Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 002/2018
PROPONENTE : Mesa Diretora
     
PARECER : Nº 001/2018
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Dispõe sobre a classificação de cargos, fixa vencimentos do quadro de servidores do Legislativo Municipal e dá outras providências"

1. Relatório:

A Mesa Diretora apresentou o Projeto de Lei nº 002/18 à Câmara Municipal, que dispõe sobre a classificação de cargos, fixa vencimentos do quadro de servidores do Legislativo Municipal e dá outras providências. Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto de lei, com emendas, foi remetido a esta Procuradoria, para parecer jurídico.

2. Parecer:

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado trata da organização do quadro de servidores da Câmara Municipal e de outras questões atinentes a essa matéria, o que compete à Mesa Diretora, nos termos do artigo 27, inc. III, e artigo 28, inc. III, da Lei Orgânica Municipal.

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, II, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

O IGAM, nas orientações técnicas nº 97/2018 e 99/2018, expôs vários comentários sobre o Projeto de Lei nº 002/2018, tanto no aspecto jurídico quanto no aspecto contábil. Sucintamente, defendeu: os cargos em comissão e a função gratificada necessitam guardar correspondência, nas atribuições, com as funções de direção, chefia e assessoramento, não podendo ser previstas tarefas típicas de servidor efetivo; os cargos de coordenador e de diretor, por configurarem atribuições de chefia e direção, devem ser alocados em estrutura administrativa que tenha servidores subordinados; nada obsta a extinção do cargo em comissão de Procurador Jurídico e a criação de um efetivo de Procurador, considerando as exigências do artigo 132 da CF/88 e da jurisprudência, que estabelecem a formação das Procuradorias por servidores efetivos; o cargo de Coordenador de Eventos deve ser alterado para Assessor de Eventos; é pertinente um pequeno ajuste na redação da cláusula de revogação; a estimativa de impacto orçamentário-financeiro contempla as premissas básicas.

Do cumprimento das exigências orçamentário-financeiras

Como bem ressaltou o IGAM, além do atendimento da competência e da iniciativa, o projeto que verse sobre a criação de cargos públicos ou sobre a estrutura de carreiras deve demonstrar o cumprimento de requisitos de ordem orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88, e na Lei Complementar Federal nº 101/00.

Prevê o artigo 169, caput e § 1º, da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Em relação à prévia dotação orçamentária, a estimativa de impacto orçamentário-financeiro comprova que há recursos suficientes para o atendimento da despesa, sem que se atinjam os limites aplicáveis ao Poder Legislativo em âmbito municipal. Quanto à autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias, o item 2 da estimativa demonstra que há previsão no artigo 29, o que se comprova da leitura da Lei Municipal nº 3.540/2017.

Ainda, a estimativa do impacto orçamentário-financeiro contempla a previsão da classificação orçamentária por onde correrá a despesa, declaração de que há previsão da despesa no orçamento e na programação financeira, demonstração do impacto no exercício corrente (2018) e nos dois posteriores, indicação dos percentuais de despesa e declaração de compatibilidade com as metas fiscais.

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Tais exigências, como afirmou o IGAM, estão devidamente atendidas pela estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresentada no projeto de lei. Ainda, dispõe o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00):

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Quanto ao referido dispositivo legal, cabe repisar que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresenta a origem dos recursos para o seu custeio e contém as premissas e a metodologia de cálculo, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais.

A respeito da adequação da despesa aos limites constitucionais e da Lei Complementar nº 101/00, veja-se o disposto no artigo 29-A, inc. I, da CF/88:

Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 25, de 2000)

I - 7% (sete por cento) para Municípios com população de até 100.000 (cem mil) habitantes; (Redação dada pela Emenda Constituição Constitucional nº 58, de 2009)

No caso de Guaíba, a receita tributária e as transferências para o Município somaram, em 2017, o valor de R$ 163.387.971,43. Aplicados 7% para a fixação da despesa total do Poder Legislativo, chega-se ao limite de R$ 11.437.158,00, que não será atingido pela criação dos cargos e/ou funções gratificadas, uma vez que as despesas previstas até o final do exercício somam R$ 9.738.841,09.

