Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 015/2019
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 149/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Autoriza o Município de Guaíba a doar uma fração de terras à Empresa Via Terres Transporte e Manutenção Ltda. e dá outras providências "

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 015/2019 à Câmara Municipal, que autoriza o Município de Guaíba a doar uma fração de terras à empresa Via Terres Transporte e Manutenção LTDA. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno.

  1. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

 

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.”

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. Parecer:

A norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

Verifica-se, também, estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado trata da transferência de bens municipais e, sobre este tema, dispõe a Lei Orgânica do Município de Guaíba:

Art. 52 Compete privativamente ao Prefeito:

[...]

XXII - administrar os bens e as rendas municipais, promover o lançamento, a fiscalização e a arrecadação de tributos;

 

Art. 92 Cabe ao Prefeito a administração dos bens municipais, respeitada a competência da Câmara quanto àqueles utilizados em seus serviços.

Como justificativa para a doação, o Poder Executivo alega, na exposição de motivos, que o ato tem por objetivo incentivar a ampliação das atividades empresariais para outros ramos, sendo finalidade, também, aumentar a frota atual e abrir novas frentes de trabalho. A empresa, que atualmente possui 40 (quarenta) funcionários, contará com cerca de 80 (oitenta) pessoas em um prazo médio de 05 (cinco) anos.

Inicialmente, a Constituição Federal de 1988, ao tratar da matéria de licitações, estabelece, no seu art. 37, inciso XXI, que “ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”. A Lei Geral de Licitações (Lei Federal nº 8.666/93), por sua vez, dispõe:

Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010)

Como se vê da leitura do dispositivo legal, um dos principais motivos da existência da licitação, na Administração Pública, é a possibilidade concreta da obtenção de propostas vantajosas e econômicas, de modo a atender ao interesse público e a efetivar, na prática, os princípios constitucionais administrativos. Hely Lopes Meirelles, em sua obra “Direito Administrativo Brasileiro”, 39ª edição, 2013, p. 290-291, assim leciona:

Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse, inclusive o da promoção do desenvolvimento econômico sustentável e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos.

[...] Com poucas divergências, a doutrina é acorde na acentuação desses traços essenciais e de duas tradicionais finalidades da licitação – obtenção do contrato mais vantajoso e resguardo dos direitos de possíveis contratados. É preocupação que vem desde a Idade Média, e leva os Estados Modernos a aprimorarem cada vez mais o procedimento licitatório, hoje sujeito a determinados princípios, cujo descumprimento descaracteriza o instituto e invalida seu resultado seletivo.

Ricardo Alexandre e João de Deus, na obra “Direito Administrativo”, 3ª edição, 2017, p. 482, por sua vez, discorrem da seguinte maneira:

Com efeito, a realização de licitação possibilita que a Administração escolha a proposta que lhe seja mais vantajosa (não necessariamente a mais econômica), evitando, em homenagem ao princípio da impessoalidade, que os gestores públicos adotem critérios pessoais ou políticos na escolha dos contratados. Além do mais, proporciona igualdade de oportunidades a todos aqueles que têm interesse em contratar com a Administração, respeitando-se o princípio da isonomia.

Assim, tem-se que a licitação, enquanto regra constitucional, garante que a Administração Pública obtenha a proposta mais vantajosa e, simultaneamente, concretize os princípios constitucionais explícitos e implícitos aplicáveis, mormente o da impessoalidade.

Há, contudo, hipóteses em que a Lei de Licitações estabelece a dispensa da licitação, que tanto podem refletir casos de licitação dispensável (art. 24) como de licitação dispensada (art. 17). Quanto a esta última, o art. 17 prevê que bens da Administração Pública podem ser alienados, cumpridos alguns requisitos para tanto: 1) existência de interesse público devidamente justificado; 2) avaliação; 3) quando imóveis, a prévia autorização legislativa; 4) em regra, licitação na modalidade concorrência. A licitação poderá ser dispensada, entre outras causas, na doação (art. 17, I, “b”, da Lei nº 8.666/93).

