Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 019/2020
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 086/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a tabela do inciso I, do Art. 61, da Lei Municipal 2.734, de 10 de maio de 2011, que reestrutura o Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério Público do Município, e dá outras providências"

1. Relatório:

 O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 019/2020 à Câmara Municipal,objetivando alterar a tabela do inciso I do art. 61 da Lei Municipal nº 2.734, de 10 de maio de 2011, que reestrutura o Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério Público do Município.A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. mérito

3.1 Da competência legislativa e da iniciativa do processo legislativo

 

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

No mesmo sentido, o artigo 6º, inciso I, da Lei Orgânica Municipal (LOM) refere: “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”.

A pretendida reestruturação do Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério Público Municipal é matéria que se insere, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque, além de veicular tema de competência legislativa não privativa da União (art. 22 da CF/88), o Projeto de Lei nº 019/2020 busca, no estrito âmbito local, modificar a tabela do inciso I do art. 61 da Lei Municipal nº 2.734, de 10 de maio de 2011, referente ao nível I dos cargos efetivos do magistério municipal.

No que diz respeito à iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto objetiva alterar o nível I dos cargos efetivos do magistério municipal, tem-se por adequada a iniciativa do Prefeito. Para os fins do direito municipal, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual quanto à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS).

Nesse caso, refere o art. 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

  1. a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;
  2. b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;
  3. c) organização da Defensoria Pública do Estado;
  4. d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

No âmbito municipal, o art. 119 da LOM reproduz as hipóteses de iniciativa legislativa privativa do Prefeito, nos seguintes termos:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Portanto, a proposta está adequada sob os aspectos da competência legislativa e da iniciativa, estando também apropriada a espécie normativa adotada para veicular a matéria, considerando que o art. 37, inciso X, da CF/88 exige lei específica para alterar a remuneração de servidores públicos e já existe disposição dessa natureza a tratar do tema (Lei Municipal nº 2.734/2011).

 

3.2 Dos aspectos materiais da proposição legislativa

 

De acordo com a exposição de motivos, a proposta foi apresentada com o objetivo de aumentar o nível I dos cargos efetivos do Plano de Carreira do Magistério Público Municipal para “1,1 x P.R” (PR = valor referencial), a fim de que nenhum membro tenha vencimento inferior ao piso nacional profissional da categoria.

O piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da educação básica é uma conquista obtida com o advento da Emenda Constitucional nº 53/2006, a qual introduziu, no inciso VIII do art. 206 da CF/88, o direito a que todo profissional dessas carreiras tenha o seu vencimento inicial fixado em valor igual ou superior a um parâmetro estipulado em lei, medida inspirada no princípio constitucional da valorização dos profissionais da educação escolar, também positivado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 no art. 206, inciso V. A referida emenda constitucional ainda criou uma regra transitória, disposta no ADCT da CF/88, no sentido de que a lei deve dispor sobre prazo para a fixação, em lei específica federal, do piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da educação básica (art. 60, inciso III, alínea “e”).

De tal cenário surgiu a Lei Federal nº 11.738, de 16 de julho de 2008, que veio a regulamentar a alínea “e” do inciso III do art. 60 do ADCT, estabelecendo regras sobre o piso salarial nacional da categoria. Dispõe o seu art. 2º, § 1º, que “O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.” Ou seja, o piso salarial profissional nacional é o valor mínimo de vencimento inicial dos cargos da categoria, abaixo do qual os entes federados não poderão estabelecer para os seus servidores, a fim de que seja respeitado o mandamento constitucional da valorização dos profissionais da educação.

Dispõe o § 2º do art. 2º que “Por profissionais do magistério público da educação básica entendem-se aqueles que desempenham as atividades de docência ou as de suporte pedagógico à docência, isto é, direção ou administração, planejamento, inspeção, supervisão, orientação e coordenação educacionais, exercidas no âmbito das unidades escolares de educação básica, em suas diversas etapas e modalidades, com a formação mínima determinada pela legislação federal de diretrizes e bases da educação nacional.” Também prevê o § 3º do art. 3º que “Os vencimentos iniciais referentes às demais jornadas de trabalho serão, no mínimo, proporcionais ao valor mencionado no caput deste artigo.” Isto é, para os entes federados que adotem jornadas de trabalho inferiores a 40 (quarenta) horas, é obrigatório que, no mínimo, seja garantida a proporcionalidade do valor fixado como piso salarial na Lei Federal nº 11.738/2008.

