Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 078/2017
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 398/2017
REQUERENTE : Comissão de Constituição, Justiça e Redação

"Altera o artigo 76 da Lei nº 1.730/2002 e dá outras providências"

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 078/2017 à Câmara Municipal, objetivando alterar o artigo 76 da Lei Municipal nº 1.730/02, que institui o Código Municipal de Meio Ambiente de Guaíba. Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto foi remetido a esta Procuradoria, para parecer jurídico. 

2. Parecer:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

O dispositivo que se pretende incluir no Código de Meio Ambiente de Guaíba se insere, efetivamente, na definição de interesse local, além de revestir-se do caráter de norma suplementar à legislação federal. Isso porque o Projeto de Lei nº 078/2017, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), estabelece um detalhamento sobre o conceito de abuso, crueldade e maus-tratos aos animais, abstratamente previsto na Constituição Federal (artigo 225, § 1º, VII) e na Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98, artigo 32).

A respeito da competência suplementar dos municípios para legislar sobre a proteção e defesa do meio ambiente, transcreve-se a esclarecedora lição de Paulo de Bessa Antunes, um dos maiores expoentes em Direito Ambiental:

Na forma do artigo 23 da Lei Fundamental, os Municípios têm competência administrativa para defender o meio ambiente e combater a poluição. Contudo, os Municípios não estão arrolados entre as pessoas jurídicas de direito público interno encarregadas de legislar sobre meio ambiente. No entanto, seria incorreto e insensato dizer-se que os Municípios não têm competência legislativa em matéria ambiental. O artigo 30 da Constituição Federal atribui aos Municípios competência para legislar sobre: assuntos de interesse local; suplementar a legislação federal e estadual no que couber, promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. Está claro que o meio ambiente está incluído no conjunto de atribuições legislativas e administrativas municipais e, em realidade, os Municípios formam um elo fundamental na complexa cadeia de proteção ambiental. A importância dos Municípios é evidente por si mesma, pois as populações e as autoridades locais reúnem amplas condições de bem conhecer os problemas e mazelas ambientais de cada localidade, sendo certo que são as primeiras a localizar e identificar o problema. É através dos Municípios que se pode implementar o princípio ecológico de agir localmente, pensar globalmente.” (‘Direito ambiental’. 8ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, pp. 77-8).

Para sanar quaisquer dúvidas remanescentes sobre a matéria, importante destacar o entendimento firmado no STF (RE nº 586.224/SP, julgado em 5/3/2015), publicado no Informativo nº 776:

O Município é competente para legislar sobre o meio ambiente, juntamente com a União e o Estado-membro/DF, no limite do seu interesse local e desde que esse regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CF/88).

No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, verifica-se estar devidamente atendida, uma vez que o PL 078/2017 foi apresentado pelo Executivo, que possui iniciativa concorrente para a matéria, nos termos do artigo 61, caput, da CF/88, artigo 59, caput, da CE/RS e artigo 38, caput, da Lei Orgânica Municipal.

Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 078/2017 é excluir a incidência do inciso XXVI do parágrafo único do artigo 76 nos casos de rodeios, atividades culturais e campeiras. Nesse sentido, a Emenda Constitucional nº 96, de 2017, incluiu o § 7º ao artigo 225 da CF/88, prevendo: “Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos.”

Portanto, sob a ótica constitucional, são permitidas certas práticas com animais, desde que fundamentadas como manifestações culturais, tal qual ocorre com os rodeios e demais atividades campeiras. À luz do texto constitucional, desse modo, não se constata ilegalidade na proposta, embora se discuta a constitucionalidade da EC 96/17, inclusive através da ADI nº 5.728, no STF. No entanto, até o momento não existe decisão declarando a inconformidade da emenda com os dispositivos constitucionais, nem suspendendo a sua eficácia, o que torna a proposta analisada presumidamente viável sob a ótica jurídica.

Sugere-se apenas emenda ao texto do § 2º, considerando os termos da orientação técnica nº 31.185/2017 do IGAM:

§ 2º O Inciso XXVI do § 1º não se aplica aos animais de grande porte, quando em parques de rodeio, atividades culturais e campeiras. (NR)

Por fim, cabe lembrar que a proposta deve aguardar o recebimento de emendas até o dia 15 de dezembro de 2017, conforme obriga o § 2º do artigo 46 da Lei Orgânica Municipal, tendo em vista que a divulgação do projeto ocorreu em 30 de novembro (fl. 05). 

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei nº 078/2017, desde que se aguarde o prazo para o recebimento de emendas (artigo 46, § 2º, LOM). Sugere-se, ainda, a emenda apresentada para tornar mais adequada a redação do § 2º, conforme orientação do IGAM.

É o parecer.

Guaíba, 08 de dezembro de 2017.

GUSTAVO DOBLER

Procurador Jurídico



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