PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre notificação de casos de violência contra o idoso e dá outras providências" 1. Relatório:A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 040/2019 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a notificação de casos de violência contra o idoso no Município de Guaíba. A proposição foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle preventivo quanto à constitucionalidade. 2. Parecer:Preliminarmente, verifica-se que a norma inscrita no artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido – e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Quanto ao conteúdo da matéria proposta, verifica-se que pretende disciplinar a conduta de agentes públicos na constatação de violência ou de maus-tratos contra idosos, estando disciplinadas a forma da notificação (art. 2º, §§ 1º e 2º), a inclusão de quesito sobre violência contra o idoso em sistema municipal de informações (art. 3º) e a fixação de prazo para a regulamentação da lei pelo Executivo (art. 5º), entre outras informações pertinentes. A matéria invade de modo indevido a chamada reserva de administração, constante no art. 61, § 1º, da Constituição Federal de 1988, substância central do princípio da separação de poderes inscrito no art. 2º da CF/88, ao dispor a respeito de providências que devem ser implementadas pelo Poder Executivo para o aperfeiçoamento da defesa dos direitos dos idosos, o que cabe exclusivamente ao gestor definir, por meio de atos próprios. O Projeto de Lei nº 040/2019, ora em análise, vai de encontro, ainda, ao disposto no art. 60, II, “d”, da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, bem como afronta o previsto no art. 82, VII, do mesmo diploma:
Nessa perspectiva, Hely Lopes Meirelles leciona que não cabe ao Poder Legislativo, através de sua iniciativa legiferante, imiscuir-se em matéria tipicamente administrativa, em respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º da CF/88 e arts. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul):
A proposição trata, eminentemente, de disciplina tipicamente administrativa, a qual constitui atribuição político-administrativa do Prefeito, caracterizando inconstitucionalidade formal. Não cabe à lei de iniciativa parlamentar estabelecer as providências que devem ser adotadas por agentes públicos e por órgãos do Executivo para a defesa dos direitos dos idosos, por se tratar de matéria de competência privativa do Chefe do Executivo, na esfera de sua discricionariedade. Veja-se o precedente do Supremo Tribunal Federal:
O Projeto de Lei nº 040/2019 apresenta, com base nos mesmos fundamentos, vício de iniciativa frente à Lei Orgânica Municipal de Guaíba, que, em seu art. 119, reserva a competência exclusiva ao Chefe do Poder Executivo Municipal nos projetos de lei que tratem da organização administrativa, inclusive quanto às atribuições dos órgãos públicos:
Lembra-se, por oportuno, que o Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741/03) já estabelece o dever de notificação compulsória pelos serviços públicos e privados de saúde quanto aos casos de suspeita ou confirmação de violência praticada contra idosos, como se transcreve a seguir:
Portanto, as suspeitas e confirmações de maus-tratos e de violência contra os idosos já devem ser objeto de notificação compulsória pelos serviços públicos e privados de saúde em todo o território nacional, por força do art. 19 da Lei Federal nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), sendo que, por previsão do § 2º, aplica-se a disciplina da notificação compulsória da Lei Federal nº 6.259/75 também aos casos envolvendo idosos. Desse modo, embora o Projeto de Lei nº 040/2019 contenha vício de iniciativa, a Lei Federal nº 10.741/03 já impõe a notificação compulsória, pelos serviços públicos e privados de saúde, dos casos envolvendo suspeita ou confirmação de violência praticada contra os idosos, tendo tal legislação aplicabilidade em todo o território nacional. Tal fato possibilita, desde já, sendo de interesse da proponente, a apresentação de requerimentos e de indicações a respeito do cumprimento das previsões da lei federal no Município de Guaíba. Conclusão:Diante do exposto, com base nos fundamentos expostos, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe – PL nº 040/19, pela caracterização de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa (art. 61, § 1º, CF/88; art. 60, II, “d”, e art. 82, VII, da CE/RS), bem como afronta ao art. 119, inciso II, da Lei Orgânica Municipal. Nada impede, por outro lado, que o Executivo Municipal receba indicações e requerimentos para aplicar e para informar dados sobre a aplicação, no âmbito local, daquilo que já consta no art. 19 do Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741/03). É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 03 de maio de 2019. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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