Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 002/2020
PROPONENTE : Ver. Dr. João Collares
     
PARECER : Nº 010/2020
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera o caput do Artigo 32 da Lei 1027/1990 – Código de Posturas do Município de Guaíba"

1. Relatório:

Veio ao exame desta Procuradoria o Projeto de Lei nº 002/2020, apresentado pelo Vereador Dr. João Collares (PDT), o qual “Altera o caput do Artigo 32 da Lei 1027/1990 – Código de Posturas do Município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal.

2. Parecer:

Preliminarmente, constata-se que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente, e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

 IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A doutrina de Alexandre de Moraes leciona que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)". (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740).

Assim, a matéria normativa constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 002/2020, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), visa regular matéria relativa ao exercício de polícia administrativa em âmbito local, especificamente com a previsão de normas previstas no Código de Posturas Municipal, as quais obrigam os realizadores de eventos a disponibilização de banheiros químicos adaptados.

Além disso, a CE/RS, no artigo 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais.

No presente caso, a medida está realmente inserida no âmbito das posturas municipais, cuja competência para definição é do Município. O poder de polícia, no magistério de Hely Lopes Meirelles é a “faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”, estando limitado seu exercício através da “Constituição Federal, de seus princípios e da lei” (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 34. Ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 133 e 137).

A própria Constituição Federal garante tal prerrogativa aos entes municipais em seu artigo 174, caput, in verbis:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

No mesmo sentido estabelece a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, no seu artigo 13, inciso I, anteriormente citado:

Art. 13. É competência do Município, além da prevista na Constituição Federal e ressalvada a do Estado:

I – exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais;

Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado. A Lei Orgânica Municipal também prevê a competência para tanto.

A jurisprudência concernente, que assegura aos parlamentares a iniciativa para proporem matérias relativas à polícia administrativa:

TJ-SP. Processo nº 2157719-89.2015.8.26.0000 Direta de Inconstitucionalidade - São Paulo - Relator: Des.: Evaristo dos Santos - Autor: Prefeito do Município de Mirassol - Réu: Presidente da Câmara Municipal de Mirassol. Requerente: Prefeito do Município de Mirassol Requerida: Câmara Municipal de Mirassol. Ementa: 1) Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 3.618, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol, de iniciativa parlamentar, que Dispõe sobre a proibição de qualquer cidadão jogar lixo em logradouros públicos, no Município de Mirassol e dá outras providências. 2) Não é reservada ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa legislativa, nem se encontra na reserva da Administração, matéria relativa à polícia administrativa, como a proibição a qualquer cidadão de jogar lixo nas ruas, avenidas, praças e demais logradouros públicos com previsão de sanção pecuniária (multa).

A jurisprudência colacionada a seguir ampara a legalidade da proposição em análise, valendo a pena trazer à tona decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo nesse sentido:

TJSP. 1024383-87.2016.8.26.0576 Apelação / Multas e demais Relator(a): Rezende Silveira Comarca: São José do Rio Preto Órgão julgador: 15ª Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 23/03/2017. Data de registro: 27/03/2017. Ementa: APELAÇÃO – EMBARGOS À EXECUÇÃO – Multa por descumprimento de Lei Municipal – Município de São José do Rio Preto – Atendimento em agência bancária – Lei Municipal nº 10.761/2010, que determinou a instalação de divisórias entre os caixas das agências bancárias – Lei que já foi declarada constitucional pelo C. Órgão Especial - Violação à Constituição não configurada – Multa que, ademais, não possui caráter confiscatório, mostrando-se adequada ao propósito de desestimular as condutas que a ensejam - Sentença mantida – Recurso improvido.

E no mesmo sentido tem assentado o TJRS:

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR Nº. 530/2017, DO MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL, QUE REGULAMENTA A OBRIGAÇÃO QUE OS PROPRIETÁRIOS OU INQUILINOS POSSUEM DE REALIZAR A LIMPEZA E A MANUTENÇÃO DO PASSEIO PÚBLICO FRONTEIRIÇO AO IMÓVEL QUE POSSUEM. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES, DA AMPLA DEFESA E DA IGUALDADE. I) Inexiste ofensa aos artigos 60, ‘d’, e 82, VII, da Constituição Estadual, visto que a Lei Complementar nº. 530/2017 não dispõe sobre organização, funcionamento ou estruturação da administração pública municipal. II) A referida Lei, ao prever a obrigação de ressarcimento ao Município de Caxias do Sul pelas eventuais despesas com a realização dos reparos, não está criando a obrigação de o Poder Público providenciar a manutenção devida, mas tão-somente o dever de o particular ressarci-lo. III) Da mesma forma ausente ofensa aos princípios da ampla defesa e da isonomia na aplicação da multa na primeira notificação, porquanto há previsão de defesa do particular no Código de Posturas do Município. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE IMPROCEDENTE. UNÂNIME.(Ação Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70075985747, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em: 13-08-2018).

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. O objetivo do Projeto de Lei nº 002/2020 é suplementar a legislação federal, já que a Lei Nº 13.825, de 13 de maio de 2019 alterou a Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000 (Lei de Acessibilidade), para estabelecer a obrigatoriedade de disponibilização, em eventos públicos e privados, de banheiros químicos acessíveis a pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida.

O que se pretende, efetivamente, é alterar os valores de multa em caso de incumprimento e prever a destinação dos valores arrecadados para o Fundo Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Convêm lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 002/2020 é dar efetividade ao disposto na Lei n.º 3.553/2017. Portanto, já foi devidamente instituído na legislação municipal o Fundo mencionado na proposição, não havendo obstáculos legais para a criação de fontes de recursos para atender o Fundo previsto na lei citada. Assim, não há interferência de um Poder em outro já que já existe a previsão de tal despesa.

Ocorre que a redação do parágrafo único necessita ser alterada, já que os outros incisos já prevêem multa para cada obrigação específica.

Ainda em observância à Técnica Legislativa, recomenda-se que a redação do parágrafo único que seja desmembrada em três parágrafos, já que a primeira frase trata da sinalização, a segunda do valor da multa e a terceira da destinação dos valores ao Fundo Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Ressalta-se, ademais, a exigência de ampla divulgação da presente proposição conforme exige a Lei Orgânica Municipal em seu artigo 46, já que pretende alterar o Código de Posturas Municipal, e, ainda, a necessidade de aprovação por maioria absoluta dos membros da Casa Legislativa, já que se trata de matéria reservada a Lei Complementar.

Conclusão:

Diante dos fundamentos expostos, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 002/2020, de autoria do Ver. Dr. João Collares, por inexistirem óbices de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que respeitadas as exigências do artigo 46 da Lei Orgânica Municipal - ampla divulgação para o recebimento de sugestões e aprovação por maioria absoluta dos membros da Câmara Municipal, por ser matéria reservada a Lei Complementar e observadas as correções de técnica legislativa.

É o parecer.

Guaíba, 17 de janeiro de 2020.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136



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