A redação prevista na alínea “b” do inciso I do art. 17 da Lei de Licitações prevê que a doação com licitação dispensada só é viável quando feita para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo. Ocorre, entretanto, que a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 927-3, processada no STF, recebeu medida cautelar para suspender, em relação aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, os efeitos do art. 17, I, “b”, porque a competência legislativa da União, em matéria de licitações e contratos administrativos, se limita a estabelecer normas gerais, razão pela qual a restrição “permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública” teria extrapolado os limites de competência legislativa federal. Assim, segundo a interpretação do STF na medida cautelar, ficaria suspenso o trecho que restringe doações apenas a órgãos e a entes públicos, tornando-se possível, como regra, quaisquer doações com licitação dispensada, desde que atendidos os demais requisitos do art. 17 da Lei nº 8.666/93.

Para tornar mais clara e fundamentada a argumentação, veja-se a lição doutrinária de Marçal Justen Filho, na obra “Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos”, 16. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 330:

O STF, em decisão cautelar na ADI 927/RS, apreciou questionamento sobre a validade e extensão de inúmeros dispositivos da Lei 8.666/1993. De modo geral, todas as impugnações foram rejeitadas, com ressalva de algumas atinentes a dispositivos do art. 17. A questão acabou despertando inúmeras dúvidas, inclusive derivadas de alguma complexidade na redação do acórdão e dos diversos votos emitidos. [...]

É bem verdade que a leitura dos votos produz algumas dúvidas, tal como adiante referido. Conforme exposto no relatório do ilustre Ministro Carlos Velloso, a inicial pleiteava o reconhecimento da inconstitucionalidade da interpretação que “dá por extensivas aos Estados e Municípios as regras do art. 17, I, b e c, II, a, b e § 1º, da mesma Lei 8.666/1993.” Quanto a isso, pleiteou-se na inicial a adoção de interpretação conforme a Constituição. Portanto, em momento algum se deduziu pleito de declaração de inconstitucionalidade dos referidos dispositivos. Dito de outro modo, não se controvertia sobre sua validade em face da própria União. Essa ressalva é de grande relevância porque a redação do acórdão, ao sumariar o resultado, pode induzir à conclusão de que alguns dos dispositivos teriam tido sua aplicação suspensa de modo absoluto. Resultado dessa ordem não pode ser admitido, eis que configuraria julgamento extra petita. Mais ainda, o teor dos diversos votos induz claramente a conclusão diversa. [...]

No tocante ao inc. I, alínea b, foi deferida a liminar para suspender a vigência, até o julgamento final, quanto a Estados, Distrito Federal e Municípios e respectivas administrações indiretas, da expressão “permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da Administração Pública, de qualquer esfera de governo”, contida no inc. I, alínea b, do art. 17. Não houve maiores divergências quanto  a esse ponto, ficando vencido apenas o Ministro Paulo Brossard.

Suspensa, então, a aplicabilidade da restrição prevista na alínea “b” do inciso I do art. 17 da Lei Federal nº 8.666/93 quanto aos Estados, Distrito Federal e Municípios, os requisitos básicos para as doações de imóveis da Administração Pública com licitação dispensada são: (i) interesse público devidamente justificado; (ii) autorização legislativa prévia; (iii) avaliação dos bens a serem doados. Soma-se a esses requisitos o que consta no art. 101 do Código Civil: “Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.” Só estão sujeitos à alienação, portanto, os bens de natureza dominical, isto é, aqueles bens que apenas compõem o patrimônio da Administração Pública, mas que não estão destinados a uma finalidade pública específica.

Nesse sentido, estão ausentes no Projeto de Lei nº 015/2019 os laudos de avaliação dos bens a serem doados, que não podem ser dispensados sob hipótese alguma, já que toda e qualquer alienação de bens públicos pressupõe a apuração do seu adequado valor de mercado. Quanto ao interesse público devidamente justificado, trata-se de matéria de mérito a ser verificada pelos vereadores, que deverão ponderar, através de seu voto, sobre a existência de justificativa plausível para a doação dos bens públicos. Todavia, um fator importante sobre a justificativa de interesse público que não foi enfrentado pelo Poder Executivo consta no art. 96 da Lei Orgânica Municipal: “O Município, preferentemente a venda ou doação de seus bens imóveis, outorgará concessão de direito real de uso, mediante prévia autorização legislativa e concorrência pública”. Nesses termos, não houve qualquer justificativa sobre a maior vantagem à Administração Pública na doação dos dois imóveis em comparação a outros institutos que não provoquem a transferência da propriedade.

