Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 004/2018
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 024/2018
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Autoriza a abertura de crédito adicional de caráter especial no valor de R$ 7.721.700,00 (sete milhões setecentos e vinte e um mil e setecentos reais"

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 004/2018 à Câmara Municipal, pleiteando autorização para a abertura de crédito adicional especial, no valor de R$ 7.721.700,00 (sete milhões, setecentos e vinte e um mil e setecentos reais), no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde, da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Segurança e do Gabinete do Prefeito. 

2. Parecer:

Inicialmente, quanto à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, a Constituição Federal de 1988 estabelece, no artigo 165, III, ser do Poder Executivo a competência para iniciar projetos de lei sobre orçamentos anuais. Tal normativa foi devidamente respeitada no caso, por ter sido o projeto apresentado pelo Executivo Municipal.

No que diz respeito à matéria de fundo, a Lei Federal nº 4.320/64, no seu Título V, disciplina a abertura de créditos adicionais. Segundo o artigo 40, créditos adicionais são “as autorizações de despesa não computadas ou insuficientemente dotadas na Lei de Orçamento.” Eles podem ser classificados em três modalidades: suplementares, que são destinados a reforço de dotação orçamentária; especiais, que são destinados a despesas para as quais não haja dotação orçamentária específica; e extraordinários, que são destinados a despesas urgentes e imprevistas, em caso de guerra, comoção intestina ou calamidade pública (artigo 41).

No presente caso, o pedido é de autorização para a abertura de crédito especial. No que diz respeito a tal modalidade, o artigo 42 da Lei Federal nº 4.320/64 prevê que “Os créditos suplementares e especiais serão autorizados por lei e abertos por decreto executivo.” Tal exigência foi devidamente respeitada, porquanto o pedido foi apresentado na forma de projeto de lei.

Ainda, para a abertura de créditos especiais, faz-se necessária a existência de recursos disponíveis para processar a despesa, devendo ser apresentada exposição justificada, na forma do artigo 43 da Lei nº 4.320/64. Esses recursos podem ser: a) o superávit financeiro apurado em balanço patrimonial do exercício anterior; b) os provenientes de excesso de arrecadação; c) os resultantes de anulação parcial ou total de dotações orçamentárias ou de créditos adicionais, autorizados em Lei; d) o produto de operações de credito autorizadas, em forma que juridicamente possibilite ao poder executivo realizá-las.

A indicação dos recursos disponíveis, na situação, está demonstrada pela compensação que será feita com a redução orçamentária de despesas do mesmo valor, indicada no Projeto de Lei nº 004/2018, na forma de anulação parcial de dotações orçamentárias (artigo 43, § 1º, III).

Particularmente quanto aos créditos vinculados às ações e aos serviços públicos de saúde, a Emenda Constitucional nº 29, de 13 de setembro de 2000, tornou indispensável a concentração de todos os recursos da saúde em fundos especiais, criados em cada âmbito da federação, confirmando o que já previa a Lei Federal nº 8.080/90 (Lei do Sistema Único de Saúde) no artigo 33, o qual determina o depósito desses valores em contas especiais, excepcionando o princípio da unidade de tesouraria, previsto no artigo 56 da Lei Federal nº 4.320/64. Os fundos especiais são criados mediante lei e, segundo o artigo 71 do mesmo diploma normativo, destinam-se à concentração de receitas que se vinculem à realização de determinados objetivos ou serviços.

Segundo o artigo 33 da Lei Federal nº 8.080/90, além da obrigatoriedade de concentração dos recursos financeiros da saúde em conta especial, a movimentação desses valores se dá sob a fiscalização dos respectivos conselhos de saúde. Na realidade de Guaíba, a Lei Municipal nº 1.155/93 criou o Conselho Municipal de Saúde (COMUSA), estabelecendo as suas competências no artigo 2º. Conforme a alínea “e” do mesmo dispositivo, cabe ao conselho aprovar e fiscalizar a execução da Programação e Orçamento da Saúde anual.

Os conselhos municipais possuem fundamento na CF/88, em razão do reconhecimento da cidadania como fundamento da República Federativa do Brasil e da democracia como forma de aquisição e exercício do poder. Os conselhos de direitos fazem parte, efetivamente, do processo de abertura para a participação cidadã na política.