O valor fixado inicialmente pela Lei nº 11.738/2008 foi de R$ 950,00 mensais, para a formação em nível médio na modalidade normal (art. 2º, caput). Tal valor, segundo a lei, deve ser atualizado anualmente, no mês de janeiro, utilizando-se para tanto uma forma própria de cálculo, que deve seguir o mesmo percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente, nos termos da Lei Federal nº 11.494/2007 (art. 5º, caput e parágrafo único).

No ano de 2020, o piso salarial dos profissionais da educação básica em início de carreira foi reajustado em 12,84%, passando de R$ 2.557,74 para R$ 2.886,24. Isto é, com a mencionada atualização, nenhum profissional do magistério público da educação básica pode ter seu vencimento inicial fixado em valor inferior a R$ 2.886,24 para 40 (quarenta) horas, cabendo, como já dito anteriormente, cálculo proporcional para as jornadas inferiores.

No caso de Guaíba, o art. 30 da Lei Municipal nº 2.734/2011 define que o regime normal de trabalho dos membros do magistério é de 20 (vinte) horas semanais. Nessa lógica, o vencimento inicial da carreira, a partir de 2020, não pode ficar abaixo de R$ 1.443,12, sendo esse o piso salarial para a jornada de 20 horas.

A forma de cálculo adotada pelo Município de Guaíba para definir o vencimento básico dos cargos é o resultado da classe e do nível a que o servidor pertence. As classes são divididas em A, B, C, D, E, F e G, constituindo a linha de promoção dos membros do magistério (art. 8º da Lei Municipal nº 2.734/2011). Os níveis, por sua vez, são a linha de habilitação dos membros do magistério, dividindo-se em I (ensino médio – habilitação normal), II (ensino superior – licenciatura plena), III (pós-graduação – lato sensu), IV (mestrado) e V (doutorado), conforme prevê o art. 20 da mesma lei.

Todo cargo se inicia na classe A (art. 9º da Lei Municipal nº 2.734/11). Os níveis, por outro lado, são calculados com base no valor referencial (P.R.), sendo que o menor deles é equivalente a “1,0 x P.R.” (nível I), isto é, corresponde exatamente ao valor referencial. Os demais níveis têm fórmulas que agregam valores maiores, sendo “1,5 x P.R.” para o nível II, “1,7 x P.R.” para o nível III, “1,8 x P.R.” para o nível IV e “2,0 x P.R.” para o nível V.

O piso salarial profissional nacional, como prevê o § 2º do art. 2º da Lei Federal nº 11.738/2008, “é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.”, sendo, em 2020, para 40 horas, o valor de R$ 2.886,24 mensais para formação em nível médio, na modalidade normal (art. 2º, caput, da Lei Federal nº 11.738/2008), e R$ 1.443,12 para 20 horas.

A proposição, nesse sentido, vem exatamente com o propósito de garantir que o piso salarial profissional nacional continue sendo respeitado no Município de Guaíba, já que, sendo de R$ 1.278,87 para 20 horas em 2019 (metade de R$ 2.557,74), ficaria abaixo do mínimo atual (2020) de R$ 1.443,12 se não houvesse alguma modificação, seja pelo acréscimo de percentual no nível I, seja pela atualização do próprio valor referencial.

O detalhe é que o Município de Guaíba tem por prática a atualização do próprio valor referencial que serve de base de cálculo dos níveis com o percentual de atualização do piso salarial nacional, podendo-se constatar do Portal da Transparência que, ainda no ano de 2019, o valor referencial (“P.R.”) era o próprio piso salarial para 20 horas (R$ 1.278,87).[1] Ou seja, a atualização do valor referencial com base no percentual de atualização do piso salarial acabava por repercutir financeiramente nos servidores dos demais níveis, por ser alterada a própria base de cálculo sobre a qual incidem os fatores de multiplicação “1,0”, “1,5”, “1,7”, “1,8” e “2,0”.

