Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Emenda à Lei Orgânica n.º 004/2019
PROPONENTE : Ver. Manoel Eletricista
     
PARECER : Nº 254/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera o § 7º do artigo 11 da Lei Orgânica Municipal"

1. Relatório:

O Vereador Manoel Eletricista, em conjunto com outros 5 vereadores, apresentou o Projeto de Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 004/2019 à Câmara Municipal, em que busca alterar a redação do § 7º do art. 11 da Lei Orgânica Municipal. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do art. 105 do RI.

2. Parecer:

Preliminarmente, verifica-se que a norma inscrita no artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido – e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Constata-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que, tratando-se de projeto de emenda à Lei Orgânica, exige o artigo 35, § 1º, da Lei Orgânica Municipal que a proposta, se for veiculada por vereador, seja subscrita por 1/3 dos membros da Câmara Municipal, requisito que foi devidamente observado (fl. 02). Embora o IGAM tenha declarado que houve apenas um proponente para o projeto, a proposta, na realidade, veio acompanhada da assinatura de 6 membros da Câmara Municipal, preenchendo o quórum de 1/3.

Além disso, a respeito da competência da Câmara Municipal para emendar a Lei Orgânica, prevê o artigo 28, inciso XV, ser da competência privativa da Câmara Municipal “manter a Lei Orgânica do Município atualizada.” Lembra-se que, para a aprovação de projeto de emenda à Lei Orgânica, deve a proposta ser discutida e votada em duas sessões, com interstício mínimo de 10 dias, considerando-se aprovada se obtiver 2/3 dos votos dos membros da Câmara Municipal nas duas sessões, conforme disciplina o art. 36 da Lei Orgânica.

A promulgação da emenda à Lei Orgânica, se aprovado o seu projeto, caberá à Mesa Diretora da Câmara, a qual conferirá o respectivo número de ordem (art. 37 da Lei Orgânica Municipal). Respeitadas tais formalidades, não se verificará qualquer vício de natureza formal, porquanto são essas as exigências para a tramitação do projeto.

No que diz respeito aos aspectos materiais do projeto de emenda à Lei Orgânica, cabe lembrar que o art. 57, § 4º, da CF/88 não é norma de reprodução ou repetição obrigatória pelos Estados, DF e Municípios, cabendo a todos os entes, no âmbito da sua autonomia política (art. 18, CF/88), compor a sua própria organização (capacidade de auto-organização). Eis a ampla jurisprudência do STF e precedente do TJRS:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA LIMINAR. § 5º DO ARTIGO 58 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO NA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL 27/2000. FALTA DE RELEVÂNCIA JURÍDICA DA FUNDAMENTAÇÃO DA ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARA A CONCESSÃO DE LIMINAR. - Esta Corte, já na vigência da atual Constituição - assim, nas ADIN's 792 e 793 e nas ADIMEC's 1.528, 2.262 e 2.292, as duas últimas julgadas recentemente -, tem entendido, na esteira da orientação adotada na Representação nº 1 .245 com referência ao artigo 30, parágrafo único, letra "f", da Emenda Constitucional nº 1/69, que o § 4º do artigo 57, que veda a recondução dos membros das Mesas das Casas legislativas federais para os mesmos cargos na eleição imediatamente subseqüente, não é princípio constitucional de observância obrigatória pelos Estados-membros. [...] (ADI 2371 MC, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 07/03/2001, DJ 07-02-2003).

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. ART. 24 DA LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE MIRAGUAÍ E ART. 29 DO REGIMENTO INTERNO DA CÂMARA DE VEREADORES. MANDATO. MESA DIRETORA DA CÂMARA DE VEREADORES. DURAÇÃO. INTERESSE LOCAL. Se os Estados-Membros em geral, consoante o norte que se deflui dos precedentes do Pretório Excelso nas ADIs 792/RJ e 793/RO, não têm que estabelecer compulsoriamente, seja frente aos princípios constitucionais mais específicos, seja diante do Princípio da Simetria, em 2 (dois) anos o mandato dos membros da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa, ainda que o tenha a Carta Estadual assim estabelecido, não estão os Municípios obrigados a se subordinar a essa regra da Carta local. [...] Como o prazo de duração do mandado da Mesa da Câmara de Vereadores não se enquadra como norma de reprodução obrigatória do conteúdo constante nas Constituições Federal e Estadual, deve ser julgada improcedente a ação. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70022726335, Tribunal Pleno, TJRS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 26/05/2008)