Para justificar o interesse público na doação das áreas, o Poder Executivo justifica, na exposição de motivos, que houve projeto de intenção para utilização de área industrial devidamente protocolado e aprovado pela Comissão Municipal de Avaliação dos Projetos de Instalação da Zona Especial de Desenvolvimento Econômico (ZEDE). O art. 3º da Lei Municipal nº 2.664/10 permite o deferimento de incentivo consistente em doação ou concessão de uso de área destinada à construção ou instalação do empreendimento. Para tanto, porém, exigem os arts. 8º e 9º que haja requerimento do interessado, acompanhado de projeto circunstanciado com diversas informações sobre a regularidade da empresa e sobre as características do investimento pretendido.

O processo administrativo relativo à concessão do incentivo econômico, entretanto, não foi encaminhado em anexo ao Projeto de Lei nº 015/19 para a análise de sua regularidade pelas comissões temáticas e pelos vereadores. Aliás, não há qualquer documento acompanhando a proposição, nem mesmo as matrículas dos bens a serem doados, aptas à comprovação da propriedade dos imóveis. Essa ausência torna inviável a análise do cumprimento da legislação local sobre a concessão de incentivos econômicos, uma condicionante à legalidade e ao interesse público na doação.

A doação contém a previsão de encargo a ser cumprido pelo donatário. Encargos são cláusulas acessórias do negócio jurídico que atribuem uma finalidade ou destinação específica do seu objeto, não suspendendo a aquisição nem o exercício do direito (art. 136 do Código Civil). De acordo com Carlos Roberto Gonçalves, na obra “Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral das Obrigações, 15. ed., São Paulo: Saraiva, 2018”,

Obrigação modal (com encargo ou onerosa) é a que se encontra onerada por cláusula acessória, que impõe um ônus ao beneficiário de determinada relação jurídica. Trata-se de pacto acessório às liberalidades (doações, testamentos), pelo qual se impõe um ônus ou obrigação ao beneficiário. É admissível, também, em declarações unilaterais da vontade, como na promessa de recompensa, e raramente nos contratos onerosos (pode ocorrer na compra e venda de um imóvel, com o ônus de franquear a passagem ou a utilização por terceiros, p. ex.). É comum nas doações feitas ao município, em geral com a obrigação de construir um hospital, escola, creche ou algum outro melhoramento público; e nos testamentos, em que se deixa a herança a alguém, com a obrigação de cuidar de determinada pessoa ou de animais de estimação. Em regra, é identificada pelas expressões “para que”, “a fim de que”, “com a obrigação de”.

Da leitura do Projeto de Lei nº 015/2019, constata-se encargo na previsão do art. 2º, que direciona o bem doado à instalação da sede industrial da empresa, para atuação no ramo de transporte de cargas, na forma do projeto de instalação.

Ocorre que doações com encargos, como regra geral, devem ser licitadas, mormente quando esses ônus possam ser cumpridos em condições de competitividade, com escolha da proposta de execução mais vantajosa à Administração Pública. Leia-se o art. 17, § 4º, da Lei de Licitações: “A doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão, obrigatoriamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação no caso de interesse público devidamente justificado.”

A respeito desse ponto, veja-se novamente a doutrina de Marçal Justen Filho, na obra “Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos”, 16. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 326-327:

Uma hipótese peculiar, objeto de tratamento específico no § 4º, é a doação com encargo. A opção por essa alternativa dependerá da relevância do encargo para consecução dos interesses coletivos e supraindividuais. Em determinadas hipóteses, a doação com encargo apresentará regime jurídico próprio, inclusive com a obrigatoriedade da licitação.

Assim, por exemplo, poderá ser do interesse estatal a construção de um certo edifício em determinada área. Poderá surgir como solução a doação de imóvel com encargo para o donatário promover a edificação. Essa é uma hipótese em que a doação deverá ser antecedida de licitação, sob pena de infringência do princípio da isonomia. Em outras hipóteses, porém, o encargo assumirá relevância de outra natureza. A doação poderá ter em vista a situação do donatário ou sua atividade de interesse social. Nesse caso, não caberá a licitação. Assim, por exemplo, uma entidade assistencial poderá receber doação de bens gravados com determinados encargos. A situação se subsumiria à alínea a do inc. II, mesmo existindo o encargo.

