PARECER JURÍDICO |
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"Institui no Município de Guaíba a Semana da Transparência Pública" 1. RelatórioA Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 055/2020 à Câmara Municipal, objetivando instituir, no Município de Guaíba, a Semana da Transparência Pública. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. 2. MÉRITODe fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Inicialmente, verifica-se estar adequada, em parte, a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe a instituição da Semana da Transparência Pública, a ser celebrada, anualmente, na semana que incluir o dia 16 de maio, data comemorativa da Lei nº 12.527/2011. Não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria aqui tratada, desde que não sejam previstos deveres, obrigações ou mesmo “permissões” ao Executivo no que diz respeito à logística e à operacionalização. A propósito do tema, destaca-se o posicionamento da jurisprudência:
Além disso, não há impedimento algum a que datas comemorativas sejam informadas por objetivos ou princípios, contanto que não obriguem de qualquer forma o Poder Executivo, traduzindo-se como meras inspirações e diretrizes do evento. Inclusive, no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – onde há vários precedentes em ações diretas de inconstitucionalidade sobre a instituição de datas comemorativas –, foi julgado constitucional o artigo 2º da Lei Municipal nº 11.409, de 08 de setembro de 2016, do Município de Sorocaba, por apenas ter fixado os objetivos da Semana de Conscientização, Prevenção e Combate à Verminose. Eis aqui parte do esclarecedor voto adotado:
Transcreve-se, ainda, ementa de outro julgado do TJSP sobre idêntica matéria:
Na presente situação, todavia, o art. 3º cria permissão ao Executivo para desenvolver ações educativas através de palestras, seminários, conferências e atividades culturais e de lazer. As disposições de natureza meramente autorizativa têm por finalidade contornar a limitação constitucional da iniciativa (art. 61, § 1º, CF e art. 60, CE/RS) para evitar a configuração de inconstitucionalidade, o que, porém, não tem essa aptidão. Inclusive, no âmbito da CCJ da Câmara dos Deputados, é recorrente o entendimento de que projetos de lei com disposições autorizativas são inconstitucionais, tendo sido editada, em 1994, a Súmula de Jurisprudência nº 1: “Projeto de lei, de autoria de Deputado ou Senador, que autoriza o Poder Executivo a tomar determinada providência, que é de sua competência exclusiva, é inconstitucional.” Na esfera da Comissão de Educação e Cultura e da Comissão de Finanças e Tributação, também já há precedentes no sentido de rejeitar projetos de lei autorizativos, por ainda assim violarem a regra de reserva de iniciativa. Além do mais, é preciso destacar a falta de juridicidade nos projetos de lei simplesmente autorizativos. Para melhor esclarecer essa questão, registra-se a lição de Miguel Reale (Lições Preliminares de Direito, 27. ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 163):
Ou seja, a lei é, necessariamente, um instrumento de constituição de direitos ou de obrigações, sendo incompatível com a sua natureza a positivação de meras faculdades ou possibilidades, que acabam não tendo qualquer juridicidade. A lei, enquanto norma genérica, abstrata, imperativa e coercitiva, não admite simples concessões. Conforme Márcio Silva Fernandes, titular do cargo de Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados, no estudo “Inconstitucionalidade de projetos de lei autorizativos”,
Assim, o art. 3º do Projeto de Lei nº 055/2020 incorre em inconstitucionalidade por configurar antijurídica “lei autorizativa”, que é considerada um meio inválido e ilegítimo de legislar por não possuir aptidão para constituir, com força de lei, direitos ou deveres. Além disso, em relação ao registro da campanha no calendário oficial de eventos, ocorre violação à reserva de iniciativa do Chefe do Executivo para deflagrar o processo legislativo. Isso porque o calendário oficial de eventos municipais é instituído por meio de lei municipal de iniciativa do Chefe do Executivo, por se tratar de matéria atinente à organização administrativa, nos exatos termos do artigo 61, § 1º, II, “b”, da Constituição Federal, aplicável por simetria aos Estados e Municípios, em virtude de sua natureza de norma constitucional de reprodução obrigatória. No mesmo sentido, o artigo 52, VI, da Lei Orgânica Municipal refere competir privativamente ao Prefeito “dispor sobre a organização e o funcionamento da Administração Municipal, na forma da Lei”. Em Guaíba, o calendário oficial de eventos é reavaliado anualmente, tendo sido instituído, neste ano, através da Lei Municipal nº 3.860, de 30 de janeiro de 2020, a qual, como já foi dito, é de iniciativa do Prefeito enquanto responsável pelas questões relacionadas à organização administrativa. O anexo único à Lei nº 3.860/2020 detalha, mês a mês, os eventos a serem realizados durante o ano pelo Município, cabendo a gestão e a ordenação ao Poder Executivo. Portanto, tratando-se de matéria relacionada à organização administrativa do Município de Guaíba, que despende recursos, pessoal e força de trabalho para a realização de eventos, convém esclarecer que a iniciativa de projeto de lei determinando a inclusão de certa campanha no calendário oficial de eventos é do Chefe do Executivo. Nesse sentido, destaca-se o posicionamento da jurisprudência:
3. ConclusãoDiante do exposto, a Procuradoria Jurídica orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa existente nos arts. 1º e 3º, caracterizado com base no art. 61, § 1º, da CF/88 e no art. 60, II, “d” da CE/RS. Recomenda-se a apresentação de substitutivo corrigindo os dispositivos viciados, podendo-se adotar o modelo anexo ao parecer. Guaíba, 31 de agosto de 2020. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B
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