Na proposta em análise, utiliza-se sistemática diferente para garantir o cumprimento do piso salarial: em vez de atualizar o valor referencial (“P.R.”) com o mesmo percentual de atualização do piso (12,84%), optou-se por manter o valor referencial intacto – já que os demais níveis já se encontram acima do piso – e por conceder acréscimo de 10% ao nível I, alterando o fator de multiplicação de “1,0” para “1,1”, o qual, calculado na base “P.R.”de R$ 1.278,87, com mais 4,31% da revisão geral anual (Lei Municipal nº 3.885/2020), chega ao valor de R$ 1.467,38, acima do piso salarial de 2020 para 20 horas (R$ 1.443,12).

Trata-se de forma de cálculo que acaba por não repercutir financeiramente nos servidores dos níveis superiores, porque se está alterando somente o fator de multiplicação do nível I (de “1,0” para “1,1”), com preservação do valor referencial (“P.R.”), base de cálculo para todos os níveis. A partir dessa sistemática, ajusta-se tão só o cargo mais baixo na carreira para que o seu vencimento básico fique acima do piso salarial de 2020, e os demais ficam sem tal acréscimo porque já têm valor superior ao fixado pela legislação federal.

Nesses termos, importa lembrar que o piso salarial nacional representa apenas o valor abaixo do qual é vedado os entes federados estabelecerem os vencimentos dos cargos da educação básica (art. 2º, § 1º, da Lei Federal nº 11.738/2008), ou seja, é o valor mínimo de vencimento dos profissionais da educação, sendo que os percentuais de atualização fixados anualmente para o piso não geram impacto sobre as classes e os níveis mais elevados na carreira, pois já estão acima do mínimo.

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.426.210-RS, afetado para julgamento de recursos repetitivos, sendo definida a seguinte tese, aplicável a todos os casos semelhantes: “A Lei n. 11.738/2008, em seu art. 2º, § 1º, ordena que o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica deve corresponder ao piso salarial profissional nacional, sendo vedada a fixação do vencimento básico em valor inferior, não havendo determinação de incidência automática em toda a carreira e reflexo imediato sobre as demais vantagens e gratificações, o que somente ocorrerá se estas determinações estiverem previstas nas legislações locais”.

Assim, só haveria obrigatoriedade de incidência automática da atualização do piso em toda a carreira e reflexo imediato nos demais níveis superiores se a legislação municipal determinasse que o valor referencial (“P.R”) fosse atualizado anualmente no mesmo percentual do piso salarial nacional, o que não é o caso do Município de Guaíba, que define ser o valor referencial do magistério atualizado na mesma data e no mesmo percentual do funcionalismo público municipal (art. 62 da Lei Municipal nº 2.734/2011).

Portanto, tem-se que o método utilizado pelo proponente para fazer com que o vencimento inicial do menor nível (“I”) e classe (“A”) dos cargos efetivos do magistério público fique acima do piso salarial nacional não afronta as normas constitucionais nem a Lei Federal nº 11.738/2008, uma vez que, segundo decidiu o STJ, em julgamento de recurso especial repetitivo, a Lei nº 11.738/2008 determina apenas o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica, não havendo determinação de incidência automática das atualizações do piso nacional em toda a carreira e reflexo imediato sobre as demais vantagens e gratificações.

