Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 003/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 025/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Transforma a denominação e atribuições de Secretarias Municipais, órgãos administrativos e cargos e dá outras providências"

1. Relatório

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 003/2021 à Câmara Municipal, o qual “Transforma a denominação e atribuições de Secretarias Municipais, órgãos administrativos e cargos e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle da constitucionalidade, da competência da Câmara Municipal e do caráter pessoal da proposição.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme Hely Lopes Meirellesna obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. MÉRITO

3.1 Da competência e da iniciativa

Quanto à competência, não há óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

A respeito da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe alterações na estrutura administrativa do Executivo, tem-se por adequada a iniciativa do Prefeito, ao qual cabem as competências privativas dos arts. 52 e 119 da Lei Orgânica Municipal:

Art. 52 Compete privativamente ao Prefeito:

[...]

VI – dispor sobre a organização e o funcionamento da Administração Municipal, na forma da Lei;

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da CE/RS:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Portanto, foram respeitadas a iniciativa e a competência para a propositura do Projeto de Lei nº 003/2021, uma vez que apresentado pelo Executivo Municipal, enquanto responsável pela sua organização administrativa.

3.2 Do conteúdo do projeto de lei

A respeito do teor do Projeto de Lei nº 003/2021, tem-se que o seu objeto é reorganizar a estrutura administrativa do Executivo de Guaíba a partir de alterações na Lei Municipal nº 3.753/2019, com previsão dealterações naorganização administrativa (Capítulo II), na competência e composição da administração (Capítulo III) e nos grupos de ações articuladas (Capítulo IV), bem como na Lei Municipal nº 3.754/2019, com transformações de cargos e extinção de funções gratificadas.

A justificativa esclarece que o projeto implementará uma reforma administrativa a fim de dispor da estrutura necessária para a execução do plano de governo da nova gestão municipal, sendo que as principais secretarias atingidas pela reforma são a Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente, a Secretaria Municipal de Obras, a Secretaria Municipal de Habitação e Desenvolvimento Urbano, a Secretaria Municipal de Trabalho e Desenvolvimento, a Secretaria de Mobilidade Urbana e Segurança, a Diretoria de Ação Comunitária, a Diretoria de Serviços Administrativos e a Diretoria de Meio Ambiente e Licenciamento Ambiental.

A proposição envolve matérias complexas e muito relevantes sob o ponto de vista da eficiência administrativa, que recomenda, por sua extensão e relevância, uma análise detida por parte de todos os atores políticos envolvidos.

Em relação às alterações na estrutura de órgãos públicos, nota-se que existem mudanças de denominações, competências e agrupamentos de secretarias municipais. Como se trata de demanda envolvendo a organização administrativa do Poder Executivo Municipal, de iniciativa privativa do Prefeito, não existem inconstitucionalidades flagrantes que impeçam a deliberação da matéria em Plenário, cabendo a análise de mérito e de interesse público aos vereadores.

No que diz respeito às alterações na estrutura de cargos públicos, com a Emenda verifica-se que estão sendo realizadas as seguintes mudanças, de acordo com o impacto orçamentário-financeiro apresentado pelo proponente:

