Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 059/2024
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 214/2024
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a Lei Municipal nº 4559/2024, que acrescenta uma vaga para o cargo de Médico Psiquiatra, para fins de incluir a carga horária específica do cargo"

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei do Executivo nº 059/2024 à Câmara Municipal, o qual “Altera a Lei Municipal nº 4.559/2024, que acrescenta uma vaga para o cargo de Médico Psiquiatra, para fins de incluir a carga horária específica do cargo.”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 94 do Regimento Interno.

2. Mérito:

Verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe a alteração da Lei nº 4.459/2024, a qual efetivou o acréscimo de uma vaga de Médico Psiquiatra ao quadro permanente de cargos, no quadro de cargos estabelecido no inciso II do art. 14 da Lei Municipal nº 1.116/93, o que está sob a reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, disposta de modo originário no art. 61, § 1º, da CF/88, aplicável por simetria aos demais entes:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observadoo disposto no art. 84, VI;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva.(Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a CF/88, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

No âmbito municipal, a Lei Orgânica dispõe no art. 119:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Portanto, verifica-se ter sido respeitada a iniciativa para a propositura do Projeto de Lei do Executivo nº 059/2024, pois apresentado pelo Executivo Municipal, enquanto responsável pela organização administrativa e pela disposição dos cargos públicos.

Em relação à competência legislativa, o art. 18 da CF/88, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo autonomia política, do ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na CF/88 para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A proposta se insere, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque altera a carga horária de cargo público efetivo da estrutura administrativa do Poder Executivo, o que, de fato, é da competência legislativa municipal (art. 30, I, da CF/88).

            Está correta a propositura de projeto de lei, aliás, para alteração da carga horária de cargos públicos, conforme jurisprudência, a qual inclusive trata da desnecessidade de impacto orçamentário e financeiro, não havendo afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal:

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE PELOTAS. CARGA HORÁRIA DOS SERVIDORES DA SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE. LEI MUNICIPAL Nº 3.116/88 E DECRETO Nº 5.879/2015. NECESSIDADE DE OBEDIÊNCIA À LEGALIDADE. 1. Rejeitada a preliminar de perda do objeto da ação. 2. O regime jurídico dos servidores públicos é concebido como complexo de regras e princípios que disciplina a acessibilidade aos cargos públicos, bem como direitos e deveres. Trata-se de núcleo normativo compreendido a partir da supremacia da Constituição, da unidade dos princípios constitucionais que materializam indicações normativas democraticamente construídas. Controle fundado na juridicidade qualificada, por meio da qual a Administração Pública submete-se ao Direito, com o propósito de evitar práticas arbitrárias. 3. A legislação municipal prevê a carga horária de cada cargo público, tendo sido disposto no § 2º do artigo 6º do Decreto nº 5.879/2015 que a "...apuração da efetividade observará a carga horária determinada para cada cargo, emprego ou função, conforme estipulado na legislação municipal ou contrato de trabalho". 4. É incontroverso nos autos que servidores da área da saúde municipal cumpriam uma jornada de trabalho inferior à carga horária estipulada para os respectivos cargos. Tal praxe, por ter sido adotada à margem da lei, não assegura a manutenção, até porque a mudança empreendida pelo Executivo, ao contrário do sustentado pelo Sindicato/apelante, não acarretou aumento da carga horária, sem o correspondente acréscimo salarial. 5. O Decreto nº 5.879/2015 nada mais fez do que impor o cumprimento da carga horária dos cargos públicos pelos servidores municipais, mediante registro eletrônico da efetividade, não alterando em nada o limite da carga horária que pudesse ensejar o pagamento de horas-extras postulado pelo Sindicato/apelante. 6. No âmbito do serviço público, além da necessária adstrição ao princípio da legalidade, inexiste direito subjetivo a determinado regime jurídico, de modo que a Administração Pública tem a liberdade de alterá-lo, sem que isso configure ofensa a direito adquirido dos servidores. 7. Manutenção da sentença de improcedência, pois a teor do parecer do ilustre Procurador de Justiça neste grau de jurisdição, a correção do equívoco administrativo deriva do poder de autotutela da administração. PRELIMINAR REJEITADA. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível, Nº 50030518120158210022, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 25-11-2021)

Informativo de Jurisprudência do TCE/SC - N. - N. 087 Período - 01 a 31 de Agosto de 2021 Consulta. Alteração da carga horária. Servidor público municipal efetivo. Caso concreto. Flexibilização trazida pelo Regimento Interno deste TCE. Interesse Público. O TCE/SC respondeu à Consulta sobre a possibilidade de alteração da carga horária de servidor público municipal efetivo e qual o instrumento normativo adequado, além de possível incidência nas vedações de atos de pessoal impostas pela Lei Complementar nº 173/2020, com o seguinte entendimento: "No regime estatutário, o Município detém poder discricionário para, unilateralmente, mediante lei formal, modificar as condições do serviço e a remuneração dos ocupantes de cargos públicos, inclusive a carga horária de trabalho, observada a iniciativa privativa, nos termos do artigo 37, inciso X, da Constituição Federal. (Inteligência dos Prejulgados 1138, 1265, 1449 e 2235 TCE)".

ALTERAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM PREJUÍZO DA REMUNERAÇÃO – CONSTITUCIONALIDADE. É constitucional a manutenção da remuneração de servidor público que teve a jornada de trabalho reduzida. Servidora pública da área de saúde impetrou mandado de segurança contra a Circular 60/15 da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, que não permitiu a implementação da redução da jornada de trabalho, de 24 para 20 horas semanais, como estabelecida pela Lei Distrital 5.174/13. O Juiz a quo concedeu a ordem para determinar o cumprimento da menor jornada, em conformidade com a lei em sentido estrito. Inconformado, o DF interpôs recurso, alegando a inconstitucionalidade da Lei Distrital, por contrariar o art. 169 da Constituição Federal, bem como a violação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Sustentou ainda, que a redução da jornada deve ser acompanhada da proporcional minoração da remuneração do servidor. Para o Relator, a referida Lei Distrital, ao reduzir o período de trabalho sem prejuízo da remuneração, quis propiciar um ganho indireto aos servidores, já que a ausência de recursos financeiros do atual cenário econômico não permite a concessão de aumento puro e simples. O Magistrado destacou que a manutenção da remuneração não implica violação ao art. 169 da CF, uma vez que a dotação orçamentária e a previsão na LDO permanecem inalteradas. Em seguida, constatou que não houve contrariedade à Lei de Responsabilidade Fiscal, pois o valor da remuneração manteve-se inalterado, ou seja, não importou em aumento de despesa com pessoal para o Distrito Federal. Por todo exposto, a Turma negou provimento ao recurso. Acórdão n. 1064731, 20160110118416APO, Relator Des. ALVARO CIARLINI, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 29/11/2017, publicado no DJe: 5/12/2017.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 059/2024, de iniciativa do Poder Executivo Municipal, por inexistirem vícios materiais ou formais que impeçam a sua deliberação em Plenário.

 

É o parecer.

Guaíba, 12 de novembro de 2024.

 

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS   

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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ICP-BrasilFERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS:01902836022
12/11/2024 17:20:05
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 12/11/2024 ás 17:19:42. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 1f12a7d51f2cf0baac998842eb0af0ba.
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