PARECER JURÍDICO |
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"Altera-se a titulação relativa ao Título VIII, acrescenta-se o Título IX, Capítulo Único, alteram´-se os Artigos 141, 142, 143, 144, 145, incluem-se os artigos 146, 147, 148, 149 e 150, acrescenta-se o Título IX, Capítulo Único, na Lei 1.027/1990 - Código de Posturas" 1. Relatório:A Vereadora Fernanda Garcia apresentou o Projeto de Lei nº 124/2017 à Câmara Municipal, objetivando acrescentar dispositivos legais ao Código de Posturas de Guaíba, garantindo o direito aos idosos, portadores de necessidades especiais e gestantes ao atendimento prioritário, com fila diferenciada e orientada de fácil e exclusivo acesso, e à reserva de vagas de estacionamentos com área superior a 100m². Encaminhado à Comissão de Justiça e Redação, o projeto foi remetido a esta Procuradoria, para parecer. 2. Parecer:O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios. A auto-organização dos Municípios está disciplinada, originariamente, no artigo 29, caput, da Constituição Federal, que prevê: “O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos”. O autogoverno se expressa na existência de representantes próprios dos Poderes Executivo e Legislativo em âmbito municipal – Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores –, que são eleitos diretamente pelo povo. A autoadministração e a autolegislação contemplam o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal. A respeito da autoadministração e da autolegislação, transcreve-se o artigo 30 da Constituição Federal, que enumera as competências materiais e legislativas dos Municípios:
As garantias trazidas na proposta se inserem na definição de interesse local. Isso porque o Projeto de Lei nº 124/2017, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (CF, art. 22), estabelece, na legislação local, as garantias de atendimento prioritário e de reserva de vagas de estacionamento aos idosos, portadores de necessidades especiais e às gestantes, o que já é reconhecido em âmbito federal (à exceção da reserva de vagas para gestantes, que ainda não é garantida), mas com o diferencial da previsão de multa pelo descumprimento da obrigação, caracterizando o exercício da competência suplementar prevista no artigo 30, inciso II, da CF/88. Além disso, a CE/RS, no artigo 13, I, já estabelece um rol de competências deferidas aos Municípios, entre as quais está a de “exercer o poder de polícia administrativa nas matérias de interesse local, tais como proteção à saúde, aí incluídas a vigilância e a fiscalização sanitárias, e proteção ao meio-ambiente, ao sossego, à higiene e à funcionalidade, bem como dispor sobre as penalidades por infração às leis e regulamentos locais.” Como bem referiu o IGAM na orientação técnica nº 28.564/2017, a medida pretendida está inserida no âmbito das posturas municipais, cuja competência para definição é do Município. No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme prevê o artigo 125, § 2º, da CF e artigo 95, XII, alínea “d”, da CE. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:
No âmbito municipal, a Lei Orgânica estabelece as competências legislativas privativas do Prefeito no artigo 119, nos seguintes termos:
Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema tratado. Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei nº 124/2017 é garantir, através da legislação local, os direitos ao atendimento prioritário e à reserva de vagas em estacionamentos aos idosos, portadores de necessidades especiais e às gestantes, com a previsão de multa pelo descumprimento das obrigações. O Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que promulgou a Convenção internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo – norma que, aliás, possui o status de emenda constitucional –, prevê, no artigo 4º, 1, que “Os Estados Partes se comprometem a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência, sem qualquer tipo de discriminação por causa de sua deficiência”, comprometendo-se a: “a) Adotar todas as medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a realização dos direitos reconhecidos na presente Convenção.” No âmbito infraconstitucional, a Lei nº 13.146/2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, estabelece, no artigo 2º: “Considera-se pessoa com deficiência aquele que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.” Sobre o atendimento prioritário na Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência, prevê o artigo 9º, inciso II, que “A pessoa com deficiência tem direito a receber atendimento prioritário, sobretudo com a finalidade de atendimento em todas as instituições e serviços de atendimento ao público.” Quanto à reserva de vagas em estacionamentos, prevê o artigo 47, caput e § 1º:
No Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741/03), a garantia de atendimento prioritário consta no artigo 3º, § 1º, inciso I:
O direito à reserva de vagas de estacionamento aos idosos está previsto no artigo 41, caput, nesses termos: “É assegurada a reserva, para os idosos, nos termos da lei local, de 5% (cinco por cento) das vagas nos estacionamentos públicos e privados, as quais deverão ser posicionadas de forma a garantir a melhor comodidade ao idoso.” Em relação às gestantes, a disciplina em âmbito federal se dá pela Lei nº 10.048, de 08 de novembro de 2000, e pelo Decreto nº 5.296, de 02 de dezembro de 2004. Quanto ao atendimento prioritário, estabelecem os seguintes dispositivos:
Quanto ao direito à reserva de vagas em estacionamentos às gestantes, ainda não houve reconhecimento em âmbito federal, mas, como foi dito anteriormente, a medida atende ao interesse local e não contém reserva de iniciativa ao Executivo, podendo ser provocada por membro do Legislativo, motivo pelo qual nada impede a sua garantia no Município de Guaíba. Assim, embora a maior parte dessas garantias esteja prevista em âmbito federal, a intenção da legisladora, nesse caso, não é apenas de “reconhecer” um direito já existente, mas, sobretudo, de trazer esses dispositivos à legislação do Município de Guaíba (Código de Posturas), com o diferencial da previsão de sanção administrativa pelo descumprimento das obrigações, o que não consta na legislação federal. Não se trata, portanto, de mera reprodução da legislação existente, mas de efetiva suplementação da legislação federal, até porque, em relação às vagas em estacionamento para portadores de deficiência, o projeto prevê o percentual de 5%, enquanto a lei federal prevê 2%, o que não torna a proposta inconstitucional, porque, no âmbito na legislação concorrente, a competência da União limita-se à edição de normas gerais (artigo 24, § 1º, CF/88), não excluindo o exercício das competências legislativas municipais (artigo 30, I e II, CF/88), cujas normas poderão ser mais benéficas. Desse modo, seguindo as linhas gerais da orientação técnica nº 28.654/2017 do IGAM, não há obstáculos materiais que impeçam a tramitação do Projeto de Lei nº 124/17, o qual atende às exigências de competência, de iniciativa e de compatibilidade vertical com os dispositivos constitucionais. É necessário, entretanto, observar o rito especial estabelecido no artigo 46 da Lei Orgânica Municipal para determinados projetos, nos seguintes termos:
É indispensável a divulgação, com a maior amplitude possível, do projeto e da exposição de motivos, de modo a possibilitar a participação popular, por entidades da sociedade civil organizada, mediante a apresentação de emendas. Sugere-se, para tanto, a realização de audiência pública e a publicação, no site da Câmara de Vereadores, de notícia convocando entidades da sociedade civil organizada para, querendo, apresentarem emendas. Caso não sejam respeitadas essas formalidades, a futura lei conterá vício formal de inconstitucionalidade, podendo ser retirada do ordenamento jurídico mediante ação direta de inconstitucionalidade ou, inclusive, ter os efeitos suspensos por meio de ação civil pública. Ainda, é preciso fazer ajustes de técnica legislativa. Isso porque, conforme refere o artigo 12, inciso III, alínea “b”, da Lei Complementar Federal nº 95/98, no processo de alteração das leis, “é vedada, mesmo quando recomendável, qualquer renumeração de artigos e de unidades superiores ao artigo, referidas no inciso V do art. 10, devendo ser utilizado o mesmo número do artigo ou unidade imediatamente anterior, seguido de letras maiúsculas, em ordem alfabética, tantas quantas forem suficientes para identificar os acréscimos”. Não é possível, portanto, renumerar as disposições de artigos e de unidades superiores em leis já existentes. Para acrescentar artigos ou capítulos em locais específicos do texto, é preciso identificar o dispositivo imediatamente anterior e acrescentar as novas disposições com a mesma enumeração, apenas incluindo os sinais “-A”, “-B”, “-C”... A renumeração de artigos e de capítulos, tal como feita, pode prejudicar a aplicação da lei porque, em muitos casos, o próprio diploma prevê, internamente, remissões aos números dessas disposições, possibilitando eventuais desordens caso passe despercebida a necessidade de renumerar todas as remissões constantes no interior da lei. Com a devida licença, segue um modelo de nova redação das disposições do projeto, que devem ser apresentadas mediante substitutivo:
Conclusão:Diante do exposto, a Procuradoria opina que o Projeto de Lei nº 124/2017 é materialmente constitucional, mas sua viabilidade formal fica condicionada ao cumprimento das seguintes exigências: a) apresentação de substitutivo, nos termos da redação acima exposta; b) ampla divulgação do substitutivo e da exposição de motivos, designando-se audiência pública e/ou publicando-se aviso no site institucional para que, em 15 (quinze) dias da referida audiência ou do registro na internet, qualquer entidade da sociedade civil organizada possa apresentar emendas à proposta (artigo 46, LOM); c) aprovação do substitutivo ao projeto em Plenário por maioria absoluta. É o parecer. Guaíba, 13 de novembro de 2017. GUSTAVO DOBLER Procurador Jurídico O Documento ainda não recebeu assinaturas digitais no padrão ICP-Brasil. |
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