O artigo 29-A, § 1º, da CF/88 estabelece outro limite a ser observado:

Art. 29-A. [...]

 1º A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 25, de 2000)

Quanto ao referido limite, o impacto orçamentário-financeiro estabelece a projeção de despesa com folha de pagamento em R$ 7.379.254,63, alcançando 64,52% da receita do Poder Legislativo, o que não torna ilegal a despesa, considerando que o limite constitucional em análise é de 70%.

Por fim, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinqüenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;

De acordo com a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, a receita corrente líquida para o exercício de 2018 é de R$ 240.962.071,00, de modo que 6% desse valor resultaria no montante de R$ 14.457.724,26. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 9.212.316,75, representando 3,82% da receita corrente líquida.

Portanto, não atingidos quaisquer dos limites previstos na CF/88 e na Lei Complementar nº 101/00 e apresentada a estimativa de impacto orçamentário-financeiro com as informações necessárias, tem-se por cumpridas as exigências de caráter financeiro para a aprovação do Projeto de Lei nº 002/2018.

2.2 Da extinção do cargo em comissão de Procurador Jurídico e da criação do cargo efetivo de Procurador

Como bem destacado na exposição de motivos, a criação de um cargo efetivo de Procurador, em substituição ao cargo comissionado de Procurador Jurídico, atende diretamente ao previsto na Constituição Federal quanto à formação da advocacia pública. Muito além da questão meramente financeira – já que o cargo efetivo tem vencimentos inferiores ao cargo comissionado –, o texto constitucional exige a formação das Procuradorias por servidores efetivos em âmbito federal e estadual, de modo a manter a autonomia funcional dos que a compõem:

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

[...]

O ingresso nas classes iniciais das carreiras da instituição de que trata este artigo far-se-á mediante concurso público de provas e títulos.

[...]

Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Não há dúvidas de que tais normas constitucionais, embora se refiram à advocacia pública nas esferas federal e estadual, são aplicáveis por simetria aos Municípios, considerando que a esses também compete a formação da sua advocacia pública.

Inclusive, considera-se que o Procurador não desempenha mera função de assessoramento, mas sim atividade eminentemente técnica, própria de servidor efetivo e inerente ao profissional da advocacia, o qual possui formação específica. Ainda que a nomenclatura do cargo denote, à primeira vista, o exercício de função de confiança, é inequívoco que a atividade jurídica se caracteriza pela técnica e necessita de autonomia, tornando-se indispensável o provimento mediante concurso público.

Nesse aspecto, o Tribunal de Justiça Gaúcho, em vários precedentes, já declarou a inconstitucionalidade de leis municipais que mantêm, em sua estrutura de cargos, função de assessoramento jurídico por cargos em comissão, por considerar a atividade como de natureza técnica, a exigir o provimento por concurso público. Veja-se:

REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS. ASSESSOR JURÍDICO. CARGOS EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÕES INCOMPATÍVEIS COM A FORMA DE PROVIMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE. NULIDADE DOS ATOS DE NOMEAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. Consoante o disposto no art. 10, par. Único, da Lei nº 440/2009 do Município de São Francisco de Assis, não há como se cogitar que os assessores jurídicos municipais desempenhassem atribuições conferidas a um cargo de confiança, porquanto se referem a tarefas de natureza eminentemente técnica, inerentes ao profissional da advocacia ou mesmo ao bacharel em direito. Inclusive, porque estavam sob a orientação e coordenação do Procurador-Geral do Município, este sim cargo em comissão subordinado ao Chefe do Executivo, responsável por traçar as linhas mestras a serem observadas pelos demais profissionais do direito. Ademais, não é simplesmente o nome dado ao cargo que irá definir a sua natureza e, consequentemente, sua forma de provimento. Não basta, pois, nominar como assessor jurídico o cargo ao qual é cometido um conjunto de atribuições cujo desempenho é inerente a um servidor efetivo, para fins de permitir a livre nomeação e exoneração, em evidente exceção ilegítima à regra geral de acesso ao cargo público via concurso público. Nulidade dos atos de nomeação mantida. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. (Reexame Necessário Nº 70062371752, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em 21/11/2014).

