Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 125/2018
PROPONENTE : Ver. Dr. João Collares
     
PARECER : Nº 286/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Obriga as entidades subvencionadas pelo Executivo Municipal a divulgar, no Portal Transparência Guaíba, informações relativas a ações que especifica e suas prestações de contas encaminhadas ao Tribunal de Contas do Estado"

1. Relatório:

O Vereador Dr. João Collares apresentou o Projeto de Lei nº 125/2018 à Câmara Municipal, objetivando obrigar as entidades subvencionadas pelo Executivo Municipal a divulgarem, no Portal da Transparência Guaíba, informações relativas a ações que especifica e suas prestações de contas encaminhadas ao Tribunal de Contas do Estado. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. Parecer:

Quanto à matéria de fundo, não há qualquer violação ao conteúdo material da CF/88 e da CE/RS. A Constituição Federal, no artigo 37, prevê: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”. Mais especificamente sobre a matéria, o § 3º, II, do art. 37 da CF/88 estabelece um comando para que a lei infraconstitucional discipline “as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII”.

A Constituição Estadual, por sua vez, dispõe no art. 19: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado e dos municípios, visando à promoção do bem público e à prestação de serviços à comunidade e aos indivíduos que a compõe, observará os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade, da legitimidade, da participação, da razoabilidade, da economicidade, da motivação...”

Impossível também deixar de recordar o artigo 5º, inciso XXXIII, da CF/88, que prevê o direito fundamental ao acesso à informação: “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.

Além disso, a determinação que se pretende instituir encontra amparo material na legislação infraconstitucional. A Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, regula o direito ao acesso a informações previsto no artigo 5º, inciso XXXIII, da CF/88, disciplinando os procedimentos a serem observados pela União, Estados, DF e Municípios para a garantia dessa prerrogativa pública. Importante, nesse caso, transcrever o art. 3º, que institui as diretrizes da publicidade das informações de interesse coletivo ou geral:

Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:

I - observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção;

II - divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações;

III - utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação;

IV - fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública;

V - desenvolvimento do controle social da administração pública.

Ocorre, no entanto, que a proposição não está a tratar de atos e de informações típicas da Administração Pública Municipal, mas de pessoas jurídicas de direito privado que recebam subvenções do Poder Público, tais como organizações da sociedade civil de interesse público e organizações sociais. E, neste ponto, o IGAM – Instituto Gamma de Assessoria a Órgãos Públicos, na orientação técnica nº 23.698/18, bem lembrou que tais entidades têm suas obrigações regulamentadas em leis federais específicas, como na Lei Federal nº 9.790, de 23 de março de 1999, e na Lei Federal nº 9.637, de 15 de maio de 1998.

Esses diplomas trazem uma disciplina completa acerca dos requisitos para a caracterização de pessoas jurídicas como “OSCIP” ou “OS”, dos seus deveres – inclusive de publicidade de atos e informações – e dos mecanismos de parcerias. Além disso, a Lei Federal nº 13.019, de 31 de julho de 2014, estabeleceu o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação. As obrigações de publicidade, de acordo com o IGAM, estão definidas precisamente nesses diplomas legais, de tal como que cabe ao Poder Legislativo fiscalizar se o Poder Executivo está cumprindo e fazendo cumprir as determinações legais, conforme as exigências de cada legislação nas quais as pessoas jurídicas subvencionadas se enquadrem.

A exemplo da disciplina da publicidade nas citadas leis federais, veja-se o art. 38 da Lei Federal nº 13.019, de 31 de julho de 2014: “O termo de fomento, o termo de colaboração e o acordo de cooperação somente produzirão efeitos jurídicos após a publicação dos respectivos extratos no meio oficial de publicidade da administração pública.” Note-se, ainda, o previsto no art. 10, § 2º, VI, da Lei Federal nº 9.790, de 23 de março de 1999, a tratar das organizações da sociedade civil de interesse público:

Art. 10. O Termo de Parceria firmado de comum acordo entre o Poder Público e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público discriminará direitos, responsabilidades e obrigações das partes signatárias.

[...]

§ 2º São cláusulas essenciais do Termo de Parceria:

[...]

VI - a de publicação, na imprensa oficial do Município, do Estado ou da União, conforme o alcance das atividades celebradas entre o órgão parceiro e a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, de extrato do Termo de Parceria e de demonstrativo da sua execução física e financeira, conforme modelo simplificado estabelecido no regulamento desta Lei, contendo os dados principais da documentação obrigatória do inciso V, sob pena de não liberação dos recursos previstos no Termo de Parceria.

