Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 009/2019
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 050/2019
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Autoriza o município de Guaíba a firmar contrato de cessão de uso de bem público municipal com a Secretaria da Educação do Rio Grande do Sul"

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 009/19 à Câmara Municipal, objetivando receber autorização para firmar contrato de cessão de uso de bem público municipal com a Secretaria da Educação do Estado do Rio Grande do Sul, para permitir o uso de próprio municipal em benefício da continuidade do serviço estadual de educação. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” Além disso, dispõe o art. 27, inciso V, da Lei Orgânica Municipal que compete à Câmara, com a sanção do Prefeito, legislar sobre a concessão e permissão de uso dos próprios municipais, o que engloba, também, a cessão gratuita de uso em favor de outros entes políticos.

No que diz respeito à iniciativa da proposição, tem-se por devidamente atendida, uma vez que exclusiva do Prefeito, na forma do art. 119, inciso II, da Lei Orgânica Municipal:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

A respeito do teor do Projeto de Lei nº 009/19, tem-se que o seu objeto é a autorização legislativa para a formação de vínculo entre o Município de Guaíba e a Secretaria Estadual de Educação, a fim de colocar à disposição do Estado do Rio Grande do Sul o espaço físico de próprio municipal, destinando-o às atividades da Escola Estadual de Ensino Fundamental Nossa Senhora do Livramento, situada em Guaíba. O prazo da cessão será de 180 dias, podendo ser prorrogado por mais 180 dias, conforme prevê o art. 2º da proposição. Nesse sentido, acertada a remessa de projeto de lei buscando tal autorização, visto que o art. 99 da Lei Orgânica Municipal condiciona a cessão à aprovação da Câmara:

O uso de bens municipais, por terceiros, só poderá ser feito mediante concessão, cessão, permissão e autorização de uso, a título precário, e por tempo determinado, conforme o interesse público o exigir, com prévia autorização do Legislativo, a qual fica dispensada nos casos de autorização de uso.

Sobre a cessão de uso, importante destacar a doutrina de Hely Lopes Meirelles, na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41 ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 632,

[...] cessão de uso é a transferência gratuita da posse de um bem público de uma entidade ou órgão para outro, a fim de que o cessionário o utilize nas condições estabelecidas no respectivo termo, por tempo certo ou indeterminado. É ato de colaboração entre repartições públicas, em que aquela que tem bens desnecessários aos seus serviços cede o uso a outra que deles está precisando.

[...]

A cessão de uso entre órgãos da mesma entidade não exige autorização legislativa e se faz por simples termo e anotação cadastral, pois é ato ordinário de administração através do qual o Executivo distribui seus bens entre suas repartições para melhor atendimento do serviço. Quando, porém, a cessão é para outra entidade, necessário se torna autorização legal para essa transferência de posse, nas condições ajustadas entre as Administrações interessadas. Em qualquer hipótese, a cessão de uso é ato de administração interna que não opera a transferência da propriedade e, por isso, dispensa registros externos.

Ainda, em Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 25. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, p. 1.169-1.171, encontra-se importante lição:

O usual na Administração é a cessão de uso entre órgãos da mesma pessoa. Por exemplo: o Tribunal de Justiça cede o uso de determinada sala do prédio do foro para uso de órgão de inspetoria do Tribunal de Contas do mesmo Estado. Ou o Secretário de Justiça cede o uso de uma de suas dependências para órgão da Secretaria de Saúde. (...) A formalização da cessão de uso se efetiva por instrumento firmado entre os representantes das pessoas cedente e cessionária, normalmente denominado de “termo de cessão” ou “termo de cessão de uso”. O prazo pode ser determinado ou indeterminado, e o cedente pode a qualquer momento reaver a posse do bem cedido. Por outro lado, entendemos que esse tipo de uso só excepcionalmente depende de lei autorizadora, porque o consentimento se situa normalmente dentro do poder de gestão dos órgãos administrativos. Logicamente, é vedado qualquer desvio de finalidade, bem como a extensão de dependências cedidas com prejuízo para o regular funcionamento da pessoa cedente. O fundamento básico da cessão de uso é a colaboração entre entidades públicas e privadas com o objetivo de atender, global ou parcialmente, a interesses coletivos. É assim que deve ser vista como instrumento de uso de bem público.

Percebe-se, assim, que o Executivo adotou o instituto correto para colocar à disposição da Secretaria Estadual de Educação o próprio municipal destinado às atividades da Escola Estadual de Ensino Fundamental Nossa Senhora do Livramento, não havendo qualquer impeditivo legal para que se ceda o uso na forma pleiteada. Além do mais, foi respeitado o caráter precário e temporário exigido pelo art. 99 da Lei Orgânica Municipal, já que a cessão poderá ser desfeita a qualquer tempo e terá duração pelo prazo de 180 dias, prorrogável pelo mesmo período.

Recomenda-se apenas que, na minuta do termo de cessão, sejam substituídos os termos “concessão de uso do bem público municipal” e “concessão”, bem como tudo aquilo que remeta ao instituto da concessão de uso, que não se confunde com a cessão de uso de bem público. Além disso, sugere-se que conste expressamente cláusula que indique a finalidade da cessão, tal como prevê o § 2º do art. 1º.

Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta no Projeto de Lei nº 009/2019, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário. O mérito do projeto – existência de interesse público a justificar a cessão – compete a cada vereador, através do exercício de consciência expresso no voto.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 12 de março de 2019.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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