Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 013/2018
PROPONENTE : Ver.ª Claudinha Jardim
     
PARECER : Nº 112/2018
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Dispõe sobre a divulgação prévia, por meio da internet, do cronograma de obras e serviços de pavimentação, tapa-buracos, poda de árvores, roçada em áreas públicas, manutenção de praças, parques e dá outras providências"

1. Relatório:

A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 013/18 à Câmara Municipal, que dispõe sobre a divulgação prévia, por meio da internet, do cronograma de obras e serviços de pavimentação, tapa-buracos, poda de árvores, roçada em áreas públicas, manutenção de praças, parques e dá outras providências. A proposição foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, emitindo-se parecer no sentido da ausência de inconstitucionalidade manifesta, embora existam precedentes judiciais contrários. A Comissão de Justiça e Redação, em reunião, solicitou novo parecer jurídico.

2. Parecer:

Em 1º de março de 2018, a Procuradoria Jurídica da Câmara de Vereadores emitiu parecer sobre o Projeto de Lei nº 013/2018, concluindo pela ausência de inconstitucionalidade manifesta, mas alertando a existência de precedentes que, de certa forma, contrariam entendimentos favoráveis à matéria, também já definidos no Poder Judiciário. Isso demonstra que a viabilidade jurídica de projetos de origem parlamentar nesse sentido – lembre-se, de divulgação de informações de interesse público no site institucional do Executivo Municipal –, oscila na jurisprudência, tornando irrealizável a tarefa de prestar assessoramento jurídico com total e absoluta segurança.

O Direito, enquanto ciência abstrata, não existe sem o fenômeno social, ao qual está intimamente ligado. Aliado a isso, a grande carga interpretativa das normas jurídicas torna aceitável o fato de, em alguns momentos, regras e princípios serem compreendidos de uma forma e, em outros, de maneira completamente diversa. Na esfera do Direito Constitucional, então, a força da interpretação é ainda maior, uma vez que as normas constitucionais carregam consigo, naturalmente, valores éticos e morais, que variam de acordo com o espaço e o tempo. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, em inúmeros julgados já aplicou aquilo que se chama de mutação constitucional: alteração do sentido de normas constitucionais sem qualquer redução ou acréscimo de texto, a demonstrar, nitidamente, a vulnerabilidade da Constituição às diversas interpretações possíveis.

Como exemplo disso no STF, têm-se as diversas definições sobre a possibilidade, ou não, do início do cumprimento da pena a partir da confirmação da sentença condenatória em segunda instância. Desde a Constituição Federal de 1988 até 2009, o STF considerava ser possível a execução provisória da pena a partir da confirmação da sentença no segundo grau de jurisdição. A partir do HC nº 84.078/09, houve mudança de interpretação do art. 5º, LVII, para ser possível o início do cumprimento da pena somente após o trânsito em julgado da condenação, após todos os recursos manejados pela defesa. Em 2016, com o HC 126.292, houve nova mudança de entendimento para declarar a possibilidade de execução provisória da pena, mesmo quando a sentença não estivesse transitada em julgado. Recentemente, no julgamento do HC 152.752, em 04.04.2018, houve a manutenção desse entendimento, mas pela acirrada votação de 6x5, o que causou grande repercussão social.

Isso tudo serve de fundamento para demonstrar que certas normas jurídicas, especialmente as de valor constitucional, suscitam muitas dúvidas na sua aplicação, produzindo interpretações diversas. É muito comum, na rotina dos tribunais e dos juízos de primeiro grau, ver-se o encerramento de casos de maneira totalmente oposta em uma e outra jurisdição, havendo, aliás, recursos específicos na lei processual brasileira para garantir uniformidade e coerência dos julgamentos.

