Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Veto Parcial n.º 082/2019
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 295/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Veto Total ao Projeto-de-Lei n.º 082/19, que "Altera o Art. 29, Inciso VII da Lei n.º 3.208 de 11 de novembro de 2014 - Código Tributário Municipal""

1. Relatório:

 Os Vereadores Alex Medeiros (PP) e Nelson do Mercado (PP) apresentaram o Projeto de Lei nº 082/2019, o qual “Altera o art.29, Inciso VII da Lei n.° 3.208 de 11 de novembro de 2014 - Código Tributário Municipal”. A proposta foi aprovada por unanimidade em 01/10/2019 e encaminhada para sanção via ofício em 03/10/2019. Remetida ao Executivo a redação final do projeto, foi protocolado na Câmara de Vereadores o Veto Total ao Projeto de Lei, sendo encaminhado à Procuradoria Jurídica para parecer.

2.mérito:

2.1. DO VETO:

O instituto do veto está disposto no art. 15 da Lei Orgânica Municipal, que possui o seguinte texto:

Art. 45 Se o Prefeito julgar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, poderá vetá-lo total ou parcialmente, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da data do recebimento.
§ 1º O veto será sempre justificado e, quando parcial, abrangerá o texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.
§ 2º As razões aduzidas no veto serão apreciadas no prazo de 30 (trinta) dias, contados do seu recebimento, em única discussão e votação, somente podendo ser rejeitado pela maioria absoluta dos Vereadores.
§ 3º Esgotado, sem deliberação, o prazo previsto no parágrafo anterior, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas, até sua decisão final, as demais matérias.
§ 4º Se o veto for rejeitado, o projeto será enviado ao Prefeito, em 48 (quarenta e oito) horas, para promulgação.

Na lição lapidar de Anderson de MENEZES (1999, p. 321), “o veto, submisso o instituto à semântica da palavra, que vem do verbo latino ‘vetare’ (vedar, proibir, impedir que se faça alguma coisa) e está na primeira pessoa do singular do presente do indicativo, consiste em atribuir-se ao chefe do executivo, por tais ou quais motivos, a competência para opor-se à conclusão da feitura da lei, forçando a respeito nova deliberação legislativa”. O veto é um ato político, caracterizando-se como instrumento do sistema presidencialista pelo qual o chefe do Poder Executivo discorda de projeto de lei já aprovado na Casa Legislativa. Aposto, a Casa Legislativa deverá fazer um novo exame da matéria, derrubando ou não o veto. “’Veto’ é o modo de o Chefe do Executivo exprimir sua discordância com o projeto aprovado” (SILVA, 2000, p. 527). Ele deverá ser fundamentado, ou seja, o presidente deverá apresentar as razões que o levaram a discordar do projeto, podendo ser a sua inconstitucionalidade ou razões de interesse público.

O poder de veto é considerado no Direito brasileiro como um instituto derivado corolário dos freios e contrapesos, manifestando-se como mecanismo do Chefe do Poder Executivo que permite contrabalançar a iniciativa legiferante do Parlamento dentro do sistema de controle recíproco da ação dos poderes, sendo duas as justificativas para o veto: a inconstitucionalidade ou a inconveniência (FERREIRA FILHO, 2002).

A doutrina de André Corrêa de Sá Carneiro (2009) entende o veto como um convite do Poder Executivo ao Legislativo no sentido de que este aperfeiçoe a elaboração de normas legais, aprovando-as sem o estigma da inconstitucionalidade ou da matéria inconveniente.

2.2: DAS RAZÕES DO VETO

No que diz respeito às razões aduzidas pelo Poder Executivo Municipal, ao apresentar as razões ao Veto, este se justifica pelo fato de que a proposta carece de documentos e informações exigidos pelo artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Assim, assevera o Prefeito Municipal que o Veto se justificaria uma vez que tais requisitos são fatores determinantes para que se reconheça a inconstitucionalidade da proposta legislativa, por afronta aos princípios da legalidade e da razoabilidade previstos na Constituição Federal.

