PARECER JURÍDICO |
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"Institui, no Município de Guaíba, o Dia Municipal da Fibromialgia, filas preferenciais e vagas de estacionamento preferencial" 1. Relatório:O Vereador Miguel Crizel apresentou à Câmara Municipal de Guaíba o Projeto de Lei nº 022/2019, que institui, no Município de Guaíba, o Dia Municipal da Fibromialgia, filas preferenciais e vagas de estacionamento preferencial. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência da Câmara e ao caráter pessoal das proposições. 2. Parecer:De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Efetivamente, a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativa do Município, insculpidas no artigo 18 da CF/88:
Alexandre de Moraes afirma que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)" (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 022/2019 dispõe sobre a promoção da dignidade humana e a inclusão social da pessoa com deficiência, matérias para as quais a iniciativa é concorrente, porquanto não incidente sobre qualquer dos temas de iniciativa privativa:
No mesmo sentido de garantia dos direitos fundamentais das pessoas com deficiência, a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, em seu artigo 13, dispõe ser competência dos Municípios promover a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida:
Destarte, a proposição está apropriada quanto à iniciativa para deflagração do processo legislativo. Quanto à matéria de fundo, também não há óbices. Isso porque o texto constitucional determina a obrigação do Estado, em sentido amplo, de oferecer condições de acessibilidade às pessoas com deficiência, de modo a eliminar e/ou reduzir as barreiras que impossibilitam o pleno exercício das suas garantias. O Decreto nº 6.949, de 25/08/2009, que promulgou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo – norma que, aliás, possui o status de emenda constitucional –, prevê, no artigo 4º, 1, que “Os Estados Partes se comprometem a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência”, comprometendo-se a: “a) Adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção.” A mesma convenção internacional, que integra o texto constitucional por ter sido aprovada na forma do art. 5º, § 3º, da CF/88, define pessoas com deficiência como “aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.” (artigo 1). Da mesma forma, no âmbito infraconstitucional, a Lei nº 13.146/2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, estabelece, no artigo 2º: “Considera-se pessoa com deficiência aquele que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.” Prevê, ainda, o art. 8º do Estatuto, a respeito do direito à acessibilidade:
Desse modo, a partir da introdução, na Constituição Federal de 1988, de todas as normas previstas na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado, abrangendo não só as condições previstas no art. 5º do Decreto nº 5.296/04, como também todo impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que possa obstruir a participação da pessoa na sociedade em igualdade de condições com os demais. A definição, como se vê, é aberta, permitindo que os portadores de fibromialgia possam ser enquadrados como pessoas com deficiência, dada a natureza incurável da síndrome, que limita no aspecto físico a participação das pessoas na sociedade em igualdade de condições. Conforme dados médicos retirados da internet[1],
Há ainda, na jurisprudência, o reconhecimento desse conceito aberto de pessoa com deficiência, construído a partir da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, extensível aos portadores de fibromialgia:
Portanto, à luz dos fundamentos expostos, é possível reconhecer aos portadores de fibromialgia a condição de pessoas com deficiência, estendendo-lhes o direito de receber atendimento preferencial e a utilização de vaga de estacionamento privativa. Por oportuno, vale ressaltar que, de acordo com a orientação técnica nº 11.145/19 do IGAM,
Assim, em que pese não haja inconstitucionalidade de natureza formal ou material, sugere-se a apresentação de substitutivo alterando a redação dos arts. 2º e 3º, para que o portador de fibromialgia possa receber atendimento preferencial e utilizar vagas de estacionamento na categoria de pessoas com deficiência, que é a condição que se lhes pode atribuir em paralelo. Recomenda-se o seguinte texto de substitutivo:
[1] https://drauziovarella.uol.com.br/doencas-e-sintomas/fibromialgia/ Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta no Projeto de Lei nº 022/2019, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário. No entanto, atendendo às recomendações do IGAM, sugere-se a apresentação de substitutivo nos termos acima indicados, visando garantir que o portador de fibromialgia possa receber atendimento preferencial e utilizar vaga de estacionamento preferencial na categoria de pessoa com deficiência, que é a condição que se lhe pode atribuir em paralelo. Guaíba, 21 de março de 2019. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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