Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Veto Total n.º 001/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 009/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Veto Parcial ao Projeto de Lei n.º 108/2019"

1. Relatório:

O Poder Legislativo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 108/2019 à Câmara Municipal, o qual “Dispõe sobre a obrigatoriedade do Poder Executivo Municipal de dar publicidade anualmente à aplicação das emendas parlamentares recebidas pelo Município de Guaíba, e dá outras providências”. A proposta foi aprovada por unanimidade em 22/12/2020. Remetida ao Executivo a redação final do projeto, foi protocolado na Câmara de Vereadores o Veto Parcial, sendo encaminhado à Procuradoria Jurídica para parecer.

2. MÉRITO:

Preliminarmente, quanto ao instituto do veto, esse mecanismo está disposto no art. 15 da Lei Orgânica Municipal, que possui o seguinte texto:

Art. 45. Se o Prefeito julgar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, poderá vetá-lo total ou parcialmente, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da data do recebimento.

§ 1º O veto será sempre justificado e, quando parcial, abrangerá o texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.

§ 2º As razões aduzidas no veto serão apreciadas no prazo de 30 (trinta) dias, contados do seu recebimento, em única discussão e votação, somente podendo ser rejeitado pela maioria absoluta dos Vereadores.

§ 3º Esgotado, sem deliberação, o prazo previsto no parágrafo anterior, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas, até sua decisão final, as demais matérias.

§ 4º Se o veto for rejeitado, o projeto será enviado ao Prefeito, em 48 (quarenta e oito) horas, para promulgação.

Na lição lapidar de Anderson de MENEZES (1999, p. 321), “o veto, submisso o instituto à semântica da palavra, que vem do verbo latino ‘vetare’ (vedar, proibir, impedir que se faça alguma coisa) e está na primeira pessoa do singular do presente do indicativo, consiste em atribuir-se ao chefe do executivo, por tais ou quais motivos, a competência para opor-se à conclusão da feitura da lei, forçando a respeito nova deliberação legislativa”. O veto é um ato político, caracterizando-se como instrumento do sistema presidencialista pelo qual o chefe do Poder Executivo discorda de projeto de lei já aprovado na Casa Legislativa. Aposto, a Casa Legislativa deverá fazer um novo exame da matéria, derrubando ou não o veto. “’Veto’ é o modo de o Chefe do Executivo exprimir sua discordância com o projeto aprovado” (SILVA, 2000, p. 527). Ele deverá ser fundamentado, ou seja, o presidente deverá apresentar as razões que o levaram a discordar do projeto, podendo ser a sua inconstitucionalidade ou razões de interesse público.

Paulo e Alexandrino (2003) lecionam, ademais, que a doutrina dominante entende que o Chefe do Executivo pode vetar, total ou parcialmente, inclusive, projeto de lei de sua iniciativa que tenha sido aprovado pelo Poder Legislativo sem nenhuma alteração, como no caso em análise.

Quanto às razões do veto, de acordo com o Prefeito, este se justifica pelo fato de que as disposições do artigo 2º do projeto contrariam o princípio da separação entre os poderes e fazem remissão a penalidades já presentes na Lei de Acesso à Informação. As razões do veto são, portanto, de ordem constitucional e de interesse público.

A análise do artigo 2º do PL nº 108/2019 leva a crer que os fundamentos constitucionais do veto não vão na linha da jurisprudência do STF:

Do relevo primacial dos "pesos e contrapesos" no paradigma de divisão dos poderes, segue-se que à norma infraconstitucional — aí incluída, em relação à Federal, a constituição dos Estados-membros —, não é dado criar novas interferências de um Poder na órbita de outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Lei Fundamental da República. (ADI 3.046, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ de 28/5/2004).

 

     E mais especificamente quanto à remissão a lei federal (no caso remissão da Lei Municipal à Lei de Acesso à Informação), decidiu o E. STF:

 

            A técnica da remissão a lei federal, tomando-se de empréstimo preceitos nela contidos, pressupõe a possibilidade de o Estado legislar, de modo originário, sobre a matéria. [ADI 3.193, rel. min. Marco Aurélio, j. 9-5-2013, P, DJE de 6-8-2013.]

O dispositivo impugnado constitui reprodução de norma constante na Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, matéria (direito de acesso à informação) para a qual o Município possui competência, razão pela qual se entende não caracterizada a inconstitucionalidade. Veja-se que o dispositivo em questão é tautológico, não trazendo qualquer inovação no mundo jurídico, sendo que apenas reproduz a Lei de Acesso à Informação. A norma também não caracteriza renúncia do direito de legislar.

A transposição, repetição ou remissão de normas entre ordens jurídicas distintas é fenômeno usual no federalismo brasileiro, diante da primazia da Constituição Federal sobre as demais ordens jurídicas e o mimetismo normativo decorrente da fragilidade dos entes subnacionais, sendo frequente que as leis das ordens estaduais, distritais e municipais reproduzam literalmente enunciados normativos presentes nas normas federais. O artigo 2º pode ser caracterizado como simples norma de auto-referência, sem realizar a importação ou incorporação de novo conteúdo material vinculante.

O dispositivo vetado remete a lei complementar federal e manifesta remissão meramente devolutiva ou formal, não podendo esse fragmento, a nosso ver, servir de parâmetro de controle no âmbito da fiscalização de constitucionalidade. Porque a remissão não incorpora conteúdo de norma fundamental específica, determinada, passível de recepção, e porque a remissão da lei municipal a norma federal constitui simples remissão formal, sem conteúdo novo, posto que a violação de qualquer norma da própria Lei de Acesso à Informação é suficiente para a violação do direito de acesso à informação, independentemente da remissão.

Veja-se que a previsão normativa do art. 2º não afronta a separação entre os poderes, pois apenas remete a Lei Complementar Federal.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela viabilidade jurídica do Veto Parcial ao Projeto de Lei nº 108/2019, de autoria do Poder Executivo Municipal, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, devendo ser votado em 30 dias de seu recebimento, em única discussão e votação, considerando as exigências do § 2º do art. 45 da LOM.

Quanto às razões, opinamos pela constitucionalidade do art. 2º do PL nº 108/2019, cabendo ainda ao Poder Legislativo analisar o Veto quanto às razões de interesse público aduzidas pelo Chefe do Poder Executivo Municipal.

É o parecer.

Guaíba, 18 de janeiro de 2021.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136



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