Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 041/2020
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 161/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a Lei Municipal n.º 2.048/2006, e dá outras providências"

1. Relatório:

 O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 041/2020 à Câmara Municipal, objetivando alterar a Lei Municipal nº 2.048, de 16 de janeiro de 2006. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2.FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva, no sentido de alertar para inconformidades que possam estar presentes. Conforme Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. MÉRITO:

 Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”.

A respeito da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto propõe alterações na Lei Municipal nº 2.048, de 16 de janeiro de 2006, que trata do regime próprio de previdência do Município de Guaíba, tem-se por adequada a iniciativa do Prefeito. Para os fins do direito municipal, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme prevêem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS).

Nesse caso, refere o art. 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Portanto, foram respeitadas a iniciativa e a competência para a propositura do Projeto de Lei nº 041/2020, uma vez que apresentado pelo Chefe do Executivo Municipal, enquanto responsável pelo regime jurídico dos servidores públicos municipais.

A respeito do teor do Projeto de Lei nº 041/2020, verifica-se que o seu objeto é alterar disposições da Lei Municipal nº 2.048/2006, de modo a majorar a alíquota patronal do RPPS para 15,16%, modificar o prazo de pagamento de alíquota suplementar e revogar os incisos III e XI do § 8º do art. 14.

Não foi acostada à proposição qualquer manifestação técnica ou documento atuarial instruindo o processo legislativo, tampouco manifestação dos Conselhos do GuaíbaPrev, nem demais informações quanto à situação financeira do Município para a análise dos Vereadores, sugerindo-se eventual solicitação pela Comissão de Justiça e Redação.

A Portaria nº 464, de 19 de novembro de 2018, do Ministério da Fazenda, “Dispõe sobre as normas aplicáveis às avaliações atuariais dos regimes próprios de previdência social – RPPS da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e estabelece parâmetros para a definição do plano de custeio e o equacionamento do déficit atuarial.” O seu art. 3º trata especificamente das avaliações atuariais anuais, estabelecendo que:

Art. 3º Deverão ser realizadas avaliações atuariais anuais com data focal em 31 de dezembro de cada exercício, coincidente com o ano civil, que se refiram ao cálculo dos custos e compromissos com o plano de benefícios do RPPS, cujas obrigações iniciar-se-ão no primeiro dia do exercício seguinte.

  • 1º A avaliação atuarial com data focal em 31 de dezembro de cada exercício deverá:

I - ser elaborada por atuário habilitado;

II - atender aos parâmetros gerais estabelecidos nesta Portaria e nas instruções normativas editadas pela Secretaria de Previdência;

III - ser realizada em consonância com a Nota Técnica Atuarial (NTA) do plano de benefícios do RPPS;

IV - atestar a situação do RPPS em relação ao equilíbrio financeiro e atuarial nessa data;

V - incluir todos os benefícios concedidos e a conceder previstos nas normas vigentes nessa data e respectivos critérios para sua concessão, manutenção e pagamento, indicando, se for o caso, a necessidade de revisão do plano de benefícios;

VI - fornecer as projeções atuariais e a avaliação da situação financeira e atuarial do RPPS, de que trata a Lei Complementar nº 101, de 2000;

VII - apurar as provisões matemáticas previdenciárias a serem registradas nas demonstrações contábeis levantadas nessa data, observadas as normas de contabilidade aplicáveis ao Setor Público;

VIII - definir o resultado atuarial do RPPS, apurando os custos normal e suplementar e os compromissos do plano de benefícios do regime para estabelecer o plano de custeio de equilíbrio do RPPS embasado em método de financiamento de que trata o art. 13 e descrito na NTA, indicando, se for o caso, a necessidade de revisão do plano vigente; e

IX - fornecer aos dirigentes e membros dos conselhos deliberativo e fiscal do RPPS e aos gestores e representantes legais dos entes federativos informações que possibilitem o contínuo acompanhamento da solvência e liquidez do plano de benefícios.

§ 2º Os resultados das avaliações atuariais anuais deverão ser registrados no Relatório da Avaliação Atuarial.

§ 3º Caso as normas de contabilidade aplicáveis ao Setor Público determinem o registro mensal das provisões matemáticas previdenciárias, os valores poderão ser obtidos por:

I - recorrência ou interpolação linear daqueles apurados na avaliação com data focal em 31 de dezembro, observando-se parâmetros estabelecidos em instrução normativa da Secretaria de Previdência; e

II - recálculo.

§ 4º A avaliação atuarial deverá ser embasada nas normas gerais de organização e funcionamento dos RPPS e na legislação do ente federativo vigentes em 31 de dezembro, mas, em caso de legislação publicada até a data de sua realização e ainda não aplicável, o Relatório da Avaliação Atuarial deverá demonstrar os seus impactos para o RPPS e para os resultados apontados.

§ 5º Para elaboração das projeções atuariais e registro das provisões matemáticas previdenciárias de que tratam os incisos VI e VII, deverá ser utilizado o plano de custeio vigente na data focal da avaliação atuarial, ou outro parâmetro definido pela Secretaria de Previdência, alinhado às normas gerais de contabilidade aplicáveis ao Setor Público.

Como se nota, a mencionada portaria determina a realização de avaliações atuariais anuais dos regimes próprios de previdência social, contemplando uma série de informações que devem fundamentar as medidas políticas tomadas para garantir o equilíbrio atuarial e financeiro dos respectivos sistemas. No presente caso, o proponente não acostou o documento indispensável para a análise dos membros e dos órgãos técnicos do Poder Legislativo, não estando comprovada, portanto, a garantia do equilíbrio atuarial do GuaíbaPrev com a fixação da alíquota patronal de 15,16% e com a modificação do § 8º do art. 14.

No que tange aos impactos financeiros da medida à luz da Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020, deve-se registrar, inicialmente, que a pandemia de COVID-19 provocou um estado de calamidade pública que, devido a suas repercussões, tornou necessária a edição de um programa federativo para que a União possa auxiliar financeiramente os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no enfrentamento da crise econômica.

O art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020 – que estabelece o referido Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19) – prevê, no art. 8º, inciso VII e § 2º:

Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

[...]

VII – criar despesa obrigatória de caráter continuado, ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I – em se tratando de despesa obrigatória de caráter continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II – não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

  As medidas propostas no Projeto de Lei nº 041/2020 configuram despesas obrigatórias de caráter continuado, na medida em que derivam de lei que fixa para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios (art. 17, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal). Desse modo, na forma do § 2º do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, a validade da criação de despesa obrigatória de caráter continuado no presente período de calamidade pública depende da prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que tais medidas deverão ser permanentes e, se não forem implementadas previamente, a lei será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

4.Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria, seguindo a Orientação Técnica nº 49.358/2020 do IGAM, entende que a viabilidade do Projeto de Lei nº 041/2020 está condicionada à instrução do processo legislativo com o cálculo atuarial que atenda às exigências da Portaria nº 464/2018 do Ministério da Fazenda e com a demonstração da prévia compensação da despesa obrigatória de caráter continuado mediante aumento de receita ou redução de despesa, conforme previsto no art. 8º, inciso VII e § 2º, da Lei Complementar nº 173/2020 (Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2). Recomenda-se que a Comissão de Justiça e Redação solicite os documentos para análise.

É o parecer.

Guaíba, 16 de outubro de 2020.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS                                                      GUSTAVO DOBLER

Procurador Geral da Câmara de Guaíba                                                     Procurador

OAB/RS 107.136                                                                                           OAB/RS 110.114B



O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil.
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 16/10/2020 ás 11:21:04. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 7019b57c2bcedd9ef73a3c796065d992.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 81830.