Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 094/2024
PROPONENTE : Ver. Marcos SJ
     
PARECER : Nº 192/2024
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui a obrigatoriedade de instalação de cordões de calçada e de bocas de lobo (caixas coletoras) nas vias públicas em que se observem alagamentos"

1. Relatório:

O Projeto de Lei do Legislativo n.º 094/2024, de autoria do Vereador Marcos SJ (PL), o qual “Institui a obrigatoriedade de instalação de cordões de calçada e de bocas de lobo (caixas coletoras) nas vias públicas em que se observem alagamentos”, foi encaminhado a esta Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 94 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o exercício de controle quanto à constitucionalidade e legalidade da proposição.

2. Mérito:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Quanto à matéria de fundo, esta parece conformar-se ao que dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

O Projeto de Lei do Legislativo nº 094/2024 se insere, efetivamente, na definição de interesse local, já que apenas institui, no Município de Guaíba, medidas que suplementam a legislação federal que diz respeito à drenagem urbana. A fixação de programas relacionados ao meio ambiente em âmbito municipal atende ao interesse local porque busca impulsionar setores, grupos ou atividades relevantes à comunidade, incentivando o debate e a criação de novas políticas públicas.

O artigo 30, inciso II, da CF/88 é claro ao garantir aos Municípios a competência para suplementar as normas federais e estaduais, no que couber. A interpretação adequada das regras constitucionais de distribuição de competências legislativas é a que garante ampla outorga de poderes aos Municípios, que só não podem criar normas que esbarrem na competência privativa do artigo 22 da CF, atribuída rigorosamente à União, nada impedindo, por outro lado, que legislem com base na competência suplementar para atender ao seu interesse local. Tanto é que, caso não se admitisse aos Municípios a competência para legislar sobre matérias versadas no artigo 24 da CF/88, não seria possível a formação dos típicos códigos sanitários (“proteção e defesa da saúde – artigo 24, XII), códigos ambientais (“proteção do meio ambiente” – artigo 24, VI), códigos tributários e leis de ordenamento territorial (“direito tributário” e “direito urbanístico” – artigo 24, I).

A respeito da competência suplementar dos Municípios para legislar sobre a proteção e defesa do meio ambiente, transcreve-se a esclarecedora lição de Paulo de Bessa Antunes, um dos maiores expoentes em Direito Ambiental:

Na forma do artigo 23 da Lei Fundamental, os Municípios têm competência administrativa para defender o meio ambiente e combater a poluição. Contudo, os Municípios não estão arrolados entre as pessoas jurídicas de direito público interno encarregadas de legislar sobre meio ambiente. No entanto, seria incorreto e insensato dizer-se que os Municípios não têm competência legislativa em matéria ambiental. O artigo 30 da Constituição Federal atribui aos Municípios competência para legislar sobre: assuntos de interesse local; suplementar a legislação federal e estadual no que couber, promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. Está claro que o meio ambiente está incluído no conjunto de atribuições legislativas e administrativas municipais e, em realidade, os Municípios formam um elo fundamental na complexa cadeia de proteção ambiental. A importância dos Municípios é evidente por si mesma, pois as populações e as autoridades locais reúnem amplas condições de bem conhecer os problemas e mazelas ambientais de cada localidade, sendo certo que são as primeiras a localizar e identificar o problema. É através dos Municípios que se pode implementar o princípio ecológico de agir localmente, pensar globalmente.” (‘Direito ambiental’. 8ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, pp. 77-8).

Importante, ainda, destacar o entendimento firmado no STF sobre os limites da competência legislativa municipal em matéria de meio ambiente (RE nº 586.224/SP, julgado em 5/3/2015), publicado no Informativo nº 776:

O Município é competente para legislar sobre o meio ambiente, juntamente com a União e o Estado-membro/DF, no limite do seu interesse local e desde que esse regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CF/88).

O projeto também encontra amparo sob o ponto de vista do meio ambiente no art. 225 da Constituição Federal, segundo o qual todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. A Carta Magna dispõe, ainda, ser competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal legislar sobre proteção do meio ambiente e controle da poluição (art. 24, inciso VI), e também dos Municípios, eis que a eles cabe suplementar a legislação federal e estadual no que couber, nos limites do interesse local (art. 30, incisos I e II).

