Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 151/2017
PROPONENTE : Ver.ª Claudinha Jardim
     
PARECER : Nº 048/2018
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Ficam o Executivo, o Legislativo e Autarquias Municipais proibidos de contratar e empossar, para ocupar cargo em comissão, bem como função gratificada, pessoa condenada, com sentença transitada em julgado, por crimes previstos na Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 - Lei Maria da Penha"

1. Relatório:

O Projeto de Lei nº 151/2017, de autoria da Vereadora Claudinha Jardim, foi encaminhado a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no artigo 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o exercício de controle quanto à constitucionalidade, à competência e ao caráter pessoal das proposições. 

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no artigo 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (artigo 105, II), alheias à competência da Câmara (artigo 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (artigo 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito das Casas Legislativas federais, com base no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (artigo 137, § 1º) e no Regimento Interno do Senado Federal (artigo 48, XI), sendo replicado em diversos outros regimentos internos.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no artigo 105 do Regimento Interno caracterizando-o como o instituto do controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer ao Plenário (artigo 105, p. único).

Inicialmente, verifica-se que o artigo 61, § 1º, da Constituição Federal, ao dispor a respeito da competência para a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, fixa as disciplinas de iniciativa privativa do Presidente da República, aplicável por simetria:

Art. 61 (...)

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

Constata-se que a matéria constante do Projeto de Lei nº 151/2017, de autoria da Vereadora Claudinha Jardim, não obstante ser laudatória, visa estabelecer proibições no que diz respeito à contratação de agentes públicos providos através de cargos em comissão e funções gratificadas, invadindo a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal prevista no referido artigo 61, § 1º, da Constituição Federal, aplicável por simetria aos demais entes federados. Além disso, consoante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, padece de vício de iniciativa, por afronta ao artigo 61, § 1º, da CF/88 a proposta iniciada por membro do Legislativo que disponha sobre o provimento de cargos dos servidores públicos da administração direta e autárquica:

É da iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo lei de criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração, bem como que disponha sobre regime jurídico e provimento de cargos dos servidores públicos. Afronta, na espécie, ao disposto no art. 61, § 1º, II, a e c, da Constituição de 1988, o qual se aplica aos Estados-membros, em razão do princípio da simetria. [ADI 2.192, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 4-6-2008, P, DJE de 20-6-2008.]

Esta Corte fixou o entendimento de que a norma prevista em Constituição estadual vedando a estipulação de limite de idade para o ingresso no serviço público traz em si requisito referente ao provimento de cargos e ao regime jurídico de servidor público, matéria cuja regulamentação reclama a edição de legislação ordinária, de iniciativa do chefe do Poder Executivo. Precedentes: ADI 1.165, rel. min. Nelson Jobim, DJ de 14-6-2002, e ADI 243, rel. p/ o ac. min. Marco Aurélio, DJ de 29-11-2002. [ADI 2.873, rel. min. Ellen Gracie, j. 20-9-2007, P, DJ de 9-11-2007.] = ADI 2.856, rel. min. Gilmar Mendes, j. 10-2-2011, P, DJE de 1º-3-2011

A matéria proposta através do Projeto de Lei nº 151/2017 macula ainda o princípio constitucional da separação dos poderes, insculpido no artigo 2º da Carta Constitucional, ao buscar o Poder Legislativo interferir de maneira indevida nas condições de provimento de cargos do Poder Executivo Municipal. É o que leciona nossa Corte Suprema:

Dentre as regras básicas do processo legislativo federal, de observância compulsória pelos Estados, por sua implicação com o princípio fundamental da separação e independência dos Poderes, encontram-se as previstas nas alíneas a e c do art. 61, § 1º, II, da CF, que determinam a iniciativa reservada do chefe do Poder Executivo na elaboração de leis que disponham sobre o regime jurídico e o provimento de cargos dos servidores públicos civis e militares. Precedentes: ADI 774, rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ de 26-2-1999; ADI 2.115, rel. min. Ilmar Galvão; e ADI 700, rel. min. Maurício Corrêa.

CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO LEGISLATIVO: INICIATIVA LEGISLATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. C.F., art. 61, § 1º, II, c. INICIATIVA LEGISLATIVA RESERVADA A OUTRO PODER: PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. C.F., art. 2º. I. - As regras básicas do processo legislativo federal são de observância obrigatória pelos Estados-membros e Municípios. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. II. - Leis que disponham sobre servidores públicos são de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo (C.F., art. 61, § 1º, II, a, c, f), à Câmara dos Deputados (C.F., art. 51, IV), ao Senado Federal (C.F., art. 52, XIII), ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça (C.F., art. 96, II, b). III. - Lei de iniciativa reservada a outro poder: não-observância: ofensa ao princípio da separação dos poderes (C.F., art. 2º). IV. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (ADI 2.731, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 25.4.2003 – grifos nossos).

Já a Lei Orgânica Municipal de Guaíba, em seu artigo 119, reserva competência exclusiva ao Prefeito nos projetos de lei que tratem de servidores do Executivo:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Por fim, quanto à proposta de instituição da vedação ao Poder Legislativo, lembra-se que o Regimento Interno da Câmara de Vereadores de Guaíba, ao tratar da proposição de normas que dizem respeito à nomeação de cargos no âmbito do Poder Legislativo, reserva a iniciativa, nesses casos, à Mesa Diretora, consoante seu artigo 28, inviabilizando que a iniciativa se dê por meio de Vereador, conforme o caso em análise. 

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe, em razão de tratar-se de matéria inconstitucional por afronta ao artigo 61, § 1º, da Constituição Federal e ao artigo 60, II, alínea “b”, da Constituição Estadual, bem como pela caracterização de vício de iniciativa frente ao artigo 119 da Lei Orgânica Municipal, com base nos esclarecimentos acima expostos, cabendo, todavia, recurso ao Plenário.

Sugere-se à autora, por outro lado, que a matéria seja proposta por meio de indicação ao Poder Executivo e por meio de indicação à Mesa Diretora.

Guaíba, 07 de março de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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