 

3.3 Das exigências orçamentário-financeiras

 

Além do atendimento da competência e da iniciativa, o projeto para a concessão de aumentos de vencimentos ou remuneração deve demonstrar o cumprimento de requisitos de natureza orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88 e nos artigos 17, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Prevê o artigo 169, caput e § 1º, da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

  • A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os arts. 15, 16 e 17:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes;

II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

  • Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.
  • Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.
  • 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
  • 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.
  • 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.
  • 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.
  • 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Como prevê o art. 15 da Lei de Responsabilidade Fiscal, são consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público as despesas que não observem às exigências dos arts. 16 e 17. Ambos os dispositivos exigem a estimativa de impacto orçamentário-financeiro no exercício em que o ato deva entrar em vigor e nos dois subsequentes, com a diferença de que, no art. 17, tal ato só será obrigatório quando se tratar de despesa obrigatória de caráter continuado (aquela que fixe para o ente uma obrigação por período superior a dois anos).

Conforme material divulgado pela Secretaria do Tesouro Nacional, vinculada ao Ministério da Fazenda, a fase de proposição legislativa é regulada especificamente pelo art. 17 da LRF, enquanto a fase executiva do ato se subordina ao disposto no art. 16[2]:

A LRF determina que a geração de despesa deve atender aos artigos 16 e 17. Cada artigo, no entanto, trata de características específicas da geração de despesa ou assunção de obrigação como o rito de execução e o tipo de despesa.

O artigo 16 traz a exigência de que a criação, expansão ou aperfeiçoamento da ação governamental que acarrete aumento de despesa será acompanhada da estimativa de impacto orçamentário e é condição prévia para empenho e licitação. O controle, portanto, está centrado na fase de execução do orçamento.

Já o artigo 17 envolve proposição legislativa para criação de uma despesa obrigatória e a estimativa do impacto orçamentário é condição prévia para a proposição de lei, medida provisória ou ato administrativo, tratando-se, pois, da fase de aprovação do orçamento.

Ambos os artigos trazem como regra geral de criação de despesa a estimativa do impacto orçamentário financeiro. No entanto, devido às características peculiares dessas despesas, existem momentos distintos para apresentação da estimativa, quais sejam:

  1. a) Art. 16: Inclusão do gasto na LOA e, em momento posterior, no processo inicial da licitação;
  2. b) Art. 17: Proposição de lei, medida provisória ou ato administrativo de criação da despesa.

Consequentemente, como a proposição veicula uma despesa obrigatória de caráter continuado, por possuir período de execução superior a dois anos, existe a necessidade de apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro nesta fase de tramitação legislativa, para que as comissões permanentes possam apurar se a alteração proposta está em consonância com as peças orçamentárias (art. 169, § 1º, da CF/88) e com os limites de despesa com pessoal (arts. 19 e 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF):

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinquenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

  1. b) 54% (cinquenta e quatro) para o Executivo.

Assim, registra-se, desde já, que a viabilidade jurídica da proposta legislativa está condicionada à apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro (art. 17 da LRF) que comprove a sua compatibilidade com as peças orçamentárias e com os limites de despesa com pessoal.

A viabilidade também está condicionada a que a promulgação da respectiva lei municipal ocorra antes dos últimos 180 dias de mandato do Chefe do Poder Executivo Municipal, já que o parágrafo único do art. 21 da LRF considera nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento de despesa com pessoal que seja expedido no período vedado.

3.4 Da inaplicabilidade do art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504/1997

O art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/97, ao estabelecer normas para as eleições, prevê que é proibido aos agentes públicos, servidores ou não, “fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos”, de modo a não afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), através da Resolução nº 23.606, de 17 de dezembro de 2019, estabeleceu o Calendário Eleitoral das Eleições de 2020, prevendo, no seu Anexo I, que a partir de 7 de abril de 2020 (terça-feira) até a posse dos eleitos é vedado aos agentes públicos fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores que exceda a recomposição da perda do poder aquisitivo ao longo do ano da eleição.[3] A data a partir da qual incide a vedação – 180 dias antes da eleição – restou definida na Resolução TSE nº 22.252/2006, cuja ementa é a seguinte:

REMUNERAÇÃO – SERVIDOR PÚBLICO – REVISÃO – PERÍODO CRÍTICO. VEDAÇÃO – ARTIGO 73, INCISO VIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A interpretação – literal, sistemática e teleológica – das normas de regência conduz à conclusão de que a vedação legal apanha o período de cento e oitenta dias que antecede às eleições até a posse dos eleitos.[4]

Ocorre que, conforme se demonstrará a seguir,a jurisprudência do TSE é uníssona ao definir que a referida vedação não é aplicável às propostas legislativas de reestruturação de carreira de servidores públicos, por não se confundirem com projetos que tratem da revisão geral de remuneração prevista no art. 37, inciso X, da CF/88.