CONCURSO PÚBLICO. DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MUNICÍPIO DE CACEQUI. NOMEAÇÃO AO CARGO DE PROCURADOR JURÍDICO DO MUNICÍPIO DE CACEQUI. PLEITO DE DECLARAÇÃO INCIDENTAL DA ILEGALIDADE DA FORMA DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DO CARGO DE PROCURADOR ADJUNTO. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS AJUIZADAS ANTERIORMENTE. DECRETAÇÃO DA NULIDADE DE PORTARIAS DE NOMEAÇÃO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI-CACEQUI Nº 1.810/98. AGRAVO DE INSTRUMENTO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE DIANTE DA REALIDADE ATUAL. A Pretensão do Município de Cacequi de ter reformada a decisão que deferiu a nomeação do agravado no cargo de Procurador Jurídico do Município de Cacequi em detrimento do cargo ocupado por outro servidor nomeado em cargo em comissão não merece ter seguimento. Isso porque foi declarada a inconstitucionalidade da Lei-Cacequi nº 1.810/98 pelo Tribunal Pleno desta Corte, norma que embasou as Portarias de nomeações de servidores para ocupar o cargo em comissão, além de ter sido decretada a nulidade de portarias de nomeação em duas ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público. Situação atual relativamente às ilegalidades praticadas pela administração municipal de Cacequi que não autoriza o seguimento do presente recurso. SEGUIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NEGADO POR MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº 70056903420, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 18/10/2013).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSESSOR JURÍDICO. CARGO EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES TÍPICAS DE PROCURADOR DO MUNICÍPIO. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL EM DESCOMPASSO ÀS CONSTITUIÇÕES FEDERAL E ESTADUAL. PRECEDENTES DO STF E DO TJRS. NULIDADE DOS ATOS DE NOMEAÇÃO DOS SERVIDORES. LEI SUPERVENIENTE. READEQUAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO. PERDA DE OBJETO. NÃO CARACTERIZADA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70071254999, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em 23/11/2016).

