Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 034/2025
PROPONENTE : Ver. Dr. João Collares
     
PARECER : Nº 066/2025
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a obrigatoriedade das escolas da rede pública e privada do município de Guaíba oferecer canais sigilosos de denúncias sobre a prática de Bullying, e dá outras providências"

1. Relatório:

O Vereador Dr. João Collares (PDT) apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 034/2025 à Câmara Municipal, o qual “Dispõe sobre a obrigatoriedade das escolas da rede pública e privada do município de Guaíba oferecer canais sigilosos de denúncias sobre a prática de Bullying, e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada a esta Procuradoria pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 94 do Regimento Interno.

2. Mérito:

Inicialmente, verifica-se estar correta a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, já que o projeto de lei apresentado propõe apenas a denominação de via pública do Município de Guaíba, matéria para a qual a iniciativa é concorrente, na forma do art. 61 da CF/88 e do art. 59 da CE/RS, aplicáveis por simetria aos Municípios, por se tratar de normas constitucionais de reprodução obrigatória. No mesmo sentido, consagra o art. 38 da LOM: “A iniciativa das Leis Municipais, salvo nos casos de competência exclusiva, cabe a qualquer Vereador, Comissão Permanente na Câmara, ao Prefeito ou ao eleitorado.”

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

As medidas de prevenção e de combate que se pretendem instituir no âmbito do Município de Guaíba se inserem, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque, além de veicular matéria de competência material do Município (artigo 227, CF), não atrelada às competências legislativas privativas da União (artigo 22, CF), o Projeto de Lei do Legislativo nº 034/2025 estabelece meios de proteção à infância e à juventude contra a prática de atos de violência física ou psicológica intencionais e repetitivos, cabendo ao Estado, à família e à sociedade coibir tais condutas de modo absolutamente prioritário.

O artigo 227, caput, da Constituição Federal prevê que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” A expressão “Estado”, obviamente, traduz-se em um conceito lato sensu, abrangendo União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Mais especificamente, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), atendendo às diretrizes constitucionais, estabeleceu um verdadeiro conjunto de normas destinadas à proteção integral e absoluta das crianças e dos adolescentes, que passaram a ser tratadas como efetivos sujeitos de direitos.

Os artigos 3º, 4º e 5º do referido Estatuto indicam, resumidamente, todos os direitos garantidos às crianças e adolescentes. Veja-se: Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

É perceptível, pois, que as medidas pretendidas no Projeto de Lei do Legislativo nº 034/2025 são compatíveis com os interesses defendidos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).

No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, as hipóteses de iniciativa privativa do Poder Executivo, que poderiam limitar o poder de iniciativa dos vereadores, estão expressamente previstas na Constituição Federal, aplicadas por simetria aos Estados e Municípios. Dispõe o artigo 61, § 1º, da CF:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva.(Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

No âmbito municipal, a Lei Orgânica estabelece as competências legislativas privativas do Prefeito no artigo 119, nos seguintes termos:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que:

I - disponham sob matéria financeira;

II - criem cargos, funções ou empregos públicos, fixem ou alterem vencimentos e vantagens dos servidores públicos;

III - disponham sobre matéria tributária, orçamentos, aberturas de créditos, concessão de subvenções, de auxílios ou que, de qualquer forma, autorizem, criem ou aumentem a despesa pública.

Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria aqui tratada, tendo em vista que, com base nos fundamentos acima expostos, não se constata qualquer hipótese de iniciativa privativa e/ou exclusiva.

Não obstante, o conteúdo normativo da proposta já está em vigor no ordenamento jurídico do Município de Guaíba nos termos da Lei Municipal nº 4.598/2024:

 

https://leismunicipais.com.br/a/rs/g/guaiba/lei-ordinaria/2024/460/4598/lei-ordinaria-n-4598-2024-dispoe-sobre-a-obrigatoriedade-das-instituicoes-de-ensino-publicas-e-privadas-seja-de-nivel-basico-fundamental-medio-tecnico-e-superior-a-oferecerem-canais-sigilosos-de-denuncias-sobre-a-pratica-de-bullying-e-da-outras-providencias?q=bullying

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela possibilidade de o Presidente, mediante despacho fundamentado, nos termos do art. 94 do Regimento Interno, proceder à devolução do PLL nº 034/2025, em razão de já estar em vigência a Lei Municipal nº 4.598, de 09 de julho de 2024, com idêntico teor.

É o parecer.

Guaíba, 10 de março de 2025.

 

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS 107.136

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10/03/2025 15:33:09
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