De início, impõe-se destacar que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em resposta à Consulta nº 772/DF, de relatoria do Ministro Fernando Neves, publicou a Resolução nº 21.054/2002[5], consolidando o seguinte entendimento: “A aprovação, pela via legislativa, de proposta de reestruturação de carreira de servidores não se confunde com revisão geral de remuneração e, portanto, não encontra obstáculo na proibição contida no art. 73, inciso III, da Lei nº 9.504, de 1997”.

Conforme consta no relatório da resolução, adotado pelo voto do relator, a proibição constante no art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504/1997 atinge apenas a revisão geral de remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda do poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, não compreendendo as reestruturações de planos de carreira, visto que estas alcançam exclusivamente algumas categorias funcionais, sem repercussão em todo o funcionalismo público do respectivo ente federado.

Ainda segundo o relatório da resolução, a revisão geral de remuneração tem caráter de generalidade e tem abrangência em sua denominação, envolvendo todos os servidores públicos de um ente federado, o que difere da reestruturação de planos de carreira, a qual atinge somente algumas categorias de servidores, a exemplo dos servidores públicos do magistério, sem repercutir sobre todo o funcionalismo público. Assim, por compreender que a conduta vedada se circunscreve apenas à concessão de revisão geral de remuneração que supere a perda inflacionária (art. 37, inciso X, da CF/88), o TSE consolidou sua jurisprudência no sentido de que não incide a conduta vedada do art. 73, VIII, da Lei das Eleições quanto às propostas legislativas que busquem reestruturar carreiras do serviço público. Leia-se julgado que aplica o referido entendimento:

Eleições 2016. Agravo regimental. Recurso especial. Representação. Conduta vedada. Art. 73, VII, da lei das eleições. Revisão geral de remuneração de servidores públicos acima da recomposição do poder aquisitivo da moeda. Inocorrência. Reexame de provas. Impossibilidade. Súmula nº 24/TSE. Dissídio jurisprudencial não configurado. Desprovimento. 1. In casu, a Corte Regional, soberana no exame dos fatos e provas, assentou que o caso sub examine não trata de revisão geral de remuneração de servidores públicos acima da recomposição do poder aquisitivo da moeda, mas de aprovação, pela via legislativa, de proposta de reestruturação de carreira de servidores com nítido objetivo de corrigir situação de injustiça e de desvalorização profissional de categorias específicas do Poder Executivo municipal. 2. Consta, ainda, do acórdão recorrido que: a) ‘as leis complementares, além de ter por objeto a reestruturação de carreira de determinadas categorias de servidores do município, não definem qualquer índice que tente recompor de maneira geral perdas próprias do processo inflacionário, fato que, a meu ver, afasta a incidência da vedação contida no inciso VIII, do art. 73, da Lei nº 9.504/97’ (fl. 1061 grifei); e b) ‘diante do conjunto fático-probatório constante nos autos, concluo que a conduta imputada aos ora Recorridos não se subsume à regra prescrita no inciso VIII, do art. 73, da Lei nº 9.504/97" (fl. 1063). 3. A análise da pretensão recursal esbarra no óbice processual constante da Súmula nº 24/TSE ante a impossibilidade de o Tribunal Superior Eleitoral incursionar na seara probatória dos autos. 4. ‘A aprovação, pela via legislativa, de proposta de reestruturação de carreira de servidores não se confunde com revisão geral de remuneração e, portanto, não encontra obstáculo na proibição contida no art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504, de 1997’ (Cta nº 772/DF, Rel. Min. Fernando Neves da Silva, DJ de 12.8.2002). 5. Nessa linha, a vantagem advinda com a reestruturação da carreira, concedida exclusivamente a categorias específicas, não pode ser considerada revisão geral de remuneração, não sendo prática ilícita coibida pela legislação eleitoral. 6. ‘No âmbito das chamadas condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas, cuja disciplina encontra-se inserta na Lei nº 9.504/97, arts. 73 a 78, imperam os princípios da tipicidade e da estrita legalidade, devendo a conduta corresponder exatamente ao tipo previamente definido pela lei’ (AgR-REspe nº 626-30/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 4.2.2016). 7. As razões postas no agravo regimental não afastam os fundamentos lançados na decisão agravada [...]. (Ac. de 14.3.2019 no AgR-REspe 39272, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto)

