício de competência legislativa, baseada no princípio da predominância do interesse, a possibilidade de edição de leis para definir denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações. 10. Recurso Extraordinário provido, para declarar a constitucionalidade do art. 33, XII, da Lei Orgânica do Município de Sorocaba, concedendo-lhe interpretação conforme à Constituição Federal, no sentido da existência de uma coabitação normativa entre os Poderes Executivo (decreto) e o Legislativo (lei formal), para o exercício da competência destinada a “denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações”, cada qual no âmbito de suas atribuições. 11. Fixada a seguinte tese de Repercussão Geral: "É comum aos poderes Executivo (decreto) e Legislativo (lei formal) a competência destinada a denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações, cada qual no âmbito de suas atribuições". (03/10/2019 PLENÁRIO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.151.237 SÃO PAULO RELATOR: MIN. ALEXANDRE DE MORAES.)

Verifica-se acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ao quanto decidido pelo STF:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 11.203, DE 19 DE OUTUBRO DE 2015, DO MUNICÍPIO DE SOROCABA. ATO NORMATIVO DE INICIATIVA PARLAMENTAR QUE ATRIBUI NOMENCLATURA A PRAÇA PÚBLICA NAQUELA CIDADE. INICIATIVA PARLAMENTAR. DENOMINAÇÃO DE LOGRADOUROS PÚBLICOS. INOCORRÊNCIA DE INDEVIDA INVASÃO DA GESTÃO ADMINISTRATIVA PELO PODER LEGISLATIVO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5º, 47, II E XIV, DA CONSTITUIÇÃO PAULISTA. INCONSTITUCIONALIDADE NÃO RECONHECIDA. AÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO PELA CÂMARA MUNICIPAL DE SOROCABA ADMITIDO PELO STF. DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA QUE SE OBSERVASSE O DISPOSTO NO ARTIGO 1.036 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INVOCAÇÃO DO TEMA 917 DA SISTEMÁTICA DE REPERCUSSÃO GERAL. CASO EM ANÁLISE, COM SUBSUNÇÃO AO TEMA. ACORDÃO ANTERIOR ADAPTADO À JURISPRUDÊNCIA DO E. STF NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ARTIGO 1.040, INCISO II, DO CPC. As hipóteses de limitação da iniciativa parlamentar estão taxativamente previstas no art. 61 da Constituição - numerus clausus -, que trata da reserva de iniciativa de lei do Chefe do Poder Executivo. Não se permite, assim, interpretação ampliativa do citado dispositivo constitucional, para abarcar matérias além daquelas relativas ao funcionamento e estruturação da Administração Pública, mais especificamente, a servidores e órgãos do Poder Executivo. Portanto, não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos. ACÓRDÃO ADEQUADO AO TEMA 917 DO STF PARA JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO. (TJSP; Direta de Inconstitucionalidade 2258181-54.2015.8.26.0000; Relator (a): Amorim Cantuária; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 18/10/2017; Data de Registro: 19/10/2017)

Portanto, nos termos do entendimento exarado pela Suprema Corte e pelo TJSP, a Lei Orgânica de Guaíba e a CF/88 em momento algum restringem a iniciativa dos membros do Legislativo para conceder denominação definitiva aos próprios públicos, aplicando-se, portanto, a iniciativa concorrente prevista no artigo 38 da Lei Orgânica Municipal. Caberia ainda às Comissões identificar se houve Decreto denominando o próprio em questão.

[1]Na presente hipótese, portanto, ao estabelecer, em seu artigo 33, inciso XII, como matéria de interesse local, e, consequentemente, de competência legislativa municipal, a disciplina de denominação de próprios, vias e logradouros públicos e suas alterações , o Município exercitou sua autonomia federativa por meio da Lei Orgânica municipal. Não há dúvida de que se trata de assunto predominantemente de interesse local (CF, art. 30, I), bem como que, o regramento municipal exigiu edição de lei formal e, consequentemente, repita-se, a obrigatoriedade de participação do Prefeito Municipal (sanção/veto)”. (RE 1151237 / SP, Acórdão, pg. 8, voto do Relator Min. Alexandre de Moraes).

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 020/2021, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer.

Guaíba, 18 de fevereiro de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136



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