Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 050/2018
PROPONENTE : Ver. Dr. João Collares
     
PARECER : Nº 127/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a proibição de incentivos fiscais a empresas que tenham envolvimento em corrupção de qualquer espécie ou em ato de improbidade administrativa no município de Guaíba"

1. Relatório:

 O Vereador Dr. João Collares apresentou à Câmara Municipal o Projeto de Lei nº 050/2018, que “Dispõe sobre a proibição de incentivos fiscais a empresas que tenham envolvimento em corrupção de qualquer espécie ou em ato de improbidade administrativa no município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência da Câmara e ao caráter pessoal das proposições.

2. Parecer:

 De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

O artigo 37 da Constituição Federal de 1988 assevera a condição de princípios norteadores da Administração Pública Direta e Indireta, dentre outros, a moralidade, legalidade e a eficiência, sendo assim a regulação da concessão de incentivos fiscais no âmbito do Município de Guaíba iniciativa que vai na direção desses princípios. Realmente, a concessão de tais vantagens a empresas envolvidas em corrupção ou ato de improbidade administrativa é inconsistente com os postulados do Estado Democrático de Direito e com os objetivos da República. No mesmo sentido encontra-se a previsão do artigo 19 da CE/RS, nos seguintes termos:

“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado e dos municípios, visando à promoção do bem público e à prestação de serviços à comunidade e aos indivíduos que a compõe, observará os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade, da legitimidade, da participação, da razoabilidade, da economicidade, da motivação e o seguinte”.

Preliminarmente, verifica-se que o PL nº 050/2018 busca positivar a mesma matéria constante do PL nº 030/2018, também de autoria do Ver. Dr. João Collares. O parecer da Procuradoria Jurídica quanto ao PL nº 030/2018 orientou pela constitucionalidade da proposição, alertando, contudo, para que fossem respeitadas as normas infraconstitucionais, especificamente as relativas ao período da proibição, visto que não poderia prever prazo infinito, devendo respeito às disposições das leis nº 12.846/13 (Lei Anticorrupção) e 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).

De fato, o proponente atendeu as recomendações contidas no referido parecer, incluindo na presente proposta legislativa artigo que regula o período de proibição, em termos semelhantes aos propostos pelo parecer jurídico, optando, naquela feita, por retirar o PL nº 030/2018, e protocolar a proposição ora em exame - PL nº 050/2018.

Vale a pena reiterar a análise quanto aos testes de constitucionalidade estabelecidos pelo parecer jurídico do PL nº 030/2018, do Legislativo.

Em primeiro lugar, a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativo do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente e no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

(...)

A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 050/18 dispõe sobre incentivos e benefícios fiscais, matéria para a qual a iniciativa é concorrente, conforme reconhecem os artigos 61 da CF/88, 59 da CE/RS e 38 da Lei Orgânica Municipal. Devidamente, a Lei Orgânica do Município de Guaíba prevê as regras matrizes do sistema tributário do Município em simetria à CF/88, prevendo inclusive a concessão de benefícios e incentivos fiscais, consubstanciando a autonomia municipal conferida pela Constituição Federal.

Destarte, a proposição está apropriada quanto à iniciativa para deflagração do processo legislativo. É cediço o entendimento dos tribunais de que as propostas legislativas que dispõem sobre incentivos e benefícios fiscais é matéria para a qual a iniciativa é concorrente. Assim o STF entendeu em julgamento com repercussão geral reconhecida, interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, firmando entendimento no sentido de que legislar sobre matéria tributária é matéria de iniciativa concorrente – iniciativa geral:

Tributário. Processo legislativo. Iniciativa de lei. 2. Reserva de iniciativa em matéria tributária. Inexistência. 3. Lei municipal que revoga tributo. Iniciativa parlamentar. Constitucionalidade. 4. Iniciativa geral. Inexiste, no atual texto constitucional, previsão de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo em matéria tributária. 5. Repercussão geral reconhecida. 6. Recurso provido. Reafirmação de jurisprudência. (ARE 743480 RG, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 10/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-228 DIVULG 19-11-2013 PUBLIC 20-11-2013 ) Sem grifo no original.

Vale a pena colacionar trecho do parecer do Procurador Gustavo Dobler quanto à matéria no momento da análise do PL nº 030/2018, evidenciando que a matéria de fundo da proposição é juridicamente relevante, e viável sua tramitação:

“Isso tudo é dito para comprovar que, de fato, incentivos fiscais são exceções do ordenamento jurídico, uma vez que, em regra, vigora o princípio da isonomia tributária, não sendo possível instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente (artigo 150, II, CF/88). E é neste ponto específico que se fundamenta o objetivo do proponente, qual seja, o de instituir critério moral para a concessão de incentivo fiscal. Se, de fato, a concessão de privilégios fiscais é exceção do ordenamento, nada mais justo que possibilitá-la apenas a aqueles que tenham qualidade moral para tanto, que não tenham qualquer envolvimento comprovado em atos de corrupção ou de improbidade. Trata-se de máxima aplicação do princípio constitucional da moralidade.

A matéria, inclusive, já é prevista nas Leis Federais nº 12.846/13 e 8.429/92:

Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5º desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras:

(...)

IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:

I - na hipótese do art. 9º, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

IV - na hipótese prevista no art. 10-A, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito) anos e multa civil de até 3 (três) vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.”

    

Conforme ressaltado no referido parecer antecedente desta Procuradoria, a proposição guarda conformidade inclusive no que diz respeito à hipótese de isenção de sanções de “publicação extraordinária da decisão condenatória” e de “proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público” através de acordos de leniência previstos na Lei Federal nº 12.846/13, bem como para redução em até 2/3 do valor da multa aplicável (artigo 16, § 2º, Lei Federal nº 12.846/13), sem prejuízo das demais sanções.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 050/2018, presente a constitucionalidade e a legalidade da matéria proposta, e por ter sido efetuada correção, em relação ao PL nº 030/2018, conforme orientado pela Procuradoria, quanto à necessidade de estabelecer prazos para a vigência da proibição, em respeito às disposições das Leis Federais nº 12.846/13 - Lei Anticorrupção e 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa.

É o parecer.

Guaíba, 24 de abril de 2018.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

 

Procurador Geral

OAB/RS 107.136



O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil.
Documento publicado digitalmente por JúLIA DAL OSTO em 25/04/2018 ás 09:20:08. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 29326fdc0ddd224feb55264a13a33631.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 52955.