Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 115/2017
PROPONENTE : Ver. Manoel Eletricista
     
PARECER : Nº 417/2017
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Prevê autorizar a poda, transplante ou supressão de árvores para os cidadãos de Guaíba"

1. Relatório:

O Vereador Manoel Eletricista apresentou o Projeto de Lei nº 115/2017 à Câmara Municipal, objetivando autorizar, em âmbito municipal, a poda, o transplante e a supressão de árvores pelos cidadãos. Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto foi remetido a esta Procuradoria, para parecer jurídico. 

2. Parecer:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A medida que se pretende instituir no âmbito do Município de Guaíba se insere, efetivamente, na definição de interesse local, eis que o Projeto de Lei nº 115/2017 visa disciplinar os atos de poda, transplante e supressão de árvores pelos cidadãos nos limites territoriais de Guaíba, o que se alinha ao estrito âmbito local, encontrando fundamento no artigo 23, inc. VI e VII, da CF/88, no artigo 13, inc. I, da CE/RS e no artigo 6º, inc. I, da LOM.

Ocorre que o Projeto de Lei nº 115/2017, embora louvável o seu objeto, contém vício de iniciativa. Para os fins do direito municipal, relevante é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE. Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Na mesma linha, dispõe, ainda, a Lei Orgânica do Município de Guaíba sobre as hipóteses de competência privativa do Prefeito:

Art. 52 - Compete privativamente ao Prefeito:

(...)

VI – dispor sobre a organização e o funcionamento da Administração Municipal, na forma da Lei;

(...)

X – planejar e promover a execução dos serviços públicos municipais;

Vale destacar que o mero fato de gerar novas despesas ao Poder Executivo não obstaculiza a tramitação de projetos de lei, desde que haja previsão do programa na lei orçamentária anual, na forma do artigo 154, I, da CE/RS e do artigo 167, I, da CF/88. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já estabeleceu o entendimento de que “Não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos.” (ARE nº 878.911/RJ, Relator: Min. Gilmar Mendes, publicado em 11/10/2016).

Sucede-se que o Projeto de Lei nº 115/2017 objetiva disciplinar serviço que envolve a prática de vários atos pela administração pública, tais como vistorias técnicas, autorizações e licenças ambientais, recebimento e processamento de pedidos de supressão, poda e transplante de árvores, o que trata, ainda que reflexamente, das atribuições dos órgãos municipais ambientais, motivo pelo qual apenas o Chefe do Executivo poderia apresentar a proposta, nos exatos termos do artigo 60, II, “d”, da CE/RS.

Destarte, apesar de ser honrosa sob o ponto de vista material, a proposta não poderia ter sido apresentada por membro do Poder Legislativo, uma vez que a iniciativa para projetos que criem ou estruturem órgãos da Administração Pública, ou que lhe atribuam obrigações, compete apenas ao Chefe do Executivo, enquanto responsável pela organização administrativa.

Além disso, como lembrou o IGAM, na orientação técnica nº 27.284/17, “Constata-se, dessa forma, a interferência diretamente na organização e funcionamento dos serviços públicos municipais, atribuição que compete privativamente ao Executivo, até também pela eventual necessidade de licença ou autorização ambiental para poda, corte, transplante e supressão de árvores, e o transporte e a destinação dos galhos.”

Assim, embora sejam admiráveis a justificativa e os termos da proposta, o Projeto de Lei nº 115/17 contém vício de iniciativa, por dispor sobre as atribuições de órgão público municipal, matéria cuja iniciativa é reservada ao Chefe do Executivo, nos termos do artigo 61, § 1º, II, “b”, da CF e dos artigos 5º, 8º, 10, 60, II, “d”, e 82, III e VII, todos da CE/RS.

Nada impede, contudo, que a proposta seja remetida ao Executivo sob a forma de indicação, com base no artigo 114 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba, para que, pela via política, o Prefeito apresente o mesmo projeto ao Legislativo, afastando, assim, a ocorrência do vício de iniciativa. 

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela inviabilidade jurídica do Projeto de Lei nº 115/2017, pela ocorrência de vício de iniciativa, nada impedindo, contudo, que seja remetido ao Executivo sob a forma de indicação (artigo 114 do RI).

Guaíba, 19 de dezembro de 2017.

GUSTAVO DOBLER

Procurador Jurídico



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