Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Veto Parcial n.º 069/2018
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 262/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Veto total ao Projeto-de-Lei n.º 069/18 que "Dispõe sobre o alinhamento e a retirada de fios em desuso e desordenados existentes em postes de energia elétrica e dá outras providências"."

1. Relatório:

O Vereador Manoel Eletricista apresentou à Câmara Municipal o Projeto de Lei nº 069/2018, que “Dispõe sobre o alinhamento e a retirada de fios em desuso e desordenados existentes em postes de energia elétrica e dá outras providências”.

Após o trâmite regimental, foi o Projeto aprovado por unanimidade em Sessão de 19/06/2018. O Projeto de Lei foi vetado totalmente pelo Chefe do Poder Executivo Municipal através do Of. Gab. 439/2018, tendo sido o Veto Total encaminhada à Procuradoria Jurídica pela Comissão de Justiça e Redação.

2. Parecer:

Na mensagem de veto (folhas 02 e 03), o Senhor Prefeito Municipal vetou totalmente o Projeto de Lei com base no Parecer 103/2018 da Procuradoria-Geral do Município, alegando tratar-se de matéria cuja competência legislativa é da União, padecendo de inconstitucionalidade.

Em que pese os fundamentos trazidos pela mensagem de veto alegando a inconstitucionalidade da matéria, esta Procuradoria sustenta mais uma vez que a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente e no artigo 30 da CF/88, que garante a auto-administração e a auto-legislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

(...)

A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 069/18 dispõe sobre a proteção ao meio ambiente, matéria para a qual a iniciativa é concorrente, conforme reconhecem os artigos 61 da CF/88, 59 da CE/RS e 38 da Lei Orgânica Municipal. Devidamente, a Lei Orgânica do Município de Guaíba prevê que cabe ao Município, em seu artigo, 6º, estabelecer políticas e normas de proteção ao meio ambiente, em simetria à CF/88, prevendo inclusive a promulgação de um Código de Meio Ambiente.

Alexandre de Moraes afirma que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)" (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740).

A Constituição da República estabeleceu como uma das obrigações dos entes proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, em seu artigo 23, inciso VI, da, estabelecendo que essa matéria é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, cabendo assim o combate à poluição visual, para preservar um meio ambiente ecologicamente equilibrado no âmbito municipal:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015)

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

Consubstancia-se a autonomia municipal conferida pela Constituição Federal no Capítulo XI, Seção IV da Lei Orgânica Municipal que tem por título “MEIO AMBIENTE”, que dispõe em seu art. 166, inciso XV, alínea “a”:

XV - avaliar regularmente os serviços públicos prestados pelo Município e por suas concessionárias ou permissionárias, no que respeita ao impacto ambiental por eles provocados:

  1. a) empresas concessionárias ou permissionárias de serviços públicos deverão atender rigorosamente aos dispositivos de proteção ambiental, não sendo permitida a renovação da permissão ou concessão, no caso de incidência da infração.

Destarte, a proposição está apropriada quanto à iniciativa para deflagração do processo legislativo. É cediço o entendimento dos tribunais de que as propostas legislativas que dispõem sobre meio ambiente é matéria para a qual a iniciativa é concorrente. Assim os tribunais vêm entendendo em julgamentos firmando entendimento no sentido de que legislar sobre essa matéria é iniciativa concorrente – iniciativa geral e que corresponde à competência municipal.

Há, inclusive, jurisprudência em Ação Direta de Inconstitucionalidade que enfrentou precisamente a constitucionalidade da possibilidade do parlamentar municipal legislar sobre a obrigatoriedade da empresa concessionária de distribuição de energia elétrica a atender as normas técnicas aplicáveis à ocupação do espaço público e promover a regularização e retirada dos fios inutilizados, tendo os tribunais assentado o entendimento de que a matéria é de competência municipal e de iniciativa concorrente:

TJ-SP. Órgão Especial. PROCESSO 2103766-45.2017.8.26.000. Constitucional. Administrativo. Lei nº 9.339, de 10 de maio de 2017, do município de Presidente Prudente. OBRIGATORIEDADE DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA A ATENDER AS NORMAS TÉCNICAS APLICÁVEIS À OCUPAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO E PROMOVER A REGULARIZAÇÃO E RETIRADA DOS FIOS INUTILIZADOS. Alegada ofensa à separação dos poderes (arts. 5º, 47, ii e xiv, e 144 CE) e invasão de competência federal para legislar sobre energia (art.22, iv, CF). INOCORRÊNCIA. INICIATIVA PARLAMENTAR. POLÍCIA ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA MUNICIPAL. NORMA QUE SE REFERE À DETERMINAÇÃO DE RETIRADA DE FIOS E CABOS DE EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇO, QUANDO EXCEDENTES OU SEM USO OU AINDA DE ALINHAMENTO DOS POSTES CONFORME AS NORMA TÉCNICAS, O QUE TANGE À PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE E URBANISMO SOBRE OS QUAIS O MUNICÍPIO ESTÁ AUTORIZADO A LEGISLAR AO TEOR DO QUE DISPÕE O ARTIGO 30, I, II E VIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Julgado em 08/11/2017.

ADI n.º 70057521932: CONSTITUCIONAL. LEI DE INICIATIVA DO LEGISLATIVO. FISCALIZAÇÃO GENÉRICA. INEXISTÊNCIA DE INTERFERÊNCIA SUBSTANCIAL NAS ATRIBUIÇÕES DO EXECUTIVO. CONCESSÃO. REGIME CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE PROVA. Em princípio, a previsão, em lei de iniciativa do legislativo local, quanto a genérico dever de fiscalização, não interfere com a organização do Executivo, nem lhe acarreta ônus de mínima expressão. (...). Unânime. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70057521932, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em 28/04/2014).

     Com base nesses fundamentos e na jurisprudência, a proposição está inserida no âmbito das normas de polícia administrativa e é imposta visando a segurança pública e a integridade física e o convívio dos munícipes em um ambiente sadio e não poluído visualmente, cabendo a iniciativa também aos parlamentares, não usurpando ainda a competência de outros entes, além de não haver ingerência na área de telecomunicações e seu funcionamento ou na gestão administrativa municipal. Cabe ainda aos Municípios instituir políticas de desenvolvimento urbano e ordenamento territorial – Direito Urbanístico, sendo louvável nessa perspectiva a proposição. Ademais, no julgamento do RE n. 581.947, o STF assentou que as concessionárias de energia elétrica se submetem às regras de direito urbanístico. Foi nesse sentido, ainda, a Orientação Técnica n.º 19.270/2018 do IGAM, de 25 de julho de 2018, referindo-se ao Recurso Extraordinário com Agravo 764.029, em que o STF manifestou-se pela constitucionalidade de lei municipal que impõe atribuições à concessionária do serviço público de distribuição de energia elétrica:

 

STF. ARE 764029 / RJ. Quanto ao mérito, a Lei Complementar nº 111 de 1º de fevereiro de 2011, tem por finalidade dispor sobre a política urbana e ambiental do município, instituindo um plano diretor de desenvolvimento urbano, e, por isto, lançando mão de sua competência de dispor sobre o espaço municipal, é que, em seu artigo 326 e parágrafo único, determina os procedimentos que deverão ser tomados pelas concessionárias, para eliminar o cabeamento aéreo, transformando-o em subterrâneo. Não se trata de instituir um imposto ou de dar diretrizes de funcionamento para as concessionárias de serviço público, isso sim de competência privativa da União, mas se cuida, apenas, de impor diretrizes que tornem o espaço urbano mais seguro e agradável aos munícipes. Assim, ao contrário do que entende a apelante, não há qualquer inconstitucionalidade na referida norma. A sentença deve, pois, ser mantida por seus próprios fundamentos. Desprovimento do recurso. [STF. Recurso Extraordinário com Agravo 764.029 Rio de Janeiro. Relator : Min. Ricardo Lewandowski. 08 de Maio de 2018.]

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria mantém o entendimento pela viabilidade e constitucionalidade do Projeto de Lei n.º 069/2018, de autoria do Ver. Manoel Eletricista, tendo o TJSP e o STF assentado que a matéria não invade a competência privativa da União para legislar sobre energia art. 22, IV, CF/88, inserindo-se no disposto no artigo 30 da Constituição Federal, portanto de competência municipal.

É o parecer.

Guaíba, 09 de agosto de 2018.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral da Câmara Municipal

OAB/RS 107.136



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