Nessas situações como da proposição em análise que levou ao Veto Total, os Direitos Financeiro e Tributário se aproximam e quase se misturam: uma lei que, versando sobre matéria tributária, implica em renúncia de receita tem o condão de desequilibrar as contas públicas, e, nesse caso, o Poder Legislativo poderia usurpar, ainda que de maneira indireta, a atribuição do Executivo de formular projetos de lei que tratam de matéria orçamentária. Entretanto, esse argumento não é suficiente para afastar a possibilidade de o parlamentar iniciar o processo legislativo tributário. A concessão de benefícios tributários, ainda que venha a repercutir no orçamento municipal – como o faz, de uma forma ou de outra, a grande maioria da legislação tributária –, não constitui lei orçamentária, estando no campo de iniciativa geral entre o Legislativo e o Executivo. Sob o viés constitucional, portanto, têm decidido com acerto as cortes estaduais e o STF de que não é reservada ao chefe do Executivo a iniciativa de proposição de leis tributárias, ainda que tais leis impliquem na redução ou extinção de tributos e na consequente redução das receitas. Por outro lado, a perda de arrecadação decorrente da adoção de medidas que implicam em renúncia de receita pode infringir preceitos de ordem legal, insculpidos na Lei Complementar nº 101/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que estabelece condicionantes para a renúncia de receita de natureza tributária, conforme evidencia o art. 14 daquele diploma.

A questão a ser enfrentada - como o fez o Chefe do Poder Executivo nas razões do veto – não é propriamente se a questão é de iniciativa do Poder Legislativo, mas se a proposta legislativa que cria determinado benefício fiscal cumpre ou não os requisitos dispostos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Sob esse prisma, é imperioso que a proposição legislativa seja acompanhada de estudo sobre seu impacto orçamentário ou mesmo que se deliberem mecanismos para compensação da perda ou da renúncia de receita, o que torna complexa a apresentação de proposições com esse objetivo por parlamentares.

No que diz respeito ao exercício da iniciativa em matéria tributária, resta pacificado no Supremo Tribunal Federal que a iniciativa é concorrente do Poder Executivo e Legislativo:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. INICIATIVA LEGISLATIVA. 1. A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em matéria tributária. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - RE: 362573 MG , Relator: Min. EROS GRAU, Data de Julgamento: 26/06/2007, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-082 DIVULG 16-08-2007 PUBLIC 17-08-2007 DJ 17-08-2007 PP-00087 EMENT VOL-0228506 PP01147 LEXSTF v. 29, n. 345, 2007, p. 267-270)

Esse entendimento do E. STF é adotado inclusive quanto à concessão de benefícios fiscais, como o caso da concessão de isenções tributárias previstas no PL Nº 082/2019. Vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INICIATIVA LEGISLATIVA. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. CONCORRÊNCIA ENTRE PODER LEGISLATIVO E PODER EXECUTIVO. LEI QUE CONCEDE ISENÇÃO. POSSIBILIDADE AINDA QUE O TEMA VENHA A REPERCUTIR NO ORÇAMENTO MUNICIPAL. RECURSO QUE NÃO SE INSURGIU CONTRA A DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO QUE SE MANTÊM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O recurso extraordinário é cabível contra acórdão que julga constitucionalidade in abstracto de leis em face da Constituição Estadual, quando for o caso de observância ao princípio da simetria. Precedente: Rcl 383, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves. 2. A iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu pela inconstitucionalidade formal de lei em matéria tributária por entender que a matéria estaria adstrita à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, dada a eventual repercussão da referida lei no orçamento municipal. Consectariamente, providos o agravo de instrumento e o recurso extraordinário, em face da jurisprudência desta Corte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AI: 809719 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 09/04/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25- 04-2013 PUBLIC 26-04-2013)

O Veto Total em análise, por outro lado, diz respeito ao controle de constitucionalidade preventivo, utilizando como parâmetro a Lei Complementar Federal 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal), que estabelece critérios para operações de renúncia de receitas aplicáveis aos entes políticos de todos os níveis federativos.

Ocorre que da análise da jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal constata-se que a matéria não possui solução simples. O Supremo Tribunal Federal tem assentado que “A pretensão de cotejo entre o ato estatal impugnado e o conteúdo de outra norma infraconstitucional não enseja ação direta de inconstitucionalidade, na linha de precedentes da Corte”. (ADI 3790 AgR, Relator(a): Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno, julgado em 29/11/2007, DJe de 01-02-2008)