Ademais, ao que tudo indica, ainda que haja certo grau de insegurança jurídica, parece estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, não havendo qualquer limitação constitucional à apresentação de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria aqui tratada, desde que não sejam previstos deveres, obrigações ou mesmo “permissões” ao Executivo no que diz respeito à logística e à operacionalização dos pretendidos programas, o que macula o projeto de vício de iniciativa.

Sobre as matérias de iniciativa legislativa do Prefeito, importa salientar que em manifestação recente o Supremo Tribunal Federal em decisão de repercussão geral do STF no recurso extraordinário com agravo nº 878.911, Rio de Janeiro, reafirma nosso posicionamento:

Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade estadual. Lei 5.616/2013, do Município do Rio de Janeiro. Instalação de câmeras de monitoramento em escolas e cercanias. 3. Inconstitucionalidade formal. Vício de iniciativa. Competência privativa do Poder Executivo municipal. Não ocorrência. Não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos. 4. Repercussão geral reconhecida com reafirmação da jurisprudência desta Corte. 5. Recurso extraordinário provido. (RELATOR: MIN. GILMAR MENDES. RECTE. (S): CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO)

No caso, a proposta aparenta não acarretar em limitação constitucional à propositura de projeto por Vereador sobre a matéria tratada, já que, com base nos fundamentos acima expostos, não se constata hipótese de iniciativa privativa e/ou exclusiva. Essa também foi a conclusão do TJRS ao julgar a ADI nº 70030187793, que versou sobre diploma legal do Município de Porto Alegre (Lei Municipal nº 10.531/2008), reconhecendo que o programa que instituía programa inserido em matéria de meio ambiente, de iniciativa parlamentar, não possuía vício de iniciativa no processo legislativo:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. NORMA MUNICIPAL QUE CRIA PROGRAMA DE REDUÇÃO GRADATIVA NO NÚMERO DE VEÍCULOS DE TRAÇÃO ANIMAL E DE VEÍCULOS DE TRAÇÃO HUMANA. VÍCIO FORMAL INEXISTENTE. Não é inconstitucional a lei de iniciativa da Câmara de Vereadores que não atribui ao Poder Executivo quaisquer ônus e merece deste a defesa de sua constitucionalidade. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE, POR MAIORIA. (Ação Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70030187793, Tribunal Pleno, TJRS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Redator: Danúbio Edon Franco, Julgado em: 05-10-2009).

Por outro lado, poderia considerar-se que a matéria diz respeito às atribuições de órgãos da administração pública municipal e estabelece normas acerca de serviços públicos de forma mais específica, para o que a iniciativa seria exclusiva do Chefe do Poder Executivo Municipal. Há linha da jurisprudência que permitiria tal conclusão:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CANGUCÚ. LEI MUNICIPAL Nº 4278/2015 . VÍCIO DE INICIATIVA. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. Lei que acrescenta atribuições administrativas à Secretaria Municipal de Obras e de Planejamento, bem como estipula critérios a serem considerados para aprovação de projetos urbanos e concessão do alvará. Iniciativa do Poder Legislativo. Vício. Afronta ao princípio da separação de poderes. ADIN JULGADA PROCEDENTE. UNÂNIME.(Ação Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70068415116, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 07-05-2018)

Ademais, o TJSP assentou a constitucionalidade de normas municipais que diziam respeito à matéria análoga, desde que a proposta não detalhasse minudentemente critérios técnicos dos bueiros e impusesse a adoção de determinados padrões de obra eliminando a possibilidade de escolha e gestão da administração:

Ação Direta de Inconstitucionalidade – Lei Municipal n.º 1.545 de 15.06.2023, que "dispõe sobre a implantação do programa bueiro inteligente como forma de prevenção às enchentes no Município de Bertioga, e dá outras providências" – Aumento de despesas sem indicação de fonte de custeio correspondente que não tem o condão de macular a lei, produzindo efeitos a partir do exercício seguinte – Lei de iniciativa parlamentar – Possibilidade – Instituição do programa em questão que não viola o princípio da reserva da Administração – Aplicação da tese fixada pelo E. Supremo Tribunal Federal no tema 917 da repercussão geral, conforme precedente específico da Suprema Corte – Inconstitucionalidade dos §§ 2.º e 3.º do artigo 1.º que, ao detalhar minudentemente critérios técnicos dos bueiros e impor a adoção do padrão em toda obra, respectivamente, acabam tolhendo qualquer possibilidade de escolha da Administração, representando intromissão indevida na gestão municipal – Ação procedente em parte. (TJSP;  Direta de Inconstitucionalidade 2057842-64.2024.8.26.0000; Relator (a): Luciana Bresciani; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 19/06/2024; Data de Registro: 20/06/2024)

