PARECER JURÍDICO |
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"Autoriza o Município de Guaíba a permutar imóvel com a empresa Perfil Participações Societária Ltda e dá outras providências" 1. Relatório:O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 062/17 à Câmara Municipal, que “Autoriza o município de Guaíba a permutar imóveis com a empresa Perfil Participações Societárias Ltda e dá outras providências”. O projeto veio acompanhado de exposição de motivos (fls. 02, 03 e 04). Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto de lei foi remetido a esta Procuradoria, para parecer. 2. Parecer:Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado trata da alienação de bens municipais e, sobre este tema, dispõe a Lei Orgânica do Município de Guaíba (LOM):
Quanto à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposta, pois conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, a Lei Orgânica do Município de Guaíba estabelece que:
Portanto, sob esses critérios, não se vislumbram vícios de ordem formal no projeto submetido à análise. Consta na Justificativa que o objetivo do Projeto de Lei é permutar um imóvel de propriedade do Município pela revitalização da “Praça Pedra Bonita” e a construção de dois Ecopontos, sendo estes sistemas de coleta que proporcionam a manutenção da limpeza pública, supostamente contribuindo para o bem estar da população e melhorando o aproveitamento do material no intuito de eliminar focos de lixo em vias públicas. O Chefe do Poder Executivo utiliza-se da doutrina e da jurisprudência dos bens públicos para fins de justificar o negócio jurídico e demonstrar o interesse público na sua realização. O Termo de Permuta que acompanha o Projeto de Lei dispõe sobre a finalidade do negócio; os laudos de avaliação dos imóveis, as reformas, os valores e prazos da obra de responsabilidade da empresa; as matrículas atualizadas dos imóveis e mapa com a demonstração da localização das áreas. Inicialmente, no que diz respeito ao âmbito material da proposição, cumpre trazer o conceito de permuta na lição do ilustríssimo doutrinador Hely Lopes Meirelles:
Assim, não há necessidade de que os bens permutados sejam da mesma espécie ou de igual valor para a configuração da troca. Consoante ilustra Pontes de Miranda:
Ademais, tratando-se de bem que a Administração pretende alienar por meio de permuta, cumpre notar que o imóvel em questão deverá integrar o patrimônio público municipal como bem dominical. Isso porque, não havendo serventia imediata de um bem imóvel, em tese, nada obsta que seja promovida a alienação ou a transferência do uso para o atendimento de uma finalidade pública, ainda que por meio de uma entidade privada. Destarte, a não serventia deverá ser declarada, por Comissão da Administração que aponte as condições do bem atualmente, realizando a devida avaliação do valor de mercado, em se tratando da alienação ou permuta. À luz dessas razões, ainda que para atender finalidade pública (construção de ecopontos), mostra-se necessário precisar a classificação do bem imóvel como sendo dominical para que se torne possível proceder à permuta, consoante o disposto ao art. 101, do Código Civil Brasileiro:
Da leitura desta norma, não resta dúvida de que somente os bens classificados como dominicais podem ser alienados na forma da legislação vigente, sendo inalienáveis enquanto destinados ao uso comum do povo ou a fins especiais, isto é, enquanto tiverem destinação pública. Somado a isto, a apreciação do conteúdo material da proposição depende da análise minuciosa da finalidade do uso do bem, para a verificação do efetivo atendimento do interesse público local. O interesse público, à parte a subjetividade de que o conceito está imbuído, pode ser assim definido nas palavras de Hely Lopes Meirelles:
Por conseguinte, somente é recomendável a realização do negócio se o interesse público estiver comprovado; destarte, o mérito do ato deverá ser avaliado pelo gestor público, diante dos critérios de conveniência e oportunidade, os quais serão referendados pelo Legislativo. Ademais, conforme previsão contida na Lei 8.666/1993, para a alienação de bens imóveis, o Executivo deverá proceder à avaliação prévia do bem, obter autorização Legislativa específica e realizar licitação na modalidade de concorrência:
No mesmo sentido, dispõe a LOM:
É de se observar, ainda, que não só a alienação deve estar informada de um interesse público, conforme reza o art. 95 da LOM acima transcrito, mas também a aquisição de bens pela Administração Pública deve atender a uma finalidade pública. E essa finalidade deve estar devidamente justificada para que os membros do Poder Legislativo possam, bem informados, decidir com liberdade sobre a legalidade e o mérito da aquisição pretendida. Ademais, cumpre notar que para a permuta a licitação, por regra, é obrigatória, ainda que tal obrigatoriedade possa ser excepcionada pela alínea 'c' do inciso I do art. 17 da Lei n° 8.666/93, quando atendidos os pressupostos legais. O referido artigo estabelece que a “permuta” realizável mediante licitação dispensada será aquela entre bens imóveis, sendo que o objeto da troca pelo poder público deverá deter peculiaridades que atendam as finalidades e necessidades precípuas da Administração, as quais condicionem quanto a sua localização, escolha, devendo o preço deter compatibilidade com o mercado. Não obstante, importante destacar que estes requisitos não mais prevalecem para os Estados, Distrito Federal e Municípios desde 03/11/03, em razão de liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADin n° 927-3, promovida pelo Estado do Rio Grande do Sul. No caso concreto, entretanto, a alienação direta do bem público não encontra permissivo no art. 17, inciso I, alínea “c”, da Lei de Licitações, como indicado