Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 031/2020
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 122/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a Lei Municipal n.º 2.777, de 25 de agosto de 2011, e dá outras providências"

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou à Câmara Municipal o Projeto de Lei nº 031/2020, o qual “Altera a Lei Municipal n.º 2.777, de 25 de agosto de 2011, e dá outras providências”. O projeto foi remetido a esta Procuradoria, para parecer jurídico, com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Leciona Alexandre de Moraes que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local.

Diante desses fundamentos, a medida que se pretende instituir se insere, efetivamente, na definição de interesse local, uma vez que diz respeito a alterações na Lei nº 2.777, de 2011, a qual disciplina os procedimentos a serem observados para as eleições de diretores e vice-diretores de escolas municipais, matéria de interesse eminentemente local e portanto inserida na competência legislativa do Município.

A iniciativa para o processo legislativo está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 031/2020 diz respeito à organização e funcionamento dos serviços públicos  e ao planejamento das políticas públicas municipais e foi apresentado pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, por força do art. 60, II da Constituição Estadual:

Art. 60. São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

(...)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Quanto à matéria de fundo, pretendendo suspender o processo em decorrência dos efeitos da pandemia do COVID-19, também não há qualquer óbice à proposta.

O próprio Governo do Estado do Rio Grande do Sul, através da Secretaria de Educação, determinou às Coordenadorias Regionais de Educação que orientassem as escolas para suspender os processos de eleição de Diretor – SEDUC, PLANO DE TRABALHO - Estabelece as medidas temporárias de prevenção ao contágio pelo COVID-19 (novo Coronavírus) no âmbito da Rede Estadual de Ensino no período de suspensão das aulas presenciais - ANEXO II, pg. 8[1].

Não se olvide, todavia, que a competência para prover os cargos de direção nas escolas públicas municipais é privativa do Chefe do Poder Executivo, como se depreende da jurisprudência assentada pelos tribunais, incluso o E. STF:

STF. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Art. 308, inc. XII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Normas regulamentares. Educação. Estabelecimentos de ensino público. Cargos de direção. Escolha dos dirigentes mediante eleições diretas, com participação da comunidade escolar. Inadmissibilidade. Cargos em comissão. Nomeações de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo. Ofensa aos arts. 2º, 37, II, 61, § 1º, II, "c", e 84, II e XXV, da CF. Alcance da gestão democrática prevista no art. 206, VI, da CF. Ação julgada procedente. Precedentes. Voto vencido. É inconstitucional toda norma que preveja eleições diretas para direção de instituições de ensino mantidas pelo Poder Público, com a participação da comunidade escolar. (ADI 2997, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 12/08/2009, DJe-045 DIVULG 11-03-2010 PUBLIC 12-03-2010 EMENT VOL-02393-01 PP-00119)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ARTIGO 213, § 1º. LEIS GAÚCHAS N.ºS 9.233/91 E 9.263/91. ELEIÇÃO PARA PROVIMENTO DE CARGOS DE DIRETORES DE UNIDADE DE ENSINO. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. É competência privativa do Chefe do Poder Executivo o provimento de cargos em comissão de diretor de escola pública. 2. Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, artigo 213, § 1º, e Leis estaduais nºs 9.233 e 9.263, de 1991. Eleição para o preenchimento de cargos de diretores de unidade de ensino público. Inconstitucionalidade. Ação Direta de Inconstitucionalidade procedente (ADI 578/RS, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. em 03 de março de 1999)

TJ/RS: Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE FREDERICO WESTPHALEN. ELEIÇÕES PARA FUNÇÕES DE DIREÇÃO DE ESCOLA PÚBLICA. PRERROGATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. 1. Rejeitada a arguição de afronta ao disposto no art. 1º da Lei nº 8.437/92, porquanto a jurisprudência pátria tem temperado o óbice legal em face de situações excepcionais em que o diferimento da liminar possa inviabilizar a eficácia do provimento, caso concedido somente ao final. 2. A Constituição da República dispõe, ao art. 37, inciso II, que "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração", o que resguarda ao Chefe do Poder Executivo a faculdade de efetuar a livre designação de servidor para a função comissionada de Diretor, sem que haja a necessidade de eleições pela comunidade escolar. 3. A decisão do juízo não viola, mas preserva a autonomia do Chefe do Poder Executivo para dispor sobre a organização e funcionamento da Administração municipal, competindo-lhe a livre nomeação e exoneração dos servidores para funções comissionadas. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (Agravo de Instrumento Nº 70072153828, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 30/03/2017)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE CAMAQUÃ. LEIS MUNICIPAIS QUE DISPÕEM SOBRE ELEIÇÕES COMUNITÁRIAS PARA OS CARGOS DE DIRETOR E VICE-DIRETOR DAS ESCOLAS. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. Os cargos de Diretor e Vice-Diretor de Escola são considerados cargos de confiança, de livre nomeação e exoneração pelo Chefe do Poder Executivo Municipal. As Leis Municipais, ao disporem que a escolha desses cargos será feita mediante eleição pela comunidade escolar, retira a prerrogativa constitucional do Chefe do Poder Público Municipal de prover servidores para exercer cargo em comissão, o que ofende o disposto nos artigos art. 37, inciso II, da Constituição Federal e 32 e 82, inciso XVIII, da Constituição Estadual, que, por simetria, aplicam-se também aos Municípios. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALDIADE JULGADA PROCEDENTE, POR MAIORIA. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70074958513, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 23/01/2018)

[1] https://estado.rs.gov.br/upload/arquivos//seduc-plano-trabalho-coronavirus.pdf

3. Conclusão:

Diante do exposto, observada a jurisprudência cotejada quanto à prerrogativa do Chefe do Poder Executivo para a escolha dos cargos de direção, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 031/2020, do Poder Executivo Municipal, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, tendo inclusive a SEDUC orientado as escolas para suspender os processos de eleição de Diretor em razão das medidas temporárias de prevenção ao contágio pelo COVID-19.

É o parecer.

Guaíba, 03 de agosto de 2020.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136



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