VOTO Nº 39229 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei Municipal de Ribeirão Preto n.º 14.852/23, que dispõe sobre a obrigatoriedade da implantação de "boca de lobo inteligente" em novos loteamentos e empreendimentos imobiliários. Vício de iniciativa e violação à separação de Poderes. Inocorrência. Assunto de interesse local. Inteligência do art. 30, inc. I, da CF. Texto que não dispõe sobre a estrutura ou a atribuição dos órgãos da Administração, tampouco sobre o regime jurídico de servidores públicos. STF, ARE 878.911-RJ, com repercussão geral. Violação à reserva da Administração. Inocorrência. Exegese do art. 47, inc. II, da CE. Polícia administrativa. Restrições ao exercício de direitos individuais para beneficiar o interesse da coletividade. Doutrina. Texto que visa concretizar direito social, assegurando a saúde. Inteligência do art. 6º, caput, da CF. STF, ADI 4.723-AP. Inconstitucionalidade. Inocorrência. Precedentes deste C. Órgão Especial. Pedido improcedente. (TJSP; Direta de Inconstitucionalidade 2276001-08.2023.8.26.0000; Relator (a): Tasso Duarte de Melo; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 12/06/2024; Data de Registro: 14/06/2024)

É dizer, “Não ofende a separação de poderes, a previsão, em lei de iniciativa parlamentar, de encargo inerente ao Poder Público a fim de concretizar direito (..) previsto na Constituição” (STF, Pleno, ADI 4.723-AP, Rel. Min. Edson Fachin, maioria, j. 22.06.20).

Quanto à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposta. Convém destacar que o objetivo principal do Projeto de Lei do Legislativo nº 094/2024 é promover a proteção dos componentes do meio ambiente natural. A Constituição Federal, no artigo 225, caput, dispõe: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

O § 1º do referido art. 225 da CF/88, detalhando os meios de garantir a proteção ambiental, obriga o Poder Público a “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.”

Do mesmo modo, o artigo 251, caput, da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul estabelece: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo, preservá-lo e restaurá-lo para as presentes e futuras gerações, cabendo a todos exigir do Poder Público a adoção de medidas nesse sentido.”

Entre as medidas de proteção ao meio ambiente, o § 1º, VII, do referido artigo prevê: “proteger a flora, a fauna e a paisagem natural, especialmente os cursos d’água, vedadas as práticas que coloquem em risco sua função ecológica e paisagística, provoquem extinção de espécie ou submetam os animais a crueldade.”

Do ponto de vista científico, Welber Senteio Smith et al. leciona que “O aumento significativo da impermeabilização dos solos induz a diminuição na taxa de infiltração e na quantidade de águas nos terrenos. As canalizações de cursos d’água causam acúmulos e alterações nas vazões naturais das águas e a intensa movimentação de grandes volumes de terras por meio de terraplanagens provoca assoreamentos e contribui para a diminuição da capacidade de vazão dos sistemas de drenagem urbana (CARVALHO et al., 2017).

Como consequência desses impactos, temos o aumento das inundações (POLI, 2013), uma vez que os episódios de chuva e enchentes acabam tendo seus efeitos potencializados, visto a ausência de vegetação marginal, situação que favorece ainda o assoreamento do leito dos rios (NOVA et al., 2015). A ausência de vegetação marginal em decorrência do desmatamento culmina em desequilíbrios de ordem física, química e ecológica, dado que a remoção da vegetação marginal de corpos hídricos resulta na erosão do solo e consequentemente no assoreamento dos rios (SILVA et al., 2015b)”[1].

A Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei Federal nº 9.433/1997, estabelece como uma de suas diretrizes a articulação da gestão de recursos hídricos com o uso e cobertura da terra, situação que mostra uma relação direta com o Plano Diretor Municipal, instrumento instituído pelo Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/2001) - responsável pelo disciplinamento da ocupação do território e estabelecimento de diretrizes; situação que pode contribuir para a redução do aporte de sedimentos para os ambientes aquáticos.

Com efeito, a Lei Federal 11.445, de 5 de janeiro de 2007, a qual Estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, já estabelece uma série de obrigações para os entes públicos, incluídos os Municípios, sendo que a proposta ora em análise suplementa a referida legislação federal. A referida norma traz diversos dispositivos nesse sentido:

Art. 2º Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes princípios fundamentais:

(...)

