Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 011/2020
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 042/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Autoriza o Poder Executivo a realizar a abertura de crédito adicional especial no valor de R$ 7.135.733,15 (sete milhões, cento e trinta e cinco mil e setecentos e trinta e três reais com quinze centavos) no orçamento corrente"

1. Relatório

O Executivo Municipal apresentou o substitutivo ao Projeto de Lei nº 011/2020 à Câmara Municipal, pleiteando autorização para a abertura de crédito adicional especial no orçamento, no valor de R$ 7.152.853,15 (sete milhões, cento e cinquenta e dois mil, oitocentos e cinquenta e três reais e quinze centavos). A proposição foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. MÉRITO

Inicialmente, quanto à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, a Constituição Federal de 1988 estabelece, no artigo 165, III, ser do Poder Executivo a competência para iniciar projetos de lei sobre orçamentos anuais. Idêntica norma consta no art. 106, III, da Lei Orgânica Municipal. Tais normativas foram devidamente respeitadas no caso, por ter sido o projeto apresentado pelo Executivo Municipal, que detém a iniciativa legislativa para dispor sobre o orçamento anual.

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o art. 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o art. 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”.

No que diz respeito à matéria de fundo, a Lei Federal nº 4.320/64, no seu Título V, disciplina a abertura de créditos adicionais. Segundo o artigo 40, créditos adicionais são “as autorizações de despesa não computadas ou insuficientemente dotadas na Lei de Orçamento.” Eles podem ser classificados em três modalidades: suplementares, que são destinados a reforço de dotação orçamentária; especiais, que são destinados a despesas para as quais não haja dotação orçamentária específica; e extraordinários, que são destinados a despesas urgentes e imprevistas, em caso de guerra, comoção intestina ou calamidade pública (artigo 41, incisos I, II e III).

No presente caso, o pedido é de autorização para a abertura de crédito especial. No que diz respeito a tal modalidade, o artigo 42 da Lei Federal nº 4.320/64 prevê que “Os créditos suplementares e especiais serão autorizados por lei e abertos por decreto executivo.” Tal exigência foi devidamente respeitada, porquanto o pedido foi apresentado na forma de projeto de lei.

Ainda, para a abertura de créditos especiais, faz-se necessária a existência de recursos disponíveis para processar a despesa, devendo ser apresentada exposição justificada, na forma do artigo 43 da Lei nº 4.320/64. Esses recursos podem ser: a) o superávit financeiro apurado em balanço patrimonial do exercício anterior; b) os provenientes de excesso de arrecadação; c) os resultantes de anulação parcial ou total de dotações orçamentárias ou de créditos adicionais, autorizados em Lei; d) o produto de operações de credito autorizadas, em forma que juridicamente possibilite ao poder executivo realizá-las.

A indicação dos recursos disponíveis, na situação, está demonstrada pela compensação que será feita com a redução orçamentária de despesas do mesmo valor, indicada nos arts. 4º e 6º, na forma de anulação parcial de dotações orçamentárias (art. 43, § 1º, III). O crédito adicional previsto no art. 1º, por sua vez, será compensado pelo produto de superávit financeiro apurado em balanço patrimonial do exercício anterior (art. 43, § 1º, I) e, nesse sentido, conforme o art. 26, § 2º, II, da LDO, deve acompanhar a proposição uma memória de cálculo que separe os recursos conforme sua destinação e fonte:

Art. 26. Os projetos de lei relativos a créditos adicionais serão apresentados com a classificação da estrutura programática da mesma forma que apresentado na lei orçamentária anual, observado o art. 12 da Lei Complementar nº 101, de 2000.

(...)

§ 2º Acompanharão os projetos de lei relativos a créditos adicionais:

I - as exposições dos motivos que os justifiquem;

II - memória de cálculo em caso de excesso de arrecadação ou superávit financeiro do exercício anterior, separando os recursos conforme sua destinação e fonte.

Particularmente quanto aos créditos vinculados às ações e aos serviços públicos de saúde, a Emenda Constitucional nº 29, de 13 de setembro de 2000, tornou indispensável a concentração de todos os recursos da saúde em fundos especiais, criados em cada âmbito da federação, confirmando o que já previa a Lei Federal nº 8.080/90 (Lei do SUS) no art. 33, que determina o depósito desses valores em contas especiais, excepcionando o princípio da unidade de tesouraria, previsto no art. 56 da Lei Federal nº 4.320/64. Nesses termos, veja-se que o art. 77, § 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabelece que “Os recursos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinados às ações e serviços públicos de saúde e os transferidos pela União para a mesma finalidade serão aplicados por meio de Fundo de Saúde que será acompanhado e fiscalizado por Conselho de Saúde, sem prejuízo do disposto no art. 74 da Constituição Federal”.