Assim, seguindo a regra legal do art. 17, § 4º, da Lei nº 8.666/93 e a lição doutrinária acima transcrita, os encargos que possam ser cumpridos por mais de um interessado e que não levem em conta, especificamente, a situação do donatário ou sua atividade de interesse social devem ser objeto de licitação, o que deve ser avaliado na situação em análise, com vistas a não se dispensar irregularmente a realização do devido processo licitatório.

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria Jurídica, em conclusão, tece as seguintes considerações sobre o Projeto de Lei nº 015/2019:

 a) a competência legislativa e a iniciativa foram adequadamente atendidas, visto que o assunto é de interesse local (art. 30, inciso I, da CF/88), não extrapolando competências de outros entes, e a proposição foi apresentada pelo Chefe do Executivo, autoridade competente para administrar os bens municipais (art. 52, inciso XXII, e art. 92 da LOM);

 b) a regra de toda e qualquer obra, serviço, compra e alienação de bens é a realização de licitação, na modalidade adequada, conforme art. 37, inciso XXI, da CF/88 e art. 2º da Lei nº 8.666/93, sendo que, no caso de doação de imóveis pela Administração Pública, é cabível, como regra, a licitação dispensada, desde que atendidos os requisitos (i) interesse público devidamente justificado, (ii) autorização legislativa e (iii) avaliação dos bens a serem doados (art. 17 da Lei nº 8.666/93);

 c) na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 927-3, processada no STF, houve deferimento de medida cautelar para suspender, em relação aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, os efeitos do art. 17, inciso I, “b”, que restringia as doações com licitação dispensada tão somente para beneficiários “órgãos ou entidades da administração pública de qualquer esfera de governo”, porque a competência legislativa da União, em matéria de licitações e contratos administrativos, se limita a estabelecer normas gerais, tendo a restrição extrapolado os limites de competência legislativa federal;

 d) estão ausentes no Projeto de Lei nº 015/19 os laudos de avaliação dos bens a serem doados, que não podem ser dispensados sob hipótese alguma, já que toda e qualquer alienação de bens públicos pressupõe a apuração do seu adequado valor de mercado, além do que ficou prejudicada a análise da existência de interesse público porque a proposição não veio acompanhada de cópia do procedimento previsto nos arts. 8º e 9º da Lei Municipal nº 2.664/10, que dispõe sobre a política de incentivo ao desenvolvimento econômico e social do Município de Guaíba;

 e) não houve, ainda, encaminhamento das matrículas dos imóveis a serem doados, para comprovação da propriedade em nome do Município de Guaíba, nem mesmo do projeto de intenção/instalação elaborado pela donatária, além do que não houve justificativa pelo Executivo, até o momento, sobre a maior vantagem na doação em comparação a outros institutos que não impliquem transferência da propriedade (art. 96 da Lei Orgânica);

 f) embora seja possível, como regra, a licitação dispensada para a doação de imóveis da Administração Pública, desde que cumpridos os requisitos legais (art. 17 da Lei nº 8.666/93), no caso de previsão de encargo, a Lei de Licitações prevê como indispensável o devido processo licitatório, sob pena de nulidade, exceto quando esses ônus não possam ser cumpridos, justificadamente, por qualquer outro interessado em seleção competitiva, por se relacionarem ao donatário ou à sua específica atividade social.

Por essas razões, opina a Procuradoria Jurídica, no momento, que a viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 015/19 fica condicionada à complementação de informações e de documentos que evidenciem, com clareza, o interesse público na doação, a maior vantagem dessa medida em comparação à outorga de direitos que não impliquem transferência da propriedade (art. 96 da Lei Orgânica) e a apuração dos valores de mercado dos bens a serem doados. Para tanto, devem ser acostadas cópias das matrículas dos imóveis, do procedimento administrativo previsto na Lei Municipal nº 2.664/10 e dos laudos de avaliação, para verificação da regularidade jurídica e do interesse público. Do contrário, não havendo tais comprovações, a proposição deve ser interpretada como juridicamente inviável.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 03 de junho de 2019.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral da Câmara de Guaíba

OAB/RS nº 107.136

 

 


 GUSTAVO DOBLER                                                                              JULIA ZANATA DAL OSTO

       Procurador                                                                                              Procuradora

OAB/RS nº 110.114B                                                                                 OAB/RS nº 108.241



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