IV - disponibilidade, nas áreas urbanas, de serviços de drenagem e manejo das águas pluviais, tratamento, limpeza e fiscalização preventiva das redes, adequados à saúde pública, à proteção do meio ambiente e à segurança da vida e do patrimônio público e privado;

A mesma lei federal, alterada em 2020, inclui no conceito de saneamento básico a drenagem e o manejo das águas pluviais urbanas em seu artigo 3º, I, d), prevendo a infraestrutura e instalações operacionais de drenagem de águas pluviais, o transporte, detenção ou retenção para que se amorteçam as vazões de cheias, contemplando ainda a limpeza e a fiscalização preventiva da rede pluvial:

Art. 3º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:

I - saneamento básico: conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de:

...

d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: constituídos pelas atividades, pela infraestrutura e pelas instalações operacionais de drenagem de águas pluviais, transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas, contempladas a limpeza e a fiscalização preventiva das redes; (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)

Da mesma forma a Lei Federal nº 14.026, de 2020, alterou as diretrizes nacionais para o saneamento básico previstas na Lei nº 11.445/2007 a fim de considerar serviço público de manejo de águas pluviais urbanas a atividade de drenagem urbana:

Art. 3º-D. Consideram-se serviços públicos de manejo das águas pluviais urbanas aqueles constituídos por 1 (uma) ou mais das seguintes atividades:          (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

I - drenagem urbana;          (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

II - transporte de águas pluviais urbanas;          (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

III - detenção ou retenção de águas pluviais urbanas para amortecimento de vazões de cheias; e          (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

IV - tratamento e disposição final de águas pluviais urbanas.          (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

Portanto, verifica-se que a proposta legislativa ora em apreço vai ao encontro do previsto na legislação federal, que estabelece como princípio fundamental do serviço público de saneamento básico a disponibilidade de serviços de drenagem e manejo de águas pluviais. Portanto, a norma, que já encontra amparo na legislação federal (Lei nº 11.445/2007), está sendo suplementada em âmbito municipal com base na competência prevista no artigo 30, II, da CF.

Nesse diapasão o Decreto Federal nº 7217/2010 prevê ainda que o Plano de Saneamento Básico do Município deverá abranger o serviço de manejo de águas pluviais, sendo que o PSB deve ser revisado no mínimo a cada 10 anos com diagnóstico que deve abranger o manejo das águas pluviais (art. 19, § 4º da Lei 11.445/2007 e art. 58, § 2º do Dec. 7217/2010).

Considera-se que se a medida fosse imposta aos empreendedores de loteamentos, em forma de medida de polícia administrativa e não de imposição de política pública a ser implementada pelo Chefe do Poder Executivo, a proposta traria maior segurança jurídica.

Por outro lado, constata-se que a jurisprudência dos tribunais pátrios considera que é obrigação e dever dos entes municipais a promoção de saneamento básico, incluída a drenagem urbana e manejo das águas pluviais, devendo executar de forma adequada obras necessárias para impedir o transbordamento das vias públicas (e.g. Tribunal de Justiça do RS: Nº 50009777920198210130, Julgado em: 11-09-2024; Nº 50000711820178210144, Julgado em: 22-08-2024; Nº 50886519420198210001, julgado em 22-08-2024), o que decorre do art. 23 da Constituição da República. Portanto, sob esse prisma, a proposta não cria obrigação nova para o Poder Executivo Municipal, tendo os precedentes do TJRS assentado que “1. Ao Ente público compete atuar sobre os sistemas de drenagem e manejo das águas pluviais de sua região.” (Nº 50272305820238210003).

[1] Ambiente & Sociedade n São Paulo. Vol. 22, 2019 n Artigo Original n 2019;22:e00571  Desassoreamento de rios, pág. 3 de 20

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta do Projeto de Lei do Legislativo nº 094/2024 e pela sua regular tramitação, cabendo à Comissão de Consituição, Justiça e Redação analisar pormenorizadamente a questão acerca da constitucionalidade da proposta, por haver divergência jurisprudencial quanto à iniciativa para a proposição da matéria.

É o parecer.

Guaíba, 26 de setembro de 2024.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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26/09/2024 20:22:27
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 26/09/2024 ás 20:22:14. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 2e1e604480eff527fd8f36132e19b778.
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