na justificativa do projeto apresentada pelo Executivo, tendo em vista que não há qualquer previsão no projeto quanto à descrição dos imóveis particulares que serão objeto da permuta, uma vez que não se trata de permuta por outro imóvel, e sim por execução de obras. Logo, ausente qualquer justificativa para se proceder à alienação de bens municipais mediante dispensa de licitação. Nesse sentido, cumpre ainda destacar que a exigência de licitação é dispensada nesse caso apenas se comprovada a especificidade dos bens a serem permutados, devendo estar amplamente demonstrados os fatos que despertam o interesse do Poder Executivo pelo bem e a inexistência de outro com as mesmas condições para ocorrência do negócio jurídico. Vale ter sempre presente a advertência de Marçal Justen Filho, segundo o qual, “antes de promover a contratação direta, a Administração deverá comprovar a impossibilidade de satisfação do interesse sob tutela estatal por outra via e apurar a inexistência de outro imóvel apto a atendê-lo”. Conclui-se, portanto, que a dispensa de licitação para a permuta não é aplicada à generalidade dos casos, mas somente quando envolvidos objetos certos e determinados, por sua vez, indispensáveis a atender o interesse público. Caso contrário, será necessário o lançamento de processo licitatório na modalidade concorrência, sob pena de nulidade da permuta, conforme elucida Diógenes Gasparini:
No caso apresentado para análise do Poder Legislativo, sequer existem bens imóveis particulares a serem permutados, restando evidente a impossibilidade de aplicação da hipótese de dispensa prevista no art. 17, inciso I, alínea “c”, da Lei 8.666/93. Nesse sentido, cabe destacar que se destinando o instituto da permuta ao “escambo” entre bens móveis ou imóveis, parte da doutrina entende, inclusive, não ser possível a permuta de bem imóvel com serviço, que se caracteriza como bem imaterial, consoante o disposto ao art. 594, do Código Civil, o que desvirtuaria a finalidade da permuta. Entretanto, na esfera federal, a Lei nº 9.636/98 conferiu à União a possibilidade de permutar imóveis de qualquer natureza, por imóveis edificados ou não, ou, ainda por edificações a construir:
Como já visto, o art. 17, I, 'c' da Lei n° 8.666/93 somente admite a permuta de bens imóveis públicos por outros bens imóveis. No entanto, de acordo com o conceito trazido pelo art. 79 do Código Civil, "São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente". De acordo com Maria Helena Diniz, o imóvel por acessão física artificial, previsto na segunda parte do art. 79 do Código Civil:
No complemento de Sílvio de Salvo Venosa:
Considerando que as "edificações a construir", previstas na Lei Federal n° 9.636/98 são considerados imóveis por acessão física artificial, se constata a viabilidade jurídica, aplicando-se este entendimento, da permuta de bens imóveis por construção. Contudo, a troca de imóveis públicos por reformas, ou seja, por um serviço, deturpa o instituto da permuta de imóveis na Administração Pública, inviabilizando, portanto, a possibilidade deste tipo de alienação. Ressalte-se, contudo, que o § 2° do art. 30 da Lei Federal n° 9.636/98 determina que sempre que houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, tal como foi exigido no art. 95, inciso I, da Lei Orgânica Municipal. Partindo do pressuposto de que sempre haverá mais de um interessado na execução de uma obra, e que, no caso concreto, a Administração Municipal não pretende incorporar a seu patrimônio um bem determinado, já existente, insubstituível, e que é de interesse público a contratação mais vantajosa para a Administração, a permuta de bens imóveis pela construção de dois ecopontos, deverá, necessariamente, ser precedida de licitação pública, na modalidade concorrência. Ademais, é preciso alertar que ainda que existente previsão legal para a permuta, o Administrador deve analisar o alcance desta em cada caso concreto, de forma a verificar se a permuta realmente trará melhores resultados para o interesse público, enquanto existe a possibilidade, por exemplo, de que o terreno seja alienado em um determinado processo licitatório e seja instaurado outro para a construção da obra pretendida. Por fim, cumpre notar que apesar de a permuta pressupor uma troca de bens de valores equivalentes, do ponto de vista prático, creia-se que, quase na totalidade dos casos, será necessária a resolução de diferenças entre o valor atribuído ao imóvel público e o valor contratado para a obra - que poderá sofrer acréscimos ou supressões no decorrer da execução, o que deverá ser considerado no edital de licitação. Assim, diante de valores permutados que não apresentem equivalência, deverá, necessariamente, ocorrer a reposição pecuniária à parte prejudicada, para que não haja lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito de qualquer dos contratantes, na forma definida no edital e especificamente detalhada no contrato. Nesse sentido, quando houver ingresso de dinheiro aos cofres públicos, o Administrador deve se ater ao disposto no art. 44 da Lei Complementar n° 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) que, ao tratar da preservação do patrimônio público, dispõe:
Por conseguinte, ainda que a permuta nos termos apresentados no Projeto de Lei em análise fosse viável, não seria recomendável aplicar os valores excedentes em serviços de revitalização de bens da Administração, como pretendido. Conclusão:Diante de todo o exposto, a Procuradoria opina pela inviabilidade do Projeto de Lei nº 062/2017. É o parecer. Guaíba, 06 de dezembro de 2017. ___________________ ___________________ Gustavo Dobler Julia Zanata Dal Osto Procurador Jurídico Procuradora O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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