  O Tribunal de Justiça do Espírito Santo, em julgado muito esclarecedor, declarou inconstitucional lei municipal que estabelecia o cargo de Procurador Municipal por provimento em comissão, sustentando ser plenamente aplicável aos Municípios, por simetria, o artigo 132 da CF/88, o qual exige a formação das Procuradorias Estaduais por servidores públicos efetivos. Isso porque, em especial, a formação dos quadros da administração pública deve, obrigatoriamente, respeitar os princípios basilares previstos no artigo 37 da CF/88, sobretudo o princípio da impessoalidade:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – [...] MÉRITO - MUNICÍPIO DE LINHARES - ARTIGO 329 E ANEXO II DA LEI Nº 2.560/2005 - CARGO DE PROCURADOR MUNICIPAL - FUNÇÃO COMISSIONADA - IMPOSSIBILIDADE - CARREIRA ACESSÍVEL SOMENTE POR CONCURSO PÚBLICO - PREVISÃO CONSTITUCIONAL - ARTIGO 132 DA CARTA MAGNA E 122 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA PELA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL - PRINCÍPIO DA SIMETRIA [...] - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. [...] 1 - Apesar do município ter sua autonomia política administrativa preservada dentro do nosso sistema jurídico essa não poderá se distanciar dos princípios estabelecidos nas constituições federal e estadual, conforme se denota do artigo 29 da Constituição Republicana e do artigo 20 da Lei Máxima do Estado do Espírito Santo. 2 - Apesar da exigência constitucional do concurso público, a ausência de uma abordagem especifica da Constituição Federal acerca da carreira jurídica municipal fez surgir uma comum e reiterada presença de cargos comissionados nesses setores, contudo, por meio de uma análise principiológica e constitucional, percebe-se que a estruturação das carreiras jurídicas municipais deve efetivar-se de forma simétrica às carreiras jurídicas da união e dos estados federados, sob pena, ao se adotar caminho diverso, de vir a incorrer em uma flagrante ofensa a diversos princípios constitucionais regentes da atividade administrativa e da Constituição Federal. ‘- A formação dos quadros da administração pública deve, obrigatoriamente, obedecer ao que prescreve o artigo 37, caput, da Constituição Federal, que elenca como princípios basilares da administração pública a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. 4 - Pela análise do artigo 132 da Carta Magna, e artigo 122 da Constituição do Estado do Espírito Santo, não pode o Município criar sua advocacia pública essencialmente com servidores comissionados, pois estaria se afastando do modelo constitucionalmente desejado pelo legislador constituinte, eis que o desejo da norma máxima é aquele que impõe o ingresso na carreira da advocacia pública por meio de concurso público de provas e títulos, e que deve ser reprisado nas Leis Orgânicas Municipais, em atenção ao princípio da simetria e aos pensamentos principiológicos da administração pública. 5 - Conforme depreende-se do artigo 33, da Lei Municipal n. 2560/2005, ora impugnada, os procuradores jurídicos, admitidos pela municipalidade em cargos em comissão, atuavam em atividades meramente técnicas, rotineiras, relacionadas à atividade-meio da Administração Pública, o que deve ser desempenhado pelos servidores efetivos nomeados por concurso, este a ser realizado pelo Poder Público e, assim sendo, é evidente que a nomeação (admissão) das funções listas no artigo 329, em conjunto com o anexo II, da Lei n.º 2.560/2005, do Município de Linhares, para exercerem a função de procurador municipal, é ofensiva à ordem constitucional que contempla o concurso público como mecanismo de acesso ao funcionalismo público, fixado no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. [...] (TJES, Classe: Direta de Inconstitucionalidade, 100120001654, Relator : JOSÉ LUIZ BARRETO VIVAS, Órgão julgador: TRIBUNAL PLENO, Data de Julgamento: 13/12/2012, Data da Publicação no Diário: 30/01/2013).

Por fim, na matéria “defesa da advocacia pública”, a Súmula nº 01 da Ordem dos Advogados do Brasil estabelece que “O exercício das funções da Advocacia Pública, na União, nos Estados, nos Municípios e no Distrito Federal, constitui atividade exclusiva dos advogados públicos efetivos a teor dos artigos 131 e 132 da Constituição Federal de 1988.

Portanto, verifica-se que é viável e, inclusive, incentivada a formação da Procuradoria Jurídica da Câmara de Vereadores de Guaíba por servidores efetivos, considerando todos os argumentos já expostos anteriormente.

 2.3 Dos cargos em comissão e/ou função gratificada de Diretor Administrativo, Diretor Legislativo, Coordenador Administrativo-Financeiro, Coordenador Operacional, Coordenador de Recursos Humanos e Assessor Legislativo

Superada a questão orçamentário-financeira para a criação dos cargos, é preciso destacar que as atribuições dos cargos citados devem guardar correspondência com o trinômio direção, chefia ou assessoramento, em virtude da regra prevista no artigo 37, inc. V, da CF/88: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;”.

Da leitura das atribuições dos cargos constantes no Anexo II, é possível constatar a compatibilidade com as funções outorgadas pela CF/88 para os cargos em comissão. Isso porque, de um modo geral, estão devidamente relacionadas às atividades de chefia, de direção, de assessoramento, de coordenação estratégica e de planejamento. Não estão previstas quaisquer atividades de natureza eminentemente técnica ou próprias de servidores públicos efetivos. Sobretudo para os cargos de coordenador, é clara e expressa a atribuição para coordenar e controlar a execução de atividades relacionadas aos setores subordinados, o que é típico de cargos de chefia. Para os cargos de diretor, também são explícitas as atribuições de exercer a direção das atividades realizadas pelos setores legislativos e pelas coordenadorias e setores administrativos da Casa Legislativa.