O STF inclusive enfatizou na ADI 3789 A GR / PR que “a verificação de eventual ilegitimidade do ato normativo há de ser aferida, necessariamente, a partir do seu cotejo direto com a Lei de Responsabilidade Fiscal. No entanto, a ação direta de inconstitucionalidade não é meio processual adequado para viabilizar exame de eventual ofensa reflexa à Constituição Federal (ADI 842 MC, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJ de 14/05/1993; ADI 1286 QO, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ de 06/09/1996; ADI 1035 AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Pleno, DJ de 27/06/1997; e ADI 1428 MC, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 10/05/1996).”. No acórdão citado, o agravante utilizou razões muito semelhantes às do veto total ora em análise, alegando que “(a) embora caiba à Lei Complementar 101/00 ditar normas gerais sobre finanças públicas, ela somente poderia ser interpretada mediante a observância dos princípios constitucionais; (b) a partir da consideração do art. 163, I, da CF, a lei estadual impugnada fora objeto de veto pelo Governador de Estado, durante sua tramitação legislativa; (c) as ações de controle concentrado possuem causa de pedir aberta, incumbindo à Suprema Corte a integral análise da compatibilidade do ato normativo impugnado com a Constituição Federal; e (d) no caso, a renúncia de receita operada pela lei questionada atingiria o Fundo de Participação dos Municípios, vulnerando o art. 158, IV, da Constituição Federal, argumento que teria sido ignorado na decisão impugnada.”. Ocorre que o E. STF de fato assentou que se tratava de fato de litígio de natureza infraconstitucional e pela inadequação do processo objetivo de controle de constitucionalidade para a análise da matéria.

Tem sido esse ainda o entendimento do MPRS, sendo caso de ilegalidade e não de inconstitucionalidade[1]:

Inicialmente, não merece conhecimento o presente pedido no ponto em que sustenta haver violação, pela norma impugnada, do artigo 14 da Lei Complementar Federal n.º 101/2000, já que impertinente, em sede de controle concentrado de constitucionalidade, a análise de eventual antinomia entre a lei apontada como viciada e outras normas infraconstitucionais. Na hipótese, ter-se-ia situação de ilegalidade, não de inconstitucionalidade, sendo inviável o controle abstrato.

Sendo assim, considera-se que há entendimento pacífico e jurisprudência consolidada do E. Supremo Tribunal Federal de que não se vislumbra hipótese de inconstitucionalidade do projeto de iniciativa parlamentar aprovado pela Câmara Municipal tendo como parâmetro desrespeito aos requisitos da LRF, como se observa:

               

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR Nº 191, DE 18 DE ABRIL DE 2000, DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ALEGADA VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 169, CAPUT E § 1º, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Controvérsia insuscetível de análise em controle abstrato de constitucionalidade, posto envolver o exame de normas infraconstitucionais (Lei Complementar nº 101/2000) e de elementos fáticos (existência da prévia autorização a que se refere o mencionado inciso II do § 1º do art. 169 do texto constitucional). Ação direta não conhecida (ADIN 2339-SC, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 18/04/2001).

ADI 3.421 – PR. “Alfim, conclui ser irrelevante a alegada ofensa à Lei de Responsabilidade Fiscal em sede de controle abstrato de constitucionalidade, levando em conta o paradigma essencialmente constitucional para a análise da ação direta. Está-se diante de opção político-normativa possível, não cabendo cogitar de discrepância com as balizas constitucionais referentes ao orçamento, sendo irrelevante o cotejo buscado com a lei de responsabilidade fiscal, isso presente o controle abstrato de constitucionalidade” (ADI 3.421 – PR, Rel. Min. Marco Aurélio, 05.05.2010)

