PARECER JURÍDICO |
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"Institui a Política de Mobilidade Sustentável e incentivo ao uso de bicicleta no âmbito do Município de Guaíba e dá outras providências" 1. Relatório:O Vereador Manoel Eletricista apresentou o Projeto de Lei nº 146/2017 à Câmara Municipal, objetivando instituir a Política de Mobilidade Sustentável e incentivo ao uso da bicicleta no âmbito do Município de Guaíba. Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto foi remetido a esta Procuradoria, para parecer jurídico. 2. Parecer:O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
A medida que se pretende instituir se insere, efetivamente, na definição de interesse local, porque diz respeito aos aspectos de mobilidade urbana, para o qual o Município é competente, nos termos do artigo 30, inc. VIII, da CF/88, nos seguintes termos: “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”. Quanto à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 146/2017 é incentivar o uso da bicicleta como meio de mobilidade urbana sustentável, o que não afronta o texto constitucional e a legislação respectiva. Ocorre que o Projeto de Lei nº 146/2017, da forma como elaborada a sua redação, contém vício de iniciativa. O sistema constitucional brasileiro se estruturou no princípio da tripartição dos poderes, na forma do artigo 2º da CF/88, de observância obrigatória pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, tendo sido distribuídas funções típicas e atípicas aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, os quais, entre si, são independentes e harmônicos. A mesma norma que institui a separação dos poderes proíbe ingerências indevidas de um poder sobre outro, de forma a garantir a já referida harmonia, motivo pelo qual a Constituição Federal estabeleceu determinadas matérias para as quais há reserva de iniciativa ao Chefe do Poder Executivo, por dizerem respeito a questões de organização administrativa e, especialmente, que estão sob o controle e gerenciamento do titular desse poder. Na CF/88, a reserva de iniciativa está prevista no artigo 61, § 1º, repetida na CE/RS pelo artigo 60, os quais preveem os inúmeros casos em que apenas o Chefe do Poder Executivo poderá deflagrar o processo legislativo. Por serem normas restritivas, tão somente essas hipóteses são reservadas ao Executivo; os demais casos são de iniciativa concorrente, garantindo-se a legitimidade das propostas por parte de membros do Legislativo. Ocorre que essas normas são demasiadamente amplas e carregam conceitos genéricos (“organização administrativa”, “servidores públicos”, “criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública”, “serviços públicos”), tornando-se quase impossível, na prática, a atividade legislativa por iniciativa parlamentar para atribuir obrigações ao Poder Executivo, porque geralmente esbarram na reserva de iniciativa legitimada pelo princípio da separação dos poderes. No caso em análise, embora seja indiscutível o mérito, o projeto de lei institui uma política pública a cargo do Poder Executivo, o qual, para atingir os objetivos previstos, realizará campanhas publicitárias de conscientização do povo, o que ultrapassa os limites do princípio da separação dos poderes na medida em que outorga ao Executivo a realização de tarefas que lhe são próprias, com invasão da sua esfera de competências. Para que não haja violação à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, de modo a não interferir na organização administrativa e nos atos de gestão do Prefeito, é preciso reformular a redação do Projeto de Lei nº 146/2017, estabelecendo as medidas previstas não como uma política pública a ser implementada pelo Executivo, mas como uma lei de incentivo ao uso da bicicleta, facultando a adoção de ações de conscientização por todos os setores. Para tanto, sugere-se a seguinte redação, já adaptada conforme as diretrizes de técnica legislativa previstas na LC nº 95/98:
Veja-se que, na redação acima proposta, deixarão de ser estabelecidas quaisquer atribuições aos órgãos públicos municipais, nem haverá interferência nos atos de organização administrativa, porquanto a norma sequer é dirigida diretamente ao Poder Público. Caso este planeje, na medida de suas possibilidades, a realização de ações de incentivo ao uso da bicicleta, a norma trará as diretrizes e os objetivos, além de reconhecer a importância desse meio alternativo de deslocamento urbano, sem deturpar, por outro lado, a independência e a harmonia entre os poderes. Assim, para que o Projeto de Lei nº 146/17 se torne viável juridicamente, nos termos do artigo 60, inc. II, alínea “d”, da CE/RS, é imprescindível realizar as alterações acima indicadas na redação, retirando a previsão das medidas como uma política pública a cargo do Executivo e instituindo as normas sob o aspecto do reconhecimento e do incentivo ao uso da bicicleta em âmbito local, sem criar atribuições aos órgãos municipais. Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria opina que a viabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 146/2017 está condicionada ao atendimento da recomendação apresentada. Guaíba, 20 de dezembro de 2017. GUSTAVO DOBLER JULIA ZANATA DAL OSTO Procurador Jurídico Procuradora O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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