Como se percebe, a recente jurisprudência do TSE, de março de 2019, expõe que não há vedação à reestruturação de carreiras específicas do serviço público durante o período de 180 dias que antecede as eleições, por não ser considerada uma revisão geral da remuneração dos servidores públicos, atingindo apenas determinadas categorias. O TSE, ademais, considera que na interpretação das regras dos arts. 73 a 78 da Lei nº 9.504/1997 imperam os princípios da tipicidade e da estrita legalidade, não sendo válidas ampliações hermenêuticas que não tenham correspondência legal.

Por outro lado, cabe registrar que, em situação específica, o TSE também já decidiu que se aplica a vedação do art. 73, VIII, no caso de o aumento de remuneração superior à inflação ocorrer sobre categorias funcionais que representem quantia significativa dos quadros de servidores públicos:

Recurso ordinário. Eleições 2014. Governador. Ação de investigação judicial eleitoral (AIJE). Conduta vedada. Art. 73, VIII, da Lei 9.504/97. Abuso de poder político. Art. 22 da LC nº 64/90. Revisão geral da remuneração acima da inflação. Configuração. Gravidade. Parâmetro adotado a partir da LC nº 135/2010. Inclusão do inciso XVI ao art. 22 da LC nº 64/90. Potencialidade. Critério superado. Opção legislativa. Mandato. Transcurso do prazo. Cassação prejudicada. Inelegibilidade. Incidência. Resultado útil e prático do recurso. Preservação nessa parte. Reforma parcial do acórdão regional. Recurso ordinário do parquet. Provimento. Recurso especial do investigado. Recebimento na via ordinária. Fungibilidade. Desprovimento. [...] 2. O art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/97 veda ao agente público fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração (lato sensu) dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º do mesmo diploma legal até a posse dos eleitos. 3. A interpretação estritamente literal do aludido artigo - de modo a entender que revisão geral apta a caracterizar ilícito eleitoral é somente aquela que engloba todos os servidores da circunscrição do pleito - não é a que melhor se coaduna com a finalidade precípua da norma de regência, que é a de proteger a normalidade e a legitimidade do prélio eleitoral da influência do poder político. Assim, revela-se defeso ao agente público conceder reajuste remuneratório que exceda a recomposição da perda do poder aquisitivo, no período vedado, a servidores que representem quantia significativa dos quadros geridos. 4. A proibição quanto ao incremento do valor percebido pelos servidores a título de contraprestação do trabalho prestado alcança qualquer das parcelas pagas sob essa rubrica, de modo que, para fins do art. 73, VIII, da Lei das Eleições, não há como distinguir vencimento-base de remuneração final. [...] (Ac. de 9.4.2019 no RO nº 763425, rel. Min. João Otávio de Noronha, red. designado Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto.)

Nesse acórdão, o TSE entendeu que estava configurada a conduta vedada do art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/1997 porque, embora não tivesse sido concedida uma revisão remuneratória acima da perda inflacionária a todas as categorias de servidores (a revisão não foi GERAL, mas setorial), o Governador do RJ concedeu revisão a 70% do funcionalismo estadual, beneficiando 336.535 servidores, conduta que, inegavelmente, transgrediu o bem jurídico protegido pela proibição (igualdade de oportunidades entre os candidatos nos pleitos).

