PARECER JURÍDICO |
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"Fica criado o Programa de Prevenção de Assédio Sexual no Transporte Público Coletivo" 1. Relatório:A Vereadora Claudinha Jardim apresentou o Projeto de Lei nº 043/2018 à Câmara Municipal, objetivando criar o Programa de Prevenção de Assédio Sexual no Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência e ao caráter pessoal da proposição. 2. Parecer:O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
A medida de prevenção e de combate que se pretende instituir no âmbito do Município de Guaíba se insere, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque a matéria veiculada na proposta é de responsabilidade comum de todos os entes federados, não sendo uma competência privativa da União (artigo 22, CF), além do que a medida proposta tem repercussão municipal, pois se vincula apenas ao serviço de transporte público no estrito âmbito de Guaíba. Quanto à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 043/2018 é obrigar os responsáveis pela prestação do serviço de transporte público municipal a adotarem medida para prevenir e reprimir os atos de abuso sexual praticados no transporte coletivo, orientando as vítimas sobre como devem proceder nesses casos, o que encontra amparo na Lei Federal nº 11.340/06. De acordo com o artigo 2º do referido diploma legal, “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.” Importante revelar, ainda, o disposto no artigo 3º da Lei Federal nº 11.340/06, que dispõe, em linhas gerais, sobre os direitos garantidos às mulheres:
No que concerne à iniciativa para o processo legislativo, para os fins do direito municipal, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:
À luz da interpretação das normas jurídicas, é clássica a lição de que as exceções devem ser interpretadas de forma restritiva. Ou seja, quando a norma jurídica excepciona uma regra geral, estabelecendo requisitos que limitam o exercício de uma prerrogativa, não se pode adotar a técnica da interpretação ampliativa para atingir outros casos não previstos na norma analisada. O rol de iniciativas privativas do Chefe do Executivo, portanto, é estrito e não admite interpretação ampliativa; do contrário, ocorreria subversão e/ou perturbação do esquema organizatório funcional estabelecido na CF, base do princípio da conformidade funcional, que rege a interpretação dos dispositivos constitucionais. Em palavras mais simples, o intérprete da Constituição não pode chegar a uma conclusão que altere “a repartição de funções constitucionalmente estabelecidas pelo constituinte originário, como é o caso da separação de poderes” (LENZA, 2011, p. 148). Inclusive, o Supremo Tribunal Federal fez história ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo nº 878.911/RJ, reconhecendo repercussão geral no tema nº 917: “Competência para iniciativa de lei municipal que preveja a obrigatoriedade de instalação de câmeras de segurança em escolas públicas municipais e cercanias”. No acórdão, o STF registrou que as hipóteses de restrição previstas no artigo 61, § 1º, da CF – e, portanto, as correspondentes nas Constituições Estaduais – são taxativas, não admitindo interpretação extensiva por consistirem em normas de exceção ao poder de iniciativa:
O entendimento recente do Supremo Tribunal Federal, órgão responsável pela guarda da Constituição (artigo 102, caput, CF), sem dúvidas ecoa por todos os tribunais brasileiros, especialmente porque manifestado em julgamento de recurso constitucional extraordinário, com o reconhecimento da repercussão geral (existência de questão relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassa os interesses subjetivos do processo – artigo 1.035, § 1º, NCPC). Na situação, o artigo 60, II, “d”, da CE/RS não prevê restrição expressa à deflagração de projeto, por parlamentar, estabelecendo a obrigação de as concessionárias do serviço de transporte coletivo público adotarem a medida prevista no PL 043/18 (divulgação de informações no interior dos veículos). Como já sustentou o IGAM anteriormente na orientação técnica nº 30.472/2017, relativa à proposição de nº 140/2017, com objeto similar, “(...) não se vislumbra estar criando atribuições ao Poder Executivo ou mesmo não se está criando regra que gere desequilíbrio financeiro em eventual contrato com a concessionária do respectivo serviço, tendo em vista que a fixação do cartaz implica em custo irrisório, podendo se configurar, inclusive, em folha de ofício digitada, já que outros critérios não foram estabelecidos, mas apenas que a informação chegue à população.” Portanto, seguindo as linhas da anterior orientação técnica nº 30.472/2017 do IGAM, não se vislumbra vício de iniciativa no PL 043/2018, tendo em vista que a obrigação é dirigida, na prática, às delegatárias do serviço de transporte público, não sendo a medida capaz de gerar, por si só, desequilíbrio financeiro, por se tratar de despesa irrisória. Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 043/2018, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário. Guaíba, 23 de março de 2018. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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