Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 134/2018
PROPONENTE : Ver. Florindo Motorista
     
PARECER : Nº 298/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui a campanha ”Abril Marrom” de prevenção e combate às diversas espécies de cegueira no âmbito do município de Guaíba e dá outras providências"

1. Relatório:

O Vereador Florindo Motorista apresentou o Projeto de Lei nº 134/2018 à Câmara Municipal, objetivando instituir a campanha “Abril Marrom”, de prevenção e combate às diversas causas de cegueira, no âmbito do Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Vereadores.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Quanto à competência e à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

No entanto, em relação ao registro da campanha no calendário anual de eventos, ocorre violação à reserva de iniciativa do Chefe do Executivo para deflagrar o processo legislativo. Isso porque o calendário oficial de eventos municipais é instituído por meio de lei municipal de iniciativa do Chefe do Executivo, por se tratar de matéria atinente à organização administrativa, nos exatos termos do artigo 61, § 1º, II, “b”, da Constituição Federal, aplicável por simetria aos Estados e Municípios, em virtude de sua natureza de norma constitucional de reprodução obrigatória. No mesmo sentido, o artigo 52, VI, da Lei Orgânica Municipal refere competir privativamente ao Prefeito “dispor sobre a organização e o funcionamento da Administração Municipal, na forma da Lei.”

Em Guaíba, o calendário oficial de eventos é reavaliado anualmente, tendo sido instituído, neste ano, através da Lei Municipal nº 3.633, de 09 de janeiro de 2018, a qual, como já foi dito, é de iniciativa do Prefeito enquanto responsável pelas questões relacionadas à organização administrativa. O anexo único à Lei nº 3.633/18 detalha, mês a mês, os eventos a serem realizados durante o ano pelo Município, cabendo a gestão e a ordenação ao Poder Executivo.

Portanto, tratando-se de matéria relacionada à organização administrativa do Município de Guaíba, que despende recursos, pessoal e força de trabalho para a realização de eventos, convém esclarecer que a iniciativa de projeto de lei determinando a inclusão de certa celebração no calendário oficial de eventos é do Chefe do Executivo. Nada impede, entretanto, iniciativa parlamentar no sentido de instituir a celebração em si, com natureza motivacional, desde que não imponha ou “permita” medidas ao Executivo.

Nesse sentido, destaca-se o posicionamento da jurisprudência:

AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 6.019/2013, QUE INCLUI NO CALENDÁRIO OFICIAL DE EVENTOS DO MUNICÍPIO DE PELOTAS AS FESTAS DE IEMANJÁ E NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. VÍCIO DE ORIGEM. MATÉRIA DE INICIATIVA PRIVATIVA DO PREFEITO. AUMENTO DE DESPESA. VÍCIO MATERIAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. CONCESSÃO DA LIMINAR PARA SUSPENDER OS EFEITOS DA LEI IMPUGNADA. POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO AGRAVO REGIMENTAL. (Agravo Regimental Nº 70057704108, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 26/05/2014).

Assim, para que a proposição fique adequada aos comandos constitucionais e não possua qualquer resquício de inconstitucionalidade, sugere-se a apresentação de substitutivo, caso o proponente concorde com a contribuição:

SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI Nº 134/2018

Institui a campanha “Abril Marrom”, de prevenção e combate às diversas causas de cegueira, no âmbito do Município de Guaíba.

Art. 1º Fica instituída, no Município de Guaíba, a campanha “Abril Marrom”, de prevenção e combate às diversas causas de cegueira, a ser realizada anualmente, no mês de abril, com o objetivo de conscientizar a população sobre a importância da prevenção de doenças que podem levar à cegueira.

Art. 2º O Poder Executivo regulamentará, no que couber, a presente Lei.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

Atente-se, todavia, para o fato de que a restrição à iniciativa parlamentar para determinar a organização do evento ao Poder Executivo pode tornar a futura lei, de certa forma, inócua e sem efetividade, uma vez que a ação do governo municipal dependerá, única e exclusivamente, dos seus próprios ânimos, sendo possível ao vereador apenas indicar a tomada de medidas pelo Executivo. Assim, caso seja aprovado o PL nº 134/2018 na forma do substitutivo, será possível aos membros do Legislativo remeter indicações ao Executivo (art. 114, RI) para que o Prefeito providencie ações e medidas de contribuição ao “Abril Marrom”, efetivando a participação do setor público municipal na campanha.

Reforça-se, finalmente, que o projeto, se aprovado na forma do substitutivo acima indicado, terá caráter motivacional e reflexivo, de incentivo e contribuição às medidas de prevenção à cegueira, sem, todavia, um caráter impositivo, justamente porque as medidas de operacionalização e organização, se atribuídas a órgão público, devem partir da iniciativa do Chefe do Executivo Municipal, como demonstrado anteriormente.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria orienta pela possibilidade de a Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver ao autor a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa e afronta ao princípio da separação dos poderes no art. 2º, caracterizados com base nos artigos 2º e 61, § 1º, da CF/88 e artigos 5º e 60, II, “d”, da CE/RS. Sugere-se, entretanto, a apresentação de substitutivo, com a finalidade de apenas instituir a campanha, sem atribuições a órgãos públicos, com exclusivo caráter motivacional e reflexivo.

Guaíba, 28 de setembro de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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