Leia-se excerto da argumentação do Procurador-Geral da República (Dr. Geraldo Brindeiro) à época de julgamento da matéria no Supremo Tribunal Federal:

Na verdade, a norma constante do art. 57, § 4º, da Constituição Federal, não inclui, a rigor, princípio constitucional, mas sim regra aplicável à composição das Mesas do Congresso Nacional. O Constituinte federal optou por incluir norma que seria de natureza regimental no texto da Constituição, não cabendo nenhuma analogia com a norma constitucional do art. 14, § 5º (esta sim encerrando princípio constitucional de irreelegibilidade aplicável às Constituições Estaduais quanto aos Governadores), que se refere obviamente a eleição pelo eleitorado e não eleição interna corporis pelas Casas Legislativas.

É bastante considerar, aliás, que o art. 27, caput, §§1º e 2º, da Constituição Federal, referindo-se expressamente às “regras” que os Estados da Federação deve seguir quanto à composição das Assembléias Legislativas, mandatos, remuneração, sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidade, licenças e impedimentos, nada estabeleceu quanto à eleição das Mesas.

O art. 57, § 4º, da CF/88 regula a forma como ocorrem as eleições no âmbito do Poder Legislativo da União, prevendo o seguinte:

Art. 57 (...)

§ 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente.

Ocorre que, como já demonstrado anteriormente, a jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que a disposição do § 4º do art. 57 da CF/88 é de âmbito regimental, só se aplicando ao Poder Legislativo da União (Congresso Nacional), sem repercutir nos demais entes federados. Assim, resumidamente, trata-se de dispositivo constitucional que não é de reprodução obrigatória nos regramentos estaduais e municipais.

Por não ser norma de reprodução obrigatória, o art. 57, § 4º, da CF/88 tem aplicação restrita ao Congresso Nacional, de modo que a organização das eleições para as mesas diretoras das câmaras municipais é matéria própria da autonomia legislativa municipal (arts. 18, “caput”, e 30 da CF/88), cabendo a cada Município estabelecer o seu regramento.

Desse modo, compete ao próprio Município de Guaíba, enquanto ente dotado de autonomia política e capacidade de auto-organização, estabelecer a sua ordenação, inclusive a forma, a periodicidade e os requisitos para as eleições da Mesa Diretora da Câmara Municipal. Portanto, não há vício de natureza formal ou material na proposição no que concerne ao art. 57, § 4º, da CF/88.

Contudo, esclarece-se que o conteúdo da proposta poderá gerar discussões sobre inconstitucionalidade material fundamentada na violação do princípio da igualdade (art. 5º, “caput”, da CF/88), já que impede a participação de vereadores nas eleições para o cargo de Presidente da Câmara tão somente pelo fato de estarem filiados ao mesmo partido político do atual gestor da Casa Legislativa, limitação que, aliás, não é verificada nas demais leis orgânicas municipais.

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta do Projeto de Emenda à Lei Orgânica nº 004/2019, podendo seguir o trâmite regimental, já que o art. 57, § 4º, da CF/88 não é de reprodução obrigatória nas leis orgânicas municipais. Porém, ressalta-se que o conteúdo da proposta poderá gerar discussões sobre inconstitucionalidade fundamentada na violação do princípio da igualdade (art. 5º, “caput”, da CF/88), já que impede a participação de vereadores nas eleições para o cargo de Presidente da Câmara tão somente pelo fato de estarem filiados ao mesmo partido político do atual gestor da Casa Legislativa, limitação que, aliás, não é verificada nas demais leis orgânicas municipais.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 17 de setembro de 2019.

 

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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