PARECER JURÍDICO |
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"Institui o Programa de Saúde Solidária no Município de Guaíba e dá outras providências" 1. Relatório:O Projeto de Lei nº 028/2018, de autoria do Vereador Dr. Renan Pereira, que “Institui o Programa de Saúde Solidária no Município de Guaíba e dá outras providências”, foi encaminhado a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência e ao caráter pessoal das proposições. 2. Parecer:De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Depreende-se, a partir da leitura da proposição, que seu objetivo consiste em estabelecer uma política pública voltada para a área da saúde, criando um sistema de arrecadação e distribuição de equipamentos e materiais da saúde às pessoas carentes. Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” Por outro lado, a proposição esbarra no disposto no art. 61, § 1º, da Constituição Federal, que estabelece a iniciativa privativa para a deflagração do processo legislativo, fixando as disciplinas próprias do Presidente da República, aplicáveis por simetria aos Estados e Municípios:
O conteúdo normativo do Projeto de Lei nº 028/2018, do Poder Legislativo, invade a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal, prevista no aludido art. 61, § 1º, da Constituição da República Federativa do Brasil, ao impor obrigações à esfera da administração pública municipal. Incide, dessa forma, em desobediência às normas constitucionais do processo legislativo, por pretender impor à Secretaria Municipal de Saúde atribuições não previstas para a pasta, como fica claro pela leitura do art. 3º, o qual confere ao referido órgão a responsabilidade de “disponibilizar espaço apropriado para estoque, controle e distribuição dos materiais, equipamentos e medicamentos doados na medida do possível”, outorgando-lhe, em linhas gerais, a gestão e a organização de toda a logística do programa, o que implica criação de despesa não prevista na lei orçamentária anual (vedada pelos arts. 167, I, da CF/88 e 154, I, da CE/RS), movimentação de servidores e criação de unidade específica para o recebimento e entrega das doações. O conteúdo do Projeto de Lei nº 028/2018 também vai de encontro ao princípio constitucional da separação dos poderes, disposto no art. 2º da Constituição Federal. A matéria ofende a chamada reserva de administração, insculpida no artigo 61, § 1º, da Constituição Federal e decorrência do conteúdo nuclear do princípio da separação de poderes, ao dispor a respeito da organização de programas públicos municipais, sobre os quais cabe ao Poder Executivo iniciar o processo legislativo. Resta configurado, ainda, o vício de iniciativa na deflagração do processo legislativo frente ao que dispõe a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, no art. 60, II, “d”, e no art. 82, VII, in verbis:
Já a Lei Orgânica Municipal reserva a iniciativa da matéria ao Prefeito em seu artigo 119, II, configurando-se caso de invasão de competência no curso do processo legislativo a matéria que pretenda interferir na organização da Secretaria Municipal de Saúde:
Nesse sentido, ensina Hely Lopes Meirelles[1]:
Na mesma linha, veja-se a jurisprudência específica sobre o caso:
Igualmente, o parecer do MPSP em ação direta de inconstitucionalidade:
[1] In Direito Municipal Brasileiro, Malheiros, 1993, págs. 438/439. Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria opina pela inviabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 028/2018, em razão de vício de iniciativa caracterizado com base no artigo 61, § 1º, da CF/88, no artigo 60, II, alínea “d”, da CE/RS e no artigo 119, II, da Lei Orgânica Municipal. Sugere-se ao autor, por outro lado, que a matéria seja proposta por meio de indicação ao Poder Executivo, nos termos do artigo 114 do Regimento Interno. Guaíba, 09 de março de 2018. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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