PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre a proibição de inauguração de obras públicas incompletas ou que, embora concluídas, não estejam em condições de atender aos fins a que se destina ou que não possam entrar em funcionamento imediato" 1. Relatório:O Vereador Manoel Eletricista apresentou o Projeto de Lei nº 078/2018 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a proibição de inauguração de obras públicas incompletas ou que, embora concluídas, não estejam em condições de atender aos fins a que se destinam ou que não possam entrar em funcionamento imediato. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. 2. Parecer:De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, administração e governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
A proibição que se pretende instituir no âmbito do Município de Guaíba se insere, efetivamente, na definição de interesse local, eis que o Projeto de Lei nº 078/2018 dispõe sobre matéria estritamente municipal, relacionada à gestão política do Poder Executivo, proibindo inauguração de obras públicas incompletas ou que, embora concluídas, não estejam em condições de atender aos fins a que se destinam ou não possam entrar em funcionamento imediato. Nesse sentido, refere o artigo 6º, I, da Lei Orgânica Municipal: “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” Ocorre que o Projeto de Lei nº 078/2018, embora louvável no seu objeto, contém vício de iniciativa. Para os fins do direito municipal, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Nesse caso, referem os artigos 60 e 82 da Constituição Estadual:
Na mesma linha, dispõe, ainda, a Lei Orgânica do Município de Guaíba sobre as hipóteses de competência privativa do Prefeito e sobre a reserva de iniciativa legislativa:
O Projeto de Lei nº 078/2018 acaba por afrontar todos os dispositivos constitucionais e legais citados, porquanto dispõe sobre a organização administrativa do Poder Executivo e sobre os atos políticos do Prefeito, proibindo-o de inaugurar obras públicas quando não estejam perfeitamente acabadas e em pleno funcionamento. Embora tal propósito encontre fundamento material nos princípios constitucionais da Administração Pública, em especial no princípio da moralidade (artigo 37, caput, CF/88), há vício formal de iniciativa por não ser permitido ao membro de Câmara deflagrar o processo legislativo a respeito de tal matéria, que se encontra na chamada “reserva de administração”. No Município de Porto Alegre, aliás, buscou-se instituir medida muito similar à analisada neste parecer, através do Projeto de Lei nº 098/2017, de autoria parlamentar, o qual, no entanto, recebeu veto total do Prefeito por considerar violado o artigo 2º da CF/88, que estabelece o princípio da separação dos poderes. Na fundamentação do veto, o Chefe do Executivo esclareceu que “o projeto de lei sob análise é um libelo de proibição a atos de gestão da Administração Pública Municipal e um comando proibitório perpetrado pelo Poder Legislativo da divulgação de políticas públicas pelo Poder Executivo.” Portanto, apesar de ser honrosa sob o ponto de vista material, por relacionar-se ao princípio constitucional da moralidade (artigo 37, caput, CF/88), a proposta não poderia ter sido apresentada por membro do Poder Legislativo, uma vez que a iniciativa para projetos que tratem da organização e da gestão dos atos públicos e políticos do Executivo compete apenas ao Prefeito, enquanto responsável pela ordenação administrativa. A propósito, destaca-se precedente do TJRS sobre matéria muito similar, julgado em 12/03/2018:
Nada impede, contudo, que a proposta seja remetida ao Executivo sob a forma de indicação, com base no artigo 114 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba, para que, pela via política, o Prefeito implemente a medida veiculada. Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria orienta pela possibilidade de a Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver ao autor a proposição em epígrafe, em razão de vício de iniciativa caracterizado com base nos artigos 5º, 8º, 10, 60, II, “d”, e 82, III e VII, da CE/RS e nos artigos 52, VI, e 119, II, da Lei Orgânica Municipal. Guaíba, 11 de maio de 2018. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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