Nesses termos, entende-se que as exigências de publicidade se encontram disciplinadas tanto na legislação federal de regência como nos instrumentos de formalização das parcerias – termos de colaboração, termos de fomento e acordos de cooperação –, cabendo ao Poder Legislativo a fiscalização do cumprimento de tais normas pelas entidades subvencionadas e pelo Poder Executivo, no exercício de sua missão institucional.

A respeito disso, inclusive, vale trazer à tona o disposto no art. 121 da Lei Orgânica Municipal de Guaíba, a fim de demonstrar o papel fiscalizador do Legislativo em matéria contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da administração direta e indireta, bem como de entidades constituídas ou mantidas pelo Poder Público:

Art. 121. A fiscalização financeira e orçamentária do Município será exercida pela Câmara Municipal, mediante controle externo, e pelos sistema de controle interno do Executivo instituídos em Lei.

§ 1º O controle externo da Câmara será exercido com auxílio do Tribunal de Contas do Estado ou órgão estadual a que for atribuída essa incumbência, e compreenderá a apreciação das contas do Prefeito e da Câmara Municipal, o acompanhamento das atividades financeiras e orçamentárias, bem como julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis por bens e valores públicos.

§ 2º Somente por decisão de 2/3 (dois terços) dos membros da Câmara Municipal, deixará de prevalecer o parecer emitido pelo Tribunal de Contas do Estado ou órgão estadual incumbido dessa missão.

§ 3º As contas relativas a aplicação dos recursos transferidos pela União e o Estado serão prestadas na forma da Legislação Federal e Estadual vigente, podendo o Município suplementá-las na prestação anual, sem prejuízo de sua condução.

Trata-se, notadamente, de reflexo do disposto no art. 70 da CE/RS:

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Estado e dos órgãos e entidades da administração direta e indireta, e de quaisquer entidades constituídas ou mantidas pelo Estado, quanto à legalidade, legitimidade, moralidade, publicidade, eficiência, eficácia, economicidade, aplicação de subvenções e renúncia de receitas, será exercida pela Assembléia Legislativa mediante controle externo e pelo sistema de controle interno de cada um dos Poderes, observado o disposto nos arts. 70 a 75 da Constituição Federal. (Vide Lei Complementar nº 11.299/98)

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física, jurídica ou entidade que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos pelos quais o Estado responda, ou que, em nome deste, assuma obrigações de natureza pecuniária.

Importante, ademais, transcrever trecho da orientação técnica nº 23.698/18 do IGAM, no sentido da inviabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 125/18:

Realizadas estas referências, o assunto não somente foge de âmbito local, como não seria da iniciativa legislativa da Câmara, a quem compete fiscalizar se o Poder Executivo está cumprindo as determinações legais de cada tipo de repasse de recurso às entidades do terceiro setor, conforme as exigências de cada legislação nas quais forem enquadradas. Algumas delas exigem divulgações por parte das entidades, outras não. Assim, não poderá criar tais obrigações para as entidades, que são regidas por legislações específicas.

Desse modo, seguindo as linhas da OT nº 23.698/18 do IGAM – Instituto Gamma de Assessoria a Órgãos Públicos, ao Legislativo cabe fiscalizar se o Poder Executivo e se as entidades subvencionadas estão cumprindo as determinações legais aplicáveis, de acordo com cada enquadramento, não podendo criar novas obrigações a essas entidades, regidas por normas específicas (Leis Federais 13.019/14, 9.790/99, 9.637/98, entre outras).

Conclusão:

Diante do exposto, nas linhas da orientação técnica nº 23.698/2018 do IGAM, a Procuradoria orienta pela possibilidade de a Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver ao autor a proposição em epígrafe, porque o assunto foge de âmbito local, como não é da iniciativa legislativa da Câmara, a quem compete fiscalizar se o Executivo e as entidades subvencionadas estão cumprindo as determinações legais já instituídas pela legislação federal aplicável, tais como as Leis Federais nº 13.019/14, 9.790/99 e 9.637/98. Assim, a devolução deve ser feita por violação ao art. 30, I, da CF/88 e ao art. 6º, I, da LOM.

Guaíba, 13 de setembro de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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