Tem-se que, na situação em análise, a pretendida alteração do plano de carreira do magistério só atingirá o nível I dos cargos efetivos de professor, não incluindo os níveis II, III, IV e V, a repercutir financeiramente em cerca de 35 servidores, segundo informação repassada informalmente a este órgão, número que não representa uma quantia significativa dos quadros geridos. Ainda, a reestruturação se justifica na medida em que busca assegurar que nenhum profissional inicie a carreira com vencimento inferior ao piso salarial nacional dos professores, conforme fundamentação do proponente na exposição de motivos.

Por fim, deve-se destacar que o entendimento do TSE, no sentido de que não há vedação à reestruturação de carreiras específicas do serviço público no período de 180 dias que antecede as eleições (por não caracterizarem revisão geral), está exposto na Cartilha de Orientação aos Agentes Públicos Estaduais, elaborada pela PGE/RS[6]:

  1. Conceituação. O referido inciso veda qualquer recomposição que supere a chamada “perda inflacionária”, seja qual for a denominação dada ao acréscimo financeiro. Logo, no ano eleitoral, permite-se a concessão de reajustes meramente inflacionários, visando à reposição da perda do poder aquisitivo. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, “a previsão geral de remuneração deve ser entendida como sendo o aumento concedido em razão do poder aquisitivo da moeda e que não tem por objetivo corrigir situações de injustiça ou de necessidade de revalorização profissional de carreiras específicas” (TSE, Consulta nº 782, Rel. Min. Fernando Neves da Silva, DJ 07/02/2003). O que o dispositivo proíbe, portanto, é a concessão geral de aumentos reais de remuneração dos servidores públicos a partir do prazo fixado no art. 7º da Lei Eleitoral, de forma que reajustes meramente inflacionários, para reposição da perda do poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, são admitidos, conforme enuncia o inciso X do art. 37 da Constituição Federal.
  1. Reestruturação de carreiras. Revisão geral. Na esteira do entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, a “aprovação, pela via legislativa, de proposta de reestruturação de carreira de servidores não se confunde com revisão geral de remuneração e, portanto, não encontra obstáculo na proibição contida no art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504, de 1997” (TSE, Consulta nº 772, Rel. Min. Fernando Neves da Silva, DJ 12/08/2002).

Desse modo, adotando-se o entendimento do TSE na Resolução nº 21.054/2002, no AgR-REspe 39272, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, de 14.3.2019, bem assim na Cartilha de Orientação aos Agentes Públicos Estaduais, elaborada pela PGE/RS, considerando, ainda, as razões para a pretendida reestruturação (fixação de vencimentos acima do piso salarial nacional do magistério, conforme exposição de motivos), entende-se que a proposta não esbarra na conduta vedada do art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/1997, pelo motivos expostos.

3.5 Das exigências para a aprovação de projeto de lei complementar

Destaca-se que a proposição em análise tem natureza jurídica de projeto de lei complementar, já que a matéria “planos de carreira dos servidores” consta no art. 46, inciso VII, da LOM, havendo requisitos mais rígidos para a deliberação parlamentar. O § 1º do referido dispositivo dispõe que, observado o Regimento Interno da Câmara, são asseguradas a ampla divulgação e a realização de consulta pública aos projetos de leis complementares, a fim de que possam receber sugestões populares. Nesse sentido, houve a expedição de edital de ampla divulgação, publicado em jornal local, dando conta da existência da proposta e da oportunidade para a apresentação de sugestões que venham a aprimorá-la.

Ademais, importante lembrar que, nos termos do art. 69 da CF/88 e do art. 46 da LOM, os projetos de lei complementar, para serem considerados aprovados, exigem o voto favorável da maioria absoluta dos membros do Legislativo, o que, na realidade do Município de Guaíba, compreende 9 vereadores (metade +1), independentemente do número presente na sessão ordinária ou extraordinária.

[1] Disponível em: <http://transparencia.guaiba.rs.gov.br/files/uploads/docs/6c9477a247744eb298b464c72af04ffd.pdf>.

