Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 045/2020
PROPONENTE : Ver.ª Claudinha Jardim
     
PARECER : Nº 124/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Cria o Dia Municipal do Empreendedorismo Feminino e dá outras providências"

1. Relatório

A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 045/2020 à Câmara de Vereadores, objetivando instituir, no Município de Guaíba, o “Dia Municipal do Empreendedorismo Feminino”. A proposição foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO 

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Inicialmente, verifica-se estar adequada, em parte, a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, já que o projeto de lei apresentado propõe a instituição do “Dia Municipal do Empreendedorismo Feminino”, a ser celebrado, anualmente, em 11 de novembro. Não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria aqui tratada, desde que não sejam previstos deveres, obrigações ou mesmo “permissões” ao Executivo no que diz respeito à logística e à operacionalização, o que macula o projeto de vício de iniciativa.

A despeito do mérito do Projeto de Lei nº 045/2020, que busca valorizar o empreendedorismo feminino no âmbito municipal, em relação ao art. 2º, a iniciativa é reservada à Mesa Diretora da Câmara. Isso porque, de um modo geral, tal autoridade é a responsável pela organização administrativa e pela ordenação das despesas de interesse interno do Poder Legislativo, cabendo-lhe a iniciativa para deflagrar o processo legislativo que disponha sobre essa matéria específica.

Nesse sentido, o art. 21 do Regimento Interno revela que “A Mesa é órgão diretivo dos trabalhos legislativos e administrativos da Câmara Municipal, eleita em votação nominal, a cada ano.” Portanto, sendo órgão diretivo da função administrativa da Câmara, tem-se que lhe compete, privativamente, iniciar as proposições que se refiram à regulamentação dos serviços internos, como as sessões solenes; do contrário, os demais membros da Casa Legislativa estarão interferindo na organização administrativa do órgão.

O Supremo Tribunal Federal já decidiu que as normas relativas ao processo legislativo, previstas na CF/88, são de reprodução obrigatória pelos entes federados:

Agravo regimental no recurso extraordinário. Constitucional. Representação de inconstitucionalidade de lei municipal em face de Constituição Estadual. Processo legislativo. Normas de reprodução obrigatória. Criação de órgãos públicos. Competência do Chefe do Poder Executivo. Iniciativa parlamentar. Inconstitucionalidade formal. Precedentes. 1. A orientação deste Tribunal é de que as normas que regem o processo legislativo previstas na Constituição Federal são de reprodução obrigatória pelas Constituições dos Estados-membros, que a elas devem obediência, sob pena de incorrerem em vício insanável de inconstitucionalidade. [...] (RE 505476 AgR, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 21/08/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-176 DIVULG 05-09-2012 PUBLIC 06-09-2012).

Importante trazer, como referência de simetria, o previsto no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (artigo 15, inc. XVII):

Art. 15. À Mesa compete, dentre outras atribuições estabelecidas em lei, neste Regimento ou por resolução da Câmara, ou delas implicitamente resultantes:

XVII - propor, privativamente, à Câmara projeto de resolução dispondo sobre sua organização, funcionamento, polícia, regime jurídico do pessoal, criação, transformação ou extinção de cargos, empregos e funções e fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

Perceba-se, assim, que em âmbito federal compete à Mesa Diretora a proposição de projetos envolvendo questões essencialmente administrativas (“organização e funcionamento”), o que, por simetria, é aplicável ao caso em análise, diante da mesma natureza das funções exercidas pela Câmara Municipal.

Desse modo, apesar de honrosa sob o ponto de vista material, a instituição de sessão solene para celebrar o Dia Municipal do Empreendedorismo Feminino (art. 2º) é matéria própria da Mesa Diretora da Câmara, por ser o órgão diretivo responsável pela função administrativa, a quem cabe dispor sobre organização e funcionamento do Poder Legislativo Municipal e, a partir disso, ordenar a realização de despesas. Assim, a proposta, nesse ponto, está maculada de inconstitucionalidade formal propriamente dita, de natureza subjetiva, por vício na fase de iniciativa, em violação aos arts. 8º, 10 e 82, VII, da Constituição Estadual.

3. Conclusão

Diante do exposto, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa caracterizado com base nos arts. 8º, 10 e 82, VII, da Constituição Estadual. Sugere-se à autora, por outro lado, a apresentação de substitutivo suprimindo o art. 2º, por não haver inconstitucionalidade na mera instituição da data comemorativa.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 11 de agosto de 2020.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil.
Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 11/08/2020 ás 10:34:38. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 8f9a03561a7f6691f509897aa7bce79c.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 81005.