O caso em análise é de difícil resolução. Como restou salientado no parecer jurídico de fls. 10-15, há diferentes entendimentos sobre a possibilidade de membro do Poder Legislativo deflagrar projeto de lei criando a obrigação de o Executivo fazer a publicação de informações de interesse público no seu site institucional. O TJRS já se manifestou contrário e favorável em alguns casos, enquanto o STF, em importante julgamento, declarou não haver vício de iniciativa em lei de origem parlamentar nesse sentido.

Os julgamentos são divergentes e não há como prever com segurança jurídica se, em eventual ação direta de inconstitucionalidade, a futura lei viria, ou não, a ser declarada incompatível com a Lei Maior por ofensa à iniciativa. Certo é, porém, que não há inconstitucionalidade manifesta, visto que, como dito, alguns julgados (até mesmo do STF) já consideraram a validade de algumas leis semelhantes e com o mesmo propósito.

As funções da Procuradoria Jurídica da Câmara de Vereadores de Guaíba, previstas no art. 3º da Lei Municipal nº 3.634/18, compreendem o assessoramento direto dos órgãos do Legislativo Municipal, o que, sem dúvidas, está sendo cumprido por parte deste servidor público. A questão central é que não há certeza, na jurisprudência, sobre a existência, ou não, de vício de iniciativa em leis nesse sentido, variando o entendimento de acordo com o órgão jurisdicional julgador.

A Comissão de Constituição e Justiça, então, terá de adotar uma das seguintes alternativas: a) reconhecer a constitucionalidade da proposição e emitir parecer favorável; b) julgar existir impedimento jurídico de inconstitucionalidade formal por não haver segurança jurídica em admitir a viabilidade do projeto, por medida de precaução e para evitar uma eventual declaração de inconstitucionalidade em ação direta.

Destaca-se, apenas para deixar totalmente claro, que a Procuradoria Jurídica inicialmente emitiu parecer pela ausência de inconstitucionalidade manifesta, o que não significa, por outro lado, que a proposta é constitucional. Tal juízo cabe, regimentalmente, à Comissão de Constituição e Justiça, e não ao Presidente da Câmara, a quem cabe apenas devolver os projetos absolutamente inconstitucionais. A própria formação do Poder Legislativo como órgão colegiado e democrático referenda a premissa de ser coletiva a apreciação final da constitucionalidade das proposições. É por esse motivo que o servidor que subscreve somente emite parecer desfavorável, à luz do art. 105 do Regimento, quando a inconstitucionalidade for inquestionável, remetendo as demais propostas à análise das comissões competentes mesmo quando exista dúvida ou falta de total clareza sobre a viabilidade jurídica.

Como sugestão ao caso em análise, para evitar maiores questionamentos futuros sobre a constitucionalidade do Projeto de Lei nº 013/2018, recomenda-se a substituição dos termos dos arts. 3º e 4º para o seguinte: “O Poder Executivo regulamentará, no que couber, a presente Lei.” Tal cláusula genérica assegura, em maior grau, o princípio da separação dos Poderes por garantir ao Executivo a liberdade de regulamentação da lei, via decreto, de acordo com a sua conveniência e oportunidade.

Conclusão:

Diante do exposto, fica lavrado, nesses termos, o parecer jurídico da Procuradoria da Câmara de Vereadores de Guaíba, ressaltando que a específica matéria é divergente na jurisprudência, em algumas hipóteses se reconhecendo a constitucionalidade e, em outras, se aplicando solução totalmente diversa. Caberá à Comissão de Constituição e Justiça avaliar os riscos e emitir parecer em algum desses sentidos: a) reconhecendo a constitucionalidade da proposição; b) julgando existir impedimento jurídico de inconstitucionalidade formal por não haver segurança jurídica em defender a viabilidade do projeto, por medida de precaução e para evitar uma eventual declaração de inconstitucionalidade em ação direta. Referenda-se, ainda, a sugestão acima apresentada, para melhor adequar os termos da proposta e diminuir os riscos de futuros questionamentos (revisão dos arts. 3º e 4º).

Guaíba, 16 de abril de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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