Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 110/2018
PROPONENTE : Ver.ª Claudinha Jardim
     
PARECER : Nº 235/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre o Plano Paz nas Escolas"

1. Relatório:

A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 110/2018 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre o Plano Paz nas Escolas. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do RI.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A medida que se pretende aprovar no âmbito do Município de Guaíba se insere, efetivamente, na definição de interesse local, eis que o Projeto de Lei nº 110/2018 visa desenvolver medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violências nas escolas, no estrito âmbito local, o que não encontra resistência na Constituição Federal de 1988 quanto à competência.

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 110/2018 é promover a proteção dos interesses das crianças e dos adolescentes, alunos das escolas municipais, por meio da educação cidadã, preparando-os para o agir ético e respeito aos valores sociais.

O artigo 227, caput, da CF/88 prevê que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” A expressão “Estado”, obviamente, traduz-se em um conceito lato sensu, abrangendo União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Mais especificamente, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), atendendo às diretrizes constitucionais, estabeleceu um verdadeiro conjunto de normas destinadas à proteção integral e absoluta das crianças e dos adolescentes, que passaram a ser tratadas como efetivos sujeitos de direitos. Os artigos 3º, 4º e 5º do referido Estatuto indicam, resumidamente, todos os direitos garantidos às crianças e adolescentes. Veja-se:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

É perceptível, portanto, que a medida pretendida no Projeto de Lei nº 110/2018 é compatível com os interesses defendidos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).

Quanto à iniciativa, para os fins do direito municipal, importa a observância das normas previstas na Constituição Estadual, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Como já restou esclarecido em outros pareceres desta Procuradoria, a interpretação do rol de iniciativas privativas do Chefe do Executivo expostas no artigo 60 da CE/RS é estrita, não admitindo interpretação ampliativa, uma vez que, do contrário, ocorreria subversão do esquema de organização funcional da Constituição, o qual garante a iniciativa concorrente como regra geral, só estabelecendo a iniciativa privativa nos casos expressos. Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado.

Alerte-se apenas para o que lembrou o IGAM na OT nº 18.139/18, no sentido de que, “não obstante o texto projetado estabeleça o objetivo buscado, não estabelece quais medidas serão adotadas e a quem competirá a execução destas, para a consecução do objeto projetado, o que determinará a ineficácia da vindoura norma, caso aprovado o projeto de lei com o conteúdo normativo proposto.”

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta do Projeto de Lei nº 110/2018, porquanto atendidas a competência e a iniciativa, podendo seguir o seu trâmite nos termos do Regimento Interno da Câmara de Vereadores de Guaíba. No entanto, alerte-se para o que sustentou o IGAM na OT nº 18.139/18, já acostada aos autos desta proposição.

É o parecer.

Guaíba, 11 de julho de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil.
Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 12/07/2018 ás 14:59:09. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 61ca2dc2afe1828d82517a6af46f1b51.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 57091.