[2] Disponível em:

<http://www.tesouro.fazenda.gov.br/documents/10180/435710/CPU_Item_1_3_Definicoes_sobre_o_artigo_16_da_LRF.pdf/85cc847b-63bf-4aba-8487-d4df9e3e8583>.

[3] Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2020/arquivos/tse-resolucao-no-23-606/rybena_pdf?file=http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2020/arquivos/tse-resolucao-no-23-606/at_download/file>.

[4] Disponível em: <http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2006/RES222522006.htm>.

[5] Disponível em: <http://www.tse.jus.br/sadJudInteiroTeor/pesquisa/actionGetBinary.do?tribunal=TSE&processoNumero=772&processoClasse=CTA&decisaoData=20020402&decisaoNumero=21054>.

[6] Disponível em: <https://www.pge.rs.gov.br/upload/arquivos/201804/20181822-arte-final-cartilha-2018-sem-tabela.pdf>.

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria, em conclusão, tece as seguintes considerações sobre o Projeto de Lei nº 019/2020:

  1. a) a competência legislativa e a iniciativa foram atendidas, visto que o assunto é de interesse local (art. 30, I, da CF/88), não extrapolando competências de outros entes, e a proposta foi apresentada pelo Prefeito, autoridade com iniciativa privativa para tratar de remuneração dos servidores do Executivo (art. 60, II, “a”, da CE/RS e art. 119, I, da LOM);
  1. b) não houve apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro da proposta, documento exigido pelo art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de modo a que fique comprovada a compatibilidade do projeto de lei com as peças orçamentárias (art. 169, § 1º, da CF/88) e com os limites de despesa com pessoal (arts. 19 e 20 da LRF);
  1. c) a viabilidade também está condicionada a que a promulgação da respectiva lei municipal ocorra antes dos últimos 180 dias de mandato do Chefe do Poder Executivo Municipal, já que o parágrafo único do art. 21 da LRF considera nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento de despesa com pessoal que seja expedido no período vedado;
  1. d) entende-se que a proposta não esbarra na conduta vedada do art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/1997, de acordo com o entendimento do TSE na Resolução nº 21.054/2002 e no AgR-REspe 39272, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, de 14.3.2019, bem como diante da Cartilha de Orientação aos Agentes Públicos Estaduais, elaborada pela PGE/RS, e à vista das razões para a pretendida reestruturação (fixação de vencimentos acima do piso salarial nacional do magistério para todos os níveis de cargos efetivos);
  1. e) o método utilizado pelo proponente para fazer com que o vencimento inicial do menor nível (“I”) e classe (“A”) dos cargos efetivos do magistério fique acima do piso salarial nacional não afronta as normas constitucionais nem a Lei Federal nº 11.738/2008, uma vez que, segundo o STJ, em julgamento de recurso especial repetitivo, a Lei nº 11.738/2008 determina apenas o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica, não havendo determinação de incidência automática das atualizações do piso nacional em toda a carreira e reflexo imediato sobre as demais vantagens e gratificações;
  1. f) tratando-se de projeto de lei complementar, há necessidade de aprovação pela maioria absoluta dos membros da Câmara Municipal (metade +1, independentemente do número de vereadores presentes na sessão ordinária ou extraordinária), nos termos do art. 69 da CF/88 e do art. 46 da LOM.

Nesses termos, opina-se pela ausência de inconstitucionalidade manifesta do PL nº 019/2020, que está apto a seguir o trâmite regimental. Contudo, a total viabilidade jurídica está condicionada: I) à tramitação na forma de projeto de lei complementar (art. 46, caput e § 1º, da LOM), considerando-se aprovado se obtiver o voto favorável da maioria absoluta dos vereadores; II) à demonstração do cumprimento dos requisitos previstos no art. 169, § 1º, da CF/88 e nos arts. 15, 17, 19, 20 e 22, parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal, por meio de estimativa de impacto orçamentário-financeiro; III) a que ocorra a promulgação da lei municipal antes dos últimos 180 dias de mandato do Prefeito, com fundamento no art. 21, parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 29 de abril de 2020.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS         &nbs



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