TRANSFORMAÇÕES DE CARGOS

Cargos

Diferença na despesa

Encarregado da Seção de Abordagem de Rua – CC2/FG2 para FG2

-240,68

Chefe da Fisioterapia – CC3/FG3 para FG3

-409,16

Chefe da Odontologia – CC3/FG3 para FG3

-409,16

Chefe da Unidade Transfusional – CC3/FG3 para FG3

-409,16

Chefe do Cadastro Imobiliário – de CC3/FG3 para FG3

-409,16

Assessor do Secretário Municipal de Educação – de CC4/FG4 para FG4

-722,15

Encarregado da Seção de Infraestrutura – FG2 para CC2/FG2

+240,68

Chefe da Divisão de Projetos e Captação de Recursos – FG3 para CC3/FG3

+409,16

Chefe do Departamento da Zona Oeste – de FG3 para CC3/FG3

+409,16

Chefe do Departamento de Serviços Urbanos – de FG3 para CC/FG3

+409,16

Assessor de Apoio Legislativo – FG3 para CC3/FG3

+409,16

Coordenador de Cultura – FG4 para CC4/FG4

+722,15

Assessor Superior II – FG6 para CC6/FG6

+4264,73

EXTINÇÃO DE CARGO

Assessor Superior I – CC5/FG5

-4501,64

Aumento da Despesa

R$ 8.820,91

Redução da Despesa com Encargos

R$ 8.898,79

Impacto com a emenda

-R$ 77,88


A Lei Complementar nº 173/2020 foi editada para o enfrentamento de uma crise sanitária sem precedentes e trouxe regras proibitivas – transitórias – que se aplicam aos Municípios, conforme estabelece o “caput” do art. 8º, que possuem um caráter de contraprestação pelos recursos repassados pela União no âmbito do Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19). As proibições impostas aos entes públicos pelo artigo 8º da Lei Complementar nº 173/2020 terão eficácia temporal de 28 de maio de 2020 até 31 de dezembro de 2021:

Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;

III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

O legislador federal estipulou proibições e restrições, especialmente voltadas a obstar aumento de despesas com pessoal. Sendo assim, frisamos que a legalidade da proposição exige que não haja a incidência das vedações trazidas pela Lei Complementar nº 173/2020.

Apesar de a LC nº 173/2020, no art. 8º, II e III, permitir a alteração da estrutura administrativa e a criação de cargos públicos, inclusive comissionados, desde que o ato não importe em aumento de despesa, se houver a criação de novos cargos fica vedado o preenchimento se tratar-se de cargos novos, já que a própria LC 173/2020 autoriza somente a nomeação nas hipóteses de reposição (inciso IV).

Nos termos da jurisprudência, é possível a alteração de nomenclatura e de atribuições de cargos públicos (vide RE nº 563708 e RE nº 563965, julgados pelo STF em 06/02/2013 e 11/02/2009). Por outro lado, nos termos das orientações dos órgãos de assessoria, o “que não é possível na alteração de atribuições e nomenclatura é a desnaturação do cargo público, ou seja, as alterações devem preservar a sua natureza precípua, de forma a evitar que, a partir das modificações realizadas, o cargo se torne completamente diverso”.

No que diz respeito ao marco temporal para a caracterização da reposição, os órgãos de assessoria jurídica têm orientado pela impossibilidade de provimento de cargos que se tornaram vagos até o dia 27 de maio de 2020 ou que venham a ser criados, mormente se caracterizado o aumento de despesa, mas ressaltam que pode haver entendimentos diversos consubstanciados em pareceres de outros órgãos.

O GRUPO DE ESTUDO SOBRE A LEI COMPLEMENTAR Nº 173/2020 do TCE-RS também considerou a princípio haver marco temporal para o conceito de reposição de cargos públicos:

Nessa hipótese, sem caráter exaustivo, cingindo-se a noção de mudança de titularidade, e tendo como marco temporal de análise a data de 27 de maio de 2020, data anterior ao dia de publicação e entrada em vigor da norma, tem-se que:

a) provido sob a forma de cargo em comissão, não há impeditivo à exoneração, seguida de nomeação de novo titular para o cargo;

O TCE-RS considera que a reposição se daria apenas em caso de vaga surgida a partir de 27 de maio de 2020 e de exoneração seguida de nomeação de novo titular para o cargo:

Mas não se desconhece que a lei pode disciplinar que determinada atribuição de direção, chefia ou assessoramento poderá ser provida sob forma de:

a) cargo em comissão (CC),

b) função gratificada (FG) ou

c) comportar ambas as modalidades (CC/FG).

Nessa hipótese, sem caráter exaustivo, cingindo-se a noção de mudança de titularidade, e tendo como marco temporal de análise a data de 27 de maio de 2020, data anterior ao dia de publicação e entrada em vigor da norma, tem-se que:

a) provido sob a forma de cargo em comissão, não há impeditivo à exoneração, seguida de nomeação de novo titular para o cargo;

b) provido sob a forma de função gratificada, mas também comportando exercício sob forma de cargo em comissão, nada impede a dispensa, seguida de nomeação, desde que não acarrete aumento de despesa;

c) provido sob forma de cargo em comissão, e há permissão de seu exercício sob forma de função gratificada, não há óbice à exoneração seguida de nomeação à função gratificada. 

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, desde que observadas as vedações impostas pela Lei Complementar nº 173/2020 e de que não haja aumento de despesa, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Substitutivo ao Projeto de Lei nº 003/2021, desde que aprovado com a Emenda do Chefe do Poder Executivo Municipal.

É o parecer.

Guaíba, 05 de fevereiro de 2021.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral da Câmara Municipal de Guaíba

OAB/RS nº 107.136

 

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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