Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 060/2020
PROPONENTE : Ver.ª Claudinha Jardim
     
PARECER : Nº 152/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe e institui no Calendário Oficial de Guaíba, a Semana Municipal do Lixo Zero, e de outras providencias"

1. Relatório

A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 060/2020 à Câmara Municipal, objetivando instituir, no Município de Guaíba, a Semana Municipal do Lixo Zero. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Inicialmente, verifica-se estar adequada, em parte, a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe a instituição da Semana Municipal do Lixo Zero, a ser celebrada, anualmente, na última semana do mês de outubro. Não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria aqui tratada, desde que não sejam previstos deveres, obrigações ou mesmo “permissões” ao Executivo quanto à logística e à operacionalização. A propósito do tema, destaca-se o posicionamento da jurisprudência:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 4.751/2014 que inclui no calendário oficial de eventos do Município a "Corrida Ciclística". Norma guerreada que não versou simplesmente sobre a instituição de data comemorativa no calendário oficial do Município, mas, ao revés, instituiu evento esportivo com criação de obrigações ao Executivo e despesas ao erário, sem previsão orçamentária e indicação da fonte e custeio. Afronta aos arts. 5º, 47, II e XIV, 25 e 144 da Carta Bandeirante, aplicáveis ao município por força do principio da simetria constitucional. Inconstitucionalidade reconhecida. [...] (TJ-SP - ADI: 21628784720148260000 SP 2162878-47.2014.8.26.0000, Relator: Xavier de Aquino, Data de Julgamento: 11/03/2015, Órgão Especial, Data de Publicação: 16/03/2015).

Além disso, não há impedimento algum a que datas comemorativas sejam informadas por objetivos ou princípios, contanto que não obriguem de qualquer forma o Poder Executivo, traduzindo-se como meras inspirações e diretrizes do evento. Inclusive, no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – onde há vários precedentes em ações diretas de inconstitucionalidade sobre a instituição de datas comemorativas –, foi julgado constitucional o artigo 2º da Lei Municipal nº 11.409, de 08 de setembro de 2016, do Município de Sorocaba, por apenas ter fixado os objetivos da Semana de Conscientização, Prevenção e Combate à Verminose. Eis aqui parte do esclarecedor voto adotado:

Como referi por ocasião da decisão em que indeferi a medida liminar (págs. 83/84), não se vê invasão de competência normativa do Poder Executivo, porquanto, instituída semana de conscientização, prevenção e combate à verminose naquela municipalidade, o artigo 2º, ora impugnado, não vai além de fixar os objetivos da campanha, sem fixar novas incumbências a servidores que, à evidência, e se necessárias, não irão além das de cunho ordinário, situação a não exigir peculiaridades características de aumento de despesas ordenadas pelo Legislativo.

Transcreve-se, ainda, ementa de outro julgado do TJSP sobre idêntica matéria:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei Nº 3.898, de 25 de abril de 2016, do Município de Mirassol, que 'Institui A Semana de Combate ao Aedes Aegypt no âmbito do Município de Mirassol'. Inicial que aponta ofensa a dispositivos que não guardam relação com o tema em debate, tal como carece de fundamentação correlata (artigos 1º, 111, 180 e 181 da CE, bem como artigo 22, inciso XXVII da CR). Impertinência de exame. Iniciativa oriunda do poder legislativo local. Viabilidade. Inconstitucionalidade formal não caracterizada. Lei que não disciplina matéria reservada à Administração, mas sim sobre programa de conscientização de caráter geral. Ausência de invasão à iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, cujo rol taxativo é previsto no artigo 24, § 2º da Carta Estadual, aplicável aos Municípios por força do artigo 144 do mesmo diploma. ATO normativo, ademais, que não impõe qualquer atribuição ao Executivo local, ostentando conteúdo educativo a justificar atuação legislativa municipal. Ausência de violação ao princípio da separação dos poderes. Mácula aos artigos 5º, 47, incisos II, XIV E XIX, da Constituição Bandeirante, não constatada. Previsão orçamentária genérica que, por si só, não tem o condão de atribuir inconstitucionalidade à lei. Precedentes. Pretensão improcedente (ADI 2101150-34.2016, rel. Des. FRANCISCO CASCONI, j. 19.10.2016).

Na presente situação, todavia, o art. 2º cria permissões ao Executivo para desenvolver ações relacionadas à Semana Municipal do Lixo Zero. O caput do art. 2º e o seu inciso I vinculam o Poder Público à realização da data comemorativa, o que desrespeita o comando do art. 60, II, “d”, da Constituição Estadual Gaúcha, assim transcrito:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Assim, embora sejam admiráveis a justificativa e os termos da proposta, o Projeto de Lei nº 060/2020 contém vício de iniciativa, por dispor sobre um programa que envolve atribuições de órgãos públicos, em afronta ao art. 60, II, “d”, da Constituição Estadual.

3. Conclusão

Diante do exposto, a Procuradoria Jurídica orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa existente no art. 2º, caput e inciso I, caracterizado com base no art. 60, II, “d” da CE/RS. Recomenda-se a apresentação de substitutivo corrigindo os dispositivos viciados, podendo-se adotar o modelo anexo ao parecer. Necessária, ainda, a correção da ementa, para a retirada da inclusão no Calendário Oficial de Eventos.

Guaíba, 22 de setembro de 2020.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI Nº 060/2020

Institui, no Município de Guaíba, a Semana Municipal do Lixo Zero e dá outras providências.

Art. 1º Fica instituída, no Município de Guaíba, a Semana Municipal do Lixo Zero, a ser realizada na última semana do mês de outubro.

Art. 2º A Semana Municipal do Lixo Zero será realizada anualmente, como instrumento de Política Pública Socioambiental no Município, e tem como objetivos:

I – proporcionar ambientes para discussão e conscientização sobre as temáticas dos resíduos sólidos no Município de Guaíba;

II – fomentar a economia solidária, inclusão social e educação socioambiental;

III – propor a reutilização do lixo, reciclagem, compostagem e a não geração de resíduos sólidos no Município;

IV – promover ações educativas e de conscientização sobre a temática;

V – incentivar o consumo consciente;

VI – realizar palestras, fóruns, seminários e eventos em geral sobre a temática, bem como ações coletivas de limpeza em espaços públicos do Município;

VII – disseminar e proporcionar a produção científica e acadêmica.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.



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