Decisão: Trata-se de agravo contra decisão de inadmissibilidade de recurso extraordinário interposto em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná ementado nos seguintes termos: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL DE LONDRINA N. 9.765/05. NORMA DE ISENÇÃO DE IPTU. CRITÉRIOS DEFINIDOS NA LEI. NATUREZA TRIBUTÁRIA E NÃO ORÇAMENTÁRIA. INOCORRÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL POR VÍCIO DE INICIATIVA (ART. 133, II/III CE/PR). OFENSA A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL – AUSÊNCIA DE ESTUDO DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO-FINANCEIRO – IRRELEVÂNCIA. BASE DE CÁLCULO É O VALOR VENAL DO IMÓVEL INDEPENDENTEMENTE DAS EDIFICAÇÕES NESTE CONTIDAS. VALOR ARBITRADO PELO MUNICÍPIO. AÇÃO IMPROCEDENTE. 1. Inquestionável ter natureza tributária e não orçamentária norma que regule a isenção do imposto predial e territorial urbano, desde que o contribuinte atenda algumas especificidades da Lei Municipal. Nenhuma ofensa a Constituição Estadual (art. 133, II/III) se observa na Lei Municipal de Londrina 9765/05 por vício de iniciativa. 2. Em simetria à Carta Federal, o art. 101, VII, ‘f’ da Constituição do Estado do Paraná prevê a propositura de ação direta de inconstitucionalidade e de constitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais e municipais em face da Constituição e a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional e, portanto, não há falar-se em inconstitucionalidade de lei municipal em face da Lei Complementar Federal 101/2000. 3. Sendo o valor venal do imóvel, critério limitador para o enquadramento na Lei de Isenção do IPTU no Município de Londrina, do contribuinte-proprietário com mais de 63 anos de idade, viúva ou imóvel ocupado por pessoa portadora de deficiência, o acréscimo da expressão independentemente do número de edificações nele construídas (Lei 9765/05) é questão inócua para adequar a hipótese de incidência na norma de isenção, desnecessário, portanto, estudo de impacto orçamentário-financeiro desta renúncia fiscal”. (fl. 167-168) No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, sustenta-se, em preliminar, a repercussão geral da matéria deduzida no recurso. No mérito, aponta-se violação aos arts. 37, caput; e 163, ambos insertos no texto constitucional. Alega-se, inicialmente, que o aresto recorrido viola o princípio da legalidade ao não observar as normas existentes na Lei de Responsabilidade Fiscal que disciplinam os requisitos necessários para renúncia de receitas públicas. Decido. A irresignação não merece prosperar. Inicialmente, verifica-se que o agravante arguiu em ação direta de inconstitucionalidade estadual, a existência de vício de ilegalidade de lei municipal que concede isenção tributária em razão de alegada inobservância dos parâmetros necessários para sua realização estampados na Lei de Responsabilidade Civil (LC 101/2000), dentre eles a ausência de estimativa de impacto financeiro, e o Tribunal de origem, com base no cotejo das referidas alegações com os disposições legais pertinentes, consignou pela desnecessidade de exigência do referido estudo. Assim, subsiste fundamento infraconstitucional autônomo e suficiente para manter o acórdão recorrido, referente à necessidade de realização prévia de estudo de impacto financeiro de norma que altere os critérios anteriormente previstos para concessão de isenção tributária. Dessa forma, em razão da existência de fundamento suficiente de natureza infraconstitucional, não impugnado mediante via adequada, incide o óbice constante do Enunciado 283 da Súmula desta Corte. Ante o exposto, conheço do presente agravo para negar seguimento ao recurso extraordinário (art. 544, § 4º, II, “b”, do CPC). Publique-se. Brasília, 27 de junho de 2013. Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente. (ARE 642014, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 27/06/2013, publicado em DJe-148 DIVULG 31/07/2013 PUBLIC 01/08/2013).

AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DECRETO Nº 41.149/2008 DO GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. NATUREZA REGULAMENTAR. ATO SECUNDÁRIO. CONTROLE DE LEGALIDADE. PRETENSÃO INCOMPATÍVEL COM A VIA DA AÇÃO DIRETA. 1. Decisão denegatória de seguimento de ação direta de inconstitucionalidade por manifesto descabimento. 2. Vocacionada ao controle da constitucionalidade das leis e atos normativos, a ação direta de inconstitucionalidade não constitui meio idôneo para impugnar a validade de ato regulamentar e secundário em face de legislação infraconstitucional. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido.” (STF - ADI: 4127 RJ , Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento: 16/10/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-217 DIVULG 04-11-2014 PUBLIC 05-11-2014)

 

LEI COMPLEMENTAR 20/1992. ORGANIZAÇÃO E ESTRUTURAÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL ESTADUAL. AUTONOMIA FUNCIONAL E FINANCEIRA. ORÇAMENTO ANUAL. OFENSA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO. ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE NO CONTROLE ABSTRATO. PRERROGATIVA DE FORO. EXTENSÃO AOS DELEGADOS. INADMISSIBILIDADE. DIREITO PROCESSUAL. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. AFRONTA AO MODELO FEDERAL. 1. Ordenamento constitucional. Organização administrativa. As polícias civis integram a estrutura institucional do Poder Executivo, encontrando-se em posição de dependência administrativa, funcional e financeira em relação ao Governador do Estado (artigo, 144, § 6o, CF). 2. Orçamento anual. Competência privativa. Por força de vinculação administrativo-constitucional, a competência para propor orçamento anual é privativa do Chefe do Poder Executivo. 3. Ação direta de inconstitucionalidade. Norma infraconstitucional. Não-cabimento. Em sede de controle abstrato de constitucionalidade é vedado o exame do conteúdo das normas jurídicas infraconstitucionais. 4. Prerrogativa de foro. Delegados de Polícia. Esta Corte consagrou tese no sentido da impossibilidade de estender-se a prerrogativa de foro, ainda que por previsão da Carta Estadual, em face da ausência de previsão simétrica no modelo federal. 5. Direito Processual. Competência privativa. Matéria de direito processual sobre a qual somente a União pode legislar (artigo 22, I, CF). 6. Aposentadoria. Servidor Público. Previsão constitucional. Ausência. A norma institui exceções às regras de aposentadoria dos servidores públicos em geral, não previstas na Lei Fundamental (artigo 40, § 1º, I, II, III, a e b, CF). Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte. (ADI 882/MT, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Correa, j. 19/02/2004).

