Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 018/2020
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 067/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre o índice de revisão geral dos vencimentos e salários dos servidores do quadro do Magistério Público Municipal"

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 018/2020 à Câmara Municipal, que objetiva dispor sobre o índice de revisão geral dos vencimentos e salários dos servidores do quadro do Magistério Público Municipal. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência e ao caráter pessoal da proposição.

2. Parecer:

2.1 Da competência municipal e da iniciativa do processo legislativo

Em relação à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

A revisão geral que se pretende aprovar se insere, efetivamente, na definição de interesse local, uma vez que compete a cada esfera da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), através de cada poder constitucional, promover a revisão geral anual de todos os agentes públicos, sempre na mesma data e sem distinção de índices, cabendo, portanto, ao Município de Guaíba adotar tal providência em relação aos seus servidores.

A iniciativa para a deflagração do processo legislativo, por sua vez, está atendida, pois o projeto apresentado trata da reposição inflacionária e da concessão de aumento real aos agentes do Magistério Público Municipal, o que encontra base no art. 61, § 1º, inc. II, “a”, da CF/88, no art. 60, inc. II, alínea “a”, da CE/RS e no art. 119, inc. I, da Lei Orgânica Municipal.

2.2 Considerações sobre a “revisão geral anual”

A revisão geral anual é um direito constitucionalmente assegurado a todos os agentes públicos como forma de recompor o valor real de vencimentos e subsídios depreciados ao longo dos doze meses anteriores pelas oscilações inflacionárias. Trata-se não de um aumento remuneratório por espécie, mas sim da restauração das importâncias perdidas em razão dos fenômenos econômicos. Difere, nesse sentido, da expressão “reajuste remuneratório”, que significa, justamente, a concessão de aumentos reais aos vencimentos ou aos subsídios de determinadas categorias de funcionários. Tal distinção é importante porque o tratamento jurídico dispensado a cada um dos institutos é diverso.

A revisão geral, enquanto reposição inflacionária, tem previsão constitucional no artigo 37, inc. X, da CF/88 e no artigo 33, § 1º, da CE/RS, nos seguintes termos:

Art. 37

(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Art. 33

(...)

1º A remuneração dos servidores públicos do Estado e os subsídios dos membros de qualquer dos Poderes, do Tribunal de Contas, do Ministério Público, dos Procuradores, dos Defensores Públicos, dos detentores de mandato eletivo e dos Secretários de Estado, estabelecidos conforme o § 4º do art. 39 da Constituição Federal, somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, sendo assegurada através de lei de iniciativa do Poder Executivo a revisão geral anual da remuneração de todos os agentes públicos, civis e militares, ativos, inativos e pensionistas, sempre na mesma data e sem distinção de índices. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 57, de 21/05/08)

As expressões “mesma data” e “sem distinção de índices” norteiam, em geral, a reposição inflacionária porque tal fenômeno econômico é geral e atinge todas as pessoas igualmente, sendo contrária ao princípio da isonomia a norma que estabeleça diferença de percentuais de revisão entre as diversas categorias de agentes públicos e/ou políticos. Já no reajuste remuneratório não há qualquer diretriz de igualdade, podendo o gestor conceder acréscimos distintos entre as diferentes classes de servidores.

O Projeto de Lei nº 018/2020 previu, no art. 1º, o percentual total de 4,31%, a título de reposição inflacionária (revisão geral) concedida ao Magistério Público Municipal. A redação do dispositivo é importante para eliminar qualquer espécie de dúvida relacionada à cumulatividade da revisão com a atualização do piso salarial profissional, prevista no art. 5º da Lei Federal nº 11.738/08. Ambos os institutos são distintos.

O piso salarial profissional nacional do magistério público corresponde a um valor, fixado anualmente, que estabelece o mínimo (“piso”) que os profissionais da educação básica (educação infantil, ensino fundamental e médio) devem receber pelo exercício de suas atividades. Isso não se confunde com a revisão geral anual, de natureza constitucional (art. 37, inc. X, CF/88), que objetiva recompor as perdas inflacionárias dos vencimentos ao longo dos últimos doze meses. Portanto, ambos os institutos são perfeitamente acumuláveis, sendo válida e adequada a norma que estabeleça a revisão geral dos vencimentos e salários dos servidores do quadro do Magistério Público Municipal pelo IPCA acumulado de janeiro a dezembro de 2019, sem prejuízo da atualização do piso salarial.

É importante ressaltar que a reposição inflacionária das perdas salariais é considerada um direito subjetivo dos servidores públicos, cuja inobservância pode acarretar, inclusive, a propositura de ação direta de inconstitucionalidade por omissão, prevista no artigo 103, § 2º, da CF/88, caso em que o Poder Judiciário, ao declarar a inconstitucionalidade pela inércia do respectivo poder constitucional, o notifica para a adoção das providências necessárias. Aliás, existem julgados que, ao defenderem a falta de efetividade dessa mera ciência ao poder violador do direito subjetivo, aplicam técnicas avançadas de decisão judicial, como as manipulativas, a partir das quais o juízo declara a inconstitucionalidade e estabelece determinada disciplina, consentânea com o parâmetro constitucional avaliado.

Com isso, ressalta-se a importância do referido Projeto de Lei nº 018/2020 por estar concretizando os direitos subjetivos dos servidores do quadro do Magistério Público Municipal, especialmente os relacionados à irredutibilidade dos vencimentos.

2.3 Do atendimento aos requisitos de natureza financeira

Além da observância da competência e da iniciativa, o projeto atende aos requisitos de natureza financeira, pois não objetiva a concessão de aumento real aos servidores públicos, o que dispensa o cumprimento de requisitos de natureza orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88 e nos artigos 17, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Tal dispensa, porém, não desobriga o proponente da exigência de observância dos limites de despesa com pessoal (arts. 19 e 20 da LRF):

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinqüenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

 b) 54% (cinquenta e quatro) para o Executivo.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela constitucionalidade, legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 018/2020, por inexistirem óbices de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, observada a fundamentação sobre as exigências orçamentário-financeiras aplicáveis (item 2.3).

É o parecer.

Guaíba, 17 de março de 2020.

JULIA ZANATA DAL OSTO

Procuradora

OAB/RS nº 108.241



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