Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 126/2018
PROPONENTE : Ver.ª Fernanda Garcia
     
PARECER : Nº 285/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a instalação de sinalizadores com dispositivos luminosos em edificações residenciais e comercias com garagens e estacionamentos regulamentados"

1. Relatório:

A Vereadora Fernanda Garcia apresentou o Projeto de Lei nº 126/2018 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a instalação de sinalizadores com dispositivos luminosos em edificações residenciais e comerciais com garagens e estacionamentos regulamentados. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal.

2. Parecer:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A auto-organização dos Municípios está disciplinada, originariamente, no artigo 29, caput, da Constituição Federal, que prevê: “O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos”.

O autogoverno se expressa na existência de representantes próprios dos Poderes Executivo e Legislativo em âmbito municipal – Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores –, que são eleitos diretamente pelo povo. A autoadministração e a autolegislação contemplam o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal.

A respeito da autoadministração e da autolegislação, transcreve-se o artigo 30 da Constituição Federal, que enumera as competências materiais e legislativas dos Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

As obrigações trazidas na proposta se inserem na definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 126/2018, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), estabelece, na legislação local, dever fundado no poder de polícia administrativa, já que se trata de medida que limita interesses individuais em prol da coletividade, notadamente no aspecto da segurança e da funcionalidade do trânsito de veículos e pedestres.

A Constituição Estadual Gaúcha, no art. 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais.” Como bem referiu o IGAM na orientação técnica nº 24.714/2018, a medida pretendida deve ser inserida no Código de Posturas, por dispor sobre deveres próprios do poder de polícia.

No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o art. 125, § 2º, da CF/88 e o art. 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

No âmbito municipal, a Lei Orgânica estabelece as competências legislativas privativas do Prefeito no art. 119, nos seguintes termos:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado.

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 126/2018 é instituir, através da legislação local, o dever de que edificações residenciais, comerciais com garagens e estacionamentos regulamentados implantem sinalizadores com dispositivos luminosos, o que, como dito, envolve matéria de poder de polícia administrativa, de competência municipal.

Ocorre, no entanto, que o dever que se pretende instituir já consta, mesmo que genericamente, no art. 128 do Código de Posturas do Município de Guaíba, assim disposto:

Art. 128 - É obrigatória a instalação de semáforo de advertência nas entradas e saídas dos seguintes estabelecimentos:

a) garagens coletivas;

b) postos de atendimento a veículos, seja a que título for;

c) estabelecimentos comerciais e industriais, desde que haja movimento habitual de veículos;

d) outros locais que, a juízo do município, sejam necessários.

Pena: a infração do disposto neste artigo acarretará multa de 1 a 5 Valores de Referência Municipal.

Assim, como bem referiu o IGAM, a aprovação do Projeto de Lei nº 126/2018, com a respectiva promulgação, causaria sobreposição de normas locais, visto que a mesma obrigação estaria regulamentada em dois diplomais legais – Código de Posturas e lei esparsa –, o que não é tecnicamente adequado sob o ponto de vista jurídico.

Caso se queira, de fato, implementar mudanças na matéria, recomenda-se que se faça a retirada da presente proposição e se apresente outra, com natureza de projeto de lei complementar, alterando o disposto no art. 128 do Código de Posturas (Lei Complementar nº 1.027/90) e introduzindo, então, as modificações pertinentes. Lembra-se, todavia, que o art. 128 já prevê o dever de instalação de semáforo de advertência – ou sinalizador com dispositivo luminoso – na entrada e na saída de estabelecimentos, visando trazer segurança à circulação de veículos e pedestres no Município de Guaíba. É de se questionar e refletir, portanto, sobre a real necessidade de alteração dessa legislação local.

Advirta-se, ainda, para o fato de que, caso seja apresentado projeto de lei complementar para a alteração do Código de Posturas, deverá a proposição seguir o rito do art. 46 da Lei Orgânica Municipal, no sentido de ser assegurada a ampla divulgação e ser realizada a consulta pública para recebimento de sugestões populares, a fim de aprimorar os termos do projeto que venha a ser apresentado, considerando a relevância social da matéria.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina que o Projeto de Lei nº 126/2018 atende aos critérios de competência, iniciativa e de matéria. Todavia, a obrigação que se pretende instituir já consta no art. 128 do Código de Posturas de Guaíba, de modo que a aprovação desta proposição ocasionará sobreposição de normas locais, o que não é tecnicamente adequado sob o ponto de vista jurídico. Aconselha-se, assim, caso ainda se pretenda tratar da matéria, que seja retirada esta proposição e apresentada outra, na forma de projeto de lei complementar, alterando ou acrescentando dispositivos ao art. 128 da Lei Complementar nº 1.027/90 (Código de Posturas), a fim de evitar tal sobreposição indevida de normas, e com respeito ao art. 46 da Lei Orgânica Municipal.

É o parecer.

Guaíba, 13 de setembro de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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