Ainda, destaca-se que os cargos e/ou funções gratificadas de Coordenador Administrativo-Financeiro, Coordenador Operacional e Coordenador de Recursos Humanos estão alocados na estrutura administrativa de modo que existam servidores que lhes sejam subordinados, o que é requisito essencial para a validade das funções de direção e chefia. De acordo com o organograma do Projeto de Lei nº 001/2018, que dispõe sobre a estrutura administrativa básica da Câmara Municipal, a Coordenadoria de Recursos Humanos ficará responsável pelo Setor de Pessoal; a Coordenadoria Administrativo-Financeira responderá pelo Setor Contábil e Financeiro, pelo Setor de Compras e Licitações e pelo Setor de Recursos Materiais; a Coordenadoria Operacional será responsável pelo Setor de Apoio Operacional; a Diretoria Administrativa, por fim, dirige todos os órgãos supracitados. Quanto à Diretoria Legislativa, estarão vinculados a ela a Assessoria de Eventos, a Secretaria Legislativa, a Assessoria Parlamentar, a Assessoria de Bancada e a Assessoria de Comissões.

Portanto, não se encontra ilegalidade no conjunto de atribuições dos cargos em comissão e/ou funções gratificadas de Diretor Administrativo, Diretor Legislativo, Coordenador Administrativo-Financeiro, Coordenador Operacional, Coordenador de Recursos Humanos e Assessor Legislativo.

2.4 Do cargo em comissão ou função gratificada de Coordenador de Eventos

Especificamente em relação ao cargo em comissão ou função gratificada de Coordenador de Eventos, vejo como correta a observação do IGAM na orientação técnica, no sentido de que a atividade se enquadra mais adequadamente como assessoramento. Isso porque, na estrutura administrativa básica da Câmara Municipal de Vereadores, a Coordenadoria de Eventos encontra-se isolada, sem órgãos subordinados, o que descaracteriza a função de chefia do então coordenador.

Portanto, considerando que a emenda corrigiu o ponto indicado pelo IGAM, alterando o cargo para Assessor de Eventos, com adequação das atribuições, tem-se por juridicamente viável o Projeto de Lei nº 002/2018 nesse aspecto, já que, por natureza, o titular do cargo fornecerá apoio à realização de todas as espécies de eventos da Câmara de Vereadores, típica atividade de assessoramento.

2.5 Da cláusula de revogação

Para adequar o previsto no artigo 9º do Projeto de Lei nº 002/2018 à técnica legislativa constante na Lei Complementar Federal nº 95/98 (artigo 9º - “A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas”), a emenda também corrigiu adequadamente a redação da cláusula de revogação.

2.6 Das demais disposições

Por fim, não há qualquer óbice à inclusão de atribuição para o exercício de atividades externas aos cargos em comissão de Assessor de Bancada, Assessor de Gabinete da Presidência, Assessor Parlamentar I, Assessor Parlamentar II e Assistente Parlamentar, bem como à função gratificada de Assistente de Gabinete da Presidência, porque ínsita à natureza dos cargos e necessária ao desempenho da função de assessoramento. A execução das tarefas externas, por óbvio, deverá ser verificada mediante o controle de efetividade pelas autoridades competentes da Câmara Municipal, o que, aliás, já é feito através de ponto eletrônico, meio apto para a verificação do cumprimento da carga horária.

As demais disposições constantes no Projeto de Lei nº 002/2018 mantêm-se inalteradas em relação à Lei Municipal nº 1.961, de 19 de maio de 2005, que são repetidas na proposta para cumprir o objetivo de consolidar a legislação pretérita sobre a matéria, nos termos do artigo 13, §§ 1º e 2º, da Lei Complementar Federal nº 95/98.

Conclusão:

Diante do exposto, seguindo as linhas gerais das orientações técnicas nº 97/2018 e 99/2018 do IGAM, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 002/2018 e das suas emendas, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

Guaíba, 04 de janeiro de 2018.

JULIA ZANATA DAL OSTO

Procuradora



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