Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Emenda à Lei Orgânica n.º 003/2019
PROPONENTE : Ver. Alex Medeiros, Ver. Manoel Eletricista, Ver. Nelson do Mercado, Ver. Florindo Motorista, Ver. José Campeão Vargas e Ver. Juliano Ferreira
     
PARECER : Nº 199/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dá nova redação aos Artigos 146 e 153 da Lei Orgânica Municipal, incluindo como disciplina curricular obrigatória a Educação Ambiental"

1. Relatório:

Os Vereadores Alex Medeiros, Manoel Eletricista, Nelson do Mercado, Florindo Motorista, José Campeão Vargas e Juliano Ferreira apresentaram o Projeto de Emenda à Lei Orgânica nº 003/2019 à Câmara Municipal, objetivando dar nova redação aos arts. 146 e 153 da Lei Orgânica Municipal, para incluir como disciplina curricular obrigatória a educação ambiental. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

No que concerne às competências legislativas, a CF/88 as divide em: a) privativa (artigo 22): atende ao interesse nacional, atribuída apenas à União, com possibilidade de outorga aos Estados para legislar sobre pontos específicos, desde que por lei complementar; b) concorrente (artigo 24, caput): atende ao interesse regional, atribuída à União, para legislar sobre normas gerais, e aos Estados e ao DF, para legislar sobre normas específicas; c) exclusiva (artigo 30, I): atende ao interesse local, atribuída aos Municípios; d) suplementar (artigo 24, § 2º, e artigo 30, II): garante aos Estados suplementar a legislação federal, no que couber, bem como aos Municípios fazer o mesmo em relação às leis federais e estaduais; e) remanescente estadual (artigo 25, § 1º): aos Estados são atribuídas as competências que não sejam vedadas pela Constituição; f) remanescente distrital (artigo 32, § 1º): ao DF são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e aos Municípios.

As matérias de educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação estão previstas como competências concorrentes, atribuídas à União, aos Estados e ao Distrito Federal, como se vê:

Art. 24 Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

[...]

IX – educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação;

Na competência concorrente, a União tem por tarefa estabelecer normas gerais sobre as matérias especificadas no artigo 24, cabendo aos Estados e ao Distrito Federal suplementá-las de acordo com as suas peculiaridades regionais (§§ 1º e 2º). Os Estados e o Distrito Federal só possuem autorização constitucional para legislar plenamente caso a União não tenha editado normas gerais; do contrário, deverão obrigatoriamente respeitá-las, especificando suas regras à luz do ordenamento federal.

Os Municípios, por sua vez, sob a ótica do artigo 24 da CF/88, não estão legitimados a legislar concorrentemente sobre esses temas. Sua competência legislativa está adstrita ao previsto no artigo 30 da CF/88, limitando-se, basicamente, aos assuntos de interesse especificamente local e à suplementação da legislação federal e estadual, no que couber.

No campo da competência suplementar dos Municípios, estes estão legitimados a complementar as normas editadas com base no artigo 24 da CF/88, desde que respeitados os aspectos gerais do regramento objeto da suplementação. Resumidamente, os Municípios só podem legislar na competência suplementar caso existam, de fato, normas federais ou estaduais sobre a matéria e se respeite o campo de abrangência das leis complementadas.

A respeito da educação ambiental, a Lei Federal nº 9.795/99 dispõe sobre esse tema e institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Trata-se de norma de caráter geral derivada da competência concorrente prevista no art. 24, inciso IX, da CF/88, de modo que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, ao complementá-la localmente, necessitam observar os parâmetros definidos na normativa federal.

Ocorre, entretanto, que o art. 10, § 1º, da Lei Federal nº 9.795/99 prevê que “A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino.” Há, portanto, uma proibição da lei federal no sentido de que a educação ambiental não pode ser ministrada como disciplina curricular própria nas instituições de ensino de todo o país, devendo ser “desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal.” (art. 10, caput, da Lei Federal nº 9.795/99).

É por essa razão que a educação ambiental integra um dos eixos de temas transversais definidos pelo Ministério da Educação como de necessário atendimento no ensino formal brasileiro. Os temas transversais estão fixados nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, sendo definidos como assuntos que devem permear todas as disciplinas obrigatórias curriculares das instituições de ensino, por se referirem diretamente à educação para a cidadania e à formação moral e social dos estudantes. São temas que, embora não possuam autonomia curricular tal como a Matemática e a Língua Portuguesa, devem estar presentes na atuação profissional dos professores como complementação das disciplinas obrigatórias, visando ao aperfeiçoamento pessoal de cada educando. Os eixos atualmente existentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN são Ética, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde e Orientação Sexual.

Portanto, diante da vedação constante na legislação federal e da previsão da temática como um dos eixos transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, a legislação local não poderia, a pretexto da competência suplementar do artigo 30, II, da CF/88, estabelecer a educação ambiental como disciplina curricular obrigatória nas instituições de ensino do Município de Guaíba, sob pena de violação do pacto federativo, já que estaria usurpando o sistema brasileiro de distribuição de competências legislativas.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria Jurídica orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver aos autores a proposição em epígrafe, em virtude da vedação constante no art. 10, § 1º, da Lei Federal nº 9.795/99 (“A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino”), regra geral derivada da competência concorrente do art. 24, inciso IX, da CF/88 e que, portanto, não permite à legislação local dispor em sentido contrário, sob pena de violação do pacto federativo, pela usurpação do sistema de repartição de competências legislativas.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 19 de julho de 2019.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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