Segundo o artigo 33 da Lei Federal nº 8.080/90, além da obrigatoriedade de concentração dos recursos financeiros da saúde em conta especial, a movimentação desses valores se dá sob a fiscalização dos respectivos conselhos de saúde. Na realidade de Guaíba, a Lei Municipal nº 1.155/93 criou o Conselho Municipal de Saúde (COMUSA), estabelecendo as suas competências no artigo 2º. Conforme a alínea “e” do mesmo dispositivo, cabe ao conselho aprovar e fiscalizar a execução da Programação e Orçamento da Saúde anual.

Os conselhos municipais possuem fundamento na CF/88, em razão do reconhecimento da cidadania como fundamento da República Federativa do Brasil e da democracia como forma de aquisição e exercício do poder. Os conselhos de direitos fazem parte, efetivamente, do processo de abertura para a participação cidadã na política.

Por exercerem, democraticamente, o controle social sobre as dotações orçamentárias de cada pasta, os conselhos municipais, quando tiverem caráter deliberativo, devem ser necessariamente consultados sobre eventuais modificações que se busquem implementar na lei orçamentária anual. Para as áreas da saúde, da assistência social e da educação, essa obrigação deriva de diplomas específicos: artigo 33 da Lei Federal nº 8.080/90 (saúde), artigo 84 da Resolução nº 33/12 do Conselho Nacional de Assistência Social e artigo 24, § 9º, da Lei Federal nº 11.494/07 (educação – FUNDEB nos Estados e Distrito Federal).

Além da lei que organiza o Sistema Único de Saúde, a Resolução nº 333, de 04 de novembro de 2003, do Conselho Nacional de Saúde, estabelece diretrizes para criação, reformulação, estruturação e funcionamento dos conselhos de saúde em todo o território nacional. A Diretriz nº 5, referente às competências, refere que cabe aos conselhos “deliberar sobre os programas de saúde e aprovar projetos a serem encaminhados ao Poder Legislativo, propor a adoção de critérios definidores de qualidade e resolutividade, atualizando-os em face do processo de incorporação dos avanços científicos e tecnológicos, na área da Saúde.” (inc. VIII). Também lhes compete “aprovar a proposta orçamentária anual da saúde, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (artigo 195, § 2º da Constituição Federal), observado o princípio do processo de planejamento e orçamentação ascendentes (artigo 36 da Lei nº 8.080/90) (inc. XII). Por fim, de acordo com o inc. XIII da Diretriz nº 5, os conselhos municipais devem “propor critérios para programação e execução financeira e orçamentária dos Fundos de Saúde e acompanhar a movimentação e destinação dos recursos”.

O caráter deliberativo do Conselho de Saúde de Guaíba (art. 1º) também reforça a necessidade de submeter ao seu crivo a proposta que cria crédito adicional especial mediante a anulação parcial de outras despesas também do Fundo Municipal de Saúde. Nesse sentido, importante destacar a orientação do texto “Créditos Adicionais e PCASP”, produzido por Adriana de Lourdes Barbosa Fantinel Richato, consultora do IGAM:

Quanto à necessidade de aprovação dos demais Conselhos Municipais quando da alteração dos orçamentos das suas respectivas pastas, deverá ser analisada a Lei de criação de cada um dos Conselhos, a fim de verificar se estes são deliberativos ou consultivos. Se forem deliberativos, necessitará de sua aprovação para alteração no orçamento das suas pastas, porém se estiver enquadrado como consultivo, eles poderão ser consultados, mas não necessitam obrigatoriamente da sua aprovação.

Por conseguinte, a proposta veiculada no Projeto de Lei nº 011/2020 precisa ser devidamente aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde de Guaíba para que possa seguir sua regular tramitação, com juntada da respectiva ata, já que envolve a abertura de crédito adicional especial, no âmbito da saúde municipal, mediante a anulação parcial de dotações orçamentárias também do Fundo Municipal da Saúde, mas categorizadas para outros fins.

4. Conclusão

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do substitutivo ao Projeto de Lei nº 011/2020, desde que juntadas a ata de deliberação do COMUSA sobre a proposição (art. 77, § 3º, do ADCT; art. 33, caput, da Lei nº 8.080/90) e a memória de cálculo prevista no art. 26, § 2º, II, da LDO.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 18 de fevereiro de 2020.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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