Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 040/2024
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 146/2024
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera o Art. 215 da Lei Municipal 2.586/2010 e dá outras providências"

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei do Executivo nº 040/2024 à Câmara Municipal, o qual “Altera o Art. 215 da Lei Municipal nº 2.586/2010, que dispõe sobre o Estatuto do Servidor Público do Município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise com fulcro no art. 72 do Regimento Interno.

2. Mérito:

No que diz respeito à competência, não há qualquer óbice à propositura legislativa em apreço. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”. Luís Roberto Barroso destaca a autonomia municipal para se auto-organizar:

Ressalte-se, por oportuno, que a capacidade de auto-organização é, do ponto de vista formal, a mais relevante manifestação da autonomia às Unidades federadas e o poder de se estruturarem tal qual um Estado, gozando de titularidade de funções da mesma natureza daquelas que compõem o Estado federal.[1]

A respeito da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o Projeto de Lei do Executivo apresentado propõe alterações no Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Guaíba, tem-se por adequada a iniciativa do Prefeito, consoante a pacífica jurisprudência do E. STF:

Ao provocar alteração no regime jurídico dos servidores civis do Estado do Rio Grande do Sul e impor limitações ao exercício da autotutela nas relações estatutárias estabelecidas entre a administração e seus servidores, a LC estadual 11.370/1999, de iniciativa parlamentar, padece de vício formal e material de incompatibilidade com a CF. [ADI 2.300, rel. min. Teori Zavascki, j. 21-8-2014, P, DJE de 17-9-2014.]

(...) a norma prevista em Constituição estadual vedando a estipulação de limite de idade para o ingresso no serviço público traz em si requisito referente ao provimento de cargos e ao regime jurídico de servidor público, matéria cuja regulamentação reclama a edição de legislação ordinária, de iniciativa do chefe do Poder Executivo. [ADI 2.873, rel. min. Ellen Gracie, j. 20-9-2007, P, DJ de 9-11-2007.] = ADI 2.856, rel. min. Gilmar Mendes, j. 10-2-2011, P, DJE de 1º-3-2011

Para os fins do direito municipal, relevante é ainda a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

  1. a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;
  2. b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;
  3. c) organização da Defensoria Pública do Estado;
  4. d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Portanto, foram respeitadas a iniciativa e a competência para a propositura do Projeto de Lei do Executivo nº 040/2024, já que apresentado pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, enquanto responsável pelo regime jurídico dos servidores públicos municipais.

A respeito do teor do Projeto de Lei do Executivo nº 040/2024, tem-se que o seu objetivo é alterar o art. 215 do Estatuto do Servidor Público do Município de Guaíba, a fim de conferir lógica semântica aos efeitos das decisões de revisões no âmbito do processo administrativo disciplinar.

A exposição de motivos justifica a apresentação do projeto com o argumento de que “Destina-se o presente projeto de lei à reforma de dispositivo constante no Estatuto do Servidor Público do Município, que trata dos processos administrativos disciplinares, de modo a conferir a devida coerência à normativa, que foi erroneamente criada com uma contradição. Isto porque o artigo estabelece que se julgada improcedente a revisão, será tornada sem efeitos ou atenuada a penalidade imposta, restabelecendo-se os direitos decorrentes dessa decisão. Assim, o pedido de alteração aqui se impõe na exata medida que, ao que nos parece, salvo melhor juízo, pretendeu o legislador dizer que será tornada sem efeitos ou atenuada a penalidade imposta, se a revisão for procedente e não o inverso. Isso é aquilo que decorre da lógica da redação. Assim, com o fito de ver adequada a presente lei propugna-se seja promovida esta alteração, para que no texto daqui por diante consta revisão julgada procedente. Pois é esta que mudará a punição”.

Em exame da legislação municipal, observa-se que as disposições acerca dos efeitos do julgamento da revisão no processo disciplinar estão previstas no art. 215 da Lei nº 2.586/2010 e, de fato, houve imprecisão na redação de seu teor:

Art. 215. Julgada (im)procedente a revisão, será tornada sem efeitos ou atenuada a penalidade imposta, restabelecendo-se os direitos decorrentes dessa decisão.

Vide, e.g., o teor do art. 182 do Estatuto do Servidor Público Federal, Lei Federal nº 8.112/1990 e do art. 254 do Estatuto do Servidor do Estado do Rio Grande do Sul – Lei Complementar nº 10.098/1994, a qual inclusive se sugere para o artigo 215 do Estatuto do Servidor Público de Guaíba:

Lei Federal nº 8.112/90

Art. 182.  Julgada procedente a revisão, será declarada sem efeito a penalidade aplicada, restabelecendo-se todos os direitos do servidor, exceto em relação à destituição do cargo em comissão, que será convertida em exoneração.

LEI COMPLEMENTAR Nº 10.098, DE 03 DE FEVEREIRO DE 1994

Art. 254. Julgada procedente a revisão, será declarada sem efeito a penalidade aplicada, restabelecendo-se todos os direitos do servidor.

Por fim, como o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Guaíba é uma Lei Complementar (art. 46, inciso VI, da LOM), só pode ser alterado por outra lei da mesma natureza, aprovada por maioria absoluta, razão pela qual devem ser garantidas à proposição a ampla divulgação e a realização de consulta pública para o recebimento de sugestões, na forma do § 1º do art. 46 da Lei Orgânica Municipal:

Art. 46 São leis complementares que dependem da aprovação da maioria absoluta dos membros da Câmara:

I - código de obras;

II - código de posturas;

III - código tributário;

IV - plano diretor;

V - código do meio ambiente;

VI - estatuto do servidor público;

VII - planos de carreira dos servidores;

VIII - lei que trata da elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.

  • Observado o Regimento Interno da Câmara Municipal, é assegurada a ampla divulgação e a realização de consulta pública aos projetos de leis complementares referidos no caput para recebimento de sugestões.

Quanto ao disposto no § 1º do art. 46 da LOM, o Regimento Interno estabelece a obrigatoriedade de divulgação de projetos de lei complementar com a maior amplitude possível com prazo de 15 dias para apresentação de sugestões:

 

Regimento Interno:

Art. 108. Na tramitação dos projetos de lei complementar do Executivo, aplicar-se-ão as regras dispostas na Seção IV deste Capítulo, com as seguintes particularidades:

I – os projetos receberão ampla divulgação à sociedade, a fim de que sejam oferecidas sugestões de aperfeiçoamento por qualquer cidadão ou entidade;

II – por decisão das Comissões Permanentes, poderão ser realizadas audiências públicas para a discussão dos projetos, convidando-se pessoas naturais e jurídicas, órgãos e entidades especializadas para delas participarem;

III – para a sua aprovação, os projetos dependem do voto da maioria absoluta dos Vereadores.

Parágrafo único. A ampla divulgação de que trata o inciso I deste artigo far-se-á por meio de publicação de edital nos meios de comunicação locais, concedendo-se quinze dias para a apresentação de sugestões de aperfeiçoamento da proposição pela sociedade.

Assim, cabe à Comissão de Constituição, Justiça e Redação publicar Edital de ampla divulgação no Diário Oficial do Poder Legislativo.

[1] Barroso, Luís Roberto, Direito Constitucional Brasileiro: O Problema da Federação, Rio de Janeiro, p. 22.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 040/2024, observada a necessidade de ampla divulgação nos termos do art. 46 da LOM para o recebimento de sugestões e aprovação por maioria absoluta dos membros da Câmara Municipal, por tratar-se de projeto de lei complementar.

É o parecer.

Guaíba, 1 de julho de 2024.

 

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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01/07/2024 14:00:50
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