A CF/88 vem aprimorando e enriquecendo os meios de participação popular no setor público, seja quanto ao acesso aos cargos públicos, seja quanto à contribuição direta do povo nas decisões políticas de Estado. Instrumentos como o concurso público, a iniciativa popular, o referendo, o plebiscito, a ação popular e os conselhos municipais fortificam o regime democrático e conferem maior legitimidade ao setor público, que passa a estar sob constante fiscalização da sociedade.

Por exercerem, democraticamente, o controle social sobre as dotações orçamentárias de cada pasta, os conselhos municipais, quando tiverem caráter deliberativo, devem ser necessariamente consultados sobre eventuais modificações que se busquem implementar na lei orçamentária anual. Para as áreas da saúde, da assistência social e da educação, essa obrigação deriva de diplomas específicos: artigo 33 da Lei Federal nº 8.080/90 (saúde), artigo 84 da Resolução nº 33/12 do Conselho Nacional de Assistência Social e artigo 24, § 9º, da Lei Federal nº 11.494/07 (educação).

Além da lei que organiza o Sistema Único de Saúde, a Resolução nº 333, de 04 de novembro de 2003, do Conselho Nacional de Saúde, estabelece diretrizes para a criação, reformulação, estruturação e funcionamento dos conselhos de saúde em todo o território nacional. A Diretriz nº 5, referente às competências, refere que cabe aos conselhos “deliberar sobre os programas de saúde e aprovar projetos a serem encaminhados ao Poder Legislativo, propor a adoção de critérios definidores de qualidade e resolutividade, atualizando-os em face do processo de incorporação dos avanços científicos e tecnológicos, na área da Saúde.” (inc. VIII). Também lhes compete “aprovar a proposta orçamentária anual da saúde, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (artigo 195, § 2º da Constituição Federal), observado o princípio do processo de planejamento e orçamentação ascendentes (artigo 36 da Lei nº 8.080/90) (inc. XII). Por fim, de acordo com o inc. XIII da Diretriz nº 5, os conselhos municipais devem “propor critérios para programação e execução financeira e orçamentária dos Fundos de Saúde e acompanhar a movimentação e destinação dos recursos.”

O caráter deliberativo do Conselho de Saúde de Guaíba (artigo 1º) também reforça a necessidade de submeter ao seu crivo a proposta que cria crédito adicional especial mediante a anulação parcial de outras despesas também do Fundo Municipal de Saúde. Nesse sentido, importante destacar a orientação do texto “Créditos Adicionais e PCASP”, produzido por Adriana de Lourdes Barbosa Fantinel Richato, consultora do IGAM:

Quanto à necessidade de aprovação dos demais Conselhos Municipais quando da alteração dos orçamentos das suas respectivas pastas, deverá ser analisada a Lei de criação de cada um dos Conselhos, a fim de verificar se estes são deliberativos ou consultivos. Se forem deliberativos, necessitará de sua aprovação para alteração no orçamento das suas pastas, porém se estiver enquadrado como consultivo, eles poderão ser consultados, mas não necessitam obrigatoriamente da sua aprovação.

A eventual inobservância da necessária deliberação da proposta pelo Conselho Municipal de Saúde poderá contaminá-la pela chamada inconstitucionalidade formal decorrente da violação de pressupostos objetivos do ato normativo, visto que descumprida a exigência constitucional de assegurar, por meio de deliberação do conselho municipal, a fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde na esfera municipal (artigo 198, § 3º, III, CF/88). Ademais, a aprovação da proposta sem a contribuição do conselho violaria a diretriz do artigo 242, inc. IV, da Constituição Estadual Gaúcha, no sentido de ser princípio orientador do Sistema Único de Saúde a “participação, com poder decisório, das entidades populares representativas dos usuários e trabalhadores da saúde, na formulação, gestão, controle e fiscalização das políticas de saúde.”

Por conseguinte, a proposta veiculada no Projeto de Lei nº 004/2018 precisa ser devidamente aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde de Guaíba para que possa seguir sua regular tramitação, com juntada da respectiva ata, já que envolve a abertura de crédito adicional especial, no âmbito da saúde municipal, mediante a anulação parcial de dotações orçamentárias também do Fundo Municipal da Saúde, mas categorizadas para outros fins.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina que a viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 004/2018 está condicionada à comprovação de aprovação desta proposta pelo Conselho Municipal de Saúde de Guaíba.

É o parecer.

Guaíba, 22 de fevereiro de 2018.

GUSTAVO DOBLER                                                                           JULIA ZANATA DAL OSTO

      Procurador                                                                                                Procuradora



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