Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 071/2019
PROPONENTE : Ver. Manoel Eletricista
     
PARECER : Nº 187/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui o Programa Adote uma Lixeira"

1. Relatório:

O Projeto de Lei n.º 071/2019, de autoria do Vereador Manoel Eletricista (PPS), que “Institui o Programa Adote uma Lixeira”, foi encaminhado a esta Procuradoria Jurídica pela Presidente em Exercício da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o exercício de controle quanto à constitucionalidade, à competência da Câmara e ao caráter pessoal das proposições.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, §1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI) e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

Constata-se que a matéria constante do Projeto de Lei n.º 071/2019, de autoria do Vereador Manoel Eletricista (PPS), de fato insere-se no âmbito de matérias de interesse local, nos termos do artigo 30, I da Constituição Federal, portanto de competência legislativa do município, ao qual ainda cabe suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, por força do artigo 30, II da CF/88. Dispõe o artigo 30 da Constituição Federal, prevendo a faculdade normativa dos Municípios, através da capacidade de editar leis locais próprias ou legislação suplementar às leis estaduais e federais:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

 

Também não incorre em inconstitucionalidade formal, visto que ao não criar obrigações ou atribuições a órgãos públicos, não usurpa a esfera de competência do Poder Executivo Municipal prevista no art. 61 da Constituição Federal, tendo quanto a isso observado os requisitos formais do processo legislativo, além de não ultrapassar o disposto no art. 2º da CF/88 e art. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul quanto à separação dos poderes.

As matérias de competência e iniciativa reservadas são rol taxativo na CF/88 e nas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas, lecionando HELY LOPES MEIRELLES que:

 “Leis de iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores, são todas as que a lei orgânica municipal não reserva, expressa e privativamente, à iniciativa do prefeito. As leis orgânicas municipais devem reproduzir, dentre as matérias previstas nos arts. 61, §1º, e 165 da CF, as que se inserem no âmbito da competência municipal. São, pois, de iniciativa exclusiva do prefeito, como chefe do Executivo local, os projetos de lei que disponham sobre criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública Municipal; matéria de organização administrativa e planejamento de execução de obras e serviços públicos; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autárquica e fundacional do Município; o regime jurídico e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias, o orçamento anual e os créditos suplementares e especiais. Os demais projetos competem concorrentemente ao prefeito e á Câmara, na forma regimental. (grifo nosso)

Com base nesses fundamentos, vê-se que o alcance material da norma diz respeito ao direito fundamental ao meio ambiente sadio no âmbito do Município de Guaíba, não havendo a reserva de iniciativa, já que não se insere dentre o rol taxativo de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo.

Nessa perspectiva, quanto à inocorrência de invasão de competência do Poder Executivo da proposição, cabe trazer a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, na Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70074889684, justamente quanto a lei municipal que institui o Programa Adote uma Lixeira:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL N. 3.038/2017, DO MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO, QUE INSTITUI O PROGRAMA ADOTE UMA LIXEIRA. LEI DE INICIATIVA DO PODER LEGISLATIVO. VÍCIO DE INICIATIVA NÃO CONFIGURADO. Lei que apenas faculta ao Poder Executivo MUNICIPAL ESTABELECER PARCERIAS COM EMPRESAS PRIVADAS, ENTIDADES SOCIAIS OU PESSOAS FÍSICAS INTERESSADAS EM FINANCIAR A INSTALAÇÃO E MANUTENÇÃO DE LIXEIRAS EM LOGRADOUROS PÚBLICOS. Ausência de determinação legal de regulamentação e implantação do programa pela administração pública municipal. Ausência de criação de atribuições a Secretarias Municipais. Violação ao princípio da separação e independência dos poderes não configurada. Não padece de inconstitucionalidade formal, por vício de iniciativa, lei municipal de iniciativa do Poder Legislativo que cria o programa denominado “Adote uma Lixeira”, facultando ao Município o estabelecimento de parcerias com empresas privadas, entidades sociais, ou pessoas físicas interessadas em financiar a instalação e manutenção de lixeiras nos logradouros públicos, com direito à publicidade. A lei impugnada não determina a implantação do programa em questão e nem estabelece prazo para tanto, meramente facultando à Administração Pública Municipal efetivar tal programa, atendendo critérios de conveniência e oportunidade, não criando atribuições a órgãos da Administração Pública e tampouco dispondo sobre matérias cuja lei é de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, previstas no art. 60, inc. II, da Constituição Estadual. JULGARAM IMPROCEDENTE. Ação Direta de Inconstitucionalidade Órgão Especial. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70074889684, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 09 de abril de 2018.)

Verifica-se que a jurisprudência acima colacionada do TJRS amolda-se perfeitamente ao projeto em análise, já que possui disposições normativas idênticas à da Lei Nº 3.038/2017, do Município de Novo Hamburgo a qual Instituiu o Programa Adote Uma Lixeira.

 

Naquela ocasião, o TJRS consignou que “A leitura do texto legal revela que não foram impostas obrigações diretas e imediatas ao Executivo (salvo a de regulamentar a lei em 30 dias  - art. 3°), tampouco foram criadas novas tarefas para seus órgãos.” e que a “A iniciativa do Poder Legislativo é louvável e vem ao encontro do interesse público”. Além de tudo, assentou que:

 

“... a preocupação de asfixiarmos as Câmaras Municipais. Sobrará o que para as Câmaras Municipais? Fazer voto de louvor, voto de pesar, dar nome em rua? Do que também me penitencio, porque já julguei com o que considero hoje uma extrema restrição à competência legislativa, que estamos estabelecendo quanto às Câmaras Municipais e que não se vê, por exemplo, no âmbito Federal, quanto à Câmara de Deputados, quanto ao Senado e à iniciativa legislativa.