 

Na mesma esteira se verificam acórdãos dos Tribunais Estaduais:

TJRS. REPRESENTAÇÃO POR INCONSTITUCIONALIDADE – Lei nº 500, de 29.11.00, do Município de Barra do Piraí, que concede desconto para pagamento de dívida ativa – Alegação de nulidade frente ao que dispõe o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal e de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 73-I, 77, 200 parágrafo 2º, e 360, todos da Constituição Estadual. A representação por inconstitucionalidade não constitui meio adequado para a declaração de nulidade de lei municipal frente a lei complementar. Não se acolhe a representação se não evidenciada a inconstitucionalidade da lei impugnada. Improcedência. (TJRJ. Representação de Inconstitucionalidade nº 146/2000 Relator: Des. Carlos Ferrari. Unanimidade. 15 de outubro de 2001.)

TJSP. ADI. LM 3.722/2015 – MIRASSOL. “Ação direta de inconstitucionalidade – Lei nº 3.722 de 18 de fevereiro de 2015, do Município de Mirassol – Concessão de isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano a proprietários de imóveis portadores de doenças graves que especifica – Iniciativa oriunda do Poder Legislativo local – Viabilidade – Competência legislativa concorrente entre os Poderes Executivo e Legislativo para edição de norma tributária – Precedentes do C. Supremo Tribunal Federal – Lei questionada, ademais, que não cria ou impõe obrigações ao Executivo – Ausência de aumento de despesa – Tese de ausência de compensação, a desrespeitar artigo 14 da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de responsabilidade fiscal) que representa mero controle de legalidade da norma – Pretensão improcedente.” (ADI 20828289720158260000 – São Paulo – Órgão Especial – Relator Francisco Casconi – 16/09/2015 – Votação Unânime – Voto nº 30132).

Por outro lado, como alertou o Parecer Jurídico nº 227/2019 ao PL Nº 082/2019, se verifica a ilegalidade de aprovação da matéria sem o atendimento aos requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, sendo que tais exigências se fazem indispensáveis para o equilíbrio das contas públicas.

Da mesma forma alertou o IGAM na OT nº 37.875/2019 ao analisar o PL nº 082/2019:

Insta destacar, que o objeto do PL, ao conceder benefício de natureza tributária de caráter não geral, causando alteração nos elementos da base de cálculo do tributo, e, consequentemente, do valor a ser arrecadado, constitui aqui, a renúncia de receita, razão pela qual sua viabilidade depende do atendimento ao art. 14 da Lei Complementar nº 101/2000.

(...)

Assim, é indispensável demonstrar o impacto da renúncia no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes e, ainda, que a medida seja considerada na estimativa de receita da lei orçamentária a cada ano (inciso I), ou estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado (inciso II) da norma acima transcrita.

III. De acordo com o exposto, conclui-se pela viabilidade técnico-jurídica do projeto de lei sob o ângulo da iniciativa. Contudo, para sua aprovação, necessária a instrução do cumprimento do disposto no art. 14, da Lei Complementar nº 101/2000, referidas no item II desta Orientação Técnica.

O TJSP é cristalino ao reconhecer que “Ademais, nem mesmo a tese de “ausência de compensação”, com invocação do art. 14, da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) pode subsidiar o exame específico de constitucionalidade à luz dos requisitos elencados no dispositivo, tratando-se a hipótese, quando muito, de controle de legalidade da norma questionada.

Nesse sentido a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados editou a Súmula CFT nº 1, de 29 de outubro de 2008, exigindo, inclusive de proposições autorizativas, a estimativa de seu impacto orçamentário-financeiro e correspondente compensação, verbis:

É incompatível e inadequada a proposição, inclusive em caráter autorizativo, que conflite com as normas da Lei de Responsabilidade Fiscal e deixe de apresentar estimativa de seu impacto orçamentário e financeiro bem como respectiva compensação.”

