PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre a obrigatoriedade de se equipar piscinas de uso coletivo no Município de Guaíba com drenos ou ralos com tampas antiaprisionamento ou não bloqueáveis bem como dispositivo que interrompa o processo de sucção e dá outras providências" 1. Relatório:O Vereador Dr. João Collares apresentou o Projeto de Lei nº 083/2018 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a obrigatoriedade de se equipar piscinas de uso coletivo no Município de Guaíba com drenos ou ralos com tampas antiaprisionamento ou não bloqueáveis, bem como dispositivo que interrompa o processo de sucção. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. 2. Parecer:O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, administração e governo próprios. A auto-organização dos Municípios está disciplinada, originariamente, no artigo 29, caput, da Constituição Federal, que prevê: “O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos”. O autogoverno se expressa na existência de representantes próprios dos Poderes Executivo e Legislativo em âmbito municipal – Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores –, que são eleitos diretamente pelo povo. A autoadministração e a autolegislação contemplam o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal. A respeito da autoadministração e da autolegislação, transcreve-se o artigo 30 da Constituição Federal, que enumera algumas das competências dos Municípios:
A garantia trazida na proposta se insere na definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 083/2018, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), estabelece um meio de garantia da segurança de pessoas que utilizam piscinas coletivas, o que se encontra no âmbito das posturas municipais como normas do poder de polícia, sobre as quais cabe a todos os entes federados dispor, no limite de suas competências. Além disso, a CE/RS, no artigo 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais.” A fim de esclarecer a possibilidade de o Município, através do Poder Legislativo, com sanção do Poder Executivo, estabelecer normas que regulamentem o exercício de atividades privadas à luz do interesse público, colaciona-se lição da doutrina:
Assim, não há dúvidas sobre a competência municipal para a criação de normas de poder de polícia, visando a impor à iniciativa privada o atendimento ao interesse público concernente à segurança do uso de piscinas coletivas, nos exatos termos do art. 13, inc. I, da Constituição Estadual Gaúcha e, inclusive, do art. 78 do Código Tributário Nacional. No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual Gaúcha:
Verifica-se, no caso, que a previsão da alínea “c” do art. 4º, bem como do seu parágrafo único, viola o sistema constitucional de reserva de iniciativas do processo legislativo, já que atribui nova função aos órgãos públicos municipais no sentido de interditar as piscinas que não atendam às condições previstas na lei. Tal matéria também afronta a Lei Orgânica Municipal nos artigos 52, VI, e 119, II, como se vê a seguir:
Veja-se na jurisprudência precedente que confirma essa análise:
Já em relação à cominação de multas, cabe referir que o próprio IGAM, em consultoria prestada no dia 18/08/2017 (orientação técnica nº 21.581/2017), recomendou que, em projeto de lei cujo objeto era a obrigação de afixar avisos, em estabelecimentos comerciais, de que os crimes contra as crianças e adolescentes são passíveis das penas previstas em lei, seria viável e, sobretudo, recomendável a cominação de penalidades para que a proposta, caso aprovada, não fosse inócua. Em diversos outros projetos de lei que tramitaram nesta Câmara de Vereadores, o IGAM também sugeriu a adoção dessa medida, a exemplo do Projeto de Lei nº 121/2017, de autoria parlamentar, em que constou a seguinte nota: “Sugere-se que sejam colocadas penalidades para que a futura lei, se aprovado o projeto, não seja inócua. Ainda, que se utilize para dosimetria da pena somente com valores, a fim de evitar questionamento acerca das medidas de caráter administrativo, que são da iniciativa legislativa do Prefeito.” (orientação técnica nº 28.559/2017). O entendimento desta Procuradoria também é pela possibilidade de fixação de multa através de proposta parlamentar. Desse modo, é preciso realizar ajuste no Projeto de Lei nº 083/2018 apenas para retirar as previsões constantes no art. 4º, “c”, e seu parágrafo único, por se referirem à medida de interdição, cuja iniciativa para determinação é reservada ao Chefe do Executivo, nos termos dos artigos 52, VI, e 119, II, da Lei Orgânica Municipal. No aspecto da técnica legislativa, é importante que se façam algumas modificações, para melhor adequar a proposição aos termos da Lei Complementar Federal nº 95/98: I. A expressão “Parágrafo único”, no art. 2º, deve ser seguida de ponto final; II. O art. 4º deve desdobrar-se em incisos, não em alíneas, conforme recomenda o art. 10, II, da LC 95/98. Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria orienta pela possibilidade de a Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver ao autor a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa existente na alínea “c” e no parágrafo único do art. 4º, caracterizado com base nos artigos 52, VI, e 119, II, da Lei Orgânica Municipal. Recomenda-se, ainda, a adequação da técnica legislativa, conforme indicado acima. Guaíba, 18 de maio de 2018. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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