(...)

Este, insisto, é um tema que deveríamos nos debruçar para estabelecer quais os limites de atuação do Legislativo Municipal e evitar-se uma restrição, porque não vai sobrar nada para o Legislativo. Depois, então, começa-se a ironizar: A Câmara de Vereadores é só para dar voto de louvor, voto de pesar e nome em rua? De certa forma, se permanecer esse enfoque rígido, está justificada essa limitação legislativa das Câmaras de Vereadores.

(...)

DES. RUI PORTANOVA:

Colegas. Este é um processo típico para começarmos a pensar numa idéia que, pouco e pouco, tem se desenvolvido neste Órgão Especial. Trata-se da ideia de, na medida do possível, buscarmos prestigiar, cada vez mais, a atividade dos vereadores e, por conseqüência, a atividade legislativa municipal. Não sei até que ponto essa idéia já esteja mesmo disseminada (tal como se fosse um norte a ser buscado) pelo conjunto dos colegas que compõem este Colégio. Na verdade, cada vez ouço do eminente colega DES. ARMINIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA - e me convenço que é tempo para começar a plantar a idéia de valorização dos Edis de nossas cidades. Não podemos perder de vista que, até antes da Constituição de 1988, as Câmaras de Vereadores sofreram as agruras de um longo e tenebroso inverno. Em 1964, por exemplo, as Câmaras foram proibidas de emendar orçamentos municipais e foi proibida a remuneração de vereadores. Na Constituição de 1988, influenciada pelo movimento democrático, a realidade dos Municípios sofreu grandes modificações. Entre tantas modificações vale destacar as mudanças ocorridas na distribuição dos recursos tributários e também no processo de descentralização de políticas públicas, que conferiu ao Município novas responsabilidades político administrativas para exercitar com autonomia os assuntos relativos ao peculiar interesse local em decorrência de seu inédito papel no novo padrão de organização federativa que a Constituição implantou. Tanto quanto posso retirar, o mais expressivo julgamento que alimenta a idéia de valorização da legislação municipal, vem do Supremo Tribunal Federal.

É o que se vê de notícia site da Suprema Corte de 20 de outubro de 2016 que segue: Lei de iniciativa parlamentar que prevê instalação de câmeras de segurança em escolas públicas é constitucional O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou jurisprudência dominante no sentido de que não invade a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para os cofres municipais, não trate da estrutura ou da atribuição de órgãos do município nem do regime jurídico de servidores públicos. A matéria foi apreciada no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 878911, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, que teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual do STF. No caso dos autos, o prefeito do Rio de Janeiro ajuizou ação direta de inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça estadual (TJ-RJ) buscando a invalidade da Lei Municipal 5.616/2013, que prevê a obrigatoriedade de instalação de câmeras de segurança em escolas públicas municipais e cercanias. Na ação, sustentou que a lei apresenta vício formal de iniciativa, pois decorreu de proposta do Legislativo local, situação que usurparia a competência exclusiva do chefe do Executivo para propor norma sobre o tema.

Rogando vênia, a divergência, estou em que, procedendo a um juízo de proporcionalidade entre a lei carioca, considerada constitucional pelo STF, e a presente lei hamburguesa, vê-se bastante possível proceder-se a juízo de constitucionalidade. Talvez valha a pena reconhecer que, na busca da valorização das leis municipais haja, neste caso pequeno gasto na execução do Projeto, quando e se implementado o programa “Adote uma lixeira”. Tomando-se de emprestado o parecer do Ministério Público, pode-se projetar, por exemplo que caberá ao Executivo apreciar as propostas das pessoas jurídicas ou físicas, selecioná-las e formalizar a concessão desse patrocínio.”

Trazemos à fundamentação, ademais, como tem feito essa Procuradoria, o assentado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, na ADIN 2039942-15.2017.8.26.0000, que teve por objeto a Lei n.º 16.612, de 20 de fevereiro de 2017, do Município de São Paulo, que dispõe sobre o “Programa de Combate a Pichações no Município de São Paulo”, de autoria parlamentar:

TJSP – ÓRGÃO ESPECIAL - ADIN 2039942-15.2017.8.26.0000 - EMENTA - Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n.º 16.612/2017 do Município de São Paulo, que dispõe sobre “Programa de Combate a Pichações”. I Inexigibilidade da outorga de mandato com poderes especiais para propositura de ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 9.868/99. Procuração que, de todo modo, anunciou ter sido outorgada para aquela sorte de propositura. II Petição inicial que alude a dispositivos infraconstitucionais. Irrelevância, já que não servirão eles como parâmetro de julgamento. III Inocorrência de ofensa à competência constitucional do Município ou aos limites para a atuação do Legislativo quanto à matéria versada no diploma impugnado. Inconstitucionalidade reconhecida, porém, de dispositivos pontuais (artigos 8º e 9º) que proíbem a Administração de contratar infratores, obrigam-na a instituir cadastro interno e autorizam o Executivo a firmar termos de cooperação. Artigos 24 § 2º e 47 da Constituição paulista. Ação parcialmente procedente. (...) Realmente, zelar pela proteção do meio ambiente urbano e pelo controle da poluição, exercer o poder de polícia e conferir ao Executivo a incumbência de disciplinar o procedimento administrativo para apuração das infrações (artigo 4º) eram atividades que já se compreendiam na natural incumbência daqueles órgãos da Administração.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei n.º 071/2019, de autoria do Vereador Manoel Eletricista (PPS), por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer.

Guaíba, 04 de julho de 2019.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral

OAB/RS 107.136



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