Por outro lado, o acórdão do TJRS colacionado ao Parecer Jurídico da PGM que acompanha o veto permite verificar que o Tribunal Gaúcho considerou que a matéria caracterizaria inconstitucionalidade a partir de outro parâmetro, qual seja o artigo 19 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, por afronta ao princípio da razoabilidade:

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. NORMA MUNICIPAL CONCESSIVA DE DESCONTO NO IPTU. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. AUSÊNCIA DE VÍCIO FORMAL. RENÚNCIA DE RECEITA FISCAL. AUSÊNCIA DA ESTIMATIVA DO IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO DA EQUAÇÃO DE RECEITAS E DESPESAS ORÇAMENTÁRIAS. PRECEDENTES. 1. É pacífico o entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a norma de isenção de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) tem natureza tributária, e não orçamentária, sendo a iniciativa de competência concorrente entre os Poderes Legislativo e Executivo. 2. A proposição legislativa que disponha sobre descontos no IPTU deve ser acompanhada da estimativa do impacto orçamentário-financeiro da renúncia fiscal daí decorrente, mormente porque a isenção não pode implicar redução das receitas previstas no orçamento, de forma a colocar em risco o equilíbrio da frágil equação de receitas e despesas orçamentárias (art. 14 da LC n° 101/2001, art. 163 e seguintes da CF/88, art. 113 do ADCT e art. 8° 19 da CE/89). 3. Ausente a estimativa do impacto orçamentário-financeiro do benefício fiscal ora questionado, deve ser reconhecida a inconstitucionalidade da norma isencional, tendo em vista que não é possível aferir se os descontos no IPTU afetarão as metas de resultados fiscais previstas na lei de diretrizes orçamentárias, cumprindo destacar, a par disso, que tampouco se fez qualquer previsão de arrecadação compensatória. Violação do princípio da razoabilidade (art. 19 da CE/89). Precedente desta E. Corte. JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. UNÂNIME.(Ação Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70078689817, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em: 10-12-2018)

De fato, o Órgão Especial do TJRS firmou o entendimento de que a redução da correção monetária de créditos tributários, quando implicar renúncia fiscal, afronta o princípio da razoabilidade inserto no art. 19 da CE/89, na hipótese de não haver a indicação da respectiva fonte de compensação:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE. LEI MUNICIPAL 11.428/2013. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. IMPOSTO TERRITORIAL URBANO (IPTU) E TAXA DE COLETA DE LIXO (TCL). Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido. Rejeitada. Mérito. A lei municipal impugnada, de iniciativa da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, apresenta ofensa ao princípio da razoabilidade. Não se pode reduzir a correção monetária dos créditos de IPTU e TCL, na forma posta, pois implica evidente renúncia fiscal, ainda mais que não indicada a respectiva fonte de compensação. Declaração de inconstitucionalidade integral da Lei 11.428/13, com efeitos ex tunc, por ofensa à Constituição Estadual. Abalo significativo no orçamento municipal e embaraço a toda a atividade administrativa do Executivo Municipal. PRELIMINAR REJEITADA, UNÂNIME. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE, POR MAIORIA. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70054571740, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em 21/07/2014).

[1] SUBJUR N.º 1690/2011

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a prerrogativa do Prefeito para vetar projetos de lei e a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela possibilidade de manutenção do veto total, salientando ter o STF assentado a ausência de parâmetro constitucional para análise de proposições aprovadas em inobservância à LRF, embora ter-se verificado que a atual jurisprudência do TJRS tem assentado a inconstitucionalidade de matéria concernente ao texto aprovado no PL nº 082/2019, especificamente por afronta ao princípio da razoabilidade (art. 19 da CERS), por caracterizar renúncia fiscal sem a respectiva fonte de compensação.

Efetivamente, verifica-se que não foi observado o asseverado no Parecer Jurídico nº 227/2019 ao PL Nº 082/2019, que já havia alertado para a ilegalidade de aprovação da matéria sem o atendimento aos requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal:

  • "Já a legalidade da proposição está sujeita à observância da exigência de estimativa de impacto orçamentário-financeiro exigida pela Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF e ao atendimento de pelo menos uma das condições estabelecidas por seu artigo 14 (renúncia considerada na estimativa de receita da LOA e que não afetará as metas de resultados fiscais da LDO ou medidas de compensação). É o parecer. Guaíba, 26 de agosto de 2019. FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS. Procurador-Geral. OAB/RS 107.136."

É o parecer.

Guaíba, 07 de novembro de 2019.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136



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